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ATRIBUTOS DEMOGRÁFICOS E SATISFAÇÃO DE UNIVERSITÁRIOS COM SUA INSTITUIÇÃO DE ENSINO
DEMOGRAPHIC ATTRIBUTES AND THE STUDENTS´ SATISFACTION WITH THEIR COLLEGE
ATRIBUTOS DEMOGRÁFICOS E SATISFAÇÃO DE UNIVERSITÁRIOS COM SUA INSTITUIÇÃO DE ENSINO
Revista Gestão Universitária na América Latina - GUAL, vol. 10, núm. 3, pp. 272-295, 2017
Universidade Federal de Santa Catarina

Recepção: 03 Março 2016
Aprovação: 14 Julho 2017
Resumo: Gestor de Instituição de Ensino Superior privada tem responsabilidades pedagógicas e mercadológicas, incluindo o atendimento de expectativas dos alunos, circundantes ao aprendizado. O empreendimento deve atrair e manter universitários que buscam capacitação para estender sua empregabilidade a custo compensador em ambiente acolhedor às tais expectativas. No Brasil, onde já dispõe de métrica oficial avaliadora da qualidade-fim do curso, cabe ao gestor adotar meios próprios para acompanhar a performance quanto a fatores como Empatia, Confiabilidade e Responsividade percebidos, que afetam a satisfação (daí, a propensão de continuidade), cuja atribuição está na ordem do sujeito, mas que, agrupados, podem estar relacionados com características demográficas. Com propósito de investigar a atuação desses conjecturados preditores no hiato expectativa-percepção do serviço, foi aplicada uma survey com escala derivada da SERVQUAL sobre 289 alunos de Administração, constituindo banco de dados submetido à análise multivariada. Sexo, Idade, Renda, Tipo de escola de origem (pública ou privada) e Atuação profissional não foram encontrados como significativos para antecipar a satisfação, obrigando ao gestor a lidar com diferenças de percepção pessoalíssimas, sem o conforto de confiar em esquemas classificadores.
Palavras-chave: Satisfação, Ensino Universitário, Educação Privada, Variáveis Preditoras, Avaliação Institucional.
Abstract: Manager of Private Higher Education Institution has pedagogical and marketing responsibilities, including meeting expectations of students, surrounding the learning. The project must attract and retain students who seek training to extend their employability in a cost-effective welcoming environment for such expectations. In Brazil, which already has official appraisal metric-quality end of the course, it is up to the manager to adopt own means to monitor the performance as to factors such as empathy, reliability and perceived responsiveness, affecting satisfaction (hence, the continued propensity) whose assignment is the order of the subject, but grouped, they may be related to demographic characteristics. In order to investigate the performance of these predictors conjectured on hiatus expectation-perception of service, equipped with survey derived from SERVQUAL about 289 students of Directors was applied, forming database subjected to multivariate analysis. Sex, Age, Income, Home school type (public or private) and Professional experience were not found to be significant to anticipate the satisfaction, forcing the manager to deal with differences in subjective perception, without the comfort of relying on classifiers schemes.
Keywords: Satisfaction, College, Private Education, Predictor Variables, Institutional Evaluation.
1 INTRODUÇÃO
De início, haveria uma tensão entre a visão que trata a Educação como direito humano e aquela que entende a Educação como serviço comercial, com avanço aparentemente irreversível, tendendo para hegemônico, da última sobre a primeira, com a mercantilização crescente do Ensino Superior propiciada por - e propiciando - uma maior participação do setor privado. O fenômeno é contrabalançado em alguma medida pela demanda e vigilância da sociedade e de órgãos fiscalizadores-reguladores para que as organizações da área assumam compromissos de uma Educação de qualidade, incorporados ao conceito de responsabilidade social, distanciando-se da alcunha pejorativa de “fábrica de diplomas” (CALDERÓN; PEDRO; VARGAS, 2011).
No Brasil, a qualidade oferecida pelas Instituições de Curso Superior (IES), públicas e privadas, é acompanhada por um conjunto robusto de indicadores oficiais dentro do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), que analisa as IES, seus cursos e o desempenho de seus estudantes, considerando aspectos como ensino, pesquisa, extensão, responsabilidade social, gestão da instituição, corpo docente e a “sustentabilidade financeira tendo em vista o significado social da continuidade dos compromissos na oferta da educação superior” (BRASIL, 2004, p.1); em tese, auxiliando a gestão daquelas instituições ao disponibilizar quadros comparativos, sob uma métrica comum, ao mesmo tempo que estimula a competição pelos estudantes informados quanto às condições de cursos e das escolas.
Ora, a sustentabilidade financeira de uma organização privada se dá, no curto prazo, controlando o fluxo de caixa, com os desembolsos (na maior proporção, fixos, de salários, aluguéis e despesas financeiras) sendo compensado pelos recebimentos (essencialmente, mensalidades pagas pelos alunos). Nesse quadro, uma situação financeira saudável implica em contenção dos custos - limitada pela contrapartida à dedicação e à capacitação exigidas do corpo docente e pela necessidade de manutenção e de atualização de infraestrutura aceitável - e garantia de continuidade do quantum de alunos adimplentes, uma vez que o valor da mensalidade decorreria do mercado.
É razoável admitir que o aluno racional persistirá enquanto considerar que o investimento, no caso, o comprometimento atual e acumulado de sua renda acrescido do custo de oportunidade (tempo que poderia ser empregado em outra atividade), será mais do que compensado pela renda futura decorrente do incremento de sua empregabilidade em função das competências adquiridas (e, também, pela valoração conexa ao diploma, ajustado em função da reputação da Escola e do reconhecimento do curso, porta de entrada para algumas carreiras). Mas, a essa equação, propõe-se que deva ser acrescida uma variável de processo, relativa à satisfação com o serviço prestado (mesmo que não monetizável de forma direta), incorporada às compensações; ou a insatisfação (idem), integrada ao investimento.
Esta (in)satisfação no presente - ônus ou bônus - que influenciaria a decisão do aluno em evadir/persistir no curso, teria afetação além do indivíduo quando repercute na sustentabilidade financeira da organização e, daí em uma das condições necessárias para oferecer uma Educação de qualidade. Se tal for verdadeiro, um Educador profissional, enquanto se preocupa com a implementação e o desenvolvimento do projeto político-pedagógico do curso, deve voltar-se, do mesmo modo, talvez a contragosto, para uma dimensão bem mais corriqueira: aquela que se preocupa com a percepção contínua dos alunos (aqui, já assumidos como clientes) quanto aos aspectos tangíveis da escola, a empatia de seus funcionários, a confiabilidade e a segurança dos processos internos e a responsividade da gestão – nas condições ditas aqui no “entorno” da aprendizagem (CEA).
Admitindo a compreensão da realidade como subjetiva, mesmo quando condicionada socialmente (LUCKMANN; BERGER, 2006), a percepção das CEA seria individual. Mas, hipoteticamente e se agrupada, tal percepção poderia estar de alguma forma relacionada com características demográficos e de outra natureza dos alunos. O teste dessa hipótese se constituiu no objetivo da pesquisa, cuja questão recebeu a seguinte formulação: qual é a afetação de variáveis demográficas na satisfação de alunos de uma Instituição de Ensino Superior?
Como o propósito de dar um endereçamento apropriado ao problema proposto, foi empreendida uma survey que se serviu de escala derivada da SERVQUAL, desenvolvida em por Parasuraman, Berry e Zeithaml (1991), que vem sendo adaptada a vários contextos organizacionais, incluindo Educação Superior. A SERVQUAL delineia as expectativas do cliente relativas a um atendimento idealizado e a percepção da qualidade do serviço efetivamente prestado, através do julgamento do usuário, permitindo medir a sua satisfação (ou a sua insatisfação). A diferença entre o desempenho esperado (expectativa) e o percebido pelo cliente em cada uma das cinco dimensões propostas pelo modelo (Aparência; Confiabilidade; Responsividade; Segurança; e Empatia), determina se o serviço é considerado como de alta qualidade (satisfação) ou de baixa qualidade (insatisfação). Se a performance percebida for maior que a esperada, o cliente ficará satisfeito e o serviço será considerado como de boa qualidade. Se ocorrer o contrário, o cliente ficará insatisfeito e o serviço será considerado como de baixa qualidade. Os fatores que apresentarem maior diferença negativa, ou gap, entre o desempenho esperado e o percebido são os que deveriam, em tese, receber prioridade para melhoria pelo Gestor Educacional.
Conjuntamente à escala, foram colhidos os dados demográficos dos respondentes, para serem testados como preditores da (in)satisfação, através da análise multivariada, habilitando os dados coletados a fornecer os subsídios requeridos a solução do problema proposto.
A justificativa do estudo se lastreia na concepção que a prestação de serviço representa uma série de interações entre a organização e o cliente (PAYNE; STORBACKA; FROW; KNOX, 2009); que transita entre o idealizado/realizado, o esperado/percebido e assim, ao conferir relevância a essa confrontação, induzida pela IES ao prestar serviços aos seus alunos, a pesquisa tem mérito na medida em que se aprofunda no entendimento de uma das várias explicações para o fenômeno da evasão escolar no nível superior, que tem repercussão na sustentabilidade financeiras das IES privadas e pode comprometer a qualidade da Educação oferecida por essas entidades.
Os resultados da investigação são apresentados neste artigo em suas últimas seções, junto com limitações da pesquisa, após uma breve revisão da literatura e do detalhamento do objeto empírico e do método da investigação.
2 CONTEXTO E CONSIDERAÇÕES TEÓRICOS
2.1 DEMANDA POR QUALIDAE EM SERVIÇOS EDUCACIONAIS NO BRASIL
O setor de serviços já é responsável por mais de dois terços do Produto Interno Bruto do Brasil (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2015) com tendência a ter a sua participação ampliada, seguindo os passos dos países desenvolvidos A expansão tem trazido consigo a exigência dos consumidores por serviços de qualidade, associados ou não a produtos materiais, pois como relatam Zeithaml e Bitner (2003, p. 2), os clientes “não apenas esperam receber bens de excelência e alta qualidade; eles também têm a expectativa de juntamente com esses produtos, receber serviços de alto nível”, aprimorando-se como consumidores a cada transação.
A preocupação com a melhoria da qualidade dos serviços teria se avolumada nas décadas de 1980 e 1990 devido às transformações vivenciadas nas esferas econômica, social, cultural e tecnológica (SOUKI; PEREIRA, 2004). Nesse contexto, a gestão da satisfação do cliente constituiu-se em um sistema administrativo que visa ouvi-los, avaliar a performance da organização a partir das percepções capturadas e, em decorrência, planejar e implementar novas ações. Isso implicaria na criação de processos melhores (LOVELOCK; WIRTZ, 2006), decorrente da percepção mais clara sobre a clientela; de informações precisas e atualizadas quanto às necessidades dos consumidores; de relações de fidelização baseadas em ações corretivas; e do desenvolvimento de confiança mútua entre os atores (ROSSI; SLONGO, 1998).
A opção de implementar ações para melhorar a satisfação do cliente, subordinando as decisões da organização ao que o cliente efetivamente espera, contribui para a competividade (COURTIS, 1991) mas pode se revelar uma tarefa árdua e provocar rupturas se as implicações para operações e recursos humanos não forem pensadas com cuidado (Lovelock & Wirtz, 2006), ainda mais no contexto educacional, dadas as suas idiossincrasias. Não suficiente, haveria de se ter clareza sobre o serviço oferecido, a fim de eliminar as lacunas existentes entre a expectativa e a percepção do serviço consumido (GRONROSS, 2003; ZEITHAML, BITNER, 2003). Nisso, a avaliação da qualidade do serviço teria que ser contínua e focada no cliente, o que submete o processo à subjetividade inerente de medições dessa ordem (TURETA; ROSA; OLIVEIRA; ANTONIALLI, 2007).
A Educação não pôde se escudar frente à demanda generalizada pela melhoria dos serviços: nessa conjuntura, as IES encontram-se estimuladas a reconhecer e a atender às necessidades dos alunos, cada vez mais concientes. E, com a ampliação da oferta de cursos de graduação,vivenciada a partir de 2004 (INSTITUTO NACIONAL DE ESTUDOS E PESQUISAS EDUCACIONAIS ANÍSIO TEIXEIRA, 2012), a qualidade do serviço prestado tornou-se um diferencial para as escolas face à concorrência acirrada para captar e manter estudantes. Tal situação tem sido alvo de preocupação e de pesquisas no âmbito acadêmico a fim de entender a qualidade da Educação Superior no país. Esses estudos estariam auxiliando a gestão institucional e subsidiado a construção de métodos avaliativos, resultando na criação do SINAES, revestido de importância na defesa externa à gestão na qualidade do ensino oferecido. Já no ambiente interno, as instituições teriam de construir seus próprios sistemas de medição e de controle, tanto institucional quanto dos cursos ofertados, apoiando a tomada de decisão relativa à adequação aos padrões de qualidade da Educação Superior, atendendo principalmente às necessidades particulares dos atores envolvidos nesse ambiente, permeado de simbologias, hábitos e costumes (FORTES; TONINI; SILVEIRA, 2013).
Um movimento isomórfico, digno de nota, é relatado por Sobral (2000), aponta que AS IES estão se aproximando cada vez mais das demandas do mercado. As universidades, que antes constituíam um ambiente tranquilo em que os docentes desenvolviam suas atividades de ensino e pesquisa e o fluxo de discente era crescente e contínuo, modificaram-se. Hoje, confrontadas com elevados índices de evasão, inadimplência e ociosidade de vagas, as IES valorizam o atendimento das necessidades e das expectativas do alunato (MEYER JÚNIOR; PASCUCCI; MANGOLIN, 2012), buscando a diferenciação através da criação de valor (BOLTON; GREWAL; LEVY, 2007) . Normalmente, o acirramento da competição implicaria em uma melhor prestação de serviço, a fim de conquistar uma parcela do mercado. Contudo, como alertam Tureta et al. (2007), cabe ressalvar que algumas IES poderiam privilegiar estratégias que, embora atraiam clientes, implicam em excessiva tolerância, acarretando na perda de qualidade do ensino, deslocando-se na contramão do que se almejaria.
2.2 A SERVQUAL E OUTRAS ESCALAS DE MEDIÇÃO DE SATISFAÇÃO COM O SERVIÇO
O primeiro modelo específico para avaliação de serviços com repercussão considerável pode ser atribuído ao trabalho, consolidador de outros anteriores, empreendido pelos pesquisadores norte-americanos Parasuraman, Berry e Zeithaml (1991). Dele materializou-se a SERVQUAL. Trata-se de uma escala que compara expectativas (E) e percepções (P) de desempenho na qualidade de serviços prestados e tem como propósito servir ao diagnóstico da satisfação do cliente. As suas 22 por 2 variáveis (E & P), que podem ser adaptadas ou suplementadas, agrupadas em cinco dimensões, apontariam os pontos fortes e fracos do atendimento prestado pela organização. As dimensões da SERQUAL, tal como proposto na última revisão de seus idealizadores, são:
Aparência (ou tangibilidade): trata-se dos aspectos físicos, tangíveis das instalações, equipamentos, pessoas e materiais associados à prestação do serviço;
Confiabilidade: refere-se à capacidade de prestar o serviço prometido de forma acurada e conforme aprazado.
Responsividade (ou capacidade de resposta): trata-se da disponibilidade para ajudar o cliente e oferecer o serviço com agilidade;
Segurança: consiste na propensão e na aptidão dos funcionários em transmitir confiança e serem corteses na prestação do serviço;
Empatia: remete-se a atenção e ao carinho dispensados individualmente aos clientes.
A escala SERVQUAL é fendida como um eixo inicial para a análise da qualidade do serviço e não como resposta final para todas as questões que a envolvem. Teria como função identificar a qualidade do serviço prestado pela organização (o que o cliente deseja ou espera do serviço confrontando-se com aquilo que obtém), permitiria a comparação com outras instituições e serviria de base para tomada de decisão (PARASURAMAN; BERRY; ZEITHAML,1991).
A SERVQUAL foi usada como base para o desenvolvimento de outras escalas, como SERPERF, a INTQUAL, a HEDPERF e a PESPERF. A SEVPERF pauta-se exclusivamente na percepção do desempenho dos serviços, acenando que a qualidade do serviço conduziria à satisfação da clientela e, como consequência a intenção de compra, desconsiderando a expectativa (CRONIN & TAYLOR, 1992). A INTQUAL tem foco nas ações internas que a administração necessita implementar para prover um serviço de qualidade (CARUANA & PITT, 1997). A HEDPERF é direcionada principalmente na melhora do desempenho dos serviços prestados por IES, utilizando técnicas qualitativas e quantitativas (FIRDAUS, 2006) - no entanto, já que a HEDPERF foi desenvolvida para estudar o nível macro, não seria suficiente para capturar caraterísticas em níveis menores, ensejando a PESPERF (YILDIZ; KARA, 2009).
Entretanto, a escala SERVQUAL, suas derivações e mesmo o modelo Expectativa & Percepção (que incorpora o paradigma “expectancy/disconfirmation” - desconfirmação de expectativas - em detrimento de outras possibilidades, como o paradigma “attidudinal”) não são consensuais entre pesquisadores interessados em avaliação da qualidade em serviços. A discussão remete à validade - de conteúdo, convergente, discriminante e monológica - bem à sua confiabilidade; e ainda: à eventual deficiência no embasamento teórico; foco no processo e não no resultado; colinearidade entre as dimensões; impropriedade da comparação com as expectativas ao invés de comparação com padrões; não suprir uma medida absoluta de qualidade; problemas relativos a polaridade das opções; e, por último, a forma de aplicação, que implica em cansaço e irritação do respondente (BUTTLE, 1996).
Nesse debate, a validade da SERQUAL é, por exemplo, ratificada por Babakus e Mangold (1992) e Pitt, Watson e Kavan (1995). Em oposição, VanDyke, Kappelman e Prybutok (1997) sinalizam que o instrumento sofre de falhas conceituais (impropriedade de associar a qualidade percebida do serviço como gap; ambiguidade do construto Expectativa; incapacidade de captar as nuanças de diferentes setores) e empíricas (Confiabilidade reduzida; validade convergente pobre, baixa validade preditiva). Ainda, haveria confusão na mente dos clientes quanto aos itens das dimensões Confiabilidade, Segurança e Responsividade (LLOSA; CHANDON; ORSINGHER, 1998) e teria sido detectada baixa estabilidade nos julgamentos de percepção, mesmo com intervalo de apenas uma semana entre teste-reteste (LAM; WOO, 1997). Parte em função desses problemas, Teas (1994) e Cronin e Taylor (1992) chegam mesmo propor desconsiderar as Expectativas, o que se constituiria em negação do modelo.
Mesmo com as ressalvas, a SERVQUAL permanece como instrumento mais empregado em pesquisas de satisfação de serviços (BUTTLE, 1996, HUGHEY; CHAWLA; KHAN, 2003) e em especial, em Educação (ver a próxima seção). Como indicação de seu impacto acadêmico, uma pesquisa em 22.07.2015 com o termo “SERVQUAL” no repositório Web of Science retornou 1083 trabalhos. Mas o American Customer Satisfaction Index (ACSI) aparece como uma opção interessante. Ele foi desenvolvido pela Universidade de Michigan em 1994 e é apresentado como única medida padronizada de satisfação de clientes disponível nos Estados Unidos. O ACSI teria sido aplicado em clientes de mais de 200 empresas (que respondem por um terço do PIB do país) de 10 setores econômicos, passados apenas dez anos de seu lançamento, compondo um banco de dados com centenas de milhares de entrevistas, útil aos gestores ao suprir o conhecimento para melhorar a alocação de recursos com o objetivo de estreitar a relação entre empresa e consumidores e permitir a comparação com os concorrentes (NATIONAL QUALITY RESEARCH CENTER, STEPHEN M. ROSS SCHOOL OF BUSINESS & UNIVERSITY OF MICHIGAN, 2005).
Por ser mais complexo que a SERVQUAL e adotar filosofia semelhante (trabalhar com expectativas e percepções de clientes), o ACSI foi preterido na presente investigação em favor da escala mais simples e mais longeva.
2.3 ALGUMAS INVESTIGAÇÕES SOBRE A QUALIDADE DE SERVIÇOS DE IES NO BRASIL
Existe um razoável volume de pesquisa sobre a qualidade em serviço na área, como aquele trabalho de Fortes, Tontini e Silveira (2013) que, utilizando os modelos SERVPERF e HEDPERF, confirmaram existir uma relação não linear entre a avaliação que o alunato faz sobre a qualidade de serviços prestados pelas IES e as dimensões consideradas.
Oliveira e Ferreira (2009) aplicaram a escala SERVQUAL a fim de mensurar a qualidade de serviços no curso de engenharia de produção da Universidade Estadual Paulista; O estudo não apresentou resultado positivo nas dimensões analisadas, indicando que as percepções dos alunos estão abaixo das expectativas. Já na análise de agrupamento estatístico houve a formação de clusters nas dimensões Confiabilidade e Aparência.
Também por meio da aplicação da SERVQUAL, Nogueira e Casas (2009) buscou avaliar a qualidade dos serviços prestados de apoio e infraestrutura de uma pequena IES da grande São Paulo, sob a ótica de seus clientes internos (professores) e externos (alunos), concomitantemente. Através das análises dos dados, os autores perceberam um alinhamento entre as expectativas dos atores envolvidos (professores e alunos).
Sousa, Silveira, Fortes e Domingues (2011) compararam as dimensões dos modelos de qualidade de serviços (SERVQUAL, SERPERF, INTQUAL, HEDPERF e PSPERF). As autoras inferiram que as dimensões analisadas, além de servir para medir a qualidade dos serviços prestações, tornaram-se proposições estratégicas de avalição das IES.
Costa Filho (2012) buscou analisar comparativamente as expectativas e percepções da qualidade de serviços entre IES pública e IES privada, na cidade de Paranavaí, por meio da escala SERVQUAL. Concluiu que a maioria dos discentes possui expectativa elevada sobre a qualidade dos serviços prestados pelas duas IES; todavia, a IES privada apresentou maior desempenho segundo as percepções dos alunos. Outro achado relevante trazido pela investigação foi que para ambas as instituições, as percepções dos alunos (nas cinco dimensões analisadas) apresentou-se menor que a expectativa, evidenciando a necessidade de ajustes para assegurar a sua qualidade de serviços - resultado esse também reportado por Tureta et al. (2007) e Lourenço e Knop (2011).
A investigação com alunos do último período do curso de graduação em Administração de uma IES privada do Sul de Minas, permitiu Lourenço e Knop (2011) detectar dois grupos (mais exigentes e menos exigentes) por meio de análise estatística descritiva multivariada. Se por um lado foram encontrados aspectos bem avaliadas, por outro, ficou aparente que estruturas, processos e condutas precisariam ser revistos.
Concluindo, de tudo selecionado, trabalhado e exposto, restou-se duas evidências: (1) o modelo “expectativa & percepção” tem sido encontrado útil como indicativo da satisfação de alunos; e (2) ainda resta a explorar a eventual relação entre os gaps revelados pela SERVQUAL e características demográficas dos alunos, como proposto nesta pesquisa, que obedeceu ao método descrito a seguir.
3 MÉTODO
A pesquisa assumiu contornos de estudo de caso, descritivo, transversal e de técnica quantitativa. A concepção da investigação abrigou uma série de decisões de admitida arbitrariedade. Foi definido que:
i. A IES a ser avaliada (IES-A) deveria ser privada (assumida como de maior preocupação com a evasão), já consolidada (para assegurar alguma estabilidade à avaliação), localizada na cidade de Belo Horizonte (por conveniência), de porte (para ampliar as chances da obtenção de amostra de tamanho apropriado à análise multivariada), com o Índice Geral de Cursos Avaliados da Instituição (IGC, dentro do SINAES) mediano, que ofereça o curso de Administração (no qual, hipoteticamente, os alunos estariam mais acostumados com questões relativas à Expectativa e à Percepção), nos horários diurno e noturno (para aumentar a variabilidade das características demográficas), com CPC também mediano. Com tais parâmetros, propõe-se que o estudo de caso se aproximaria da idealização de caso característico.
ii. A população seria os alunos do 1º ao 4º período, dos oito de um curso padrão, sob a justificativa que é nesse estágio que a evasão seria mais crítica.
iii. A amostragem deveria assumir caráter de censo, oferecendo iguais condições para que todos elementos da população fossem abrigados na amostra. A taxa de resposta aceitável seria de no mínimo 75%.
iv. Seria utilizada um questionário composto de três partes: dados demográficos e variáveis de controle; expectativas frente a uma prestação de serviço excelente; e, ao final, percepções frente ao serviço prestado efetivamente pela IES – optando-se por escala do tipo Likert, tanto para as expectativas quanto para as percepções, sendo oferecidas cinco alternativas aos respondentes (de discordo permanente, grau = -2; discordo, -1; não concordo nem discordo, 0; concordo, +1; concordo totalmente, grau +2) - desenho esse que distingue a escala da SERVQUAL padrão, de sete alternativas. A justificativa para esse desenho de escala foi simplificar o trabalho para o respondente, em um questionário extenso por natureza.
Os critérios foram atendidos de forma satisfatória. A IES-A, de controle familiar, sediada em Belo Horizonte, conseguiu IGC e CPC (Administração) próximos a 2,5; portanto, no meio da faixa 3, o que indicaria uma qualidade de ensino “regular”, tornando mais crítica a percepção da qualidade das CEA. A aplicação da survey aconteceu em meados de 2014, constituindo uma amostra composta de 289 questionários de 326 respondidos (17 deles foram descartados por incompletude e erros de preenchimento) frente a uma população de estimada de 360 alunos. A proporção tamanho da amostra & tamanho da população atingiu 80% e não foram encontradas relação entre as características demográficas e os não respondentes.
A decomposição dos dados demográficos dos alunos da amostra indicou que 57,8% dos respondentes eram mulheres e 76,8% estudavam à noite (frente ao complemento, 23,2% que estudavam de manhã). A maior fração (33,9%) estava no segundo período do curso, seguida de quarto período (32,9%), primeiro período (18,0%) e, finalmente, o restante (15,3%) no terceiro período. A distribuição da Idade foi: de 17 a 19 anos = 21,1%; de 20 a 22 anos = 42,2% (classe mais frequente); de 23 a 25 anos = 20,4%; de 26 a 28 anos = 6,6% e os restantes, mais velhos, 9,7%. A maior parte era originária de escolas públicas (62,6%) e trabalhava na área do curso (62,3%), frente a 23,5% que trabalhavam em outra área e o complemento, de 14,2% que não trabalhavam. A distribuição da Renda familiar foi encontrada como: até 3,0 salários mínimos (SM) = 24,2%; de 3,1 a 5,0 SM = 31,5%; de 5,1 a 7,0 SM = 21,1; de 7,1 a 9,0 SM = 8,3% e acima de 9,0 SM = 14,9. Assim, tratar-se-ia de um grupo que pertenceria a classe média (no seu extrato inferior). É interessante observar que, como esperado, o turno diurno tem maior proporção de pessoas mais jovens e que não trabalham.
Os itens de Expectativa (Ei, i de 1 a 22) e seu par (Pi, i de 1 a 22) da survey compuseram as 5 dimensões, seguindo o modelo de Parasuraman, Berry e Zeithaml (1991) onde i = 1 a 4 determinam a dimensão Aparência; 5 a 9, Confiabilidade; 10 a 13, Responsividade; 14 a 17, Segurança; e, 18 a 22, Empatia.
Os dados foram lançados no software IBM SPSS versão 21, com dupla conferência para se reduzir erros de lançamento e submetidos a análise descritiva uni e multivariada seguindo procedimentos de Hair Júnior, Balck, Babin & Anderson (2005), a fim de detectar os gaps existentes entre as dimensões, apresentados na Tabela 1, na seção 4.
Na análise de dados da SERVQUAL levou-se em conta a indicação de Buttle (1996) para quem a computação pode ser feita de várias formas, como: item por item (e.g. P1 - E1, P2 - E2, ...P22 - E22); dimensão por dimensão (P1 + P2 + P3 + P4/4) – (E1 + E2 + E3 + E4/4), e por item isolado (P1 + P2 + P3 …+ P22/22) - (E1 + E2 + E3 + … + E22/22). Não tendo uma melhor forma, optou-se pela redundância: usar todas.
Assim, dados derivados foram obtidos com as seguintes operações, tomando uma escala ordinal em métrica:
PEi = Pi - Ei
Pi_n = Pi + P(i+1) + P(i+2) + ... + P(n-1) + Pn
Ei_n = Ei + E(i+1) + E(i+2) + ... +E(n-1) + En
PEi_n = Pi_n - Ei_n
Em complento foi aplicada a técnica de agrupamento do SPSS para os dados (Analisar > Classificar > Agrupamento de duas etapas, Medida de distância = Euclidiano, Critério de agrupamento = BIC, Número de agrupamentos = determinar automaticamente) resultando no conjunto de clusters decorrentes de variáveis como a seguir:
CPE1 ... 22 Cluster dos gaps PE1, ... , PE22, respectivamente.
CPE1_4 Cluster Aparência, à partir das variáveis: PE1 a PE4;
CPE5_9 Cluster Confiabilidade, à partir das variáveis: PE5 a PE9;
CPE10_13 Cluster Responsividade, à partir das variáveis: PE10 a PE 13;
CPE14_17 Cluster Segurança, à partir das variáveis: PE14 a PE17;
CPE18_22 Cluster Empatia, à partir das variáveis: PE18 a PE22;
CPE 1_22 Cluster Avaliação Geral, à partir das variáveis: PE 1 a PE22;
CPE1_4B Cluster (B) Avaliação, à partir da variável PE1_4;
CPE5_8B Cluster (B) Confiabilidade, à partir da variável PE5_8;
CPE9_13B Cluster (B) Responsividade, à partir da variável PE9_13;
CPE14_17B Cluster (B) Segurança, à partir da variável PE14_17;
CPE18_22B Cluster (B) Empatia, à partir da variável PE18_22;
CPE1_22B Cluster (B) Avaliação Geral, à partir da variável PE1_22.
Os agrupamentos dimensionais resultaram dois grupos, de forma apropriada, denominados: “Menos insatisfeitos” e “Mais insatisfeito”, pois em todos os casos, o valor médio de cada classe foi negativo ou próximo de zero, indicador de insatisfação.
Explica-se a duplicidade de cluster para cada dimensão pela possibilidade de de duas formas diferentes, trabalhando-se com variáveis com diferentes grau de agregação. Não sendo objetivo da pesquisa responder pela melhor forma, optou-se por ambas. É oportuno apontar que, apesar de altamente correlacionados, os agrupamentos classificam alguns casos em classes diferentes, como no exemplo: Avaliação Geral - Menos insatisfeito (161 casos) e Mais insatisfeito (128 casos), frente Avaliação Geral (B) - Menos insatisfeito (180 casos) e Mais insatisfeito (109 casos); portanto, 19 classificações discordantes do total de 289 casos; para valor de Tau-b de Kendall de 0,873 e significância de 0,000.
Para facilitar meios para visualizar os cluster formados, foi calculada a média, o desvio padrão e computado o número de casos para cada grupo (GI: Menos insatisfeito e GII: Mais insatisfeito) para cada uma das dimensões do modelo e para a Avaliação Geral. A Tabela 1 ilustra os resultados para a variáveis CPEi_nB

Grupos: GI- Menos insatisfeito; GII- Mais insatisfeito
Fonte: dados da pesquisaFinalmente, para a última fase da análise, os dados primários e derivados de Expectativas e Percepções foram cruzados com dados demográficos (Sexo, Idade, Tipo de escola de origem – privada ou pública, Renda familiar e Atuação profissional: se não trabalha; ou se trabalha na área do curso, no caso, administração; ou se trabalha em outra área) dos alunos respondentes mais duas variáveis de controle (turno e período). A utilização das variáveis de controle foi justificada por dois motivos: sua eventual atuação sobre a satisfação e, não menos importante, para servir como indicação da efetividade dos testes propostos e efetivados.
Nos cruzamentos, foram empregadas:
i. ANOVA, associado ao cálculo de médias de cada variável frente as classes da variável demográfica em análise para variáveis tomadas como intervalares (Pi, Ei, Ei_n, Pi_n,PEi, PEi_n). Salienta-se que ANOVA requer que as populações a partir das quais foram retiradas os k subgrupos sigam a distribuição normal (tem-se de analisar a normalidade da variável dependente em cada um dos subgrupos) e com variâncias iguais (homocedasticidade). Contudo, considerou-se que a violação do pressuposto de normalidade não teria consequências sérias se os grupos tiverem dimensões razoáveis (Murteira, 1990); e que, na prática, a homogeneidade da variância só se tornaria importante quando as dimensões dos grupos fossem muito diferentes - quando a amostra maior for pelo menos duas vezes maior que a menor amostra pois, quando as amostras não são fortemente desequilibradas, o efeito da heterogeneidade da variância, mesmo se acentuada, seria pouco significativo (Guimarães & Cabral, 1997).
ii. Teste não paramétrico V Cramer’s; para cruzamento de Turno, Sexo; Tipo de escola de origem e Atividade profissional com as variáveis Cluster.
iii. Teste não paramétrico Tau-b de Kendall (para Idade, Período, Renda familiar; se matriz quadrada nn) ou Tau-c de Kendall (para Idade, Período, Renda familiar; se matriz retangular nm) para as variáveis Cluster.
Aqui, é oportuno salientar que: (1) tais testes não paramétricos dispensam os pressupostos de normalidade e de homocedasticidade (Hair Júnior, Balck, Babin & Anderson, 2005); (2) em todos os cruzamentos, foi utilizado como critério de significância estatística de correlação o resultado menor ou igual 0,05; (3) trabalhou-se com a hipótese inicial H0 habitual em estatística: as variáveis em consideração não estariam correlacionadas entre si (excedendo ao limite de significância estabelecido); e (4) a hipótese alternativa HA seria assentada quando os dados levam a rejeição de H0.
Portanto, foram feitos 826 cruzamentos decorrente de 118 (variáveis originais e derivadas) multiplicadas por 7 (5 variáveis demográficas e 2 variáveis de controle), computando-se a frequência que a estatística do teste foi encontrada como significativa. Quanto maior essa frequência (e também maior a estimativa de associação), mais revelador seriam as variáveis demográficas (no caso, sobre 118 x 5 = 590 cruzamentos) e de contole (118 x 2 = 236 cruzamentos) sobre o modelo em estudo.
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Tabela 2 apresenta a distribuição de frequência das indicações dos respondentes frente a sua Expectativa quanto aos itens 1 a 22 (nomeados E1 a E22) e a sua Percepção frente aos mesmos itens (nomeados P1 a P22) nas classes: concorda totalmente (CT); concorda parcialmente (CP), não concorda, nem discorda (portanto, ponto neutro = PN), discorda parcialmente (DP) e discorda totalmente (DT). Adicionalmente, E1_22 representa a soma das ocorrências das expectativas em cada classe, da mesma forma que P1_22 representa a soma das ocorrências em cada classe. As frequências agrupadas E1_4 e P1_4 representam, respectivamente, a expectativa e a percepção quanto aos tangíveis; E5_9 e P5_9, quanto à Confiabilidade; E10_13 e P10_13, quanto à Responsividade; E14_17 e P14_17, quanto à Segurança; finalmente, E18_22 e P18_22, quanto à Empatia. Para calcular E e P, a frequência em cada classe (CT, CP, PN, DN e DT) foi ponderada, respectivamente, por: 2, 1, 0, -1 e 2. (P – E) representando a diferença da Percepção frente Expectativa para o quesito (ou grupo de quesito correspondente). Por fim, a última coluna apresenta o gap = (P-E)/E, em %, naquele item ou conjunto de itens. Pela Tabela 2, a IES-A deixou a descoberto 62,2% (última coluna da linha E1_22 ) da expectativas de seus alunos, o que representa um gap bem significativo. Isso pode ser percebido pelo deslocamento das opiniões mais concentradas nas classes CT e CP quanto às Expectativas no sentido de CP, PN e DP para as Percepções dos itens. Os demais gaps encontrados, referentes à Aparência, Confiabilidade, Responsavidade, Segurança e Empatia, são respectivamente: 52,6; 70,1; 80,5; 53,6 e 55,6%.

É interessante observar a agudeza dos itens referentes aos quesitos 10 a 13, referentes ao atendimento. Os alunos foram bem críticos nesse ponto (menor grau de Percepção). Da mesma forma, deve-se ressaltar os quesitos 13 (mais crítico de todos, com o maior gap), 10, 9, 6, 1 e 22 – extremados negativamente. Em oposição aos itens menos negativos: 3 (melhor performance, com gap pouco superior a 5%, 16 e 19.
Ainda de acordo com a Tabela 2, por mais insatisfatório que seja a performance em todas as dimensões, a Responsividade (itens 10 a 13) e a Confiabilidade (itens 5 a 9) deveriam receber tratamento mais urgente da IES-A, na opinião dos alunos.
A Tabela 3 apresenta, a título ilustrativo, o teste de correlação entre os gaps indicados na Tabela 2, onde, repassando, as varáveis PE1_4, PE5_9, PE10_13, PE14_17 e PE18_22 indicam respectivamente os agrupamentos (tal como indicado na seção anterior) da média aritmética da diferença entre a Percepção e Expectativa - portando, o gap - dos quesitos referentes à Aparência; à Confiabilidade; à Responsividade; à Segurança; à Empatia e por último o gap Avaliação geral.Observando-a, comprova-se um grau bem considerável de colinearidade, o que indica uma comunicação indesejável entre os elementos e as dimensões da SERVQUAL. Para efeito da pesquisa, fica patente que quem foi encontrado mais insatisfeito em uma das dimensões do modelo, tendia também a estar bem insatisfeito nas demais.

Nota: todas correlacoes foram encontradas significativas no nivel 0,000 (2 extremidades).
Fonte: dados da pesquisaAs Tabelas 4A a 4H apresentam os resultados do teste de associação levado a cabo conforme os passos e critérios da seção predecessora.







Nas Tabelas 4A a 4G, n = quantidade de associações com o nível de significância exigido e a relação n/N, em percentagem, indica a proporção de associações encontradas com significância estatística frente ao número total de possibilidades (no caso, 118). Assim, as duas variáveis de controle atuam de forma destacada, acima da metade das oportunidades; enquanto as váriáveis demográficas tem atuação bem inferior: Sexo, de maior proporção, foi encontrada relevante em apenas 11% das oportunidades. A Tabela 5 traz um comparativo da performance entre as variáveis demográficas e as de controle, atestanto uma diferença da ordem próxima de 10 vezes favorável às variáveis de controle.

Das tabelas dessa seção, comprova-se que a diferença favorável às variáveis de controle se mostrou presente nos dois tipos de teste empregados: intervalar, que poderia ser motivo de contestação pelo requisito de normalidade e homocesdasticidade entre os grupos; e o não paramétrico, ainda que de menor poder, mas que dipensa os requisitos.
Por outro lado, quer considerando as variáveis de controle quer as demográficas, as associações, quando existentes, são fracas. Por exemplo, considerando “Período”, a média das associações, no caso a estatísta Eta, não passou de 0,208; com a menor associação com o nível de significância aceito foi 0,112 e maior não passou de 0,333 (tomadas em módulo, independentemente do sinal da associação, em todos os casos).
Uma leitura dos dados permite afirmar, com razoável certeza, que a insatisfação dos alunos com a IES-A é ligeriamente menor entre os alunos do turno diurno (em todas as dimensões da SERVQUAL e também na Avaliação Geral). Também, que a medida que os alunos vão avançando no curso, do primeiro para o quarto período, a insatisfação, que já de início é alta, avança um pouco mais, dependendo do teste, em todas as dimensões e no geral (tratamento intervalar) ou com exceção em Confiabilidade (tratamento não paramétrico, considerando os clusters).
Entre as 38 associações com as variáveis demográficas, aquelas mais interessantes, de maior grau de agregação são: CPE10_13B (cluter de Responsividade agrupado pela variável PE10_13) com Sexo; PE10_13 (novamente, Responsividade) e CPE18_22B (cluster de Empatia) com Idade; e E1_22 (Expectativa conjunta) com Renda familiar.
Quanto à Responsividade, as mulheres tenderam a se alistarem com maior frequência do que esperado, se fosse válido H0, no grupo “Mais insatifeito” (composto por 109 alunos, de PE10 _13 médio de -1,982 e desvio-padrão de 0,708) em detrimento do grupo “Menos insatisfeito (com 180 alunos, de PE10_13 médio igual a -0,200, desvio-padrão de 0,540). Daí, haveria rejeição de H0, para V de Cramer de 0,116 e Sig. = 0,049.
Ainda quanto à Responsividade, as pessoas mais velhas, acima de 23 anos, foram encontradas com PE10_13 de -1,099, frente aos mais jovens, de -0,740, diferença essa com nível de significância de 0,031 (e Eta = 0,192), que implicou em rejeição de H0 para esse teste.
A diferença quanto a Idade também foi encontrada significativa, agora quanto ao gap de Empatia, considerando os dados agrupados. Os alunos mais velhos foram encontrados com maior frequência do que esperado, se fosse válido H0, no grupo “Mais insatisfeito” (composto por 124 alunos, de PE18_22 médio igual a -1,4806 para desvio-padrão de 0,653) frente ao grupo “Menos insatisfeito” (com 165 estudantes, para PE18_22 médio igual -0,036 e desvio-padrão de 0,402). Daí, haveria rejeição de H0, para Tau-c de Kendall de 0,125 e Sig. = 0,047.
Por último, foi detectada uma relação interessante entre “Renda” e Espectativa Total (E1_22): foi constatada um diferença (Sig. = 0,045 e Eta = 0,183) entre as faixa de renda, onde “Até 3,0 Salário Mínimos (SM)”, E1_22 médio foi de 1,128, desvio-padrão de 0,637, com 70 alunos; “De 3,1 à 5,0 SM” = 1,181; 0,618; e 91; “De 5,1 à 7,0 SM = 1,012; 0,644 e 61; De 7,1 à 9,0 SM” =1,418; 0,479; 24; e “Acima de 9,0 SM” com E1_22 médio de 0,983; desvio-padrão de 0,729; com 43 respondentes.
5 CONCLUSÕES
Rememorando, o objetivo perseguido na pesquisa foi responder se algumas variáveis demográficas selecionadas poderiam explicar o grau de satisfação de universitários frente à sua instituição de pesquisa (mais especificamente, a satisfação quanto algumas das condições específicas ao entorno do aprendizado: aspectos tangíveis da escola, a empatia de seus funcionários, a confiabilidade e a segurança dos processos internos e a responsividade da gestão).
As variáveis demográficas selecionadas foram: Sexo, Tipo de escola de origem, Renda familiar, Idade e Atividade profissional. Foram descartados a priori, outras como raça (ou cor), religião e local de nascimento.
Estudando-se o caso da IES-A, descobriu-se que não se trata de satisfação e sim de “grau de insatisfação” e que, com algumas ressalvas – apresentadas na parte final da seção 4, é aceitável admitir que as variáveis demográficas selecionadas não são boas preditoras do grau de insatisfação dos alunos, pois foram poucas e de pequeno valor estatístico as associações encontradas e nenhuma delas explica, mesmo que parcialmente, a variabilidade do grau de insatisfação geral (no máximo, por uma ou outra dimensão) que, em última instância, entra como ônus na decisão de continuação do curso.
Foram concedidas amplas oportunidades para que tais variáveis se apresentassem como viáveis ao entendimento da variabilidade do grau de insatisfação entre os estudantes. Em paralelo, para testar a conveniência da análise empreendida, estudou-se o comportamento quanto ao turno e ao período do aluno no curso. De modo geral, os testes captaram a associação entre as variáveis de controle e as dimensões e a avaliação geral do grau de insatisfação. Não se pode dizer o mesmo quanto às variáveis demográficas. Portanto, propõe-se que o fato de não se encontrar as eventuais associações entre as variáveis demográficas e grau de insatisfação não decorre de insuficiências do desenho da técnica de pesquisa.
A repercussão prática do achado está na indicação que, submetida, grosso modo, às mesmas condições ao entorno da aprendizagem, as pessoas as percebem de forma distinta e não relacionadas a Sexo, Idade, Renda familiar, Tipo de escola de origem e Atividade profissional. O entendimento dessa reação se evidencia complicado, desgastante e como se não bastasse, deve ser dinâmico (ver variação do grau de insatisfação em função do período) e circunstancial (ver variação do grau de insatisfação em função do turno diurno ou noturno). Ao final, resta ao gestor educacional de dar atendimento personalíssimo às necessidades de seus clientes, de classe muito especial, o aluno-universitário.
Posto isso, é imperioso apontar algumas das limitações do achado. A mais óbvia é que se trata de um estudo de caso e assim, a extensão para outras IES e, na mesma IES, para outros cursos, tem risco não determinável. Outras insuficiências e potenciais questionamentos estão no desenho metodológico em si: (a) se aplicar testes estatísticos a amostra, por maior que fosse, não aleatória; (b) definição enviesada da população, pois essa não alcançou alunos que, de tão insatisfeitos – ou, por outro motivo – abandonaram o curso; (c) não lidar empiricamente com a relação pressuposta entre evasão e grau de insatisfação; (d) não acompanhar o grau de insatisfação do quinto ao oitavo período; e (f) a opção por uma escala (SERVQUAL) e pelo modelo expectativa-percepção em detrimento de outros, situação que pode ser discutida mais devidamente com a literatura disponível.
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