Resumo: Este artigo analisa como o Brasil e o mundo avançaram na última década em relação ao percentual de domicílios com acesso a banheiros e também em relação ao fim da defecação a céu aberto. Aponta que estes progressos se devem em grande parte à pressão exercida por iniciativas mundiais, como os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. Embora se reconheça a melhoria dos indicadores no território nacional, interessa verificar se esse avanço se deu de modo que respeitasse a equidade pretendida pelas políticas de saúde e de saneamento. Utiliza dados dos últimos dois censos, considerando o ano a partir do qual a universalização de acesso a banheiros e o fim da defecação a céu aberto ocorrerá no Brasil. Com apoio de mapas temáticos, conclui que foi possível identificar que o fim da defecação a céu aberto e do acesso universal a banheiros não se darão de forma uniforme no território.
Palavras-chave:Defecação a céu abertoDefecação a céu aberto, Banheiros Banheiros, Equidade Equidade, Saneamento Saneamento.
Abstract: This article analyzes that Brazil and the world advanced over the last decade in relation to the percentage of households with access to toilets and also towards the end of open defecation. These progresses are in large part due to pressure from global initiatives such as the Millennium Development Goals and the Sustainable Development Goals. Although Brazil improved its situation, it is important to verify whether this advance occurred in a way that respects the equity sought by health and sanitation policies. By using data from the last two censuses, the year from which the universalization of access to toilets and the year from which there will be no open defecation in Brazil were estimated. With the support of thematic maps, it was possible to identify that the end of open defecation and the universalization of access to toilets will not take place in an equitable manner in the Brazilian territory.
Keywords: Open defecation, Toilets, Equity, Sanitation.
Artigos - Dossiê Temático
SAÚDE SEM BANHEIROS?: evolução da defecação a céu aberto e do acesso a banheiros no Brasil
HEALTH WITHOUT TOILETS?: open defecation and access to toilets evolution in Brazil.
Recepção: 09/12/15
Aprovação: 22/02/16
Apesar dos recentes avanços globais em relação ao saneamento básico, o número de pessoas sem acesso a instalações sanitárias ainda se apresenta como um desafio. Segundo dados de 2015 do Joint Monitoring Programme1, uma em cada oito pessoas defecam a céu aberto no mundo, totalizando quase um bilhão de pessoas (UNITED NATIONS CHILDREN'S FUND; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2015a).
Essa situação vem ganhando atenção nas arenas internacionais. Entre as iniciativas mundiais relevantes, podem ser citadas as metas dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (UNITED NATIONS, 2000); o reconhecimento do World Toilet Day pela Assembleia Geral das Nações Unidas (2013); e o recente lançamento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, que constituiu como meta o fim da defecação a céu aberto em 2030 (UNITED NATIONS, 2015). Entre os muitos indicadores existentes sobre as condições de saneamento, a falta de acesso a banheiros e, por consequência, a defecação a céu aberto, são considerados como muito importantes (DAHAL et al., 2014). De fato, a falta de acesso a instalações sanitárias adequadas possui impactos econômicos e sociais importantes, e está relacionada a uma série de doenças, apontadas no Quadro 1.
No Brasil, país que detém o sétimo maior Produto Interno Bruto (PIB) do mundo (BANCO MUNDIAL, 2015), milhões de pessoas não possuem acesso a instalações sanitárias adequadas. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) (2011b), o número de brasileiros que habitam domicílios sem acesso a banheiros ou sanitários, ou seja, que defecam a céu aberto, é de cerca de seis milhões de cidadãos.
Para fazer frente à situação de saneamento no país, em 2007, foi promulgada a Lei n.º 11.445, de 5 de janeiro, que instituiu as diretrizes gerais para o saneamento básico. Esta lei traz como princípio fundamental a universalização do acesso ao saneamento básico, definida como a ampliação progressiva do acesso de todos os domicílios ocupados ao saneamento básico (BRASIL, 2007). Outro princípio da referida lei de importância para este trabalho é o da equidade. Tal princípio está relacionado à ausência de desigualdades no acesso ao saneamento pelos diferentes tipos de estratificação social, como, por exemplo, nível de escolaridade, local de residência, renda, gênero, etc. (LUH et al., 2013). Em outras palavras, todos devem ter acesso ao saneamento, sem exclusões de qualquer natureza. Isso significa que, formalmente, as políticas de saneamento devem priorizar a redução do déficit, inclusive de banheiros e sanitários.
No âmbito do Governo Federal, o Brasil vem tentando debelar esse déficit por meio de programas específicos de construção de banheiros, a exemplo daqueles executados por meio da Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) (2013, 2014), entidade vinculada ao Ministério da Saúde (MS). Também, programas habitacionais da União, como o Minha Casa, Minha Vida, atuam incidentalmente sobre o déficit, considerando que a construção das instalações sanitárias é requisito mínimo para os projetos do programa (BRASIL, 2011).
Apesar dos esforços do governo central, é clarividente que o desafio de universalizar o acesso a banheiros passa também pelo empenho dos entes subnacionais. Também, sabe-se que há correlação entre a falta de instalações sanitárias e a condição de pobreza extrema (UNITED NATIONS CHILDREN'S FUND; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2015a), o que indica tanto que as intervenções do Estado para a construção de banheiros são fundamentais para o desenvolvimento, como também que as políticas redistributivas (v.g. Bolsa Família) podem influenciar na redução do número de domicílios cujos moradores defecam a céu aberto.
Considerando o caso brasileiro, o objetivo deste artigo original é analisar, com base nos dados dos dois últimos censos, como se comportou o acesso por parte da população brasileira às instalações sanitárias na década de 2000-2010, focando no número de domicílios cujos moradores defecam a céu aberto e no número de domicílios que possuem instalações sanitárias adequadas. Também, visa prever, a partir dos dados da década em comento, quando o Brasil universalizará o acesso a banheiros a todos os cidadãos.
De forma mais específica, este trabalho visa analisar, utilizando-se de instrumentos de espacialização das variáveis (mapas temáticos), como os avanços da última década relacionados ao tema se distribuíram no território nacional, de forma que seja possível verificar as condições de equidade em relação ao acesso a banheiros e à defecação a céu aberto.
2 CATEGORIAS DE ANÁLISE: defecação a céu aberto e acesso a banheiros
A defecação a céu aberto é o ato de dispor fezes humanas em corpos hídricos, em praias ou em quaisquer outros espaços abertos (UNITED NATIONS CHILDREN'S FUND; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2015b). Também se considera na mesma categoria a disposição de fezes humanas como resíduos sólidos, ou seja, dispostos à semelhança do que se passa com o lixo (UNITED NATIONS CHILDREN'S FUND; WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2015b).
No âmbito dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, criou-se uma Escada do Saneamento2, para ilustrar quais as situações menos adequadas (base da escada) e as mais desejáveis (topo da escada). Conforme se pode ver na Figura 1, a defecação a céu aberto é a situação mais desfavorável para as políticas de saneamento, visto que há grandes riscos de contato do indivíduo com o material excretado. Dessa forma, para fins deste trabalho, esta categoria será analisada, por ser entendida como a mais prejudicial para a população.
Por outro lado, no topo da escada, estão as duas categorias em que as instalações sanitárias não são compartilhadas entre diversos domicílios, i.e. a situação em que cada habitação possui sua própria instalação sanitária. Embora alguns autores sugiram que instalações compartilhadas podem ser sanitariamente adequadas (EXLEY et al., 2015; HEIJNEN et al., 2014), é de verificar que há ganhos não relacionados à saúde nas instalações individuais, especialmente aqueles vinculados à privacidade, à dignidade e ao bem- estar.
Essa observação é importante em razão de que este trabalho utilizará dados do IBGE, que, por sua vez, distingue banheiros e sanitários em termos de compartilhamento, como pode ser verificado no Quadro 2.
Assim, para ser considerado banheiro, não pode haver compartilhamento do cômodo entre domicílios, bem como deve dispor de teto e paredes e possuir chuveiro ou banheira e vaso sanitário. Claramente, essa é a categoria de análise tomada como a mais desejável para a população brasileira.
Destarte, este trabalho avaliará as duas categorias apontadas acima, mais especificamente por meio da análise da redução de domicílios cujos moradores defecam a céu aberto e no aumento de acesso a banheiros, conforme definição do IBGE.
3 METODOLOGIA
Utilizando-se os dados do Censo 2000 e 2010, analisar-se-á o comportamento do percentual de domicílios com acesso a banheiros e de domicílios nos quais os habitantes defequem a céu aberto (INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA, 2011a; 2015). Para a primeira categoria, a situação ideal é o acesso universal, ou seja, da totalidade da população nacional; para a segunda, o objetivo seria a redução absoluta do número de domicílios nessa situação.
Visando fazer frente ao objetivo descrito no parágrafo anterior, para cada censo, utilizaram-se os microdados da categoria universo, no grupo referente às características dos domicílios, desagregados no nível de setor censitário. Este é o menor nível de desagregação possível no censo, e foi utilizado em razão de permitir qualquer nível de agregação no território nacional (por Região, UF, etc.).
Os dados utilizados neste trabalho foram os dispostos no Quadro 3.
O acesso a banheiros em determinado ano (2000 ou 2010) foi calculado conforme a equação3 abaixo.
A evolução dos domicílios com acesso a banheiros seguiu a equação4 abaixo.
O indicador Evoluçãoacesso a banheiros (2010-2000) resulta em uma taxa de evolução no acesso a banheiros na década. Para calcular o ano em que determinado território universalizará o acesso a banheiros, utilizou-se a fórmula5 abaixo.
O percentual de domicílios cujos moradores defecam a céu aberto seguiu a seguinte equação6:
A redução do percentual de domicílios cujos moradores defecam a céu aberto foi dada pela equação7:
O indicador ReduçãoDom.Def.Ceu Aberto(2010-2000) resulta em uma taxa de redução de domicílios nos quais os moradores defecam a céu aberto, referente à década de 2000 a 2010. Para calcular o ano em que determinado território porá fim à defecação a céu aberto, utilizou-se a fórmula8 abaixo:
Para a análise espacial dos anos de universalização de acesso a banheiro e de fim da defecação a céu aberto, utilizaram-se as malhas digitais do IBGE (2013). Para fins de elaboração dos mapas temáticos, utilizaram-se as microrregiões como unidade territorial de análise, em razão de se configurarem como o menor nível de agregação para o qual há comparabilidade entre os censos de 2000 e 2010. Os municípios, talvez a unidade territorial ideal de análise, não eram comparáveis, visto que diversos deles foram criados na década em comento; ao contrário das microrregiões, que se mantiveram constantes nos dois censos.
Para a representação gráfica, foi utilizado o software ArcMAP 10.1®.
4 DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
4.1 Acesso a banheiros
Na Tabela 1, é possível verificar – por região, UF e em todo o território nacional – o percentual de domicílios com acesso a banheiros, a evolução percentual na década e o ano estimado de universalização do acesso, considerando a taxa de aumento do acesso na década.
Inicialmente, é possível perceber que o Brasil, mantido o ritmo da década de 2000 a 2010, universalizará o acesso a banheiros em 2018. No entanto, num país de dimensões continentais, a média pode esconder mais do que revelar: ao observar-se a situação da Região Norte do país,ver-se-á que a universalização só ocorrerá em 2019, ao passo que nas regiões Centro-Oeste e Sul, a universalização estimada foi em 2014. Em termos de região, é possível perceber que o Norte e Nordeste possuem situações mais desfavoráveis, seguidos pela Região Sudeste e Sul e Centro-Oeste.
Essa mesma análise pode ser realizada, considerando-se os diversos estados- membros. Embora o Estado de São Paulo já tenha universalizado o acesso a banheiros em 2010, o Estado do Acre só debelará todo o déficit em 2025. Abaixo, a Figura 2 apresenta o número de estados no Brasil por ano de alcance da universalização de acesso a banheiros.
Pela figura, é possível perceber que apenas onze estados já universalizaram o acesso a banheiros (ano de 2015 e anteriores) e que, considerando que a universalização para o território nacional será atingida em 2018, cinco estados estarão atrasados em relação à media do país: Maranhão, Piauí, Acre, Amazonas e Pará.
No entanto, considerando as dimensões dos Estados brasileiros, analisar-se- ão os anos de universalização de acesso a banheiros por microrregião, conforme mostrado na Figura 3.
Pelo mapa, é possível perceber que a demora na universalização do acesso é uma característica típica da região Norte e Nordeste do país e do norte do Estado de Minas Gerais e Goiás, embora, neste último, a mancha seja menos extensa. Interessante notar que as manchas mais escuras na Região Nordeste estão localizadas no semiárido brasileiro, região de baixo desenvolvimento econômico e com alto índice de pobreza extrema. Importa perceber também que, apesar de localizado na Região Nordeste, o Estado do Rio Grande do Norte universalizou o acesso a banheiros na maior parte do seu território. No Norte do país, algo parecido ocorre com o Estado de Rondônia.
Com características semelhantes ao semiárido em relação à renda, é possível verificar que a região da calha do Rio Amazonas na região Norte do país, possui diversas regiões de vermelho mais intenso, em que a universalização se dará só após o ano de 2025.
Apesar das áreas citadas, em que a universalização tipicamente tardará, é possível perceber que, mesmo em estados e regiões em que a universalização se daria mais rapidamente, como a Região Sul, há microrregiões que nos afirmam que o acesso não se dará de forma equitativa no tempo. De fato, os três estados do Sul do país possuem diversas manchas no mapa, locais em que a universalização só ocorrerá entre os anos de 2016 e 2020. Em uma microrregião de Santa Catarina, o acesso universal só ocorrerá entre os anos de 2021 e 2025.
No Centro-Oeste, o Estado com mais manchas é o Mato Grosso do Sul, especialmente no lado ocidental do território. Entretanto, também há manchas no Estado de Mato Grosso, de Goiás e, surpreendentemente, no Distrito Federal. Na Região Sudeste, além do já comentado Estado de Minas Gerais, especialmente na sua porção Norte, é possível reconhecer manchas no Estado do Rio de Janeiro. Os estados de São Paulo e Espírito Santo possuem pouquíssimas ocorrências, tendo a maioria de suas microrregiões cores claras, que indicam universalização até o ano de 2015.
4.2 Defecação a céu aberto
Na Tabela 2, é apresentado - por região, UF e em todo o território nacional - o percentual de domicílios em que os moradores defecam a céu aberto, bem como a redução percentual na década e o ano estimado de fim de defecação a céu aberto no território, considerando a taxa de redução na década.
Como era esperado, a situação de defecação a céu aberto está mais próxima de ser resolvida do que aquela referente à universalização de acesso a banheiros. Reitera-se que a falta de acesso a qualquer tipo de instalação para a disposição sanitariamente adequada das fezes se mostra como a pior conjuntura a que pode estar submetida a população, em relação aos temas discutidos neste artigo.
Segundo os dados dispostos na Tabela 2, 2015 figura como o ano de fim de defecação a céu aberto no Brasil, mantido o ritmo da década de 2000 a 2010. No entanto, as desigualdades no território continuam a mostrar- se, ainda que menos elevadas do que aquelas verificadas na Tabela 1.
Considerando as regiões do país, percebe-se que o mesmo padrão se repete em relação aos banheiros: as regiões Norte e Nordeste estão em situação mais desfavorável, seguidos pela Região Sudeste, Sul e Centro- Oeste. A amplitude entre regiões, neste caso, é pequena, de apenas 4 anos para o fim da defecação a céu aberto. Em relação aos estados, ao considerar os que já atingiram o fim da defecação a céu aberto (ano de 2015 e anteriores), tem-se 19 estados. Até o final do ano, deste ano de 2016, 23 estados. No extremo oposto, há os estados de Roraima e Piauí, que porão fim à defecação a céu aberto em 2020 e 2021, respectivamente. Em posição intermediária, estão os estados do Amazonas e do Acre, que não terão mais defecação a céu aberto em 2017 e 2018, respectivamente.
Realizando o mesmo procedimento da análise de universalização de banheiros, analisar-se-ão os anos para o fim da defecação a céu aberto por microrregião, conforme mostrado na Figura 4.
Com base no mapa temático, é possível perceber que a demora para o fim da defecação a céu aberto não se apresenta como um problema típico do centro-sul do país. Note-se que a Região Sul (com exceção de uma microrregião no Estado do Rio Grande do Sul), Centro-Oeste (à exceção de duas microrregiões no Mato Grosso e uma no Estado de Goiás) e a Região Sudeste (exclusive a porção norte do Estado de Minas Gerais) não possuem manchas intensas no território. De fato, na maior parte destas regiões, o fim da defecação a céu aberto já deve ter ocorrido.
Mesmo para a Região Nordeste e Norte, percebe-se que a mancha se apresenta menor e menos intensa do que aquela relacionada à análise da Figura 3.
No entanto, é importante frisar que as manchas mais escuras na Região Nordeste continuam localizadas no semiárido brasileiro e, na Região Norte, continuam localizadas na calha do Rio Amazonas. Isso significa que, em parte dessas regiões (v.g. o sul do Piauí e áreas contíguas a esta no Estado da Bahia, bem como microrregiões nos estados do Acre, Pará, Roraima e Amazonas), a defecação a céu aberto só terá fim na próxima década. Por outro lado, é de verificar que os estados do Rio Grande do Norte e de Rondônia não possuem nenhum tipo de mancha nos seus territórios.
Após a análise dos resultados, é possível perceber que, apesar de o Brasil, de maneira geral, ter avançado em relação ao acesso a banheiros e a redução de domicílios cujos moradores defecam a céu aberto, esse avanço não se deu de forma uniforme no território do país. Ao dividir o Brasil em regiões, estados e em microrregiões, pode-se perceber que se está longe de um avanço regional minimamente justo, que respeite a dignidade de todos os brasileiros. Em outras palavras, a depender de onde um determinado cidadão habita, ele tem chances maiores de ter acesso a banheiros e de não defecar a céu aberto, o que rompe com conceitos centrais do campo das políticas públicas, como universalização e equidade.
Foi possível perceber, no decorrer da pesquisa, que a região do Semiárido brasileiro, bem como a calha do Rio Amazonas, possuem as situações mais desfavoráveis nas duas categorias analisadas. Em relação à universalização de banheiros, foi possível verificar que não havia um isolamento absoluto das regiões Norte e Nordeste em comparação ao resto do país, embora a situação nestas duas regiões fosse pior. Na comparação do fim da defecação a céu aberto, viu-se como as demais regiões do país já debelaram este problema, restando o Norte e o Nordeste em péssima situação.
Ao comparar-se a atividade econômica do Brasil com os dados apresentados, ver-se-á como a desigualdade de renda se manifesta no território brasileiro de forma assustadora. Enquanto que nas regiões mais ricas do país os problemas se apresentam de forma mais branda, as regiões de extrema pobreza enfrentam situações de miserabilidade, em geral, e, em particular, no saneamento.
Uma limitação importante deste trabalho é que os anos de universalização de acesso a banheiros e de fim da defecação a céu aberto foram estimados a partir de dados da década de 2000-2010, ou seja, é possível que o ritmo da década em comento não seja seguido de 2010 em diante. Se é fato que o período analisado neste trabalho foi de relativa prosperidade, especialmente em relação ao avanço dos indicadores sociais no Brasil, não é possível predizer o que ocorrerá de fato na década de 2010-2020 e posteriores. Considerando-se que atualmente o Brasil vive uma série de contramarchas na economia e nos investimentos em infraestrutura e em políticas sociais, sinaliza-se que haverá obstáculos na década atual que não estiveram presentes na anterior.
A partir dos resultados deste artigo, é possível avançar na direção da melhoria da atuação do Estado no combate ao déficit de acesso a banheiros e à defecação a céu aberto. Um tema de estudo que auxiliaria no entendimento sobre a efetividade das políticas públicas de saneamento é verificar em que medida os programas públicos de construção de banheiros distribuem os seus recursos nas regiões de maior déficit. Também, estudos que considerem análises de stakeholders poderiam ajudar a compreender o porquê de o Estado não haver priorizado os investimentos em banheiros.