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DETERMINANTES DA PARTICIPAÇÃO FEMININA NO ESPORTE NO NORDESTE DO BRASIL

DETERMINANTS OF WOMEN’S PARTICIPATION IN SPORTS IN THE NORTHEAST OF BRAZIL

Márcia Regina Godoy
Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), Brasil
Divanildo Triches
Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), Brasil

DETERMINANTES DA PARTICIPAÇÃO FEMININA NO ESPORTE NO NORDESTE DO BRASIL

Revista de Políticas Públicas, vol. 20, núm. 2, pp. 781-804, 2016

Universidade Federal do Maranhão

Resumo: O artigo analisa, por meio da teoria do capital saúde, os determinantes econômicos da participação em atividades desportivas entre as mulheres, de 20 a 40 anos, residentes no Nordeste do Brasil. Utiliza o modelo de regressão probabilística para os dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios de 2008. Destaca que os resultados revelaram que16,76% das mulheres praticam atividades desportivas. A modalidade esportiva mais praticada é a caminhada. A escolaridade e a renda são as variáveis que mais afetam positivamente a probabilidade de uma mulher praticar exercício físico. O fator redutor é ter filhos até 5 anos. Essas conclusões foram coerentes com a teoria do capital saúde e podem ser utilizados por gestores públicos na adoção de políticas públicas para encorajar e difundir a prática da caminhada, atividade que não requer investimento em equipamentos e acompanhamento especializado.

Palavras-chave: Esporte, economia da saúde, atividades desportivas, sedentarismo, Região Nordeste.

Abstract: The aim is to analyze through health capital theory, the economic factors that influence participation in physical activity or sport of women between 20 and 40 years in Northeast of Brazil. Uses the probalistic regression model to run date from the Brazilian Household Survey in 2008.The results pointed out 16,76% of women interviewed practiced some physical activity and that walking is the most practiced sport activity. The regressions showed that the main factors that affect the physical activity participation are schooling and income, a reducing factor is to have children 5 years old or younger. These conclusions were supported by the theory of capital health and, therefore, they can be used by public managers to adopt public policies to encourage and to spread the practice to walk. This kind of activity does not require investment in equipment and monitoring.

Keywords: Sports, health economics, physical activity, sedentary, Northeast region.

1 INTRODUÇÃO

A população brasileira está vivenciando uma epidemia de obesidade. Em 2013, aproximadamente metade da população tinha sobrepeso e quase um quinto do total era obesa, considerando o índice de massa corporal superior a 30. As dietas ricas em calorias e sedentarismo são fatores que contribuem para a epidemia global de obesidade. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS World Health Organization [WHO]), o sedentarismo é o quarto fator de risco mais importante para a mortalidade precoce e é responsável por cerca de 3,2 milhões de mortes por ano no mundo. É amplamente reconhecido que a prática regular de atividade física de intensidade moderada, tal como caminhada, ciclismo, ou participação em esportes, tem impactos benéficos no bem-estar,e reduz a incidência de doenças como a hipertensão arterial, a diabetes, a artrose, a osteoporose, obesidade, entre outras, conforme WHO (2002, 2009).

O crescimento da população com excesso de peso ou obesa tanto no Brasil como no mundo tem causado preocupação entre formuladores de políticas públicas e pesquisadores. Para Brown e Robert (2011), Chau e outros (2008) e Vaughan e outros (2008), esse fato tem contribuído para o aumento de pesquisas, que mostram o papel de fatores econômicos no que tange à obesidade, à prática de atividades desportivas e a escolhas de hábitos saudáveis de vida

Apesar do aumento da produção acadêmica internacional sobre a participação em atividades desportivas, ocorrido na primeira década do século XXI, ainda é incipiente a discussão sobre os seus determinantes socioeconômicos de acordo com Brown e Robert (2011). Além disso, no Brasil, há uma baixa participação da população em atividades desportivas e há escassez de estudos empíricos com representatividade nacional sobre os determinantes da participação nessas atividades. Desse modo, o presente artigo busca contribuir com este conhecimento, tendo como foco principal a investigação sobre a influência de fatores socioeconômicos na prática de atividades desportivas.

Nesse sentido, o presente artigo analisa, por meio do uso da teoria do capital saúde, os determinantes econômicos da participação em atividades desportivas entre as mulheres, entre 20 e 40 anos, residentes na região Nordeste do Brasil. Para tal, são utilizados dados da Pesquisa Nacional de Amostra de Domicílios (PNAD) de 2008, caracterizada como uma amostra probabilística de representatividade nacional, composta de 391.868 entrevistas feitas em 150.591 unidades domiciliares distribuídas por todo o território nacional.

Desse modo, procura-se ampliar as evidências em relação a resultados já encontrados, a fim de confirmá-los por meio de estimação econométrica. Destaca-se a importância de investigar os determinantes da participação em atividades desportivas entre as mulheres da região Nordeste, tendo em vista a ausência desse tipo de estudo no Brasil. Além disso, as evidências encontradas poderão contribuir para o conhecimento público dos benefícios provenientes da prática de atividade física, além de fornecer mecanismos de estímulos para que as mulheres adotem um estilo de vida mais ativo.

A contribuição do estudo refere-se à mensuração de determinantes da participação em atividades desportivas entre as mulheres da região Nordeste. Os resultados econométricos mostraram que a escolaridade e a renda são as variáveis que mais afetam positivamente a probabilidade de uma mulher praticar alguma prática desportiva. Por outro, as mulheres mais saudáveis em decorrência da prática de atividades físicas tenderão a ser mais produtivas e, portanto, poderão ter maiores rendimentos.

O artigo está estruturado em cinco seções, além desta introdução. A segunda faz uma breve revisão do modelo de formação do capital saúde, que mostra como decisões de gastos e uso do tempo afetam a participação em atividades desportivas, além dos estudos empíricos. Nas duas seções seguintes, encontram-se apresentados o modelo econométrico e discussão dos principais resultados da pesquisa. Por fim, a quinta seção traz as conclusões e a condução de políticas públicas voltadas à promoção da prática de atividades desportivas.

2 ABORDAGEM DO MODELO DE GROSSMAN E ESTUDOS EMPÍRICOS

A abordagem teórica desenvolvida por Grossman (1972) trata o bem saúde como um estoque de capital. Ele uniu os conceitos de capital humano e o uso do tempo, presentes nos estudos de Becker (1962) e Gronau (1976), para construir um modelo matemático com a finalidade de explicar variações na saúde e cuidados médicos, em termos de variações de curvas de oferta e de demanda pelo bem saúde. Nesse modelo, as escolhas de consumo ao longo da vida são vistas como um problema de investimento, de tal forma que o consumidor pode escolher entre investir na sua própria saúde ou em outros bens. A saúde, por sua vez, é vista como um bem de consumo que entra diretamente na função utilidade dos indivíduos, e também como um bem de capital que permite a obtenção de dias saudáveis.

No modelo de Grossman (1972), a produção de saúde está sujeita às restrições orçamentárias e de tempo. Assim, os indivíduos escolhem como alocar o seu tempo entre lazer (incluindo atividade física), atividades remuneradas e atividades não remuneradas. Tais indivíduos escolhem também como alocar a sua renda entre o consumo de bens de consumo e de bens intermediários para a produção de saúde (como gasto em atividade desportiva). O modelo de Grossman (1972) usa uma função de utilidade intertemporal de um consumidor representativo conforme a equação (1):

onde HoHo é o estoque de saúde inicial, HiHi, estoque de saúde no tempo i em que i corresponde o período 0,1,2,3,...,nΦinΦi representa o fluxo de serviço por unidade de estoque no período i, hi = fHi consumo total em atividades ligadas à produção de saúde no período i , ZiZi, total de consumo de outros bens no período i e nn é tempo de vida do indivíduo

Pela equação (1) tem-se que a função utilidade do consumidor depende tanto do estoque de saúde herdado, como também desse estoque em cada momento do tempo; além do consumo de outros bens. O tempo de vida depende da quantidade Hi que maximiza a utilidade sujeita à produção e restrição de recursos. Além disso, função de utilidade intertemporal está sujeita às várias restrições. A primeira refere-se à depreciação. O modelo assume que, em cada período, o consumidor faz investimentos em saúde e que o investimento líquido, no estoque de saúde, é igual ao investimento bruto menos a depreciação:

em que Ii é o investimento bruto d é a taxa de depreciação durante o período i. a qual é exógena, mas ela pode variar de acordo com a idade e entre os indivíduos.

A segunda restrição é composta pelas funções de produção. Os consumidores fazem investimento bruto em saúde e em outros bens, que estão presentes na sua função de utilidade e variam de acordo com um conjunto de função de produção, de acordo com as expressões (3) e (3’):

onde Mié o cuidado com a saúde, Xisão os insumos na produção de Zi, THi e Tisão insumos tempo (tempo usado na produção de saúde e outras atividades), Zié o consumo de bens em cada período i, Ei, o estoque de capital humano e E corresponde à educação e busca transmitir a ideia de que a produtividade na produção de investimento em saúde (3) depende do nível de educação, isto é, pessoas com maior nível de escolaridade produzem investimento em saúde de forma mais eficiente.

De forma simplificada, pode-se dizer que os principais pontos desse modelo são: i) a saúde pode ser vista como um estoque, tal como o estoque de capital humano; ii) o processo de formação do capital saúde é individual e requer além do simples consumo de bens e serviços de saúde comumente estudados como aquisição de planos de saúde, medicamentos e consultas médicas-, usar parte do tempo para a produção de saúde; iii) o estoque de saúde está sujeito à depreciação, cuja taxa varia de pessoa para pessoa; a idade é negativamente correlacionada com o capital saúde, mas positivamente correlacionada com os gastos em cuidados com saúde; iv) a taxa salarial dos indivíduos é positivamente correlacionada tanto com a demanda por saúde, quanto com a demanda por cuidados de saúde; v) a educação é positivamente correlacionada com o capital saúde, mas negativamente correlacionada com os gastos em cuidados de saúde; vi) os que possuem maior nível educacional demandam maior estoque ótimo de saúde.

O debate acadêmico sobre os efeitos da atividade desportiva, como fator protetor da saúde, surgiu em 1953, com Morris e outros (1953), o qual se constitui como o marco das pesquisas na área de atividade desportiva. Os autores mostraram a associação entre a inatividade física e doenças cardíacas1. Desde então, pesquisas sobre os benefícios da prática regular de atividade física têm aumentado e sabe-se que os seus benefícios vão além dos efeitos diretos na saúde2.

Além disso, a prática de atividades físicas tem impacto no mercado de trabalho, por meio da maior probabilidade de participação no mercado de trabalho e aumento da produtividade dos trabalhadores ativos, os quais recebem salários entre 5% e 10% maiores do que os dos trabalhadores sedentários, como mostraram Kosteas (2012) e Lechner (2009). Para esses autores, a participação em atividades desportivas é um sinal aos potenciais empregadores que o indivíduo tem boa saúde, possui maior habilidade social e é mais motivado ou competitivo.

Na produção acadêmica internacional há uma vasta literatura que analisa a participação de adultos em atividades desportivas3. Entretanto, um pequeno número de artigos tem considerado os seus determinantes econômicos da participação. Estudos realizados na Inglaterra, Escócia, e Estados Unidos, com de Humphreys e Ruseski (2007, 2009, 2010), Ruseski e outros (2011), investigaram os determinantes da participação em atividades desportivas através de um foco teórico e empírico na escolha entre lazer e trabalho e o uso do tempo, enfatizando principalmente a contribuição do capital humano e os seus reflexos na formação do capital saúde4.

No Brasil, apesar da relevância do tema e o incentivo à prática de atividades desportivas se ter iniciado ainda no século XIX, são poucos os estudos populacionais que abordam essa temática. Rego e outros (1990), publicaram o primeiro estudo nacional com amostras populacionais, incluindo a atividade física como variável principal. Hallal e outros (2007) e Dumitch (2009) realizaram revisões sistemáticas da literatura brasileira sobre a participação em atividades físicas, e constataram um expressivo crescimento do número de artigos publicados desde 20055. Vasconcelos e Anjos (2003) utilizaram uma amostra com representatividade nacional, no qual foram entrevistadas mais de 267 mil pessoas. Apesar de sua relevância, os dados utilizados não refletem a realidade atual, pois eram oriundos do Estudo Nacional da Despesa Familiar, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em 1974-1975.

3 POLÍTICAS PÚBLICAS E O MERCADO DE DESPORTO NO BRASIL

A prática de esporte e de exercícios físicos é incentivada, no Brasil, por meio de políticas públicas desde 1850. O Decreto-Lei nº 3199, de 14 de abril de 1941 e de aproximadamente 60 atos legais outorgaram ao Estado o papel normativo, além de estabelecer as bases de organização dos desportos no país. A prioridade passou a ser o desenvolvimento do esporte de alto rendimento, pois o governo via o esporte como um elemento facilitador das relações internacionais do país.

Durante o regime militar, a proposta política visava a transformar o Brasil em uma potência olímpica. Nesse sentido, a Constituição Federal de 1967, a Portaria MEC nº 148/1967, a Lei n.º 6.251, de 8 de outubro de 1975 estabeleceram a competência da União para legislar sobre o esporte, incentivaram a prática do desporto nas escolas públicas. A prática de desporto era vista como uma medida disciplinadora, moralizadora e capaz de aperfeiçoar aptidões. Tanto no âmbito nacional como internacional havia uso político-ideológico do esporte, principalmente em competições internacionais, como os Jogos Olímpicos.

As políticas públicas voltadas ao desporto foram reconhecidas pela Constituição Brasileira de 1988, estabelecendo o esporte como um direito social. Esse direito está assegurado no art. 217º do Capítulo III, Seção III – Do Desporto. Nesse artigo, a prática esportiva passa ser um direito de todos os brasileiros, havendo a necessidade de priorização de recursos públicos para tal finalidade.

Na década de 1990, as Leis nº 8.672, de 6 de julho de 1993 e nº 9.615, de 24 de março de 1998, também conhecidas por Lei Zico e Lei Pelé – dois futebolistas que ocuparam cargo, no governo, equivalente ao de Ministro de Esporte – estabeleceram as bases do direito desportivo no Brasil. Além disso, elas organizaram a Justiça Desportiva; reestruturaram o sistema esportivo, em especial, o futebol e ditaram regras para as relações entre dirigentes e atletas profissionais. Em Janeiro de 2003, como já referido, foi criado o Ministério do Esporte. No ano seguinte, durante a 1ª Conferência Nacional do Esporte, ocorrida em Brasília, elaborou-se a Política Nacional do Esporte (PNE). O debate da PNE envolveu cerca de 83 mil pessoas de 2.500 municípios. A PNE foi aprovada em assembleias do Conselho Nacional do Esporte (CNE) e permitiu que a atividade desportiva seja tratada como questão que diz respeito ao Estado, e ao direito de todo o cidadão brasileiro.

As principais diretrizes da PNE são: a) universalização do acesso e promoção da inclusão social; b) definição de esporte como meio de melhoria da qualidade de vida e desenvolvimento humano, c) incentivo à pesquisa e produção de conhecimento na área esportiva, d) instrumento para a promoção e preservação da saúde e desenvolvimento social e econômico. Atualmente, as principais responsabilidades atribuídas ao Estado, nesse campo, podem ser resumidas em quatro categorias de ação: i) regulamentar e fiscalizar a oferta de atividades esportivas; ii) promover políticas de difusão da prática esportiva; iii) estimular o desenvolvimento do desporto nacional em todos os níveis; e iv) apoiar a realização de eventos de interesse econômico e social.

O Ministério da Saúde criou, em 2006, a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC) no Sistema Único de Saúde (SUS). Essa política recomenda a implantação de ações e serviços no SUS, como a prática de atividades físicas – Tai Chi, ginástica, etc. com o objetivo de garantir a prevenção de doenças (BRASIL, 2006). Seguindo as diretrizes da PNPIC, em abril de 2011, o Ministério da Saúde instituiu o Programa Academia da Saúde, que busca por meio da implantação de infraestrutura desportivas e disponibilização de pessoal qualificado, promover a saúde da população. (BRASIL, 2011).

O Ministério do Esporte (ME), por sua vez, tem desenvolvido vários programas estratégicos, como o Bolsa-Atleta e o Segundo-Tempo, com o objetivo de democratizar o acesso à prática e à cultura do Esporte. Tais programas buscam promover o desenvolvimento integral dos indivíduos como fator de formação da cidadania e melhoria da qualidade de vida. Além disso, o ME tem implantado e modernizado as infraestruturas destinadas ao desporto e lazer, e fomentado pesquisas para o desenvolvimento de políticas sociais de esporte e lazer.

Ademais, o governo brasileiro criou o sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL) o qual tem a finalidade de acompanhar os fatores de risco. Assim, anualmente, são entrevistadas mais de 50 mil pessoas das capitais dos estados do Brasil. Esse sistema coleta, por meio de questões curtas, informações sobre: características (de) antropométricas, de saúde, demográficas, socioeconômicas, estilo de vida, alimentares, frequência e duração de atividade física dos entrevistados. Entre 2006 e 2011 os dados do VIGITEL mostram que a prática de atividade física no lazer tem permanecido em torno de 14% do total entrevistado; já quando se estende para atividade física no lazer ou deslocamento, este percentual sobe para 30%.

Em 2008, o IBGE investigou, pela primeira vez na PNAD, prática de atividades físicas no Brasil. Na PNAD/2008, foram entrevistadas 391 mil pessoas de todo o Brasil, constituindo-se, assim, uma ampla fonte de informações sobre a população brasileira. Na PNAD/2008, além de dados sobre prática de atividades físicas, há informações socioeconômicas, demográficas e de saúde, e das condições dos domicílios dos entrevistados, o que possibilita obter mais informações sobre o perfil dos praticantes de atividades desportivas6.

No que tange ao mercado esportivo brasileiro, o qual é responsável por 1,6 milhão de empregos ligados direta ou indiretamente ao esporte, representa 2,42% da população empregada. A Relação Anual de Informações Social (RAIS) 2010 mostra a existência de pelo menos 41 mil empresas ligadas ao setor desportivo no Brasil.

De acordo com a Pesquisa do Esporte, realizada pelo IBGE (2003), em 2003, somente os governos municipais, estaduais e federal empregavam cerca de 68 mil pessoas para a área do esporte, sendo que 90% delas desempenhavam atividades de esporte-educacional.

Em termos de dispêndios, a Pesquisa de Orçamento Familiar (POF), realizada pelo IBGE, em 2008/2009, mostrou que, em média, o brasileiro gasta mensalmente R$12,06, em atividades de recreação e esporte. Isto representa 0,5% das despesas totais das famílias brasileiras. O valor gasto nessas atividades é variável entre as regiões do país, como mostra a Tabela 1. Nota-se que a região Sul é a que apresenta maior gasto, com R$ 16,09; em seguida aparece a região sudeste, com R$ 15,88. Os menores gastos médios ficam por conta das regiões Nordeste e Norte, na ordem, com R$ 5,68 e R$ 6,56.

Tabela 1
Despesa média mensal familiar com recreação e esporte, por classe de rendimento mensal por região (em R$)
Região Média Até 830 Mais de 830 a 1.245 Mais de 1.245 a 2.490 Mais de 2.490 a 4.150 Mais de 4.150 a 6.225 Mais de 6.225 a 10.375 Mais de 10.375
Sul 16,09 2,14 4,68 7,76 15,13 37,33 43,89 91,27
Sudeste 15,88 1,60 2,64 5,62 12,74 25,19 45,75 108,37
CentroOeste 8,63 1,59 2,08 4,22 11,85 23,32 29,80 40,05
Norte 5,68 1,34 3,06 5,69 12,02 17,05 23,22 44,23
Nordeste 6,56 1,05 2,34 4,83 13,66 14,24 32,04 68,78
Elaborada pelos autores, conforme dados do: INSTITUTO BRASILEIRO E GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa de Orçamentos Familiares 2008-2009: despesas, rendimentos e condições de vida. Rio de Janeiro, 2010.

A evolução dos gastos públicos com esporte ao longo do tempo é difícil de ser avaliada, pois até 2002, não havia um órgão especifico no Governo Federal para tratar de questões da política nacional dos esportes. Apenas em janeiro de 2003, ocorreu a criação do Ministério do Esporte. Desde então, as despesas da União com desporto estão claramente designadas no orçamento público. Em 2011, a participação relativa das despesas da União com desporto no gasto total da União correspondeu a 0,03% dos gastos total do governo com todas as despesas, o que corresponde a R$ 308,8 milhões. Isso representa um gasto médio de R$1,60 por habitante. Os maiores percentuais foram observados nos anos de 2006 e 2007, com 0,09 e 0,10% do total do orçamento, respectivamente. Os municípios, por sua vez, apresentam um gasto mais elevado com desporto, principalmente, os da região Sudeste, com uma média R$33,30 por habitante7. E a menor despesa fica com a região a qual se situa em R$10,64 por habitante.

4 MÉTODO DE ESTIMAÇÃO E DADOS AMOSTRAIS

O modelo de regressão probabilística é empregado para analisar os determinantes da decisão de participação em atividades físicas. Esse tratamento metodológico leva em conta as características dos dados, em que a variável dependente é binária. A probabilidade de participação é influenciada por um vetor de características individuais (Xi)Xi), que representam entre outras variáveis, a idade, o sexo, a escolaridade, a renda, o uso do tempo dos entrevistados.

onde y é i uma variável indicadora binária que assume o valor caso o indivíduo declare praticar alguma atividade desportiva nas duas semanas que antecederam a pesquisa, e 0 caso contrário.; Xi é o vetor de variáveis explicativas, ββ os coeficientes das variáveis independentes, z as variáveis normais padronizadas. Pode-se, então, expressar as probabilidades de participar em atividades desportivas considerando que:

Os resultados de modelos do tipo probit indicam a probabilidade de ocorrência de um evento. Os sinais positivos ou negativos são determinados pelos coeficientes (β,sβ,s) associados aos X,s X,s fornecem, inicialmente, a indicação sobre o sentido, positivo ou negativo, da influência de uma variável explicativa, XiXi, e a grandeza dessa influência.

Neste estudo, são empregadas as seguintes variáveis explicativas: anos de escolaridade, idade, cor, tempo total ocupado (trabalho + afazeres domésticos + deslocamento até o trabalho), participação no mercado de trabalho, renda familiar per capita, mãe de criança de até 5 anos de idade, número de filhos, autoavaliação do estado de saúde, posse de plano de saúde, uso de tabaco. A variável dependente é atividade no desporto que é dicotômica, que assume valor 1 se a entrevistada é ativa e 0 se for sedentária8.

A base de dados utilizada foi a PNAD de 2008. Essa pesquisa é de base domiciliar, realizada pelo IBGE, com 391.868 pessoas entrevistadas em 150.591 unidades domiciliares distribuídas por todo o Brasil. As informações coletadas tratam da prática de atividades físicas, de dados socioeconômicos, demográficos, de saúde e das condições dos domicílios dos entrevistados. Pela sua abrangência nacional, a PNAD 2008 caracteriza-se como uma fonte detalhada de informações sobre a população brasileira e o seu engajamento em atividades físicas. Considerando as diferenças entre os gêneros, no que se refere à prática de atividades desportivas, utilizam-se dados de mulheres entre 20 e 40 anos de idade, residentes nos estados do Nordeste do Brasil. Esse segmento amostral tende a apresentar a menor taxa de participação em atividades desportivas o qual é composto por 12.307 mulheres. Dentre elas, 2.043 (16,76%) declararam praticar alguma atividade física nos três meses que antecederam à pesquisa.

5 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

As diferenças entre as mulheres ativas no esporte e as sedentárias da região Nordeste do Brasil são grandes, como revelam as Tabelas 2 e 3. As sedentárias tendem a apresentar os piores indicadores, como menor número de consultas médicas, com uma média de 3,13 contra 2,58 das mulheres ativas, menor escolaridade, com cerca de oito anos, em média, contra 10,3. Esse fato resulta em menor rendimento individual e familiar. As mulheres sedentárias também investem menos em atividades promotoras de saúde e fumam mais, um fator de risco à saúde. As consequências do comportamento de risco das sedentárias refletem-se na sua pior autoavaliação de saúde. As mulheres sedentárias também possuem um número médio pouco maior de filhos, de 1,62 contra 1,13 das ativas.

A participação feminina em atividades desportivas varia entre as regiões do Brasil e entre os anos de estudo, como ilustra a Tabela 3. Nota-se que a região Sul exibe a maior taxa de prevalência da participação em atividades desportivas, com uma média 28,17% do total. Em seguida aparece a região Centro-Oeste e Sudeste com uma média de 25,8% e 21,0%, respectivamente. Já a região Nordeste apresenta a menor taxa média de participação, com 16,4%. Essas diferenças regionais são mais proeminentes entre as mulheres não escolarizadas. Por outro lado, as maiores proporções de mulheres praticantes de atividades físicas são observadas, em todas as regiões, nas faixas de escolaridade mais elevadas. No caso da Região Sul e Centro Oeste, a mulheres com escolaridade de 15 anos ou mais são praticamente a metade das entrevistadas.

Tabela 2
Estatísticas Descritivas da amostra de mulheres de região do Nordeste do Brasil
Variável Ativas Sedentárias
Média Desvio Padrão Min Max Média Desvio Padrão Min Max
Número de Consultas 3,58 4,78 0 96 3,13 4,28 0 90
Número de Filhos 1,13 1,30 0 13 1,62 1,64 0 18
Fumantes (%) 6,40 24,4 9,97 29,0
Plano de saúde (%) 33,08 0,47 0 1 15,52 0,36 0 1
Anos de Estudo 10,29 3,45 0 15 7,98 4,06 0 15
Tempo Ocupado (horas) 45,69 24,03 0 168 46,60 23,19 0 204
Renda familiar per capita (R$) 671,20 1040,87 0 15666 337,48 544,87 0 18000
Salário/hora de trabalho (R$) 5,58 8,07 0 112,5 3,16 5,25 0 275
Auto avaliação do estado de Saúde 2,01 0,69 1 5 2,13 0,69 1 5
Elaborada pelos autores, conforme microdados de: INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios: suplemento 2008. Rio de Janeiro, 2008.

Tabela 3
Percentual de mulheres praticantes de atividades desportivas no Brasil, segundo anos de estudo e regiões em 2008.
Anos de Estudo Norte Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste
0 4,73 4,78 9,02 12,78 8,62
1 a 3 6,65 6,56 8,55 6,45 11,05
4 10,1 8,53 9,90 12,02 13,90
5 a 7 9,84 9,89 12,94 16,86 16,35
8 14,19 13,29 13,56 21,08 18,30
9 a 11 17,53 15,30 17,44 24,85 21,58
12 20,18 20,27 21,43 29,11 26,58
12 a 14 29,14 28,90 29,78 41,14 35,44
15 ou mais 33,28 35,90 41,23 49,10 47,54
Média 17,25 16,40 21,05 28,17 25,82
Elaborada pelos autores, conforme microdados da PNAD/2008.

A Tabela 4 apresenta escolaridade e tempo semanal ocupado, renda familiar, número de consultas e número de filhos das mulheres entre 20 a 40 anos na região Nordeste. Em todos os quesitos apontados, observa-se uma associação altamente positiva no grau de escolaridade. Desse modo, a limitação de tempo não tende a ser um fator impeditivo para a adoção de práticas promotoras de saúde, pois as mulheres com maior escolaridade, apesar de terem menor tempo disponível do que as não-alfabetizadas, elas praticam mais atividades físicas e fazem consultas médicas com maior frequência.

Tabela 4
Educação e uso do tempo das mulheres de 20 a 40 anos da região Nordeste, em 2008
Anos de Estudo % Ativas Renda Familiar per capita Tempo ocupado Número Consultas Número de Filhos
0 4,78 162,22 41,64 3,21 2,84
1 a 3 6,56 152,18 46,26 3,34 2,68
4 8,53 159,58 47,45 2,88 2,52
5 a 7 9,89 188,11 48,14 3,08 2,06
8 13,29 236,06 48,26 3,04 1,70
9 a 11 15,30 258,49 44,83 3,16 1,26
12 20,27 403,69 47,64 3,22 0,93
13 a 14 28,90 846,61 38,95 3,67 0,59
15 ou mais 35,90 1,513,18 45,07 4,03 0,71
Total 16,40 391,52 46,26 3,24 1,53
Elaborada pelos autores, conforme microdados da PNAD/2008.

Salienta-se ainda que a renda tem um papel relevante no acesso a atividades desportivas como mostra a Tabela 5. A diferença da participação das entrevistadas com renda baixa, com aquelas com renda familiar mais alta, é muito elevada. Nota-se que 7% das mulheres com renda de até R$100,00 praticam alguma atividade física, acima de R$2.000,00 esse percentual é de mais de 40%. Destaca-se, contudo, que o percentual de ativas cresce até quase 60% com aumento das faixas de rendimentos até R$ 8.000 e, após, no intervalo seguinte, ou seja, acima de R$ 8.000 a R$ 10.000, a participação feminina em atividade física cai para aproximadamente um terço do total. Já essa proporção chega a superar a 60% na faixa de rendimento mais alto.

Tabela 5
Participação feminina em atividades desportivas segundo a classe de rendimento familiar per capita, Nordeste em 2008 (em R$)
Classe Ativa (%) Classe Ativa (%)
Até 100 7,16 1.501 – 2.000 39,35
100 – 200 11,83 2.001 – 4.000 41,52
201 – 300 14,82 4.001 – 6.000 53,76
301 – 400 18,38 6.001 – 8.000 57,14
401 – 500 21,90 8.001 – 10.000 33,33
501 – 750 23,89 Acima de 10.000 62,50
751 – 1.000 25,39
1.001 – 1.500 33,63 Total 16,30
Elaborada pelos autores, conforme microdados da PNAD/2008.

A modalidade desportiva, segundo escolaridade das mulheres brasileiras, está reportada na Tabela 6. É notório que renda e escolaridade são quesitos essenciais que determinam modalidade desportiva praticada. A maioria das mulheres ativas pratica caminhada, que é uma atividade física que exige poucos recursos financeiros. Essa proporção é crescentemente em favor ao menor grau de instrução, ou seja, a caminhada é atividade física preferida por mais de 80% das mulheres com até 3 anos de estudos. Essa preferência se reduz sensivelmente, para cerca de 37%, para as mulheres com nível de instrução de 15 ou mais anos de escolaridade. Tal relação é oposta no que tange a outras modalidades desportivas como futebol, basquete, ginástica aeróbica, corrida (inclusive em esteira) ou tênis e outros esportes em que os maiores percentuais são observados em maiores níveis de instrução.

Tabela 6
Modalidade desportiva segundo anos de estudo das mulheres no Brasil 2008
Anos de Estudo Caminhada (exceto em esteira) Futebol e outros (*) Outros Esportes Deixou de praticar nos últimos 30 dias Total
Não alfabetizado, 82,81 12,50 4,69 0,00 100
1 a 3 80,87 12,17 1,74 5,22 100
4 76,26 18,71 5,04 0,00 100
5 a 7 69,75 18,47 9,55 2,23 100
8 62,79 25,19 9,30 2,71 100
9 a 11 53,82 31,94 13,89 0,35 100
12 54,53 30,97 13,27 1,23 100
13 a 14 38,32 40,65 19,63 1,4 100
15 ou mais 36,91 40,63 21,48 0,98 100
Total 54,14 30,67 13,80 1,39 100
Elaborada pelos autores, conforme microdados da PNAD/2008. *Incluem-se, nesse item, basquete, ginástica aeróbica, corrida (inclusive em esteira) ou tênis.

Em geral, o resultado obtido sugere que algumas mulheres podem preferir a prática de exercícios por conta própria, sem intervenção de instrutor ou porque há ausência de espaços públicos adequados à prática de esporte e lazer. O baixo nível de renda se constitui em outro obstáculo para a prática de outra modalidade que requeira algum investimento financeiro e acompanhamento especializado, como a ginástica e a hidroginástica. Tais fatores podem explicar por que a modalidade desportiva caminhada é preferida pelas mulheres brasileiras.

A frequência e modalidades esportivas praticadas pelas mulheres nordestinas entre 20-40 são ilustradas na Tabela 7. Visualiza-se que a maior percentagem dessas mulheres pratica de três a quatro dias por semana, quase 36,0 % do total. Sendo que as modalidades futebol, basquete, ginástica aeróbica, corrida (inclusive em esteira) ou tênis, com 40,0% e outros esportes, com 38% são as mais preferidas, seguida da frequência de cinco a seis dias por semana, com 27%. Já a prática diária é a menos escolhida pelas mulheres nordestinas, com um pouco mais de 10% do total entrevistado. Em relação à duração da prática de atividade física, 93,31% relataram que é de pelo menos 30 minutos. Apesar de a duração ser compatível com o preconizado pela WHO (2009), que é de pelo menos 30 minutos durante 5 ou mais dias, a frequência não o é, pois menos da metade ou 39,7% fazem 5 ou mais dias atividades desportivas.

Tabela 7
Frequência e modalidades esportivas praticadas pelas mulheres nordestinas entre 20-40 anos em 2008
Frequência Semanal Caminhada (exceto em esteira) Futebol e outros (*) Outros Esportes Total
De 1 a 2 dias 26,10 20,63 25,66 24,34
De 3 a 4 dias 33,13 40,09 37,98 35,96
De 5 a 6 dias 25,59 29,14 26,87 26,87
Todos os dias 15,19 10,14 9,49 12,83
Total 100,0 100,0 100,0 100,0
Elaborada pelos autores, conforme microdados da PNAD/2008. *Incluem-se, nesse item, basquete, ginástica aeróbica, corrida (inclusive em esteira) ou tênis.

Os resultados econométricos da regressão probabilística apresentados na Tabela 8 indicam que a escolaridade é o principal determinante da participação feminina em atividades desportivas. Essa conclusão está de acordo com o modelo de Grossman (1972), o qual aponta que escolaridade se reflete na ocorrência de uma produção mais eficiente da saúde. Assim, indivíduos com mais anos de estudo praticam mais atividade desportivas, pois eles compreendem melhor os seus benefícios em termos monetários e de saúde e, advindos da adoção de hábitos de vida saudáveis.

O segundo fator que mais afeta positivamente a probabilidade de participação em atividades desportivas é a renda familiar per capita. O exercício de atividade remunerada também tem efeito bastante positivo. Desse modo, as políticas públicas voltadas para a elevação da escolaridade e da renda da população teriam efeitos benéficos para diminuir a prevalência de inatividade física e aumentar o bem-estar social e econômico.

Tabela 8
Resultados da Regressão Probabilística
Atividade no desporto Coeficiente Desvio Padrão Estatística Z P > z Intervalo de confiança de 95%
Anos de estudo 0.051 0.004 13.37 0.000 0.044 0.059
Idade 0.007 0.002 2.99 0.003 0.002 0.011
Cor/raça -0.007 0.024 -0.27 0.785 -0.053 0.040
Renda familiar per capita (log) 0.156 0.015 10.54 0.000 0.127 0.185
Tempo total ocupado -0.002 0.001 -4.31 0.000 -0.003 -0.001
Economicamente ativa 0.162 0.031 5.21 0.000 0.101 0.222
Número de filhos 0.012 0.010 1.11 0.267 -0.009 0.032
Mãe de criança de até 5 anos -0.201 0.027 -7.45 0.000 -0.254 -0.148
Estado de Saúde -0.036 0.017 -2.14 0.032 -0.068 -0.003
Fumante -0.136 0.047 -2.9 0.004 -0.229 -0.044
Plano de Saúde 0.153 0.030 5.17 0.000 0.095 0.212
Constante -2.439 0.104 -23.38 0.000 -2.643 -2.234
Nº de obs. 20.435 LR chi2 = 1406,35 Prob > chi2 0,00 Pseudo R2 =7,73
Elaborada pelos autores, conforme microdados da PNAD/2008.

Apesar de a prática de atividades desportivas contribuir para o aumento do estoque de saúde de um indivíduo, os resultados aqui encontrados mostram que a deterioração do estado de saúde tem um efeito negativo importante sobre a probabilidade de participação em atividades físicas. Constitui um grande desafio aos provedores de saúde convencer indivíduos com fatores de morbimortalidade e saúde debilitada sobre os benefícios da prática desportiva, de modo a engajá-los em programas de promoção à saúde com o intuito de melhorar a sua qualidade e expectativa de vida.

Como esperado, o tempo total ocupado entre atividades remuneradas e afazeres domésticos, bem como o fato de ser mãe de uma criança de até cinco anos, afetam negativamente a probabilidade de participação em atividades desportivas. O alto custo de oportunidade do tempo pode explicar a menor probabilidade das mulheres que são mães de crianças pequenas de praticarem atividades desportivas. Esses resultados mostram que a estrutura familiar e as limitações de tempo afetam a participação nos esportes. Assim, políticas públicas voltadas ao cuidado e educação de crianças podem contribuir para o aumento da participação das mulheres com filhos pequenos, em atividades desportivas. Um resultado interessante é que as mulheres sedentárias investem menos na formação do seu capital em saúde, quer seja pela aquisição de planos de saúde ou pela prática de atividades desportivas.

6 CONCLUSÕES

A análise exploratória dos dados deixou bastante evidente as diferenças da prática de atividades físicas entre as regiões e classes sociais. Entretanto, o percentual de mulheres praticantes de atividades desportivas aumenta com o número de anos de estudo e rendimento; assim, níveis salariais mais baixos estão associados às trabalhadoras sedentárias. A análise das modalidades desportivas praticadas pelas entrevistadas revelou que a caminhada é a modalidade mais frequente. Considerando essa preferência, os gestores públicos podem utilizar técnicas comportamentais para encorajar e difundir a prática dessa modalidade desportiva, já que essa atividade não requer investimento em equipamentos e acompanhamento especializado.

A regressão probabilística mostrou que a escolaridade e a renda são as variáveis que mais afetam positivamente a probabilidade de uma mulher praticar alguma prática desportiva. Esses resultados são coerentes com a teoria do capital saúde e mostram que mulheres com maior escolaridade e renda utilizam parte de seu tempo livre para produzir saúde, por meio da prática adicional de atividades físicas. Além de praticarem mais atividades desportivas, que resulta numa taxa de depreciação da saúde menor, essas mulheres adquirem mais planos de saúde do que as sedentárias. Esses resultados mostram que essas mulheres investem mais em atividades promotoras de saúde. Além dos fatores individuais apontados na análise econométrico, o baixo gasto público com desporto e lazer pode ser um fator explicativo para a menor participação feminina no Nordeste do Brasil, em comparação às demais regiões.

Espera-se que os resultados obtidos permitam o melhor entendimento dos determinantes da participação em atividades desportivas. Além disso, possam auxiliar gestores das áreas de saúde e esporte a desenhar políticas de infraestrutura e incentivos com a finalidade de aumentar a participação da população nessas atividades. Finalmente, para pesquisas futuras, sugerem-se estudos que investiguem os benefícios potenciais no mercado de trabalho, como aumento da produtividade e do bem-estar dos empregados, provenientes da prática de atividades desportiva.

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Notas

1 Uma abordagem sobre o sistema de saúde nos países do Mercosul é feita por Nogueira e outros (2015) e Vendruscolo e outros (2015) mostra as ações na área de saúde tomada pelo gestores numa região específica do Estado de Santa Catarina.
2 A atividade física possibilita melhora das funções mentais, como destacam Ettner (1996), Tomporowski (2003), Hillman, Erickson e Kramer (2008) e Gomez-Pinilla (2008). A melhoria das condições psicológicas foi tratada por Folkins e Sime (1981) e Lindwall e Hulya (2003). E os impactos sobre o aumento do capital social, e habilidades sociais foram reportadas por Aguilera e Bernabé (2005), Eccles e outros (2003), Anokye, Pokhrel e Rushby (2014) e Xiao, Li e Feisher (2015).
4 Tais estudos utilizaram o aporte teórico de Becker (1962, 1964,1965), Gronau (1976) e Biddle e Hamermesh (1990) e Grossman (1972).
5 Na revisão conduzida por Hallal e outros (2007) foram encontrados 42 artigos que utilizaram amostras com tamanho superior a 500 observações. Dumitch (2009), ao revisar sistematicamente a literatura, encontrou 47 estudos publicados entre 1990 e 2008.
6 Há diferenças mitológicas entre a as duas pesquisas. O sistema VIGITEL estabelece amostra mínima de 2.000 indivíduos por cidade, a qual é obtida por sorteio sistemático de 5.000 linhas telefônicas dessa cidade. Assim, em função do desenho amostral e maior número de entrevistados, a utilização da PNAD permite estimar com mais precisão a cobertura de serviços de saúde, bem como a participação dos brasileiros em atividades protetoras de saúde, como a prática de atividades físicas.
7 Dados tabulados pelos autores a partir de SIAFI STN/CCONT/GEINC e STN/Finbra 2010/Dados Contábeis dos Municípios.
8 Na PNAD 2008, os entrevistados responderam Sim ou Não à seguinte pergunta: Nos últimos três meses, praticou algum tipo de exercício físico ou esporte?
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