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CARTOGRAFIA DOS BABAÇUAIS: a palmeira dos mapas1
MAPPING OF BABASSU: the palm tree of maps
Revista de Políticas Públicas, vol. Esp, pp. 189-192, 2016
Universidade Federal do Maranhão

Mesas temáticas coordenadas


Recepção: 22/01/16

Aprovação: 06/06/16

Resumo: O presente artigo tem como objetivo destacar a importância da compreensão dos procedimentos cartográficos no âmbito de um projeto de pesquisa visando o mapeamento social da região ecológica dos babaçuais. Enfatiza o tratamento desse conhecimento, não somente por um prisma geográfico, mas, sobretudo, levando em consideração os conhecimentos tradicionais que cada comunidade carrega sobre os territórios aos quais são pertencentes. Por representar autografias em forma de mapas, tais comunidades fazem uso dos mapas sociais para reivindicar direitos que lhes são negados. Destaca que, no caso especifico das quebradeiras de coco babaçu, as autocartografias representam mulheres invisíbilizadas pelo Estado e afetadas por grandes empreendimentos econômicos, que buscam através dos mapeamentos denunciarem crimes contra seus territórios a exemplo da devastação das palmeiras, o aumento das carvoarias e avanço das siderúrgicas. Nessa perspectiva, conclui que se pode pensar a apropriação de cartografias sociais pelas quebradeiras de coco babaçu, também, como estratégia para o fortalecimento de suas formas organizativas.

Palavras-chave: Cartografia social, mapa, região ecológica do babaçu.

Abstract: The present article has the importance of understanding the cartographic procedures as part of a research project aimed at mapping the social ecological region of babassu .And treat this knowledge, not only a geographical perspective, but above all taking into account traditional knowledge that each community carries on the territories which are owned. To represent autographs in the form of maps, these communities make use of social maps to claim rights that are denied. So, in the specific case of the babassu coconut breakers, the autocartographies represent women made invisible by the State and affected by large economic enterprises and seek through the mappings report crimes against their territories as: devastation of palm trees, the increase in coal production and advancing steel mills. From this, concludes that the appropriation of social cartography of the babassu coconut breakers, represents a strategy to strengthen its organizational forms.

Keywords: Social cartography, maps, ecological region of babassu.

1 INTRODUÇÃO

Com a intenção de expressar conhecimentos tradicionais e formas de uso dos recursos naturais a partir de representação dos mapas, esse artigo busca para, além disso, demonstrar técnicas de elaboração dos mapas e análise da cartografia social interpretada pelos agentes sociais em trabalhos de campo realizados em comunidades tradicionais no âmbito do projeto Cartografia Social dos Babaçuais: mapeamento social da região ecológica do Babaçu.

A maneira como os agentes se apropriam desse mecanismo para reivindicar seus direitos e se colocarem contra situações adversas em seus territórios, constitui parte de um processo de relações que estabelecem entre si e entre seus pares diante de contextos de mobilizações que permeiam a luta das mulheres quebradeiras de coco nas áreas de ocorrência do babaçu.

De forma que, o olhar do sujeito pesquisado que interpreta o seu lugar, transparece nas representações daquilo que é considerado relevante e que seus olhos ressaltam. Os mapas produzidos pelos agentes sociais nas oficinas são reflexos do conhecimento tradicional objetivado pelos agentes sociais (FARIAS JUNIOR, 2010). Os símbolos atribuídos aos itens desenhados são espelhos da importância oferecida aos lugares considerados relevantes, cujos elementos contemplam conhecimentos sobre o território que permitem situá-los quanto a forma de organização social e política do território. Como ressalta Bourdieu (1997) o espaço social se retraduz no espaço físico.

2 CARTOGRAFIA SOCIAL DOS BABAÇUAIS E SUA TÉCNICA DE ELABORAÇÃO

As percepções iniciais constituem a palmeira dos mapas, os primeiros mapas dos babaçuais. Um desenho, uma aventura, que vai se conectando aos pontos, às curvas das linhas de áreas, de caminhos que tornam visíveis mulheres que quebram coco. Suas vidas, suas lutas pela vida, pela palmeira dos mapas, o babaçu.

Essas percepções se dão, também, pelo processo de elaboração das informações cartográficas. Estas, conciliadas com as informações de bancos de dados e com as experiências de pesquisa em campo. Situações localizadas que podemos discorrer sobre os procedimentos e métodos de pesquisa e as técnicas de laboratório de cartografia social.

Sobre estas técnicas podemos considerar inicialmente o levantamento de dados sobre as bases cartográficas já existentes. Os mapas que foram elaborados por diferentes fontes, constituem a base fonte a princípio. As fontes, neste momento, apresentam realidades que podem compor um diálogo preliminar. Seja como fonte temporal e como fonte de constatação, por interesses comerciais ou industriais e sociais pelos povos e comunidades tradicionais.

De imediato, as fontes até o momento são físicas, mapas antigos impressos. Considerando assim, cinco mapas que constituem as fontes cartográficas para iniciarmos o levantamento de dados técnicos digitais sobre os mapas. No entanto, apenas um desses, detínhamos os dados técnicos digitais em formato de base cartográfica, nos referimos ao mapa Guerra do Carvão. Sobre os outros mapas, até o momento não havia dados digitais em linguagem para Sistema de Informações Geográficas (SIG), que pudéssemos alimentar o banco de dados, elaborar novos e reelaborar os mesmos mapas. Para isto, recriar as bases cartográficas dos mapas impressos, físicos, seria necessário usar técnicas cartográficas sociais aliadas a conhecimentos de cartografia e tecnológicos de SIG avançados.

Diante desta análise, iniciou-se o procedimento de consulta de dados geográficos nas fontes de bases cartográficas levantadas disponíveis como: Instituto Brasileiro de Geografia (IBGE), Agência Nacional de Águas (ANA), Ministérios dos Transpor0074es, Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO), Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), Fundação Nacional do Índio (FUNAI), imagens de satélite e os próprios mapas como bases de referência. Para isto, considerando as referências de Sistemas de Informações Geográficas, o SIRGAS 2000.

Os mapas referidos como fontes temporais ou de constatação para este projeto de pesquisa, como informações técnicas para o laboratório de cartografia social temos: i - (1911) - Mapa Mattas e Campos no Brasil. Esboço organizado pelo Serviço Geológico e Mineralógico por determinação do Ministro da Agricultura, Indústria e Comércio. Ministério de Agricultura, Indústria e Comércio - Serviço de Informações - 1925. Reprodução do mapa da primeira edição deste trabalho. ii - (1983) - Mapeamento e Levantamento do Potencial das Ocorrências de Babaçuais 1983. Ministérios do Exército - Diretoria de Serviço Geográfico. Ministério da Indústria e do Comércio - Secretaria de Tecnologia Industrial. Escala 1:1.000.000. iii - (1993) - Guerra dos Mapas - Programa Grande Carajás: áreas reservadas, uso e ocupação do solo, conflitos sociais e recursos naturais. Mapa elaborado para o seminário/consulta: Carajás: Desenvolvimento ou Destruição. Promovido pelo GTA/Carajás e pelo GTA/Babaçu. Escala 1:1.300.000. iv - (2005) - Guerra Ecológica nos Babaçuais - Conflitos Socioambientais. Movimento Interestadual das Quebradeiras de Coco Babaçu (MIQCB).

Projetos Campanha contra o desmatamento e a coleta de coco inteiro, Lei do Babaçu Livre e Coleção Nova Cartografia Social da Amazônia Escala 1:1.000.000. v - (2014) - Mapeamento Social como instrumento de gestão territorial contra o desmatamento e a devastação: processo de capacitação de povos e comunidades tradicionais - Guerra do Carvão. Projeto Nova Cartografia Social da Amazônia (PNCSA). Escala 1:1.300.000.

Após consulta às bases cartográficas fontes e aos mapas fontes impressos, iniciou-se o processo de reelaboração das bases cartográficas a partir dos mapas impressos, com exceção do quinto mapa, o Guerra do Carvão, do qual já detemos as informações e bases cartográficas.

Sob as técnicas de cartografia social. Primeiro identificamos as legendas com organizações e dados relevantes existentes nos mapas. Este procedimento ocorreu em alguns encontros e reuniões com a equipe de pesquisa e a equipe do laboratório de cartografia social. No decorrer, houve algumas seções com a equipe toda, onde foram discutidas algumas abordagens. Nestas abordagens foram evidenciados os relatos dos agentes sociais, as organizações, os encontros com as lideranças. Os mapas impressos foram analisados, digitalizados, scanneados e fotografados para que pudéssemos inseri-los na interface do software SIG.

A equipe de laboratório de cartografia social, a partir do software SIG ArcGIS ArcInfo Advanced 10.2.2 instalado em uma mesa digitalizadora de alta resolução iniciou os procedimentos. E após consultas às equipes fizemos os procedimentos de separação das bases cartográficas dos mapas impressos. Esta separação deu-se pela identificação e georreferenciamento de informações geográficas em todos os mapas, os quatros primeiros citados com exceção do ano de 2014. Este procedimento de georreferenciamento gerou informações distintas de todos os mapas. Usamos ferramentas tecnológicas de precisão como: georreferenciamento, conversão geográfica, análise espacial, seleção automática, seleção por atributos, conexão de tabelas, edição de vértices, edição gráfica.

Os mapas agora existem, como bases geográficas, de forma digital, em formato Shapefile (SHP). Formato de arquivo que é permitido leitura no software SIG - ArcGIS 10.2.2. Estas informações podem, agora, ser manipuladas de maneira a elaborarmos novos mapas com considerável acurácia. Sejam para identificar as manchas de babaçuais, organizações, associações, elementos físicos e geográficos que estão presentes nos diferentes mapas, assim como agregar informações atuais.

Esta etapa proporcionou uma gama de informações que poderão ser usadas nos trabalhos de campo o andamento da pesquisa. Isto organizou outros mapas situacionais para o campo como o mapa dos cocais, o mapa da baixada, o mapa do bico, o mapa das organizações, o mapa das áreas de babaçuais, castanhais, soja, dendê, unidades de conservação e outros dados cartográficos.

Estes mapas estarão somando para a disseminação das informações previstas para o desdobramento do projeto. Tais informações estarão disponíveis em banco de dados, conectadas para acesso dos agentes sociais e instalação dos minilaboratórios. Com a instalação dos minilaboratórios os dados levantados a partir dos mapas impressos e dos trabalhos de campo formarão uma nova base cartográfica para acesso em rede.

Os dados a serem coletados no desdobramento da pesquisa proporcionarão uma gestão territorial, dos eventos localizados, ainda não evidenciados pelos agentes sociais com tecnologia embarcada em rede. A inserção das informações agilizará uma eventual tomada de decisão pelas organizações sociais diante das políticas governamentais. Esta gestão conectará agentes sociais e pesquisadores a partir das informações cartografadas.

Para esta inserção ocorrer completamente, serão proporcionados cursos e treinamentos para a operação dos minilaboratórios. Cursos de legislação, ambiental e territorial, de Convenção 169, noções básicas de manuseio com GPS, software SIG, instalação e operação de programas em computadores e treinamentos para a continuidade das atribuições operacionais e manutenção.

3 CAMINHOS PERCORRIDOS PARA DELINEAR “O MAPA DAS PALMEIRAS”

A forma como essas informações serão inseridas na cartografia social dos babaçuais estarão versadas por uma gama de informações que são estabelecidas pelos agentes sociais de maneira pertinente por se tratar de um contexto de luta e de conflitos frente a diferentes contextos de atuação, seja por grandes empreendimentos econômicos, seja por fazendeiros ou empresas de pequenos portes.

Entretanto, cabe aqui enfatizar que os recursos naturais, sintetizados então na ideia de terra e as mobilizações no sentido de sua conservação, servem de reforço à reivindicação da identidade coletiva de mulheres quebradeiras de coco (ALMEIDA, 2008). Essa especificidade faz parte de uma interpretação que não pode ser dissociada das mobilizações existentes nas áreas de ocorrência do babaçu. São essas mobilizações que passam a compor parte de um conjunto considerado para a reprodução física e social de comunidades inteiras que habitam essas regiões. Essa identidade é reforçada, fortalecendo também os laços de solidariedade que são criados face à ocorrências dos antagonistas sociais.

Essas mulheres reconhecidas como quebradeiras de coco babaçu apresentam necessidades que lhe são particulares em decorrência de suas práticas e relações sociais com os recursos naturais. Elas arquitetaram formas de organizações especificas, de relações de trabalho com os recursos naturais que lhes permitem reivindicar direitos que lhes assegure o livre acesso a esses recursos. São as palmeiras de babaçu que asseguram a essas mulheres importância na reprodução física, social e cultural.

No âmbito do projeto Cartografia Social dos Babaçuais: mapeamento social da região ecológica do Babaçu, para elaboração do mapa nos ancoramos nas informações que foram sendo mais evidentes durante o período dos trabalhos de campo, onde a ênfase dada às formas organizativas no mapa que apresentam relação direta ou indireta com as mulheres quebradeiras é parte de um contexto de informações fornecidas pelos agentes sociais. É possível ainda identificar áreas com maior ou menor incidência de palmeirais, áreas com verdadeiras florestas homogêneas e outras se demonstram bem espaçadas, sendo, portanto, permeadas por essas formas organizativas e movimentos sociais relacionados.

Esse espaçamento das palmeiras identificado em muitas áreas pode ser explicado pelas extensas áreas de pastagens que permeiam as áreas de babaçuais, mas pode também significar mecanismos de manejo do babaçu. Na região dos cocais maranhense, a existência de florestas homogêneas de babaçu nem sempre significa grande produtividade da palmeira, exigindo assim, praticas de derrubadas de algumas palmeiras para o aumento da produtividade da palmeira. Alguns desses pastos apresentam palmeiras espaçadas e algumas pindovas, entretanto, essas pindovas são por vez, são envenenadas para não prejudicarem o gado.

São essas demandas que tornam os mapas em questão situacionais, evidenciando os aspectos sociais dos lugares, pois ao produzir tais mapas os agentes sociais reproduzem aquilo que julgam necessário enfatizar para retratar sua própria realidade. Ao analisar o mapa, os pontos evidenciados como referências são compatíveis com os discursos de apropriação de lugar construído pelos agentes sociais.

Os mapas elaborados evidenciarão de fato, as características pertinentes nos discursos dos agentes, dando ênfase aos fatores religiosos, aos usos dos recursos naturais e à organização social em torno do território, permitindo compreender a realidade dos agentes sociais. A informação obtida no mapa retrata maneiras de interpretações que não está naturalizada nas produções dadas oficialmente, pelo contrário, são parte de um processo de apropriação do saber construído pelos agentes sociais ligadas aos seus interesses comuns, pois trata-se de uma construção coletiva.

4 CONCLUSÃO

O trabalho de elaboração de mapas consubstanciado na Cartografia Social enquanto processo nos conduz a uma reflexão que é fazer entender que as cartografias sociais produzidas são resultado das ações e da participação dos agentes sociais envolvidos.

São cartografias que refletem suas lutas, conflitos, crenças e formas de mobilizações que compõem parte daquilo que interessa para saber como vivem, tornando possível o uso desses instrumentos atuantes no processo de construção social dos mapas.

Transformando tais cartografias sociais em objeto de ação política, revelando-se ferramentas uteis para mobilizar comunidades e gerar debates locais sobre situações adversas que acometem seus territórios.

Referências

ALMEIDA, A. W. B. de A. Antropologia dos Arquivos da Amazônia. Rio de Janeiro: Casa 8/ Fundação Universidade do Amazonas, 2008.

BOURDIEU, P. Compreender: a miséria do mundo. Rio de Janeiro: Vozes, 1997.

FARIAS JUNIOR, E. de A. Cartografia social e conhecimentos tradicionais associados à reivindicação de territorialidades específicas no baixo Rio Negro: os quilombolas do Tambor. Cadernos de Debates Nova Cartografia Social, Manaus, v.1, n. 1, p. 90-97, 2010.

Notas

1 Artigo produzido a partir de experiências na elaboração de cartografias sociais e pesquisas de campo realizadas no âmbito do projeto Cartografia Social dos Babaçuais: mapeamento social da região ecológica do Babaçu.


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