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FEMINISMO EM TEMPOS DE BARBÁRIE: as mulheres e o desaÞ o na reinvenção da organização política
Revista de Políticas Públicas, vol. 22, pp. 831-850, 2018
Universidade Federal do Maranhão

Mesas temáticas coordenadas


Recepção: 15 Março 2018

Aprovação: 16 Maio 2018

Resumo: O trabalho faz breves reflexões sobre a barbárie que expressa mundialmente a crise contemporânea do capital em um processo voraz de opressão (exploração e dominação) da classe trabalhadora e de suas frações. Destaca que tal crise se diferencia quanto aos componentes estruturais de classe que sustentam a dominação do capital quais sejam: raça/etnia e gênero. Por essa razão, as mulheres que constituem parte da classe trabalhadora, e especialmente as mulheres negras, são profundamente atingidas nos processos de barbárie em curso, daí o feminismo se constituir em importante movimento social no enfrentamento ao capital. Analisa como a legitimação da barbárie se dá em um processo de naturalização das consequências da acumulação do capital como parte da estratégia ideológica de alienação dos sujeitos sociais e por essa razão apresenta a categoria da alienação e da consciência como fundamentais para a luta política do feminismo.

Palavras-chave: Barbárie, feminismo, alienação e consciência.

Abstract: This paper brings brief reflections on the barbarism that expresses the contemporary crisis of capital worldwide in a voracious process of oppression (exploitation and domination) of the working class and its fractions. It points out that such a crisis differs in terms of the structural class components that underpin the domination of capital, such as race / ethnicity and gender. For this reason, women who are part of the working class, and especially black women, are deeply affected in the processes of ongoing barbarism; hence, feminism becomes an important social movement in confronting capital. It analyzes how the legitimation of barbarism occurs in a process of naturalization of the consequences of the accumulation of capital as part of the ideological strategy of alienation of social subjects and for this reason presents the category of alienation and consciousness as fundamental to the political struggle of feminism.

Keywords: Barbarism, feminism, alienation and consciousness.

1 INTRODUÇÃO

O presente ensaio volta-se para uma reflexão sobre as transformações recentes na sociedade brasileira sob a égide neoliberal, partindo da compreensão de que embora desde a década de 1970, o neoliberalismo tenha sido gestado mundialmente como uma nova forma de acumulação capitalista, no Brasil foi mantida sob a orientação do Banco Mundial (BM) um processo diferenciado dessa acumulação por meio de governos de cunho social burguês, ancorado em um fugaz nacionalismo, e no caso dos governos Lula e Dilma, de governos neodesenvolvimentistas. Somente no século XXI, o neoliberalismo passa a expressar-se de forma sistemática, porém, conciliando pilares da financeirização com Políticas compensatórias formuladas e implementadas com a mobilização e participação social tendo como fundamento o combate à pobreza.

No entanto, após o golpe que resultou no impeachment da Presidenta Dilma Rousseff, a adoção do neoliberalismo mostrou-se cada vez mais alinhado à acumulação burguesa capitalista em detrimento dos direitos assegurados constitucionalmente pela população brasileira, evidenciando, assim, a hegemonia sem precedentes do capital financeiro e resgatando práticas autoritárias e conservadoras de um Estado que busca anular a esfera pública no tocante à garantia de direitos e à relativa participação popular conquistada desde as últimas décadas do século XX. Dessa forma, a população brasileira, e em especial, alguns sujeitos sociais a exemplo das mulheres (resguardando aqui evidentemente, as diferenças entre as mesmas, e por conseguinte, as diferentes maneiras de expressão de desigualdades, exploração e dominação que recaem sobre as mulheres nesse contexto), sofrem mais as agruras do modo de acumulação capitalista neoliberal que se implanta desde então.

Isso posto, não significa desconsiderar que os governos Lula e Dilma, como já mencionado, estavam articulados à financeirização do capital, apenas expressavam uma busca consensual e legitimada, uma vez que na correlação de forças que compunham tais governos havia uma herança significativa das organizações que simbolizavam a sociedade civil do campo democrático e popular como costumeiramente denominada. Nessa perspectiva de análise, concordo com Roberto Leher (2013), quando com base em Perry Anderson no prefácio do livro de Flávio Farias (2013), chama a atenção para o fato de que o neoliberalismo tornou-se um pressuposto também da esquerda referenciada na social democracia e em concepções marxistas que busca como alternativa à convivência com o capitalismo, efetivar direitos sociais focalizados entre os segmentos sociais.

Nesse ideário, o Estado brasileiro, sob a orientação de organismos como o BM, adotou termos como nova governança, governança compartilhada e outros similares para adjetivar a participação dos cidadãos na esfera estatal. Não se trata da velha prática de cooptação individual para legitimar as práticas de governos, mas sim de uma participação institucionalizada coletivamente e, mais, trata-se de uma participação demandada também de fora para dentro das instâncias de governo. A experiência de governos de esquerda nas três esferas de governo provocou, por vezes, confusões na sociedade civil organizada no campo à esquerda, que confundiam governo e sociedade. Entretanto, esse não é um comportamento isolado do Estado brasileiro, porém, há de se perceber a relação entre o universal, particular e singular, e, assim, buscar perceber como essas conexões se expressam nos contextos de cada território nacional. Conforme Farias (2013, p. 30),

[...] na configuração neoliberal, a mundialização do capital é ao mesmo tempo uma globalização guerreira e imperialista, que não rompeu sua articulação com as formas estatais capitalistas nacionais e regionais, uma e outras se correspondem e se colocam no mesmo diapasão, ainda que, progressivamente, estejam-se constituindo aparelhos institucionais internacionais que, sem dúvida, reduzem a soberania dos Estados, muito mais nos países periféricos do que nos centrais.

Na atual realidade brasileira, o governo que resulta do golpe à democracia traz à baila a negação de todas as maneiras de efetivação do diálogo propositivo com o Estado. A reação conservadora e autoritária do Governo Temer tem como propósito o aniquilamento dos sujeitos sociais que se contrapõem aos ditames do capital e, para tal, utiliza-se de pseudos valores religiosos, cívicos e outros, mostrando claramente a relação entre a dimensão ideológica que permeia as esferas econômica, jurídica e política.

Dessa forma, é importante compreender que o neoliberalismo é mais do que um ajuste estrutural no campo econômico, pois como ideologia, atinge as dimensões política, social e econômica e, nesse sentido, é determinado e determina a estrutura e a superestrutura das sociedades, o que leva à conclusão de que o neoliberalismo manifesta-se no cotidiano atingindo coletivamente os indivíduos, redefinindo lugares, sujeitos, relações... imprimindo novas sociabilidades à medida que interfere nos lugares, nos espaços, nos territórios, por conseguinte, os processos de opressão (exploração e dominação) causam cada vez mais humilhação, violências e sofrimentos que tornam indivisíveis a dimensão material da dimensão subjetiva.

Assim, cada vez mais, o neoliberalismo revela a máxima observada por Marx e Engels (2004) de que “[...] as ideias dominantes são as ideias da classe dominante”, pois no caso brasileiro, no atual complexo das teias que movem a acumulação capitalista e na qual se insere o Estado como mediador desse processo, a sociedade vive contraditoriamente ora a negação, ora a afirmação de valores enunciados por um governo que se mostra incondicionalmente a serviço do capital. Essa ambiguidade, concluo, é determinada pelas condições objetivas de vida que conduz às interpretações burguesas sobre a realidade imediatamente vivida.

A busca incessante pelo pensamento único em defesa dos ideais burgueses de acumulação de capital tem sido constante, e, nessa perspectiva, o conservadorismo norteia as práticas que formatam um novo marco civilizatório. Para tal, conservadorismo e autoritarismo se mesclam na contramão das garantias de direitos e não apenas atentam contra novas conquistas, como também desconstroem direitos já assegurados, a exemplo da contrarreforma trabalhista e da seguridade social em curso no Brasil; contudo, na dinâmica contraditória do capital, esse processo proporciona as formas de resistência da classe trabalhadora.

Como ressaltam Paulo Neto (2001), Iamamoto (2001), Pastorini (2010) e outros (as), a contradição capital x trabalho continua sendo a determinação das novas configurações de exploração, dominação e desigualdades daí oriundas, e, dessa forma, determina a resposta dos trabalhadores (es), incluindo aí, sujeitos até então menos impactados ou mesmo menos mobilizados e conscientes da sua condição. Logo, como observam tais autores (as), não se trata de uma nova questão social, o que se apresenta no cenário mundial desde metade do século XX, acentuando-se nas primeiras décadas do século XXI; são tão somente, novas configurações ou novas expressões da questão social que continuam a resultar da relação capital x trabalho, considerando as singularidades, sem perder a dimensão do universal, posto que “A mundialização do capital tem primazia ontológica como configuração que reproduz sem cessar, numa escala ampliada, as forças produtivas e as relações de produção sobre a base das quais se ergue o modo estatal global.” (FARIAS, 2013, p. 48).

A violação aos direitos elementares da pessoa humana, configurando a humilhação, chega aos extremos na contemporaneidade. Alguns autores denominam tal fenômeno de crise do processo civilizatório, apogeu da barbárie. Barbárie aqui compreendida como o oposto da civilização; logo, a barbárie assemelha-se à selvageria.

Norbert Elias (1994), na sua obra O Processo Civilizador, nos mostra como o conceito de civilização sofreu diversas mudanças até adquirir o significado que possui hoje, qual seja, de controle dos instintos, de um comportamento mais baseado no racional do que no emocional; então, o autor nos mostra como o controle sobre os indivíduos foi determinante no processos civilizador.

No imaginário social, as cavernas seriam os lugares da selvageria. Arendt (1997), por sua vez, nos fala da esfera privada como a esfera passível da violência, contudo o processo de acumulação do capital ancorado na globalização torna violentas todas as esferas da sociedade e, por conseguinte, torna violenta a sociedade. A pobreza, a ideologia do consumo, as desigualdades crescentes, a indiferença do Estado-nação em face das humilhações vividas pela população, a falta de perspectivas para muitos, em especial para a juventude, geram sentimentos de animosidade entre os sujeitos, fortalecendo comportamentos orientados pelo individualismo, pela lógica do TER para SER. Mas vale a ressalva: a questão não é individual, é coletiva. Não que a barbárie tenha nascido com o capitalismo, mas sem dúvida, com ele se recrudesce. Assim, podemos afirmar que a barbárie revigora-se e assume maiores dimensões quanto maior a capacidade de extrair o lucro que gera a sua acumulação; essa é a sua determinação, ou seja, a barbárie resulta da crise do capital e não da maior ou menor humanização de cada SER em Si, daí o desafio do enfrentamento coletivo a esse fenômeno.

Nessa perspectiva de análise, é importante compreender que, embora as relações de gênero, raça/etnia e outras identidades determinem diversas expressões da barbárie, esses elementos apenas a estruturam, pois como lembra Saffioti (2004), é necessário compreender a simbiose entre capitalismo, patriarcado e racismo.

2 TEMPOS DE BARBÁRIE OU CRISE DO CAPITAL?

Não estamos tratando de fenômenos estanques. A crise do capital causa a barbárie desde o seu nascedouro. Em uma dinâmica contraditória, a crescente acumulação capitalista gera um fosso social que resulta na deterioração das condições de vida da maioria da população desde o seu surgimento: pilhagens, saques, expropriação, exploração (inclusive de crianças) marcam o surgimento do capitalismo, reservando as devidas particularidades históricas.

Como observa Marx (1991) no Livro 1 do Capital, à medida que a sociedade avançava na produção de bens e serviços, quanto mais domínio mostrava sobre a tecnologia, mais pessoas encontravam-se na condição de despossuídos, sem condições de atender às necessidades elementares para se manterem. O movimento de acumulação do capital retira da pessoa a condição vital para a sua reprodução, qual seja, o trabalho. Lembro aqui do compositor brasileiro Gonzaguinha quando diz: “[...] Um homem se humilha se castram os seus sonhos, seu sonho é a sua vida e a vida é o trabalho e sem o seu trabalho um homem não tem honra, e sem a sua honra se morre e se mata”. Aí consiste o que tão simplesmente o capital denomina de marginalidade ou violência de alguns contra todos; ou seja, transfere aos sujeitos a responsabilidade pela violência que gera e que, na aparência, se expressa como comportamento individual; assim, a essência destrutiva do capital, que conforme Antunes (2000, p. 22-26), decorre do seu próprio metabolismo social,

[...] deu origem a uma das tendências mais importantes do modo de produção capitalista, que Mészáros denomina taxa de utilização decrescente do valor de uso das coisas [...] O capital operou, portanto, o aprofundamento da separação entre a produção voltada genuinamente para o atendimento das necessidades humanas e as necessidades de auto reprodução de si próprio. Quanto mais aumentam a competição e a concorrência interceptais, mais nefastas são suas consequências, das quais duas são particularmente graves: a destruição e/ou precarização, sem paralelos em toda a era moderna, da força humana que trabalha e a degradação crescente do meio ambiente, na relação metabólica entre homem, tecnologia e natureza, conduzida pela lógica societal subordinada aos parâmetros do capital e do sistema produtor de mercadorias.

Sob essa ótica, compreende-se que a barbárie é interpretada apenas na sua aparência; logo, não é apreendida como uma construção social gerada pelo capital, passando a ser disseminada apenas como um comportamento desviante gerado pelos indivíduos. Em consonância com essa compreensão, as alternativas buscadas para sanar a violência consistem em atos de repressão (em nome da ordem), exercidos pelos aparatos policiais e legitimados pela sociedade, chegando em muitas situações a agir em nome da justiça, cometendo atos de linchamentos e outros, valendo-se da máxima: fazer justiça com as próprias mãos. Essas práticas conservadoras e reacionárias grassam a ordem mundial contemporânea. A proteção exclusivamente individual buscada por cada sujeito individual gera a violência coletiva orquestrada pela lógica do capitalismo em escala planetária. Aí tem lugar a militarização, a moralidade casuística que reafirma práticas patriarcais e se mantém indiferente à violência contra as mulheres, a intolerância ao diferente (com destaque para a intolerância religiosa e aos estrangeiros refugiados), o crescente comportamento homofóbico, o tráfico de mulheres e de meninas, o narcotráfico, a destruição dos recursos naturais em escala planetária e outros danos à humanidade. Tudo isso é representado socialmente como dados em separado.

Ocorre um estranhamento aos fatos, pois, embora a população sinta a ausência do Estado, ela não é capaz de apreender a totalidade do processo. A compreensão mostra-se fragmentada, espacializada e imediata, pois os elementos que compõem o metabolismo do capital e fazem o seu movimento, são invisíveis. Assim, perde-se a dimensão da totalidade, não se identifica que as contradições do capital têm como corolário, a barbárie dos tempos atuais, ou seja, não se compreende que cada vez o capital cria e recria formas de acumulação do capital e que em tais formas está contido o germe da exploração, violação, dominação e da humilhação que faz surgir a barbárie de forma particular e singular a cada contexto.

Dito isso, reafirmo que o capitalismo, ao gerar novas expressões do pauperismo, redesenha a barbárie social e as respostas dadas não correspondem, uma vez que não se voltam para as determinações estruturais, haja vista que o Estado responde à questão social, tentando desvinculá-la da lei geral da acumulação, fazendo transparecer, por conseguinte, que a questão social e a acumulação do capital não estão intrinsecamente relacionadas; esse é um comportamento acentuadamente presente nas sociedades capitalistas no atual contexto de crise do capital, fazendo emergir nos países centro do capitalista, um contingente de pobres em ascensão. Observa Paulo Neto (2012, p. 206) que,

o desenvolvimento capitalista produz, compulsoriamente, a “questão social” – diferentes estágios deste desenvolvimento produzem diferentes manifestações da “questão social”; esta não é uma sequela adjetiva ou transitória do regime do capital: sua existência e suas manifestações são indissociáveis da dinâmica específica do capital tornado potência social dominante. A “questão social” é constitutiva do capitalismo: não se suprime aquela se este se conservar.

Assim, frente à voracidade do capital, a desordem parece abstrata e não ditada pelas grandes corporações financeiras que moldam a economia, a política e o social aos interesses do capital financeiro. Por essa razão, vários setores da esquerda passam a aderir às plataformas neoliberais com vistas a amenizar os conflitos sociais existentes. O ideário participativo da democracia burguesa acomoda, assim, parte significativa dos movimentos sociais e os denominados processos identitários assumem o lugar das classes sociais. Essas práticas são embasadas sobretudo por um revisionismo das teorias que antes orientavam essas representações da esquerda. Ao lado disso, acentuam-se as desigualdades que cada vez mais são analisadas de per si, sem a perspectiva analítica da totalidade.

Dessa forma, perde-se de vista o movimento do geral para o particular e vice-versa, impossibilitando-nos entender as contradições inerentes ao capital que dão origem à pobreza nos países europeus e nos Estados Unidos, por exemplo; ou seja, sem esse exercício de apreensão da totalidade, não se compreende, portanto, a pobreza em meio a economias que crescem no contexto da globalização. No caso do Brasil, a sua maior inserção na ordem mundial caminhou juntamente com altos índices de violência urbana e rural, com a destruição sem precedentes dos recursos naturais, com a expropriação de trabalhadores (as) de seus territórios pela apropriação do capital que os capturaram como espaços privilegiados para a acumulação, como o fez desde sempre, sendo que agora em processos mais intensos de concentração e centralização por meio da transnacionalização que envolve esses processos.

Frente à barbárie, muitos desafios se apresentam à organização da classe trabalhadora nas suas diversas frações de classe, sem, contudo, perder a perspectiva da unidade. E neste trabalho, refletiremos sobre alguns desafios postos aos movimentos feministas no enfrentamento à acumulação contemporânea do capital e, por conseguinte, à barbárie. Importante ressaltar que esse breve ensaio longe está de esgotar a realidade em análise.

3 O MOVIMENTO FEMINISTA: desafios no enfrentamento à barbárie

Em meio à globalização que expressa uma nova mundialização do capital, a classe trabalhadora compreendeu que a unidade planetária dos (das) trabalhadores (as) se encontra cada vez mais atual. O chamamento de Marx e Engels para a unidade proletária mundial, ainda se constitui uma necessidade. Articulações como o Fórum Social Mundial (FSM), com suas limitações, se constituem em esforços nessa direção. A unidade construída por organizações latino-americanas também dão mostras desse esforço, a exemplo da Via Campesina, que embora não se restrinja à América Latina, tem ali a sua grande expressão. Ainda que haja uma inclinação de parte da sociedade civil do campo democrático e popular (que na perspectiva de cumprir a agenda dos direitos humanos) a aderir às ideologias de cunho burguês, outra parte resiste a essa inclinação e outra busca mediar a relação com o Estado na perspectiva da proposição e contraposição, sem, contudo, abrir mão do acesso à participação nos processos de formulação e implementação de políticas públicas de caráter universal e/ou focalizado, bem como do acesso às mesmas. Nesse bloco estão as organizações que buscam construir o processo de democratização das instâncias do Estado por meio dos canais institucionais de participação, a exemplo dos Conselhos de Direitos e dos Conselhos de Políticas Públicas e, por fim, destacaríamos as organizações que se contrapõem radicalmente a qualquer possibilidade de concertação com o Estado, atuando tão somente na mobilização e confronto ao Estado Capitalista, concebendo-o como espaço exclusivo de respostas aos interesses da burguesia. Estas organizações, ao primarem por uma outra ordem societária, buscam construí-la na contraposição, e não na articulação por dentro das instâncias institucionais.

O Movimento Feminista ou os Movimentos feministas, em suas diversas correntes, expressam as caracterizações mencionadas, embora com predominância do terceiro e quarto bloco. Isto diz da polissemia que permeia o movimento feminista em seu conjunto.

É inegável que o movimento feminista se constitui, na contemporaneidade, no movimento social com maior visibilidade e poder de articulação mundial. À medida que se asseveram as desigualdades sofridas pelas mulheres no mundo, com índices alarmantes de assassinatos femininos, as mulheres avançam na mobilização em escala mundial. Em cada país, as mulheres constroem institucionalmente ou não, canais de mobilização, divulgação e uma práxis que mistura ações de massa com ações pedagógicas de médio e longo alcance. Nesses processos, cabe o diálogo e/ou alianças no conjunto polissêmico já mencionado como ações estratégicas, a depender do objetivo.

No entanto, é importante considerar que as especificidades de raça/etnia, orientação sexual e outras (especialmente de caráter de identidade) não avançam suficientemente na unidade da formulação de agendas de lutas que confrontem o capital. A compreensão teórica da articulação intrínseca entre patriarcadoracismo-capitalismo ainda não se traduz em ações políticas para muitos desses movimentos ou organizações. Apesar da trajetória de luta mundial das organizações de mulheres e a depender de cada país (registra-se uma maior ou menor articulação entre mulheres brancas e mulheres negras); essa unidade ainda fica refém de uma generalização das mulheres em torno de um feminismo que às vezes parecer pairar abstratamente sobre as diferenças de classe e raça/etnia (para destacar diferenças mais estruturantes).

Na década de 1981, Angela Davis (2016), ao lançar o seu livro Mulheres, Raça e Classe, descreve e analisa o processo de organização e participação política das mulheres nos Estados Unidos e as dificuldades nesse processo para que o racismo e, portanto, as particularidades das mulheres negras fossem percebidas e incorporadas como situações diferenciadas. Conforme a autora, foi longo o processo para que essa unidade pudesse ser construída e, mesmo assim, apresentando fragilidades e lacunas ainda presentes no século XXI.

Davis (2016), contudo, ressalta a necessária articulação classe/ raça e a necessidade de colocar tal articulação no centro da análise econômica. Para Davis (2016, p. 203), “As dimensões críticas da violência sexual constituem uma das facetas e uma profunda e continua crise do capitalismo. Como lado violento do sexismo, a ameaça de estupro persistirá enquanto a opressão generalizada contra as mulheres continuar a ser uma muleta essencial para o capitalismo”.

A referida autora também chama a atenção para o enfrentamento da cultura sexista e racista considerando o capitalismo e a sua forma de manifestação e rebatimento em cada contexto e segmento social, o que não significa fragmentar a luta, mas considerar a sua materialização frente à expressão concreta do capital. A cumulação do capital se manifesta diferentemente em cada particularidade histórica, assim como apresenta consequências de acordo com essas diferenciações. E por essa razão, Angela Davis (2017) chama a atenção para a necessidade de pensar a opressão sobre as mulheres como um triunfo do capitalismo, mas tendo presente que essas opressões, bem como as lutas que as ensejam, são diferentes para cada segmento de mulheres, no tocante às classes sociais e etnias; por essa razão, a cultura e a política adquirem para ela um valor sem igual no enfrentamento das mulheres negras ao capital. Por meio da cultura se forma a consciência política como elemento fundamental desse enfrentamento.

E nesse sentido, a autora resgata os ensinamentos teóricos e políticos de Clara Zetkin para mostrar que a luta política só é possível com a elevação da consciência alienada para a consciência crítica, e que esse processo se dá no bojo da própria luta, articulando os vários sujeitos à medida que os mesmos são contextualizados em suas realidades e nas formas que o capital os atingem. Quando isso ocorre, se podem articular as várias dimensões da luta, e, dessa forma, relacioná-la a cada realidade concreta.

Desse pensamento, busco trazer a categoria da consciência como vital para pensar o avanço e desafios do e ao feminismo mundialmente.

5 A CONSCIÊNCIA CRITICA COMO SUBSTRATO DO FEMINISMO NO ENFENTAMENTO À BARBÁRIE

Do exposto até aqui, me permito afirmar que ao falarmos sobre barbárie, estamos, sobretudo, fazendo referência à crescente degradação humana em contraponto à perspectiva da emancipação humana, equivalendo portanto a barbárie ao próprio capital em sua voraz acumulação.

Mas como vimos, a barbárie aparece de forma fenomênica, não mostrando a sua essência. Então, a sua determinação aparece de forma alienada aos sujeitos sociais, que, apesar de senti-la, não a reconhecem como produto das relações de produção capitalistas que afasta os sujeitos do processo de produção, da sua criação, e, dessa forma, os impossibilitam de compreender a dinâmica da reprodução social. Aprendemos com Marx e Engels (2004) que a realidade determina a consciência e não o seu contrário. Assim, esses autores nos ensinam que as ideias comumente interpretadas como ideologias são elaborações que atendem a interesses, e no caso das sociedades capitalistas, obedecem prioritariamente aos interesses do capital.

Claro está que não estamos tratando de um movimento unilateral. Os confrontos, os contrários, as contradições são movimentos que permeiam as relações, e, portanto, embora a ideologia burguesa seja hegemônica, essa hegemonia não se dá sem lutas de contrários, daí falar de ideologias, que no campo da disputa ideológica utilizam-se de instrumentos os mais diversos. A depender da correlação de forças, esses instrumentos alcançam os diversos espaços sociais: escolas, Igrejas, famílias etc. Adentram as esferas políticas, jurídicas e o Estado.

A classe dominante, ancorada nas instituições sociais, moldam os processos de socialização dos sujeitos, e os aparatos institucionais, por sua vez, fazem ecoar os enunciados dominantes. Por meio de práticas educativas, do controle, da coerção, da manipulação, a ideologia dominante se dissemina e gera a alienação compreendida como a ocultação e distorção do real.

A alienação consiste na compreensão fenomênica da realidade. O real se torna o imediato fragmentado. Como nos ensina Marx (2003), esse imediato é parte do processo de compreensão da realidade, mas somente se concretiza se conseguimos ultrapassá-lo, articulando as diversas dimensões do todo. Não se trata de ligar/relacionar, mas sim, de compreender as relações intrínsecas dos processos. Somente assim, a realidade reflete o exercício de apreensão do concreto ao abstrato, resultando no concreto pensado, que permite superar a individualidade ou particularismo que existe nas análises do real sob a ótica a-criticidade, da naturalização dos acontecimentos, ou melhor, do movimento do real.

É imprescindível compreender a alienação, para, assim, compreendermos o processo de formação da consciência. Como observa Cisne Mirla (2014, p. 37), “[...] a consciência é fruto social, resultante de um processo ininterrupto, ou seja, ela não é estanque, exatamente por ser social”. Com base nessa autora, podemos dizer que a compreensão da consciência é um desafio para que possamos compreender como as imagens, os símbolos e as coisas se formam e adquirem significado na mente humana; como as representações sociais constituem elementos do imaginário individual e social; como ocorre a síntese entre a percepção objetiva do mundo na dimensão subjetiva dos sujeitos, ou seja, como se dá a síntese entre a dimensão subjetiva e o mundo objetivo.

Como os sujeitos, ao estabelecerem relações com o mundo e no mundo, processam tais relações por meio de símbolos e linguagens e formam a compreensão que se expressa em enunciados e práticas cotidianamente.

Com base nesse pensamento, compreendo que a superação da alienação e a formação da consciência crítica (sendo esta o oposto daquela), se constituem um dos grandes desafios ao movimento feminista. No seio das sociedades, a socialização entre os sexos impõe a forma de ser mulher e de ser homem, com base em relações de poder (econômico, social, político). Essas relações são determinadas historicamente, e, no capitalismo, elas se reafirmam em desigualdade mais do que em qualquer período da história, pois como já tratamos em outra parte deste trabalho, as desigualdades de classe, raça/etnia e sexo sustentam a acumulação capitalista desde o seu primórdio.

Particularmente em relação às mulheres, a alienação permite naturalizar as violências, explorações e dominações que sobre elas recaem, considerando tais fenômenos como parte inevitável da ordem social. Não se desvelando a dominação presente nas relações sociais, considera-se, portanto, que os papéis e lugares dos sujeitos estão pré-estabelecidos na ordem social para que tudo funcione integradamente, sem desvios; nesse sentido, a criminalização às mulheres que ousaram e ousam desafiar essa ordem foi sempre uma constante na história do capital. Fato é que em épocas anteriores ao capitalismo, essa opressão também se deu; contudo, não contou com os aparelhos que a legitimam de forma institucionalizada, não contou com uma sociedade com tamanhas descobertas cientificas e tecnológicas, não contou com uma caracterização planetária que se eleva em conhecimentos e informação, não contou com a geração de riqueza monetária em tamanha escala. Não contou com o Estado.

E tudo porque a divisão sexual do trabalho é sustentáculo da acumulação do capital e, para tal, as mulheres precisaram tornar-se invisíveis na esfera da produção, configurando tão somente como ajudantes em momentos de crise; talvez essa tenha sido uma das primeiras representações sociais da mulher com vistas a aliená-la da condição de sujeito social.

Quando Marx fala do estranhamento do trabalhador do seu produto, impossibilitando-o de se ver como produtor da riqueza, estranhamento semelhante ocorre com as mulheres que ao sustentarem o seu trabalho, não se veem como portadoras dessa participação, incluindo aqui o trabalho dentro do lar na esfera da reprodução, tratado por Saffioti (1979), no livro A mulher na sociedade de classes: mito e realidade. A autora trabalha essa invisibilidade, esse não reconhecimento do trabalho da mulher, ou a sua subordinação/secundarização como formas de exploração do trabalho das mulheres. E mostra como essa condição imposta às mulheres é legitimada pelos homens de todas as classes e se torna naturalizada pelas mulheres que não se percebem como exploradas, uma vez que estão alienadas nos papéis que foram socializadas desde a infância.

E não por acaso, o movimento feminista tem na luta pelo reconhecimento ao trabalho uma das suas históricas bandeiras de lutas. Embora se faça oportuno demarcar como essas lutas se configuram diferentemente para a diversidade de mulheres, cabe a ressalva de que o trabalho há muito se constitui em categoria teórica e política fundamental para o feminismo no mundo, inclusive a luta pelo corpo, pelo direito ao domínio do seu corpo (muitas vezes acusada de bandeira burguesa dos movimentos feministas), foi e continua sendo uma forma de confronto ao capital que tem no corpo feminino um reservatório de fórmulas utéia para acumulação do capital em todas as suas fases.

Ao conceber a mulher explorada e dominada na esfera pública e privada, o movimento feminista avança para a luta política no patamar que relaciona as duas esferas da vida social. E nessa perspectiva, a luta é política e se trava em todas as esferas (rua e casa) na interlocução com os diversos sujeitos sociais nessas esferas. Para tal, desconstruir modelos advindos do processo de socialização se faz necessário. Nessa desconstrução que é eminentemente pedagógica, constroem-se e reconstroem-se identidades: de gênero, raça/etnia outras. Ai percebemos quão importante se apresenta a política para as mulheres. Política no sentido amplo, na forma de comunicar-se com o mundo, desvelando o que está oculto ou obscuro. A luta política se sustenta nesse desocultamento que nada mais é do que a desalienação que questiona e rompe com modelos institucionalizados.

Se não fazemos as interconexões entre essas dimensões, não conseguimos nos aproximar da totalidade que dinamiza a realidade. Por essa razão, o movimento feminista se constitui na luta pedagógica pelo desocultamento, pela construção da consciência crítica.

O feminismo, mundialmente, vivenciou diversas fases e continua a vivenciá-las, contudo, nesse construto, as diferentes formas de fazer o movimento demonstram a homogeneidade nessa desconstrução. As práticas traduzidas pelo movimento não expressam, no seu conjunto, a diversidade, e, sobretudo, as diferenças e antagonismos na forma de conceber e se posicionar frente à realidade.

A luta política é o cerne da luta de classes. O feminismo é ao mesmo tempo parte do universal e do particular. O feminismo é concebido neste trabalho como movimento social, mas também como ideologia que no movimento da sociedade constrói e dissemina ideias que, por sua vez, desconstroem as ideologias dominantes, coloca-se na formação de uma contra ideologia que tem como horizonte a emancipação humana. Para o feminismo, conflita no interior da própria classe trabalhadora, quando explodem os sustentáculos do patriarcado, incorporado pelos trabalhadores independente da raça/etnia, da localização geográfica e outras identidades.

Assim, o feminismo confronta a barbárie contemporânea que destrói os laços civilizatórios construídos até então. No Brasil, a ascensão do conservadorismo faz ruir os direitos conquistados pelas mulheres nas esferas pública e privada; a barbárie se materializa sobretudo nos alarmantes índices de feminicídio. O mapa da violência publicado anualmente nos mostra o crescimento da violência sobre as mulheres negras com maiores percentuais, do que sobre as mulheres brancas. E mostra, também, que o fenômeno da violência contra as mulheres no Brasil cada vez mais se espalha pelos interiores dos estados, ou seja, o espaço rural também expõe dados alarmantes de violências as mais diversas, o que às vezes, resulta em assassinatos.

Dessa forma, o Estado precisa efetivamente fazer valer a legislação no sentido de implantar ações que coíbam a violência contra as mulheres. A impunidade reafirma o patriarcado, e em se tratando das mulheres negras, o descaso é maior porque está ancorado no racismo institucional, fazendo com que as instituições considerem natural a violência entre as populações negras, ou menos importante, que uma mulher negra sofra violências de qualquer natureza.

As mulheres têm se tornado mais pobres. Cada vez, mais mulheres no mundo constituem a maior parcela da população flutuante disponível à acumulação do capital. Em vários países, mesmo com o aumento da escolaridade das mulheres em relação aos homens, elas continuam, em sua maioria, em desvantagens em relação aos homens com o mesmo nível de escolaridade: menores salários e menos oportunidades para desempenharem funções mais elevadas do que os homens.

A redução ou precarização dos serviços públicos impõem às mulheres pobres uma carga excessiva de trabalho. A falta de equipamentos para as crianças e os velhos se torna um agravante para a inserção dessas mulheres no mundo do trabalho, o que as obriga quase sempre a recorrerem a redes familiares ou a outras mulheres, o que acaba na reprodução da precarização da inserção das mulheres no mundo do trabalho, especialmente o trabalho dos que requerem maiores cuidados. Isso tem sido uma limitação crucial às mulheres pobres e negras, em sua maioria. Daí porque o debate sobre o trabalho das mulheres na esfera do privado, no trabalho da sua casa, se constituir em importante componente da agenda pública na interlocução com o Estado. Essa falta de atendimento a essas demandas representam a desresponsabilização do Estado para com as demandas das mulheres, mas também a desresponsabilização com a infância e a juventude, uma vez que quase sempre recai sobre elas esses cuidados. É, portanto, uma tarefa fundamental para sociedades como a brasileira, posto que aumenta o número de mulheres que assumem, sozinhas, a chefia da família.

A financeirização do capital as coloca em condições de expropriação dos seus lugares com expulsão compulsória pela instalação de grandes projetos; em outros casos, assiste-se à sua expulsão ou de parte de suas famílias pelas guerras (no segundo caso, muitas vezes mulheres ficam sozinhas cuidando dos filhos em total abandono). A financeirização subtrai a ação do Estado do compromisso com a saúde, com a educação, com o meio ambiente, com o trabalho. Essas mulheres, mães, assistem a entrada dos seus filhos (as) no tráfico e/ ou prostituição pela falta de perspectivas.

Assim, observamos como as estratégias do capital para obter aumento na taxa de lucro impactam, sobremaneira, a vida das mulheres pobres, visto que atinge fundamentalmente a vida das mulheres em geral, assim como atinge toda a classe trabalhadora. Portanto, para a o feminismo, a luta é de classe e de raça/etnia. No processo de formação da consciência crítica feminista se desocultam as classes como um todo homogêneo em si, e, nesse sentido, raça/ etnia e desigualdades entre os sexos são percebidas como ideologia reproduzida também pelos homens pobres... e negros. Somente esse processo dialético de identificar as contradições, as possibilidades de unidades e os contrários no interior da própria classe torna possível a formação da consciência de si, para em um sucessivo exercício de desalienação, construir a consciência para si. Movimento semelhante realiza o feminismo na perspectiva da formação da consciência de si (a mulher individualmente) como condição para a consciência para si (mulheres coletivamente). Acredito ser este o desafio atual para o movimento feminista no enfrentamento à barbárie.

6 CHEGANDO A ALGUMAS CONCLUSÕES

O processo de alienação, ancorado na ideologia capitalista, sempre foi sustentáculo da dinâmica de acumulação do capital. Não existe um mundo objetivo independe do subjetivo. O comportamento dos sujeitos é determinado pelas condições objetivas da sua existência e tais condições resultam das relações sociais, ou seja, resultam do modo de produzir e reproduzir nas sociedades. Na esfera da produção e da reprodução, os sujeitos são designados pelas suas marcas: Ser homem ou mulher, ser branco, negro (a).

O capitalismo precisa da divisão social do trabalho para exercer a exploração e a dominação. Mas não basta. Precisa também da divisão sexual do trabalho. Tanto a divisão social quanto a divisão sexual aparecem como naturais dentro da ordem social, daí a necessidade da ideologia para cuidar dos ensinamentos que darão conta de uma compreensão de mundo de forma a-critica servindo aos interesses do capital.

A acumulação do capital sempre foi um processo estranho aos sujeitos. Incompreensível, uma vez que não se dá a conhecer; logo, as consequências que decorrem dessa acumulação expressam mais desigualdades, pois geram mais riqueza concentrada em mãos de poucos. Disso resulta e barbárie, e, assim, parece correto afirmar que a barbárie é a própria acumulação de capital.

Mas esse processo, ao avançar e consolidar-se, gera crises cíclicas. E as crises resultam das inconsistências no processo de acumulação, especialmente porque tais inconsistências geram consciência da exploração. Isto permite o confronto entre as classes e processos de rupturas com a ordem estabelecida. Somente assim, a barbárie é confrontada.

Mas o confronto e a ruptura necessárias não se dão somente na esfera da produção, uma vez que a opressão (exploração e dominação) se dá na superestrutura da sociedade. Nesse sentido, o movimento feminista ao eleger a alienação como elemento que mascara a realidade, o faz teórica e politicamente com vistas a uma práxis para a desconstrução/construção de novas compreensões de mundo para a elaboração de projeto político onde a ideologia feminista tenha centralidade. Assim, as categorias alienação e consciência são importantes no atual contexto da globalização neoliberal no sentido da contraposição à naturalização da barbárie social.

REFERÊNCIAS

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