Resumo: Este trabalho propõe analisar a relação entre o comportamento climático da cidade do Rio de Janeiro/RJ com a ocorrência dos casos de dengue durante os anos de 2010 até 2014, nos bairros Alto da Boa Vista e Santa Cruz, localizados nas Zonas Norte e Oeste, respectivamente. No aspecto climático, a pesquisa analisou as médias de temperaturas e os totais de pluviosidade para ambos os bairros, observando a correlação com os casos de dengue registrados mensalmente. Concluiu que o período mais favorável à deflagração da dengue ocorreu no outono, por obter os melhores limiares térmicos e pluviométricos ao vetor.
Palavras-chave:ClimatologiaClimatologia, dengue dengue, Rio de Janeiro Rio de Janeiro.
Abstract: This study aims to analyze the relation between the climatic behavior and the occurrence of dengue fever cases in the city of Rio de Janeiro/RJ. Specifically to the years of 2010 until 2014, in the neighborhoods Alto da Boa Vista and Santa Cruz, located at North and West Zones, respectively. About the climatic aspect, the research analyzed the temperatures averages and the total of rainfall in both neighborhoods, observing the relation with dengue fever cases registered each month. The conclusion was that the best period during the year to the development of dengue fever is on autumn, due to the best temperature and rainfall threshold.
Keywords: Climatology, dengue fever, Rio de Janeiro.
Mesas temáticas coordenadas
CLIMA E DENGUE: uma ajuda para compreender a epidemia na cidade do Rio de Janeiro
Recepção: 08 Fevereiro 2018
Aprovação: 09 Maio 2018
A dengue corresponde a um dos maiores problemas de saúde pública nas cidades do Brasil e do mundo, sendo mais intensificada em países de clima tropical. Isto ocorre porque as condições climáticas favorecem a proliferação do vetor e do vírus causador da doença, especialmente quando associado a alguns aspectos socioeconômicos existentes na maioria das cidades localizadas na faixa tropical do globo terrestre.
Tal característica é impulsionada por serem países que passaram por um processo de urbanização tardio e muito acelerado, levando a uma infraestrutura urbana inadequada às realidades locais, propiciando a existência de condições essenciais a diversos problemas socioambientais, dentre eles, as doenças causadas por vetores. (MENDONÇA; SOUZA; DUTRA , 2009). Ainda mais por essas enfermidades serem muito influenciadas por fatores como o saneamento básico, hábitos da população urbana, o precário sistema de políticas públicas e a ausência de uma efetiva conscientização da população.
Com isso, o presente trabalho busca contribuir para a discussão das condições climáticas (temperatura e o total de precipitação pluviométrica) existentes na cidade do Rio de Janeiro, Brasil, que propiciam o desenvolvimento epidemiológico da dengue, analisando como a mesma varia dentro do espaço geográfico da capital fluminense. Além da variação espacial dos casos de dengue, é investigada a sazonalidade mensal que a doença possui, buscando identificar os períodos de cada ano mais suscetíveis à ocorrência de casos.
Essa atenção a diferentes bairros é justificada pelo fato de haver uma heterogeneidade de totais de casos entre os bairros e zonas administrativas. Devido a isso, o recorte espacial da pesquisa é centrado na análise climática e epidemiológica em dois bairros, sendo eles, o Alto da Boa Vista, localizado na Zona Norte, e o Santa Cruz, na Zona Oeste (Figura 1).
No ato de investigação atentou-se à diferença da heterogeneidade do espaço urbano dos mesmos, além das condições térmicas e pluviométricas específicas de ambos os bairros, que são favoráveis ou não à manifestação da doença.
A escolha dos bairros Alto da Boa Vista e Santa Cruz foi impulsionada tanto pela diferença da intensidade da manifestação da doença entre eles, como pela disponibilidade dos dados climáticos e epidemiológicos para estes dois bairros, apresentando boa cobertura, especialmente, entre os anos de 2010 e 2014, o que motivou este recorte temporal para a pesquisa.
O período entre 2010 e 2014 também foi motivado pelo comportamento da dengue na cidade, pois durante estes quatro anos houve uma grande oscilação no total de notificações de casos de dengue na cidade do Rio de Janeiro, alcançando uma epidemia no ano de 2012 com 130.412 casos, enquanto que em 2010 houve o registro de 3.268 casos e em 2014 o total de 2.649, de acordo com a Secretaria Municipal de Saúde da cidade do Rio de Janeiro.
Portanto, esta pesquisa busca evidenciar que a saúde humana está muito atrelada à saúde do espaço geográfico em que os sujeitos se encontram, pois ambos devem ser vistos de forma integrada. Desse modo, através da Geografia da Saúde e da Climatologia Médica, busca-se evidenciar que os elementos naturais proporcionam condições favoráveis (ou não) a determinadas doenças, assim como as intervenções humanas no meio antes natural podem ser favoráveis (ou não) à redução dos riscos e vulnerabilidades socioambientais.
O espaço geográfico está em alteração contínua a fim de atender aos objetivos da população ali presente. Com isso, a frequente alteração da forma, função e estrutura espaciais, a partir de distintos processos realizados com os avanços das técnicas (SANTOS, 1996), resultam na alteração da camada atmosférica mais próxima desta urbanidade, desencadeando o clima urbano próprio (MONTEIRO, 1976).
Isto é, compreender o clima de uma cidade é entender que esta caracterização climática não está livre de influências antrópicas, mas representa o processo de evolução urbana particular a cada município. Por isso, o estudo do clima urbano tem de estar atento aos condicionantes socioeconômicos necessários para a sua existência.
Dessa forma, pode-se compreender que a atmosfera carioca atual é resultado de toda a evolução urbano-histórica pelo qual a capital fluminense vem passando no decorrer dos anos, especialmente a partir da década de 1980, devido ao processo de urbanização acelerada pelos quais as cidades dos países subdesenvolvidos passaram, denominada por Milton Santos (1993) como urbanização corporativa.
Porém, se deve enfatizar que não apenas de processos urbanos o clima da cidade do Rio de Janeiro é constituído, mas sim, da relação indissociável entre o fato natural (fatores climáticos naturais) e o fato social (a urbanidade). (MONTEIRO, 1976; BRANDÃO, 2013).
Sobre os fatores determinantes naturais, o clima carioca é fortemente determinado pela sua posição no globo terrestre, maritimidade, nível do mar, relevo intraurbano, sistemas atmosféricos e aos diferentes tipos de uso e cobertura da terra.
Quanto à localização, a cidade do Rio de Janeiro está situada em uma latitude média, entre as latitudes 22º 74’ 58’’ S e 23º 07’ 34’’ S, e entre as longitudes 43º 10’ 36’’ O e 43º 74’ 65’’ O, o que determina a sua localização na zona tropical do planeta, recebendo forte radiação solar ao longo do ano.
Somado a isto, há o fato de estar ao nível do mar e ser banhada pelo oceano atlântico, o que determina a forte influência da maritimidade sobre o controle da amplitude térmica diária, dos altos valores de umidade relativa do ar e da posição favorável à atuação de distintas massas de ar e centros de ação atmosféricos. Isto promove frequentemente o “[...] conflito entre os sistemas atmosféricos polares e intertropicais.” (BRANDÃO, 2013, p. 125).
Portanto, o seu clima é caracterizado como um Clima Tropical Aw, de acordo com a classificação de Köppen, que é a utilizada como referência nesta pesquisa. Este modelo de classificação climática utiliza “[...] um conjunto de letras maiúsculas e minúsculas para designar os grandes grupos climáticos, os subgrupos ou ainda as subdivisões que indicam características especiais sazonais.” (MENDONÇA; DANNI-OLIVEIRA, 2007, p. 119).
A cidade do Rio encontra-se no grande grupo de Climas tropicais chuvosos e no subgrupo Clima de savana. A primeira letra – A – corresponde à temperatura, onde o mês mais frio apresenta temperaturas médias acima de 18ºC. Já a segunda letra – w – corresponde à distribuição da precipitação pluviométrica ao longo das estações, que para este caso, representa chuvas de verão. Ou seja, há um maior regime de chuva durante os meses mais quentes – novembro a março. (MENDONÇA; DANNI-OLIVEIRA, 2007).
De forma a ilustrar esta abordagem, é notável, de acordo com a Figura 2, que nos meses de novembro a abril há a ocorrência de temperaturas médias máximas (TMA) acima de 27ºC e médias mínimas (TMI) em torno dos 23ºC, já de maio a setembro ocorrem TMA em torno dos 25ºC e TMI em torno dos 18ºC.
Isso demonstra que não há uma grande amplitude térmica ao longo das estações, há uma amenização da temperatura de maio a setembro, ocorrendo uma pequena variação no decorrer do ano entre as TMA e TMI, não sendo superior a 10ºC. A exceção ocorre apenas ao comparar a TMA de fevereiro com a TMI de julho, quando chegou à maior amplitude térmica média, 11,8ºC.
Essa variação da temperatura não muito acentuada não está associada apenas à latitude da cidade, mas principalmente, pela maritimidade, pois, de acordo com Mendonça e Danni-Oliveira (2007, p. 48), os oceanos “[...] são fundamentais na ação reguladora da temperatura e da umidade dos climas. Além de servirem como principais fornecedores de água para a Troposfera, controlam a distribuição de energia entre oceanos e continentes”. Ou seja, a proximidade ao oceano atua como um regulador higrométrico e térmico.
Já o total pluviométrico possui uma amplitude maior ao longo do ano. Sobre tal, durante os meses de dezembro a março há registros médios acima de 100 mm mensais na maior parte da cidade.
Dentre os fatores locais que têm maior participação na diversidade microclimática da capital fluminense, há o relevo, a proximidade ao oceano e a urbanização, que afetam as variações termohigrométricas e pluviométricas entre os bairros.
Quanto ao relevo, a cidade do Rio de Janeiro possui três grandes maciços, sendo eles, o da Tijuca, o da Pedra Branca e o do Marapicú-Gericinó-Mendanha – conforme evidenciado na Figura 3 – que possuem forte influência nas características microclimáticas de algumas áreas da cidade.
Os maciços vão determinar a circulação do ar que ocorre na cidade, pois atuam como barreiras e corredores para tal. Portanto, há um fenômeno climático de forte incidência na CRJ que é a presença de áreas a barlavento e a sotavento na dinâmica de circulação do ar, determinadas devido à presença dos maciços e as respectivas posições das suas vertentes.
Na CRJ a brisa marítima não atinge toda a cidade de forma igualitária; isto se dá pelo fato de a brisa marítima encontrar os maciços da Tijuca e o da Pedra Branca como barreiras naturais.
Dessa forma, os bairros que estão nas vertentes sul destes maciços, ou seja, os bairros litorâneos (Zona Sul e parte da orla da Zona Oeste) terão uma amenidade climática causada devido ao frescor originário desta brisa. Já a Zona Norte e parte dos bairros da Zona Oeste que estão compreendidos entre os maciços da Pedra Branca e do Mendanha terão uma circulação do ar muito falha, predominando momentos de calmaria, além do maior aquecimento e ressecamento do ar que chega nestes pontos da cidade após atravessarem os maciços, a sotavento. (SERRA; RATISBONNA, 1941).
Outro aspecto muito relevante nas condições climáticas da cidade do Rio é a urbanização, sendo responsável pelo desencadeamento das ilhas de calor e frescor na cidade, resultando em varrições significativas entre os bairros.
De acordo com a Figura 3, é notável como há áreas da cidade com elevadas estimativas de temperatura de superfície terrestre (ETST) enquanto outras estão com valores bastante inferiores. As áreas da cidade que apresentaram as maiores ETST são aquelas em que apresentam as maiores densidades demográficas e a maior ocupação urbana, evidenciado na Figura 4. Estas estão presentes majoritariamente nas Zonas Norte e Oeste da cidade do Rio de Janeiro.
Os bairros da maior parte da Zona Norte, especialmente aqueles mais próximos da Baixada Fluminense (limite com os municípios vizinhos), e aqueles na Zona Oeste entre os maciços da Pedra Branca e do Mendanha concentram majoritariamente o intervalo de ETST “superior a 37.6 ºC”.
Sobre os maciços há os menores valores, encontrando-se ali encravado no Maciço da Tijuca o bairro Alto da Boa Vista. Já o Santa Cruz, no outro extremo da cidade, encontra-se ao nível do mar e possui uma ocupação de área construída muito maior que o Alto da Boa Vista (Figura 4).
As áreas com a maior cobertura vegetal são aquelas sobre os maciços, já as baixadas da Guanabara e de Sepetiba, onde está a principal ocupação do espaço geográfico da cidade, é notável a maior presença da cobertura urbano, assim como os maiores valores de ETST (Figura 3).
Portanto, nota-se que a temperatura terrestre é apresentada de forma mais acentuada no bairro Santa Cruz do que no Alto da Boa Vista, assim como possui maior cobertura urbana que o segundo, que apresenta maior cobertura de vegetação.
Quando analisamos a média do padrão termopluviométrico, como evidenciado na Tabela 1, dos bairros Alto da Boa Vista e Santa Cruz entre 2010 e 2013, percebemos que o primeiro apresenta maior amenidade da temperatura do ar, enquanto o segundo apresenta maiores valores de temperatura. Isto é justificado tanto pela maior altitude do Alto da Boa Vista em relação ao Santa Cruz como pelo aspecto do uso e cobertura da terra distintos entre ambos.
Inversamente proporcional à temperatura, enquanto o Alto da Boa Vista apresenta os menores valores de temperatura, ele vai apresentar os maiores totais pluviométricos anuais, enquanto que o Santa Cruz apresenta totais de chuva inferiores a 1.000 mm, em média, do que o ABV (Tabela 2).
Por fim, é evidente como os bairros da cidade do Rio variam bastante entre si, possuindo uma diversidade microclimática e entre os dois especificamente analisados nesta pesquisa, o Alto da Boa Vista se comporta mais como uma ilha de frescor perante ao Santa Cruz, melhor caracterizado como uma ilha de calor urbana carioca.
Como procedimento para o desenvolvimento desta pesquisa, foi realizado primeiramente um levantamento bibliográfico nas áreas da Climatologia, principalmente, nas subáreas de Climatologia Urbana (MONTEIRO, 2013) e Climatologia Médica (SANT’ANNA NETO; ALEIXO; SOUZA, 2012; MENDONÇA, 2000, 2010), assim
como um embasamento sobre comportamento da dengue em si, analisando a dinâmica de ocorrência da mesma, os seus ciclos biológicos e outras características particulares. (TEIXEIRA BARRETO; GUERRA, 1999; MORIN; COMRIE; ERNST, 2013).
Esse referencial sobre as particularidades da doença foi essencial para elencar os elementos climáticos da temperatura e precipitação nesta análise climática, pois os autores os consideram como os principais influenciadores climáticos sobre o vetor Aedes aegypti.
Foi realizada a análise dos dados climáticos, tais como as temperaturas médias mínimas e médias máximas e os totais de pluviosidade mensais, da cidade do Rio de Janeiro – com ênfase nos bairros Alto da Boa Vista e Santa Cruz no período de 2010 até 2014, para poder analisar a variação desses dados por mês e depois uma comparação entre os anos.
Esses dados foram obtidos a partir do Portal Geo Rio1, do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET)2 e do Sistema Alerta Rio3. Posteriormente, foram tabulados a partir do software Microsoft Excel 2010. Já os dados a respeito do total de casos notificado da dengue foram coletados a partir da Secretaria Municipal de Saúde (SMS)4, onde há o número de casos anuais e com detalhamento de cada mês por divisão administrativa e bairros da capital fluminense.
Por conseguinte, a elaboração dos mapas foi executada a partir da aquisição das bases cartográficas obtidas pelo banco de dados cartográficos do Instituto Pereira Passos (IPP)5, Portal Geo Rio6 e pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)7. Já a imagem de satélite, classificada a partir de técnicas de sensoriamento remoto, foi obtida do satélite Landsat 8, para o ano de 2016, a partir do site do United States Geological Survey (USGS)8. O processo de classificação da imagem de satélite para obter os mapas de cobertura da terra e a estimativa da temperatura de superfície terrestre foi realizado através do plugin Semi Automatic Classification Plugin, utilizado no software Quantum Gis, versão 2.1.8.
Quando se fala das influências climáticas sobre a ocorrência da dengue, é importante compreender de que forma os elementos climáticos afetam os principais personagens desta dinâmica de transmissão da doença: (sendo eles,) o vetor Aedes aegypti, o virus da dengue e os seres humanos. A efetiva ocorrência da doença é dada a partir da forte interação entre essas três partes.
Há limiares térmicos e pluviométricos favoráveis à ocorrência da dengue. No aspecto térmico, o limiar de temperatura ideal para esse desenvolvimento se encontra entre o intervalo de 20ºC até 30ºC. Entretanto, em 90% dos mosquitos, a 27ºC o vetor atinge o pico ótimo de desenvolvimento. Acima disso o valor máximo suportado para o seu desenvolvimento é de 34ºC até a fase adulta, pois temperaturas maiores que estas provocam retardamento do processo devido à redução das taxas de evolução particular de cada fase.
Assim, o gradativo resfriamento a partir de 27ºC provoca lentidão nesse processo, parando totalmente a aproximadamente 9ºC. O período total para alcançar a fase adulta é de aproximadamente uma semana em períodos com o ótimo térmico (27ºC), e em torno de 22 dias fora deste intervalo, especialmente em dias mais frios (BESERRA et al., 2006; MORIN; COMRIE; ERNST, 2013).
No âmbito pluviométrico, a chuva participa como um grande influenciador da dinâmica sazonal da doença. Porém este atua de forma mais indireta, já que a chuva vai ser responsável apenas por propiciar locais que podem se tornar habitat dos mosquitos. A chuva em excesso é desfavorável, pois em muitos casos acaba destruindo o recipiente ou retirando as larvas dos próprios recipientes devido ao possível transbordamento. (IBARRA et al., 2013).
Sobre isso Mendonça, Roseghini e Castelhano (2012) chamam a atenção para a importância das chuvas intermitentes, porque chuvas consecutivas dificultam a capacidade de voo do mosquito e, como abordado anteriormente, o seu excesso pode interromper o ciclo de reprodução.
Com isso, nos bairros Alto da Boa Vista e Santa Cruz foi notado que a temperatura foi reconhecida como a principal reguladora da variação dos casos de dengue a cada mês nos dois bairros, tendo como limar térmico favorável entre 19ºC e 31ºC, conforme a Tabela 3.
Já de forma mais específica a cada bairro, o Alto da Boa Vista possui temperaturas mais amenas do que o Santa Cruz, e em relação ao total pluviométrico, o Alto da Boa Vista apresenta os maiores valores mensais. Porém, na escala local, no ABV, nenhum mês com média mínima inferior a 19ºC obteve o maior registro de casos, pois este foi o mínimo favorável para este bairro; já em relação à média máxima favorável, não foi superior a 29ºC. Para o Santa Cruz, os limiares térmicos ótimos são superiores tanto na mínima como na máxima, sendo predominantemente na faixa dos 20ºC e 30ºC, respectivamente.
Em relação às influências da precipitação, foi reconhecida uma relação em outra escala de tempo daquela observada para a temperatura, pois foi notada uma influência na escala mais semestral, porque em todos os anos epidêmicos notou-se a maior concentração dos casos no semestre mais chuvoso, que se trata do primeiro, englobando os meses de janeiro até junho. Por isso, os meses cujos totais pluviométricos médios se encontram entre 121,02 mm e 231,86 mm foram os mais favoráveis à disseminação da doença; já os meses com totais pluviométricos inferiores a 100 mm e muito superiores a 300 mm apresentaram tendência à redução dos casos (Tabela 3).
Notou-se que a análise dos estudos sobre a relação entre as variáveis climáticas e a dengue deve ser acompanhada da valorização de quatro fatores essenciais: a temperatura, a chuva, os ciclos biológicos e os hábitos da população local. Devem-se evitar os determinismos, seja ambiental ou social, (mas sim) e valorizar a pluralidade de fatores que desencadeia a dengue.
Por fim, ficou evidenciado que diferentemente do ideário popular sobre o verão ser a estação mais vulnerável para a população ter a dengue, a estação que se demonstrou mais favorável foi o outono, englobando os meses de março, abril e maio como os mais suscetíveis para ambos os bairros. E foi notada maior influência das flutuações de temperatura na escala mensal, e para a chuva na semestral, à manifestação da dengue.
A cidade do Rio de Janeiro está localizada numa latitude média, na zona tropical do planeta, o que justifica a recepção de grandes taxas de insolação ao longo do ano. Associado a isso, vários fatores geográficos locais, diferentes usos e coberturas de solo desencadeiam numa diversidade de climas existentes, muitas vezes favoráveis ao aparecimento do mosquito da dengue. Associadas, a esses elementos, as práticas culturais/socais/políticas estabelecidas nesse espaço proporcionam as grandes crises epidemiológicas na cidade.
Para tal estudo, considera-se de suma importância reconhecer a necessidade de uma análise multifacetada das possíveis causas à ocorrência da dengue, assim como qualquer outro fenômeno estudado na Geografia, mas em especial quando se trata da relação dos estudos geográficos atrelados à saúde e à existência de determinadas doenças de cunho socioambiental tão forte. Por isso é que nos estudos de Geografia da Saúde, em muitos momentos, há diálogos com outras ciências além da Geografia, como a Biologia e a Epidemiologia, o que evidencia o caráter plural dessa problemática.
Por fim, foi observado que há sazonalidade da ocorrência da doença tanto por influência térmica como pluviométrica, porém em escalas diferenciadas, sendo importante compreender que os estresses térmico e hídrico podem ocorrer tanto por excesso como por redução exacerbada desses elementos climáticos. Isso favoreceu, em especial nos anos com maiores registros de casos (2011, 2012 e 2013), a sazonalidade concentrada no trimestre março – abril – maio, meses que apresentavam a combinação desses elementos climáticos mais suscetíveis à contaminação da população.