Servicios
Servicios
Buscar
Idiomas
P. Completa
POLÍTICA COMO AÇÃO RESPONSIVA NO PARFOR DA BAIXADA FLUMINENSE: formação, responsabilidade e responsividade
Elizabeth Orofino Lucio
Elizabeth Orofino Lucio
POLÍTICA COMO AÇÃO RESPONSIVA NO PARFOR DA BAIXADA FLUMINENSE: formação, responsabilidade e responsividade
Revista de Políticas Públicas, vol. 22, pp. 1527-1544, 2018
Universidade Federal do Maranhão
resúmenes
secciones
referencias
imágenes

Resumo: Este texto apresenta o registro da construção de um trabalho de formação docente no PARFOR que engloba a formação inicial e continuada de professores no Instituto Multidisciplinar da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. O diálogo entre a tríade: estágio curricular na formação de professores, discursos e práticas educativas na Educação Infantil e o lugar da leitura e da escrita na formação docente nos permite indagar sobre as especificidades das experiências docentes e seu entendimento sobre a infância. Ademais, no caminho dessa problematização, questiona-se a forma como o estágio curricular adentra a prática pedagógica universitária por meio de uma pesquisa-formAÇÃO. Por fim, o texto provoca-nos a pensar a fotografia como potencial formativo e investigativo que une arte-vida-conhecimento.

Palavras-chave:LicenciaturaLicenciatura, PARFOR PARFOR, educação infantil educação infantil, ensino fundamental ensino fundamental, formação docente formação docente, fotografia fotografia, leitura e escrita leitura e escrita.

Abstract: This text presents the record of the construction of a teacher training work in PARFOR that includes the initial and continuous training of teachers at theMultidisciplinary Institute of the Federal Rural University of Rio de Janeiro. The dialogue between the triad: curricular internship in teacher education, discourses and educational practices in Early Childhood Education and the place of reading and writing in teacher education allows us to inquire about the specificities of teaching experiences and their understanding about childhood. In addition, in the way of this problematization, the question is how the curricular internship enters the university pedagogical practice through a research-formation. Finally, the text causes us to think of photography as a formative and investigative potential, which unites art-life-knowledge.

Keywords: Bachelor’s degree, PARFOR, infant education, elementary school, teacher training, photography, reading and writing.

Carátula del artículo

Mesas temáticas coordenadas

POLÍTICA COMO AÇÃO RESPONSIVA NO PARFOR DA BAIXADA FLUMINENSE: formação, responsabilidade e responsividade

Elizabeth Orofino Lucio
Universidade Federal do Pará UFPA, Brasil
Revista de Políticas Públicas, vol. 22, pp. 1527-1544, 2018
Universidade Federal do Maranhão

Recepção: 15 Março 2017

Aprovação: 16 Maio 2018

1 INTRODUÇÃO: caminho

Como professora universitária, formadora de professores e pesquisadora bakhtiniana, acredito no poder das palavras e na possibilidade de escrever e contar a história a contrapelo. Pelo discurso e pela ação, os homens podem distinguir-se e não serem apenas diferentes, pois é com palavras e atos que nos inserimos no mundo humano (ARENDT, 2005) e essa inserção é a morte do velho e o nascimento do novo, categorias carnavalescas bakhtinianas que remetem a um mundo novo. Assim, realizo uma analogia para defender uma formação humana alicerçada no ato em que a experiência, a escuta dialógica, a atitude responsável e responsiva diante da palavra do outro favoreça a palavra própria.

Busco, com esse coletivo, movimentos a contrapelo (BENJAMIN, 1994) que dialoguem com os estudos pós-coloniais e colabore para a gestação da criação de um processo de formação inicial e continuada de professores em que os docentes sejam protagonistas, autores heróis (BAKHTIN, 1992, 2003) da formação e que suas vozes próprias ecoem em novos Encontros de formação inicial e continuada, por via da extensão universitária, que valorizem a escuta como essencial para uma educação que produza novos sentidos e efetive uma perspectiva enunciativa discursiva (ANDRADE, 2011). Tal perspectiva de formação vai ao encontro de um processo de valorização, compartilhamento-publicização (LUCIO, 2016) dos saberes docentes, qualificando experiências na escola pública da Baixada Fluminense como legítimos.

Trago a palavra compartilhamento hifenizada com publicização para atender ao propósito de marcar uma posição ético-política e epistemológica de configuração mais ampla do que aquela que geralmente subjaz ao uso do termo em contextos de formação docente, centrada numa lógica utilitarista, pragmática, de funcionalidade do gesto de compartilhar, circunscritos na simetria dos sujeitos: professores universitários falando para futuros professores e professores, diretores para diretores, em movimentos endógenos na escola. No confronto das múltiplas vozes da formação, o futuro professor e o professor em exercício, quando não está na posição de espectador aprendente, poucas vezes é autor e coautor na formação. Trata-se de uma valorização das contribuições dos sujeitos inseridos no cotidiano escolar, por via do estágio curricular, mas que não basta para legitimar os docentes e futuros professores na esfera do discurso pedagógico.

A categoria compartilhamento-publicização está diretamente relacionada ao horizonte social bakhtiniano que, por um lado, ajuda a superar a lógica do mercado da formação, viabilizado pela universitarização e, por outro, rompe com a visão endógena de formação centrada na escola para a escola. Não se trata de negar o legado da universidade na produção do conhecimento no campo pedagógico, mas de tomá-la como potencializadora da publicização do discurso docente, à medida que se constitua o horizonte social, o espaço-tempo compreendido em uma relação verbal, ou seja, o espaço-tempo da enunciação (GRUPO DE ESTUDOS DOS GÊNEROS DO DISCURSO, 2009), o qual orienta os sujeitos quanto aos valores construídos na interação na formação, propondo assunção de posicionamentos.

A palavra caminho é usada aqui no sentido de rumo, direção e escrita, no sentido de escrita com assinatura, acompanhada de atenção e o empenho em favor dos docentes e das crianças da Baixada Fluminense, em um contexto histórico em que docentes lutam por melhores condições de trabalho, contra a privatização e o desmonte da escola pública, defendem pedagógica e politicamente concepções que não “[...] interditem as formas linguísticas e os sujeitos.” (GERALDI, 2010, p. 61), sendo necessário contar palavras, ou seja, trazer à existência palavras de futuros docentes e professores em exercício e levá-las em conta. Considerá-las, divulgá-las, revelá-las, propagá-las, proferi-las. Essas palavras, principalmente dos docentes e futuros docentes da Baixada Fluminense que, por meio da existência do Instituto Multidisciplinar e do Plano Nacional de Formação de Pro- fessores (PARFOR), integram um tempo histórico de possibilidades (FREIRE, 1996) em uma região marcada pela violência Dos Barões ao extermínio. (ALVES, 2003).

É importante destacar que o Instituto Multidisciplinar (IM) da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) constitui-se referência nacional brasileira, primordialmente na Região da Baixada Fluminense, em razão dos estudos que fomentam possibilidades de busca de novos sentidos da vida que pulsa (MINAYO, 2007) na Baixada, possibilitando a pesquisa-formAÇÃO que, embrenhada em um contexto social e político complexo, permite-nos olhares sobre/para as crianças e os docentes, alunos das classes populares da Educação Infantil, do Ensino Fundamental e da Universidade de uma grande metrópole brasileira, abrindo perspectivas autorais, autônomas e emancipadoras.

Essas tensões fazem-me escrever como ação política responsável e responsiva, constatando que é preciso refletir e construir novas práticas formativas docentes e práticas educativas na Universidade.

Justiça e Ousadia marcam, também, as inquietações que pervagam este caminho que registra uma experiência no IM/UFRRJ e que se materializa nas seguintes questões: como os problemas de ordem econômica, sociocultural e política, nos quais se originam a violência e o fenômeno ideológico da criminalização da pobreza, reverberam-se e desdobram-se nas escolas públicas da Baixada Fluminense e no IM/UFRRJ? O que isso tem a ver com a crença de que os alunos da Educação Infantil e da Universidade, oriundos de classes populares, são impotentes ou incapazes de apropriação e inserção na cultura da escrita, no universo letrado? Como fazer para que as marcas do fenômeno ideológico do preconceito linguístico e suas reverberações não adentrem o espaço acadêmico? De que forma planejar um estágio curricular de modo a integrar um espaço em que teorias e práticas em interconexão proporcionem a construção da aprendizagem sobre a educação escolar, em um contexto histórico marcado pela implementação da Lei Federal 11.274, de 6 de fevereiro de 2006 (BRASIL, 2006) e pela discussão acerca da obrigatoriedade escolar para pessoas de 4 a 17 anos (PL nº 414/2008; PL nº 06755/2010), aliando o exercício da docência e a pesquisa?

Alinhavo, assim, o contexto introdutório e passo a dialogar com alguns aportes teóricos para, inicialmente, abordar a temática fotografia, formação docente e heterociência. Em seguida, considero relevante apresentar a questão da implementação da Lei Federal 11.274/2006 (BRASIL, 2006) e das portarias (PL nº 414/2008; PL nº 06755/2010), em diálogo com a Resolução CNE/MEC nº 02 de 1 de julho de 2015. Por fim, apresento como concebo a linguagem articulada à dimensão sociocultural em que estão inseridos os sujeitos, ou seja, o caminho do IM/UFRRJ como uma Universidade que na atualidade possui responsabilidade com a Educação Básica e a formação de professores da Baixada Fluminense, isto é, uma Instituição socialmente responsável pela construção de um percurso de estudo comprometido com a busca de superação dos problemas sociais e com a produção de conhecimentos que gerem novos percursos em contextos e situações específicas da formação docente.

2 CAMINHO E CAMINHOS

Neste artigo, interessa-me especificamente analisar como a formação docente vivida dentro do IM/UFRRJ, nas disciplinas Prática de Ensino e Estágio Supervisionado na Educação Infantil, articula práticas educativas no sentido de compreender as especificidades das experiências dos futuros docentes e seu entendimento sobre as crianças envolvidas no processo relacional entre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental. Durante minha atuação docente no IM/ UFRRJ, na disciplina Prática de Ensino e Estágio Supervisionado na Educação Infantil no período 2015-2, em uma turma que englobava futuros docentes e docentes em exercício na Educação Infantil, realizei o planejamento e o trabalho do estágio supervisionado por meio de visitas às instituições de Educação Infantil, privilegiando fotografias que eram produzidas nas visitas como potencial formativo e investigativo, além do relatório de estágio. Elegendo para a pesquisa-formAÇÃO as fotografias apresentadas e socializadas durante as aulas e organizadas na primeira exposição fotográfica da Educação Infantil no IM, realizada no dia 29 de outubro de 2015, intitulada A Educação Infantil que eu vejo: vivências e práticas e na segunda exposição, concretizada em 27 de junho de 2016, nomeada Pelos caminhos com as crianças da Baixada Fluminense, desafiei-me, em conjunto com os docentes, a investigar vivências, práticas, saberes docentes e olhares sobre a infância, implícitos nessas fotografias, socializadas nas aulas e organizadas de forma autoral pelas alunas, para exposição, com o fim de refletir sobre a formação vivida e praticada nesse processo. As fotografias e a exposição fotográfica apresentam possibilidades para pensarmos e articularmos a complexidade da formação e o percurso investigativo desse processo de estudo, abrindo horizontes para pensarmos outro modo de fazer outra ciência: uma heterociência (BAKHTIN, 1992, 2003; BRAIT; MELO, 2013) que una vida-arte-conhecimento e que se funda em um princípio estético, compreendendo as fotografias e a exposição fotográfica como “[...] um modo de dizer o conhecimento por meio da linguagem.” (GERALDI, 2011), especificamente a linguagem fotográfica.

3 AULAENCONTROS

As Aulasencontros (LUCIO, 2016) trouxeram à tona diversos desafios que perpassam o cenário educacional brasileiro, entre eles brechas entre a Educação Infantil e a Escola Básica, por meio de fotografias que registram práticas docentes com crianças da Educação Infantil, envoltas em atividades escolarizadas de leitura e escrita, assim como docentes e futuros docentes, escritores apagados diante do desafio da escrita, mostrando-nos que é necessário construir e buscar formas de formação-atuação.

Assim, entendo que as Aulasencontros no IM/UFRRJ, por meio das quais foi possível realizar o primeiro momento desse trabalho, constituíram-se como instância importante, por considerar os professores da escola básica, presentes no PARFOR, e futuros docentes como sujeitos que constroem conhecimentos, pois os principais recursos da Educação são as pessoas, os saberes e as experiências mobilizadoras. (CANÁRIO, 2011).

4 FORMAÇÃO DOCENTE

A ação principal dessa ação é a realização de aulasencontros que se constituem em eventos de uma pesquisa-formAÇÃO em que os futuros professores e docentes em exercício são constantemente convidados a falar e escrever sobre suas práticas no relatório de estágio.

Inicialmente, havia uma grande socialização por parte dos integrantes da turma por meio da oralidade, mas, ao serem convidadas a escrever, as alunas integrantes da turma sempre mostravam resistência, utilizando argumentos que se embasavam ora na responsabilização do fracasso escolar pela trajetória na escola pública, ora pela complexidade entre a universidade e a escola básica, o que podemos ratificar por meio dos enunciados abaixo, repletos de intencionalidades:

Minha trajetória de estudante foi bem difícil, porque tinha dificuldade de aprender a ler e isto foi muito ruim. (Informação verbal)1.

Fiz as séries iniciais com bastante dificuldade. Ensino Médio não terminei no tempo certo, parei várias vezes. Fiz o curso de formação de professores em um ano. Não é fácil escrever. (Informação verbal)2.

Sempre estudei em escola pública. (Informação verbal)3.

Um breve desabafo […] Inicio falando sobre a universidade, vejo que de fato aquilo que aprendemos está longe do que praticamos. Hoje depois de um certo tempo me tornei novamente aluna e posso perceber que a escola durante muito tempo não mudou, embora o “discurso” teórico seja outro. Às vezes me pergunto se não seria bom ter permanecido apenas aluna, seria bem mais fácil. Lidar com essa dualidade me incomoda demais, assim como escrever!! (Informação verbal)4.

Alicerçando o trabalho com a linguagem como produção discursiva das professoras e futuras docentes, encontrei nas fotografias um dispositivo de formação (CANÁRIO, 2001) que, somando-se aos conhecimentos existentes, é um dispositivo de trocas de saberes e construção conjunta de conhecimentos e novas práticas pedagógicas.

O encontro com as fotografias, após a primeira visita às instituições de Educação Infantil, planejada no Estágio Curricular, fez com que eu alterasse minha atuação pedagógica. A posição de simetria (SOBRAL, 2015) que vivenciava e a relação dialógica, em que docente e alunas são sujeitos que falam (BAKHTIN, 2003), que podem refletir, aprender e ressignificar-se (FREITAS, 2007), conduziram--me à reflexão de que as fotografias permitiam a desinvibilização de saberes e fazeres das docentes e das crianças da Baixada Fluminense, além de possibilitar uma ponderação importante sobre a supremacia da escrita numa sociedade grafocêntrica e com multiletramentos. (ROJO; MOURA, 2012).

Acolher outras escritas, escritas semióticas, foi um movimento necessário no sentido de (re)conhecer as maneiras de registro e produção de discurso das docentes alunas que não se sentiam autorizadas a escrever e que, na complexidade do percurso de docência que se tornou investigação, abriu possibilidades para pensar um outro modo de fazer pesquisa com os futuros professores e docentes, lendo as imagens e a experiência (LARROSA; LARROSA, 2015) visual, dialogando com elas e com seus autores, considerando cada produção discursive enunciada, durante a Aulasencontro, um ato de cocriação, coparticipação, no ato de narrar.

Contudo, é preciso reconhecer nas Aulasencontro a importância de não perder de vista o lugar exotópico que devia ocupar, pensando sempre que a exotopia é algo por conquistar e, na batalha, é mais comum perder a pele do que salvá-la (BAKHTIN, 1992), é transpor-me da linguagem interna de minha percepção para a linguagem externa da expressividade externa e entrelaçar-me por inteiro, sem resíduo, na textura plástico-pictural da vida, enquanto homem entre outros homens, enquanto herói entre outros heróis (BAKHTIN, 1992).

A fotografia, enquanto arte, representação da vida e do conhecimento, enquanto elo de interação de produção oral, visual e escrita, conduz-me a problematizar seu papel no processo formativo docente, pensando que estamos diante de uma documentação narrativa (SUÁREZ, 2007, p. 80), pensada como

[...] una modalidad particular de indagación narrativa e interpretativa que pretende reconstruir, documentar, tornar públicamente disponibles, tensionar y volver críticos los sentidos, comprensiones e interpretaciones pedagógicas que los docentes construyen, reconstruyen y negocian cuando [...] conversan entre colegas acerca de sus propias práticas educativas. [...] A través de ellas, los procesos de documentación narrativa llevados a cabo colaborativamente por docentes e investigadores se presentan como vías válidas para la reformulación, la ampliación y la transformación de la propia práctica docente que incursiona en lo inédito, en lo silenciado, en lo aún no descrito ni dicho.

Elegemos, assim, a fotografia didocente (LUCIO, 2016), fotografias produzidas por futuros docentes e docentes no estágio curricular sobre a infância e as práticas pedagógicas da EI, como enunciados que contêm uma narrativa possível dos conhecimentos tecidos entre a arte, a vida e o conhecimento, pensando como João Wanderley Geraldi (2011), o qual afirma que nem sempre o modo de dizer o conhecimento precisa ser tradicional, isso pode ser feito de várias formas, como por um filme, por imagens ou outros tipos de linguagem.

Na perspectiva bakhtiniana, a fotografia, objeto de estudo e estratégia metodológica da pesquisaformAÇÃO (LUCIO, 2016) a ser realizada neste estudo, é concebida como uma unidade de comunicação, como uma unidade de sentido, necessariamente contextualizada. Sendo assim, a fotografia não se constitui apenas por seus elementos semióticos internos (cor, foco, enquadramento de luz, entre outros), mas, também, por condições extraverbais da situação da qual se constitui.

Na obra Discurso na Vida e Discurso na Arte – sobre a Poética Sociológica, Voloshinov (1981) afirma que o enunciado é composto por três fatores: (a) o horizonte espacial comum dos interlocutores;

(a) a compreensão comum da situação por parte dos interlocutores e (c) a avaliação comum dessa situação. Assim, compreende-se que o enunciado e as condições sociais de sua enunciação constituem o processo de interação verbal, ou seja, o verbal (ou outro material semiótico) e o não-verbal (a dimensão social) que integram a situação.

A fotografia como enunciado caracteriza-se por seus elementos semióticos internos e por suas particularidades de enunciação. Segundo Voloshinov/Bakhtin (1981, p. 190), a situação extraverbal está longe de ser meramente a causa externa de um enunciado – ela não age sobre o enunciado de fora, como se fosse uma força mecânica. Melhor dizendo, a situação se integra ao enunciado como uma parte constitutiva essencial da estrutura de sua significação.

Considero, nesta pesquisa, que as fotografias didocentes (LUCIO, 2016), enquanto enunciados, à medida que são determinadas por seu horizonte temporal, espacial, temático e axiológico, constroem-se a partir da posição valorativa de seu autor e são tecidas por diversas dialogias.

Nesse movimento, as fotografias didocentes instigam-me a pesquisar sobre elas, buscando compreender os saberes e fazeres das crianças e dos docentes da Educação Infantil na Baixada Fluminense e, imersa nesse contexto, pergunto: a fotografia é uma documentação narrativa potente para a formação inicial e continuada de docentes? A fotografia corrobora para a formação do professor como pesquisador de sua prática? É possível reconfigurar o estágio curricular por meio do ato de fotografar? A experiência do ato fotográfico e da composição de exposição fotográfica, enquanto princípio estético integrante do processo formativo, contribui para o conhecimento do mundo, da criança e da docência na Educação Infantil? O ato fotográfico foi vetor da escrita verbal dos relatórios de estágio?

No confronto das múltiplas vozes da formação, o futuro professor e o professor em exercício, quando não está na posição de espectador aprendente, poucas vezes é autor e coautor na formação. Trata-se de uma valorização das contribuições dos sujeitos inseridos no cotidiano escolar, por via do estágio curricular, mas que não basta para legitimar os docentes e futuros professores na esfera do discurso pedagógico. A categoria compartilhamento-publicização está diretamente relacionada ao horizonte social bakhtiniano que, por um lado, ajuda a superar a lógica do mercado da formação, viabilizado pela universitarização e, por outro, rompe com a visão endógena de formação centrada na escola para a escola. Não se trata de negar o legado da universidade na produção do conhecimento no campo pedagógico, mas de tomá-la como potencializadora da publicização do discurso docente, à medida que se constitua o horizonte social, o espaço-tempo compreendido em uma relação verbal, ou seja, o espaço-tempo da enunciação (GRUPO DE ESTUDOS DOS GÊNEROS DO DISCURSO, 2009), o qual orienta os sujeitos quanto aos valores construídos na interação na formação, propondo assunção de posicionamentos.

5 ENTRE A LEI, AS PORTARIAS E A RESOLUÇÃO: brechas curriculares

Entendo que os processos formativos de professores são territórios em processo de constituição, permeados por tensões e disputas, tanto no plano político quanto no epistemológico. Dessa forma, faz-se necessário refletir sobre a contextualização da Educação a partir do século XXI e os marcos legais que entrelaçam a Educação Infantil e a formação de professores na licenciatura.

Em uma região marcada pelas desigualdades sociais como a Baixada Fluminense, um projeto de coletivo docente não pode deixar de se preocupar com a produção do conhecimento no campo dos processos formativos e com a questão das políticas que possam propor dispositivos de enfrentamentos destas desigualdades, no escopo do processo educacional diante de um contexto internacional e nacional em que as políticas oficiais de avaliação do desempenho dos estudantes vêm fomentando desenhos curriculares, práticas pedagógicas e projetos de formação docente que demandam/ buscam uniformização e homogeneidade. Na perspectiva hegemônica, a aprendizagem se compreende/vê como um processo linear e progressivo, realizado por movimentos previsíveis, segundo modelos predeterminados. Os resultados e processos infantis que se distanciam dos padrões predefinidos frequentemente são tratados como dificuldades de aprendizagem, o que indica o não reconhecimento de sua qualidade. (ESTEBAN; SAMPAIO, 2012).

A ampliação do ensino fundamental para nove anos, por meio da Lei Federal n. 11.274/2006 (BRASIL, 2006), e a discussão acerca da obrigatoriedade escolar para pessoas de 4 a 17 anos (PL 414/2008; PL 06755/2010), assim como a reformulação curricular prevista na Resolução CNE/MEC n. 02/2015, que modifica as Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação inicial em nível superior, trazem questões para a pesquisa que triangulem a implementação da lei, a relação Educação Infantil e Ensino Fundamental e formação docente nas licenciaturas.

Segundo a minha perspectiva, os sujeitos envolvidos nesse processo, docentes, futuros professores e crianças e os contextos podem subsidiar o diálogo e a ampliação da compreensão das continuidades e/ou rupturas vividas na Educação Infantil e no Ensino Fundamental, pelas crianças e pelos docentes, ciente de que o desafio é estreitar a distância entre o que é proposto e as ações concretas.

As políticas educacionais, segundo Stephen Ball e seus colaboradores (BOWE; BALL; GOLD, 1992; BALL, 1994), merecem destaque por suas influências em diversos trabalhos no Brasil (MAINARDES; MARCONDES, 2009). Sua concepção pós-moderna da policy cycle approach ou abordagem do ciclo de políticas e o contexto do ciclo de políticas, denominados de contexto de influência, contexto da produção de texto, contexto da prática, contexto dos resultados/ efeitos e contexto de estratégia política, apontam a necessidade de se articularem os processos macros e micro na análise de políticas educacionais, relacionando-os à interdependência, visão com a qual corroboro.

O caminho para concretização do discurso oficial e político de uma infância de direitos perpassa, sem dúvida, pela criação de dispositivos de formação concebidos em conjunto entre futuros docentes, professores ligados às instituições de EI e às universidades, lembrando que a formação acontece na produção de estratégias, de metodologias adotadas, havendo sempre construção do conhecimento e teorização do que ocorre na formação.

Aliar a concepção de formação docente à perspectiva da formação de adultos (CANÁRIO, 2011) é tratar a formação como um processo autogerido coletivamente, enfatizando sempre que o espaço universitário é composto de adultos e que as instituições de EI são uma organização social, ou seja, uma construção social feita por pessoas que não são autômatas, ou seja, só é possível trabalhar com os contextos em que as pessoas estão e sentem-se implicadas e interventoras. Eis o nosso desafio ao propor a construção de um coletivo docente que aja entre as brechas das políticas oficiais, hegemônicas e colonialistas, de formação docente no IM/UFRRJ.

6 O IM/UFRRJ: a universidade que forma professores

O acabamento do presente artigo dá-se em um contexto histórico de grandes temores, conduzindo-nos à reflexão de que, mesmo nas piores circunstâncias, há esperança e que vale a pena ser protagonista de grandes mudanças, pois, do espaço da universidade para as comunidades da Baixada Fluminense, o PARFOR multiplicou experiências humanas docentes, contribuindo para que os professores do ensino básico não sucumbissem ao apagamento, à alienação e à resignação. O PARFOR semeou inquietações e tornou-se verdade através de cada integrante que, durante quatro anos, diariamente, exibia sua inconformidade e rebeldia pedagógica por meio do ensino da leitura e da escrita das crianças de classe. Deixando uma contribuição para as turmas futuras do PARFOR, sintetizo a seguir alguns princípios que resultaram de meu estudo, lembrando sempre que princípios são proposições fundamentais para a formação docente:

1º A formação é um Encontro e precisa ser construída de forma coletiva entre os docentes da Educação Básica e da Universidade.

2º O currículo de formação deve ser implicado com as questões docentes e sociais.

3º Cada professor é livre para ousar e ser autor da sua prática e não reprodutor de materiais instrucionais ou de boas práticas, procurando sempre proporcionar uma aprendizagem significativa para todos os alunos e alunas.

4º Todos os docentes e discentes terão direito de ler e escrever em todos os gêneros discursivos, tendo, cada um, sua autoria e individualidades respeitadas.

5º Considerando a escrita como uma aquisição histórica da sociedade, fica afirmado que a produção da escrita docente é o alicerce das atividades de formação.

6º É imprescindível ir ao encontro do processo de valorização docente, por meio do compartilhamento-publicização de seus saberes, qualificando experiências na escola pública como legítimos.

7º A Universidade é um bem público e o local privilegiado da formação docente e da produção do conhecimento no campo pedagógico, sendo a potencializadora da publicização do discurso docente, propondo novos horizontes sociais e uma nova assunção de posicionamentos.

Finalizo com uma epígrafe de Antonio Nóvoa (2014, grifos nossos), inspirada em seu texto escrito durante sua estada no Brasil em 2014, intitulado Em busca da Liberdade nas universidades: Para que serve a investigação em Educação, em que o professor afirma que

As formas dominantes de organização do trabalho acadêmico e de avaliação dos professores,estão a afetar gravemente a ideia de universidade e as nossas vidas profissionais e pessoais. Chegou o tempo de repensar a investigação educacional numa perspectiva mais ampla, com uma liberdade sem condição. Porque a Liberdade é tudo, e tudo o resto é nada. (grifos nossos).

Meu desejo é que a liberdade continue sendo a marca da universidade, em que cada sujeito constrói livremente sua pesquisa e seu percurso de estudo, e que cada vez mais possamos juntar nossa vozes a grupos e movimentos, combatendo, por meio de nossos trabalhos, as tendências dominantes do mercado de formação docente, criando uma nova organização da vida na academia.

Os dez anos de criação do curso de Pedagogia no IM/UFRRJ marcam a consolidação dessa Instituição que, durante anos, dedicou-se aos estudos nas áreas das ciências agrárias e abriu seu espaço para a formação de docentes de diferentes áreas em cursos de licenciatura, como lócus de formação de professores na Baixada Fluminense.

Assinalo como singular o interesse por registrar e teorizar a vivência de uma formação que construiu a mudança de estratégias formativas por meio das inter-relações e interlocuções de futuros professores, professores da educação básica e de uma professora formadora pesquisadora universitária, sobretudo, quando a escola básica e a universidade entrecruzam-se na dialogia da formação docente que foi propiciada pela implementação do PARFOR no IM/UFRRJ.

A construção de um curso de Pedagogia em que caibam todos e todas (LINHARES, 2014) é o alicerce do IM/UFRRJ e reafirmação da relação entre universidade e escola básica, integrando o ensino, a pesquisa e a extensão universitária, é o objetivo dessa proposta que pretende contribuir para o seu fortalecimento, ratificando, assim, que a Universidade é um bem público e o local privilegiado da formação docente e da produção do conhecimento no campo pedagógico, sendo a potencializadora da publicização do discurso docente, propondo novos horizontes sociais e uma nova assunção de posicionamentos. (LUCIO, 2016).

Material suplementar
REFERÊNCIAS
ALVES, J. C. S. Dos barões ao extermínio: uma história da violência na Baixada Fluminense. Duque de Caxias: APPH,CLIO, 2003.
ANDRADE, L. T. de. Uma proposta discursiva de formação docente. Revista Práticas de Linguagem, Juiz de Fora, v. 1, n. 2, p. 87-98, jul./dez. 2011. Disponível em: http://www.ufjf. br/praticasdelinguagem/files/2012/02/Fale-para-o-professor. Acesso em: 1 fev. 2014.
ARENDT, H. A Condição Humana. 10. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2005.
BAKHTIN, M. (VOLOCHINOV). Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1992.
BAKHTIN, M Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes,2003.
BALL, S. J. Educational reform: a critical and post-structural approach. Buckingham: Open University Press, 1994.
BENJAMIN, W. Magia e técnica, arte e política: ensaios sobre literatura e história da cultura. Trad. Paulo Sérgio Rouanet – 7. ed. – São Paulo: Brasiliense, 1994. (Obras Escolhidas, v. I).
BOWE, R.; BALL, S.; GOLD, A. Reforming education & changing schools: case studies in policy sociology. London: Routledge, 1992.
BRAIT, B.; MELO, R. Enunciado/enunciado concreto/ enunciação. In: BRAIT, B. (Org.). Bakhtin: conceitos-chave. São Paulo: Contexto, 2013.
BRASIL. Lei n. 11.274, 6 de fevereiro de 2006. Altera a redação dos Arts. 29, 30, 32 e 87 da Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de idade. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 7 fev. 2006. Disponível em: www.senado.gov.br. Acesso em: 27 jul. 2015.
BRASIL.Projeto de Lei nº 06755, de 5 de fevereiro de 2010. Altera a redação dos arts. 4º, 6º, 29, 30, 32 e 87 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que “estabelece as diretrizes e bases da educação nacional”, dispondo sobre a educação infantil até os 5 (cinco) anos de idade e o ensino fundamental a partir dessa idade. Brasília, DF, 2010. Disponível em:http://www25.senado. leg.br/web/atividade/materias/-/materia/. Acesso em: 28 maio 2016.
BRASIL.Projeto de Lei nº 414, de 14 de outubro de 2008. Define o justo motivo autorizativo da despedida arbitrária do empregado a dificuldade econômica ou financeira do empregador e a infração disciplinar, a desídia ou a insuficiência de desempenho do empregado. Regulamenta a Constituição Federal de 1988. Brasília, DF, 2010. Disponível em:http:// www25.senado.leg.br/web/atividade/materias/-/materia/. Acesso em: 28 maio 2016.
CANÁRIO R. Formação inicial de professores: que futuro(s)?: síntese dos Relatórios de Avaliação dos Cursos para o 3º Ciclo do Ensino Básico e Ensino Secundário. Porto: INAFOP, 2001.
CANÁRIO R. A “aprendizagem ao longo da vida”: análise crítica de um conceito e de uma política. In: ______. (Org.). Formação e situações de trabalho. Porto: Porto Editora. 2011.
ESTEBAN, T.; SAMPAIO, C. S. Diferença, alteridade e aprendizagem: desafios infantis ao saber docente. In: ENCONTRO NACIONAL DE DIDÁTICA E PRÁTICAS DE ENSINO – ENDIPE, 16., Campinas, SP, 2012. Anais...Campinas, SP, 2012.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 7. ed. São Paulo: Paz e Terra. 1996.
FREITAS, M. T. A perspectiva sócio-histórica: uma visão humana da construção do conhecimento. In: ______; SOUZA,J.; KRAMER, S. Ciências Humanas e Pesquisa: leituras de Mikhail Bakhtin. São Paulo: Cortez, 2007. p. 26-38.
GERALDI, J. W. A aula como acontecimento. São Carlos: Pedro & João Editores, 2010.
GERALDI, J. W. Alfabetização e letramento: perguntas de um alfabetizado que lê. In: ZACCUR, E. (Org.). Alfabetização e letramento: o que muda quando muda o nome? Rio de Janeiro: Rovelle, 2011.
GRUPO DE ESTUDOS DOS GÊNEROS DO DISCURSO.Palavras e contrapalavras: glossariando conceitos, categorias e noções de Bakhtin. Caderno de Estudos I. SP: Pedro e João Editores, 2009.
LARROSA, J.; LARROSA, J. Tremores: escritos sobre experiência. Belo Horizonte: Autêntica, 2015. (Coleção: Experiência e Sentido).
LINHARES, C. Cintilações das Memórias de um Curso de Pedagogia: expandindo as fronteiras de um prefácio. In: RAMOS, L. M. P. de C.; PAULO, L. H. (Org.). Memórias da Pedagogia: relatos pioneiros do IM/UFRRJ. 1 ed. Seropédica, RJ: Editora da UFRRJ, 2014.
LUCIO, E. O. A palavra conta, o discurso desvela: saberes docentes na formação continuada de professores de leitura e escrita. Tese (Doutorado em Educação) - Faculdade de Educação, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.
MAINARDES, J.; MARCONDES, M. I. Entrevista com Stephen J. Ball: um diálogo sobre justiça social, pesquisa e política educacional. Educação e Sociedade, Campinas, v. 30, n. 106, jan./abr. 2009.
MINAYO, M. C. S. (Org.). Pesquisa Social: teoria, método e criatividade. 25. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.
NOVOA, A. Em busca da liberdade nas universidades. Rio de Janeiro, 2014. Transcrição da palestra proferida na Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 4 de setembro.
ROJO, R.; MOURA, E. Multiletramentos na escola. São Paulo: Parábola Editora, 2012.
SOBRAL, A. Do dialogismo ao gênero: as bases do pensamento do Círculo de Bakhtin. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2015.
SUÁREZ, Daniel H. Docentes, narrativa e investigación educativa. La documentación narrativa de las prácticas docentes y la indagación pedagógica del mundo y las experiencias escolares. In: SVERDLICK, I. (Comp.). La investigación educativa: una herramienta de conocimiento y acción. Buenos Aires: Novedades Educativas, 2007.
VOLOCHÍNOV, V.N. Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. Trad. Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira. São Paulo: Hucitec, 1981.
Notas
Notas
1 Fragmento de questionário diagnóstico respondido pela aluna Fabiana Rosa do IM/ UFRRJ, professora da Rede Municipal de Queimados, apresentado como trabalho inicial da disciplina Prática de Ensino e Estágio Supervisionado na Educação Infantil, realizado no segundo semestre de 2015
2 Fragmento de questionário diagnóstico respondido pela aluna Josely Ramos do IM/ UFRRJ, professora contratada da Rede Municipal de Japeri, apresentado como trabalho inicial da disciplina Prática de Ensino e Estágio Supervisionado na Educação Infantil realizado no segundo semestre de 2015
3 Fragmento de questionário diagnóstico respondido pela aluna Priscila Britto do IM/ UFRRJ, professora da Rede Municipal de Austin, apresentado como trabalho inicial da disciplina Prática de Ensino e Estágio Supervisionado na Educação Infantil, realizado no segundo semestre de 2015
4 Fragmento de questionário diagnóstico realizado pela aluna Ana Cristina do IM/ UFRRJ, professora da Rede Municipal do Rio de Janeiro, apresentado como trabalho inicial da disciplina Prática de Ensino e Estágio Supervisionado na Educação Infantil, realizado no segundo semestre de 2015
Buscar:
Contexto
Descargar
Todas
Imágenes
Visualizador XML-JATS4R. Desarrollado por Redalyc