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Resumo: O artigo discute políticas de bibliotecas, leitura e informação na construção de um Estado Nação. Reflete como a leitura e a informação se constituem canais para construção de sujeitos politicos e como esta perspectiva foi pensada nos governos de Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff com a implementação do Plano Nacional do Livro e da Leitura criado em 2006 e esvaziado nos governos de Temer e Bolsonaro. Observa que a falta de informação, pobreza e analfabetismo de um País, atinge em proporções agudas o acesso à informação através de serviços adequados de bibliotecas públicas, o que se constitui uma necessidade urgente, porém a total desarticulação do PNLL contribuiu para a descontinuidade desta política, interferindo na construção do Estado de Direito cuja dimensão é democrática, não condiz com autoritarismo e prescinde de programas de leitura e informação para se consolidar
Palavras-chave: Estado democrático, bibliotecas públicas, leitura, informação, Brasil - Democratização da Informação.
Abstract: Libraries, reading and information policies are discussed in the construction of a Nation State. It reflects how reading and information constitute channels for the construction of political subjects and how this perspective was conceived in the governments of Luiz Inácio Lula da Silva and Dilma Rousseff with the implementation of the National Book and Reading Plan created in 2006 and emptied in the governments of Temer and Bolsonaro. It is observed that in a country where the lack of information, poverty and illiteracy reach acute proportions, access to information through adequate public library services is an urgent need, but the total disarticulation of the PNLL, contributed to the discontinuity of this politics interfering in the construction of the Rule of Law whose dimension is democratic, does not match authoritarianism and does not need reading and information programs to co-solidate itself..
Keywords: Democratic state, public libraries, reading, information, Brazil - Democratization of Information.
1 INTRODUÇÃO
O debate e a efetivação acerca das políticas públicas do livro, leitura, literatura e bibliotecas no Brasil caracterizam-se por tradições e por seu caráter tardio, descontínuo e elitista. A fragilidade institucional que impacta e assombra a correlação de forças entre a sociedade civil e o poder público demarca as muitas idas e voltas dessa política no Brasil. A leitura, na perspectiva adotada nesta análise, como sendo um direito humano, como aponta Cândido (2011), é inerente ao processo das formações societárias e com a obrigação da manutenção e acesso a esse direito pelo Estado.
Desde a criação da primeira política pública em 1937, ainda no Governo de Getúlio Vargas, quando foi criado o Instituto Nacional do Livro com a responsabilidade de implantar a política do livro e das bibliotecas no País, observamos que esta política no Brasil foi marcada por descontinuidades e retrocessos. Somente no período que corresponde aos anos de 2003-2015 foi possível vislumbrar uma resposta do Estado brasileiro a esse segmento importante de formação cultural.
Apesar dos investimentos públicos criados a partir do Programa Mais Cultura, os índices de leitura no Brasil cresceram de forma lenta. Na primeira edição da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada em 2008, observou-se que: 35% dos brasileiros dedicam seu tempo livre à leitura; enquanto 77% preferem assistir à televisão. A maioria dos entrevistados, ou seja, 45% leram a partir de empréstimos de livros realizados por pessoas próximas ou através de compra, e; 73% informaram não frequentar uma biblioteca, embora grande parte não desconheça sua existência (AMORIM, 2008). A referida pesquisa também aponta que “[...] 77,1 milhões de brasileiros, ou 45% dos entrevistados, não leram nenhum livro nos últimos meses [...]”. (AMORIM, 2008, p. 215).
Nos anos subsequentes observamos pequenos avanços nas políticas implementadas, tendo em vista o volume de recursos destinados às bibliotecas e à constituição de acervos que contribuiu para aproximar o leitor dos livros e das bibliotecas. Esses avanços, porém, foram interrompidos com o golpe de 2016, que interrompe um ciclo de programas sociais que vinha sendo implementado no País.
Os retrocessos são visíveis e seus efeitos são sentidos em estudo semelhante realizado no Maranhão: Retrato da Leitura, Livros Livrarias e Sebos no Maranhão: desvendando práticas leitoras dos maranhenses e cadeia produtiva do livro, financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa no Maranhão (FAPEMA), através do Edital Nº 40/2014 UNIVERSAL cujos resultados são apresentados no livro: Bibliotecas, Livro E Leitura no Maranhão: políticas públicas para pensar uma sociedade leitora e cidadã. Os objetivos traçados na pesquisa demonstram a real dimensão do estudo:
Compreender os fatores sociais e políticos que implicam na formação de leitor no Maranhão, analisando a cadeia produtiva do livro e seu reflexo no fechamento das livrarias maranhenses, buscando compreender como a ausência de políticas públicas no campo da leitura e informação incide sobre a formação de leitores. (FERREIRA, 2015, p. 5).
Os dados levantados no período de 2015-2018, quando se inicia o desmonte das políticas públicas no Brasil, refletem no fechamento de bibliotecas e livrarias no corte dos orçamentos para compra de livros para as bibliotecas públicas que incidem, principalmente, nos pequenos municípios brasileiros, especialmente aqueles com menor renda per capita, o que reflete na falta de equipamentos culturais, a exemplo da maioria dos municípios maranhenses. Livro, livraria e bibliotecas passaram a ser considerados objetos de luxo pelo atual governo. O cerceamento à livre produção cultural e a tentativa constante de taxação dos livros denota seu viés elitista e a falta de preocupação e sensibilidade com a democratização da informação.
Porém, contra toda opressão, surgem estratégias de resistência, e o Maranhão, em comparação com o restante da nação, tem se destacado nesse movimento contraofensivo de ataques ao acesso à informação e o direito à leitura, o avanço na política de implementação de bibliotecas aponta para uma resposta diante do cenário nacional.
Neste texto, buscamos refletir sobre o papel do Estado brasileiro na implementação de políticas públicas para garantir o acesso da população à cultura e à informação. Partimos das leituras de Max Weber e Norberto Bobbio sobre o sentido de política e Estado de direito, das reflexões de Lafarge-Horellou, Chantal; SEGRÉ, Monique. Sociologia da Leitura. Para aprofundar essas categorias de análises busca-se, desta maneira, refletir sobre como o estado brasileiro tem sido omisso na implementação de políticas públicas de cultura, leitura e bibliotecas, bens considerados necessários para que sejam construídas as bases de uma sociedade democrática. Nesta comunicação, os dados da Pesquisa Retrato da Leitura no Brasil e Retrato da Leitura, Livros Livrarias e Sebos no Maranhão permitem demonstrar as contradições do Estado e como a descontinuidade das políticas incidem sobre os déficits de leitura no País.
2 POLÍTICAS PÚBLICAS E POLITICAS CULTURAIS NO BRASIL: qual o papel do Estado na sua implementação?
Política é a ciência da governação de um Estado ou Nação, é também a arte de negociação para compatibilizar interesses coletivos. Weber a concebeu como “o conjunto de esforços feitos com vistas a participar do poder ou a influenciar a divisão do poder, seja entre Estados, seja no interior de um único Estado” [...] “o Estado somente pode existir, se sua população obedecer os detentores do poder, cuja autoridade deve ser reconhecida e legítima" (WEBER.1998, p. 55-57). Bobbio por sua vez, considera que “[...] os fins da política são tantos quantas forem as metas a que um grupo organizado se propõe, segundo os tempos e as circunstâncias” (BOBBIO, 2000, p. 167). Sua concepção de política estava circunscrita à esfera do Estado que deveria ser a instituição responsável pela ordem social e, portanto, apta a realizar a política.
Ao pensar a política no contexto do Estado de direito não se pode perder de vista que suas diferentes interpretações conduzem a desvios de compreensão do conceito. O que é político para uns não é necessariamente político para outros, pois, ao longo da história, as várias esferas da vida pública dão sentidos diferenciados ao termo justificando desvios de conduta e interferência do privado no público como bem atestam os últimos acontecimentos envolvendo o Governo Bolsonaro, que tem indignado a sociedade brasileira. O caso das rachadinhas, e o caso da tentativa de superfaturamento da vacina contra a Covid 19, mostram de forma clara e inconteste como o atual dirigente do nação brasileira e os seus ministros praticam tráfico de influência, tendo sido acusados de vários atos ilícitos que comprometem a integridade do governo e põem em suspeição grande parte dos atuais dirigentes seguidores do presidente. As críticas transcritas na grande imprensa ajuízam como o poder do Estado tem sido desvirtuado para beneficiar o atual dirigente, sua família e seus apoiadores, detentores de grandes fortunas, que tem ampliado seu capital, favorecido por atos de corrupção, que penaliza a maior parte das populações pobres que necessitam de políticas públicas para sobreviver.
Mas, não podemos perder de vista que o sentido político da expressão política é considerada como:
[...] uma das faculdades mais importantes da sociedade moderna que se guia devido às ações dos políticos em especial dos bons políticos que estão imbuídos de bons propósitos e sabem das suas responsabilidades de criar leis que servem para transformar a sociedade garantindo igualdade de direitos e vida digna para todos. (FERREIRA, 2013, p.4).
A partir dessa discussão consideramos que o sentido de política permite pensar o Estado de Direito tal qual Norberto Bobbio o pensou no contexto do regime democrático, que se efetiva no governo do povo alicerçado em decisões coletivas que beneficiem a sociedade em sua totalidade. Desse modo, regime democrático e direitos sociais são inseparáveis, pois estão fundamentados na garantia da coisa pública, conforme preceitua Bobbio (1986, p.19):
[...] Estado de direito em sentido forte, isto é, do estado que não apenas exerce o poder sub lege, mas o exerce dentro de limites derivados do reconhecimento constitucional dos direitos ‘invioláveis’ do indivíduo. Seja qual for o fundamento filosófico destes direitos, eles são o pressuposto necessário para o correto funcionamento dos próprios mecanismos predominantemente procedimentais que caracterizam um regime democrático. (BOBBIO, 1986, p. 19).
Assim, como compreendemos que o Estado de Direito se efetiva na garantia dos direitos constitucionais e está relacionado a processos dinâmicos articulados a planos de ação que têm metas pensadas e refletidas a partir de uma realidade a ser transformada. Sua efetivação depende da atitude de gestores de construir mecanismos. Como foram pensados alguns dos principais modelos de planos já construídos neste País, a exemplo do Plano Nacional de Bibliotecas Escolares – PNBE e do Plano Nacional do Livro e da Leitura – PNLL, referente ao período de 2003 a 2015 que se constituíram modelos de ação concreta implementados pelo Ministério de Educação e pelo Ministério da Cultura como políticas públicas de educação e de cultura, cujo efeito foi sentido em muitos estados nacionais.
Os citados planos foram construídos a partir de um modelo de sociedade capaz de pensar a realidade em diferentes contextos e de intervir nessa realidade, buscando transformá-la. Foi nessa perspectiva que foi construído o Programa Mais Cultura o qual incluía vários planos e programas, entre os quais o Plano Nacional do Livro e da Leitura - PNLL, considerado uma política pública de Estado de grande importância, na medida em que visa:
[...] assegurar e democratizar o acesso à leitura e ao livro a toda a sociedade, com base na compreensão de que a leitura e a escrita são instrumentos indispensáveis na época contemporânea para que o ser humano possa desenvolver plenamente suas capacidades, seja no nível individual, seja no âmbito coletivo. (BRASIL, 2006, p. 25).
Porém, o que se observou é que esse plano, antes de atingir minimamente os objetivos a que se propunha, foi desarticulado pelo Governo de Michel Temer, posto que houve o esvaziamento de todos os projetos sociais implantados pelos Governos de Luiz Inácio Lula da Silva e de Dilma Rousseff (2003-2015). Ressalte-se que, o número de espaços de informação criados até então, não conseguiam suprir as necessidades de leitura e informação da sociedade brasileira. Daí a urgência de ampliar o número de bibliotecas e/ou salas de leitura, abrir livrarias e criar espaços de cultura que possam envolver a comunidade como um todo. Mas, o que se observou a partir do golpe contra Dilma Rousseff foi o desmonte do Estado de Direito, que vinha sendo gradativamente construído nos Governos que antecederam Michel Temer. Esse desmonte atingiu, de forma devastadora, as ações que estavam em andamento, criadas a partir de 2003.
A descontinuidade do PNLL afetou o projeto de nação e o modelo de democracia que foi pensado entre os anos de 2003-2015, porque interrompeu a possiblidade de fazer da leitura uma prática presente na sociedade, através de um conjunto de programas que vinham, mesmo que de forma lenta, alterando valores de uma cultura da não-leitura, prática comum entre os brasileiros, como nos mostra a Pesquisa: Retrato da Leitura no Brasil em todas suas edições, embora se perceba pequenos avanços no período de 2007-2016. Importante lembrar que a leitura é considerada um processo que não se estabelece de forma passiva, mas sim, como um processo de interação entre texto e leitor, “[...] configurando-se como um meio de aquisição do que se passa ao redor do homem; portanto, tem dimensão social e cultural; provoca, enriquece e encaminha a reflexão [...]”. (SOLÉ, 1998, p. 21).
3 POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O LIVRO, LEITURA, LITERATURA E BIBLIOTECAS: o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) e a Política Nacional de Leitura e Escrita (PNLE)
A concepção do Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL) foi norteada por uma perspectiva cultural, onde o leitor não seria aquele que apenas decifra códigos e decodifica um texto, mas aquele que vai para além dos símbolos e consegue efetivar uma leitura crítica, tornando o leitor o personagem principal de qualquer livro. Ao delimitar um plano onde se almeja o desenvolvimento de uma sociedade leitora é necessário refletir, também, sobre que tipo de leitor e leitura se espera alcançar com o plano, e isso para além dos números de vendas no mercado editorial (fator também considerado importante, mas não o único) e tornar o texto rico em potencialidades nas múltiplas direções em suas possibilidades (GIL, 2007).
As palavras Livro, Leitura e Literatura e Bibliotecas, pensadas nesse plano, referem-se respectivamente às três dimensões das políticas culturais desenvolvidas no país: econômica, a do direito à cidadania e a do valor simbólico, onde as dimensões não podem ser justapostas, mas pensadas de forma articulada respeitando a potencialidade das culturas populares e dos saberes tradicionais com o que existe de mais moderno em tecnologia, pois conforme aponta Gil (2007):
Um Estado republicano, comprometido com os valores democráticos, tem o dever de ampliar o leque de instrumentos à disposição dos cidadãos para expandir suas possibilidades de leitura do mundo, para além das versões monopolizadas e da homogeneização cultural (GIL, 2007, p.10).
Dessa forma, o PNLL privilegia a biblioteca e a formação de leitores e mediadores de leitura, como principais diretrizes para uma política pública voltada ao livro e à leitura no Brasil, tendo por base a necessidade de se formar uma sociedade leitora como condição essencial e decisiva para promover a inclusão social no que diz respeito a bens, serviços e cultura. Para tanto, pretendeu-se conferir a este plano a dimensão de uma política de Estado, com natureza abrangente, com o fim de garantir organicidade nas políticas, programas, projetos e ações oriundas do plano, desenvolvidas no âmbito dos ministérios, com prevalência pelo MinC e o MEC, governos estaduais e municipais, empresas públicas e privadas, organizações da sociedade e do voluntariado geral, tentando evitar o caráter assistemático, fragmentado e pulverizado que tem caracterizado as políticas culturais efetivadas no Brasil (PNLL, 2007).
A política de Estado, nessa concepção, deverá traduzir-se em programas de governo, com coordenações interministeriais articuladas com Estados, municípios, empresas e instituições do Terceiro Setor. O PNLL norteia-se em quatro eixos principais (desde seu lançamento em 2006 os objetivos tiveram algumas alterações no ano de 2010 e, por último em 2014), a saber: Democratização do acesso; Fomento à leitura e à formação de mediadores; Valorização institucional da leitura e incremento de seu valor simbólico; Desenvolvimento da economia do livro como estímulo à produção intelectual e ao desenvolvimento da economia nacional (CADERNO DO PNLL, 2014).
O objetivo central do plano seria o de assegurar e democratizar o acesso ao livro e à leitura a toda a sociedade com o entendimento que ambos são imprescindíveis para o desenvolvimento de qualquer nação e para o desenvolvimento humano, quer seja de forma individual ou coletiva. Para o fortalecimento do PNLL montou-se uma força tarefa coordenada entre legislativo e executivo para fomentar a criação de planos no nível estadual e municipal. O Plano Estadual do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas (PELLLB) e o Plano Municipal do Livro, Leitura, Literatura e Bibliotecas (PMLLLB) encontram resistência para sua formulação nas duas instâncias e percebe-se um envolvimento maior da sociedade civil organizada para que os planos sejam elaborados, do que pelo poder público. Tal afirmação pode ser atestada pelo quantitativo ínfimo de planos municipais e estaduais efetivados apenas em alguns municípios como: Natal, São Paulo, Nova Iguaçu, Salvador, Curitiba, Porto Alegre, Juína (MT) estes dois últimos com previsão orçamentária e alguns estaduais, a exemplo de: Paraná, Rio de Janeiro, Mato Grosso e Pernambuco.
No entanto, a cultura política praticada no Brasil não permite que apenas o plano aprovado nas câmaras e assembleias garantam a efetivação da política, sendo necessária a criação de conselhos mistos (sociedade civil e poder público) para acompanhamento da execução. Com a descontinuidade como uma das tradições pertencentes às políticas culturais brasileiras, houve uma forte preocupação em relação à continuidade do PNLL, haja vista o mesmo já ter sofrido com as constantes mudanças ocorridas no âmbito do MinC até culminar com sua dissolução. Para tanto, a garantia de sobrevida do plano só seria possível mediante a instituição de uma lei que permitiria sua continuidade mesmo em outros governos.
A Lei 13.696 de 12 de julho de 20181, fruto da mediação entre a sociedade civil, movimentos sociais, partidos políticos e poder público, institui a Política Nacional de Leitura e Escrita (PNLE) como estratégia permanente para promover o livro, a leitura, a escrita, a literatura e as bibliotecas de acesso público no Brasil. Em seu parágrafo único consta: A Política Nacional de Leitura e Escrita será implementada pela União, por intermédio do Ministério da Cultura e do Ministério da Educação, em cooperação com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios e com a participação da sociedade civil e de instituições privadas.
São diretrizes da PNLE:
I - a universalização do direito ao acesso ao livro, à leitura, à escrita, à literatura e às bibliotecas;
II - o reconhecimento da leitura e da escrita como um direito, a fim de possibilitar a todos, inclusive por meio de políticas de estímulo à leitura, as condições para exercer plenamente a cidadania, para viver uma vida digna e para contribuir com a construção de uma sociedade mais justa;
III - o fortalecimento do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas (SNBP), no âmbito do Sistema Nacional de Cultura (SNC);
IV - a articulação com as demais políticas de estímulo à leitura, ao conhecimento, às tecnologias e ao desenvolvimento educacional, cultural e social do País, especialmente com a Política Nacional do Livro, instituída pela Lei nº 10.753, de 30 de outubro de 2003;
V - o reconhecimento das cadeias criativa, produtiva, distributiva e mediadora do livro, da leitura, da escrita, da literatura e das bibliotecas como integrantes fundamentais e dinamizadoras da economia criativa (BRASIL, 2018).
A orientação de ação para a PNLE prevista na redação da lei é que a mesma siga princípios e diretrizes de planos nacionais estruturantes como o Plano Nacional de Cultura (PNC), Plano Nacional de Educação (PNE) e o Plano Plurianual da União (PPA).
Para a consecução dos objetivos e diretrizes da Política Nacional de Leitura e Escrita, deverá ser elaborado, a cada decênio, o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL), que estabelecerá metas e ações, nos termos de regulamento. O PNLL deverá ser elaborado nos 6 (seis) primeiros meses de mandato do chefe do Poder Executivo, com vigência para o decênio seguinte, e deveria ser elaborado em conjunto pelo Ministério da Cultura e pelo Ministério da Educação de forma participativa, assegurada a manifestação do Conselho Nacional de Educação (CNE), do Conselho Nacional de Política Cultural (CNPC) e de representantes de secretarias estaduais, distritais e municipais de cultura e de educação, da sociedade civil e do setor privado.
No entanto, a extinção do MinC e seu escopo de atuação reduzidos a uma secretaria especial, a desmobilização dos conselhos de educação e de política cultural, a constante tentativa da taxação de livros, tudo isso colaborou para a descontinuidade do PNLL. Já se passaram três anos de mandato e nada de debate acerca de sua elaboração, agora garantido por lei.
4 AS BIBLIOTECAS E A LEITURA NO BRASIL: e seus reflexos no Maranhão
Essa situação perdura até hoje nos pequenos municípios, que ainda não perceberam o quanto as mudanças de local prejudicam os acervos e atrasam na consolidação dos trabalhos pedagógicos e culturais. Um exemplo dessa situação é a Biblioteca de Arari, que após ser retirada do Prédio onde funcionava desde 1982, em virtude da precariedade das suas instalações foi transferida para uma pequena casa na Avenida Principal; posteriormente, seu acervo foi encaixotado e, atualmente, o prédio se encontra fechado. Outro exemplo dessa mesma situação foi o que aconteceu com a Biblioteca Pública de Pinheiro, que funcionou durante décadas no prédio onde funcionou a Prefeitura, depois foi transferida para um prédio do IBGE, depois foi instalada na Casa do Memorial José Sarney e atualmente funciona em uma sala na Academia de Letras do Município, e apenas uma pequena placa indica sua existência. A maioria da população desconhece sua localização.
Ao longo dos Séculos XX e XXI, o que se observa é que a cultura oral vem superando cada vez mais a sociedade da escrita; com isso, perdemos a capacidade da memorização e, portanto, do aprofundamento da leitura e do aprendizado da ideia, que em geral é extraída na escrita da leitura, ou seja, quando anotamos ou expressamos por meio da escrita a compreensão do que se leu. A escrita permite que o leitor reflita sobre os pensamentos e que os questione, e isso a oralidade não permite. Desse modo, a leitura se tornou generalizada, sendo ocasionada a perda da facilidade de memorizar o que é ensinado ao leitor.
Além disso, o livro vem perdendo o seu conceito de material físico e “[...] se resume hoje a baterias carregadas de energia [...]” enfatiza Delgado (1999, p.13). Os novos formatos do livro, em especial, do livro eletrônico, retira do leitor o prazer e a paixão de ler fisicamente “[...] suas folhas, a capa, as ilustrações, o sumário, o índice. As notas de pé de página, as referências bibliográficas ... E mais: seu cheiro, suas marcas, uma palavra sublinhada, uma anotação marginal, um risco vertical [...]” (DELGADO,1999, p.13) vão perdendo o sentido. É como se os leitores tivessem sido expropriados, em parte, do prazer de ler, embora não se possa desconsiderar o fato de o livro impresso continuar sendo a principal opção dos leitores, conforme se observou nesta pesquisa.
Neste debate, não se pode desconsiderar que o livro impresso ainda é inacessível para grandes contingentes populacionais, uma vez que ainda se convive com parcelas significativas de populações que não tiveram acesso ao livro, ou que têm dificuldade de acessá-los, dada a escassez de bibliotecas públicas que, em geral, localizam-se apenas nas sedes dos municípios. Esse fato se agrava, quando se percebe que além da ausência de bibliotecas nas localidades, também há a ausência de bibliotecas escolares e salas de leitura, as quais seriam capazes de suprir essa lacuna.
A maioria dos entrevistados alega preferir ler livros impressos; e, uma boa parte desconhece a existência dos e-books. Destaca-se que a maior dificuldade detectada na pesquisa está relacionada à falta de hábito de leitura, sendo que em algumas cidades o acesso às redes de internet apresenta pane constante com queda de energia e avaria nas torres. Cidades do Maranhão, como: Poção de Pedra; Pindaré, Araioses, Matinha, Lagoa do Mato, Serrano e Tutóia são exemplos onde a rede apresenta problemas constantes. Neste debate, não se pode deixar de destacar o crescimento dos livros digitais no Brasil. Para Marcelo Gioia, CEO da Bookwire no Brasil, houve um aumento substancial na venda de livros neste formato nos tempos da pandemia do novo coronavírus e declara que:
[...] entre os dias 9 de março e 26 de abril, [2020] a distribuidora entregou a clientes finais 9,5 milhões de unidades de livros digitais. “Para se poder fazer uma comparação, em 2019 – o melhor ano em performance da Bookwire, que apresentou crescimento de 57% em faturamento em relação a 2018 – distribuímos um pouco menos que 12 milhões de unidades de e-books no ano inteiro. Cerca de 25 a 30 mil unidades todo dia. E nessa crise, em 49 ou 50 dias, foram distribuídos esses 9,5 milhões, 190 mil unidades de e-books todo dia nesse período. (LEONARDO NETO, 2020).
O tornar-se leitor e o ato de ler com profundidade é um processo que deveria ter início desde os primeiros anos da escola, quando as crianças começam a decifrar as primeiras letras, fazendo analogia com os objetos. É nessa fase que as crianças devem ser motivadas rumo à leitura. O recomendável é apresentar, inicialmente, a leitura dos contos de fadas, pois este tipo de literatura estimula nas crianças a imaginação e, consequentemente, a reflexão. A ausência de leitura nas fases iniciais da escola contribui para o déficit de leitores, razão porque muitos chegam à universidade sem ter vivenciado os diferentes momentos de construção de um leitor crítico.
Esse fato é agravado pela ausência de bibliotecas escolares ou a precariedade das existentes, conforme aponta o estudo de Ferreira (2012). Além da falta de equipes qualificadas para atender tanto as bibliotecas escolares como a rede de bibliotecas públicas que funcionam, em grande parte dos municípios brasileiros, há também, um déficit de equipes qualificadas sem bibliotecários para trabalhar programas de leitura sintonizados com o Plano Nacional do Livro e da Leitura – PNLL criado com a finalidade de: “[...] formar uma sociedade leitora como condição essencial e decisiva para promover a inclusão social de milhões de brasileiros no que diz respeito a bens, serviços e cultura, garantindo-lhes uma vida digna e a estruturação de um país economicamente viável” (BRASIL, 2011).
3.1 O PNLL no Maranhão e as descontinuidades
O Maranhão tem ensejado uma discussão acerca das políticas culturais em uma espécie de contraofensiva diante do desmonte e desmobilização efetivada pelo governo federal que não efetiva a Política Nacional de Leitura e Escrita (PNLE) enfraquecendo a possibilidade da construção de uma sociedade leitora. Alguns marcos legais a nível estadual foram concretizados: o Plano Estadual de Cultura (2014) com vigência 2015-2025, o Decreto 31.506/2016 que institui a Rede Estadual de “Faróis do Saber” no âmbito da Secretaria de Turismo e Cultura (SECTUR) e da Lei 10.613/2017 que cria o Sistema Estadual de Bibliotecas Públicas (SEBP).
Segundo dados do SEBP (2018), atualmente, dentre os 217 municípios maranhenses, 161 contam com bibliotecas públicas municipais que estão ligadas indiretamente ao sistema e conta com 94 Faróis do Saber integrados ao SEBP com 75 destes em pleno funcionamento e 19 no processo de reforma e revitalização para retorno às atividades (SEBP, 2018), ou seja, em termos quantitativos, têm-se aproximadamente 74% de municípios maranhenses com bibliotecas, é evidente que para além da fria linguagem dos números se faz necessária uma avaliação mais detalhada destes equipamentos culturais em relação aos seus produtos e serviços, alinhamento com as demandas culturais e sociais da cidade, relação com a comunidade e sociedade, a existência da/o profissional bibliotecária/o, no entanto, em comparação ao restante do país, trata-se de um avanço a presença destes espaços culturais, que são as bibliotecas, na maioria dos municípios maranhenses.
O processo de formação de leitores em qualquer Nação, quaisquer Estados ou Municípios, deve ser visto como um projeto que busca construir um novo modelo de sociedade. Pensar um projeto dessa natureza exige do Estado a criação de novos referenciais que objetivem formar uma nova cultura, baseada na leitura e em práticas culturais libertadoras. Para tanto, devem acontecer investimentos públicos que envolvam as famílias, as escolas e a comunidade, estreitando laços afetivos com livros capazes de despertar a emoção, a criação e; não apenas, o lado cognitivo, reduzindo o livro a somente um objeto de saber e conhecimento pedagógico. Recuperar a ludicidade do livro, sem perder a criticidade que a leitura e a literatura possibilitam ao leitor, e transformar as bibliotecas em lugares de prazer, de memória e de descobertas, deve fazer parte do projeto dessa nova cultura.
Como pensar esse projeto em um Estado, onde faltam nos bairros: bibliotecas, cinemas, teatros, museus, centros culturais, livrarias, espaços de lazer, dentre outros direitos básicos componentes preponderantes para a formação de sujeitos e de uma nova cultura? Como pensar esse projeto, considerando a ausência de livrarias em praticamente todos os municípios maranhenses, exceto em São Luís, Caxias e Imperatriz? Como pensar a formação de leitores, quando as bibliotecas existentes não possuem bibliotecários qualificados para organizar e dinamizar esses espaços culturais e educacionais?
As respostas e reflexões apresentadas resultaram de uma pesquisa de campo, que envolveu mais de 60 entrevistados e 1391 informantes que responderam um questionário com perguntas abertas e fechadas. O estudo foi realizado por meio de pesquisa quantitativa e qualitativa, buscando uma reflexão dialética sobre as implicações da ausência de políticas de biblioteca, livro e leitura no desenvolvimento sociocultural dos maranhenses. O estudo abrangeu 13 municípios, conforme apresentados na Tabela 1:
Ao repensar as bibliotecas, especialmente as Biblioteca Públicas, consideradas canais importantes para construção de projetos que visam formar leitores e cidadãos, os bibliotecários têm buscado articulações com a sociedade civil, desse modo o/a bibliotecário/a passa a ser visto como como um sujeito social, participante e ativo capaz de interagir com a sociedade, sendo coparticipante das mudanças de paradigmas que se vislumbram para a construção de uma sociedade democrática.
Apesar dos problemas apontados em grande parte dos municípios investigados, observa-se que em Codó-MA há uma reação positiva por parte da população, que responde ao estímulos de construção de políticas de leitura neste município.
3.2 A contraofensiva no campo do livro, leitura, literatura e bibliotecas no Maranhão e o panorama leitor no Município de Codó-MA.
Nesta seção serão apresentados alguns resultados da pesquisa “Retratos da leitura no Maranhão” sob a coordenação da professora doutora Maria Mary Ferreira com foco no município de Codó e com a apresentação dos dados referente às categorias acerca de leitura e bibliotecas (FERREIRA; NASCIMENTO; MARTINS, 2021). O Município Codó atualmente possui uma área de 4.364,499 km², dos quais 4,452 km² estão em zona urbana e com população de 120.548 habitantes, de acordo com o IBGE (2016). A população estimada em 2017 é de 120.810, anteriormente em 2010 era 118.038, Codó conta com bibliotecas universitárias nos campi da Universidade Federal do Maranhão (UFMA), Universidade Estadual do Maranhão (UEMA), Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia (IFMA), uma biblioteca pública municipal, um farol do saber, salas de leitura na rede municipal e estadual, biblioteca no Instituto de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IEMA) e uma biblioteca no Instituto Histórico e Geográfico de Codó e algumas bibliotecas comunitárias em associações, instituições e ONGs.
Para análise no município de Codó foram aplicados, de forma aleatória, 166 questionários, com um público composto por estudantes, professores, vendedores, profissionais autônomos, donas de casas, pessoas desempregadas, lavradores, taxistas, mecânicos, etc. Entre os diversos bairros envolvidos na pesquisa, destacamos: São Francisco, São Sebastião, São Pedro, Centro, Codó Novo, Santa Filomena, Santo Antônio, Santa Teresinha, etc.
Quando questionados sobre o significado da leitura, 67% dos entrevistados afirmaram que a leitura é uma fonte de conhecimento para a vida, 15% como atualização profissional e, outros 7% asseguraram ser uma atividade prazerosa.
Em relação à quantidade de livros que os codoenses leram nos últimos três meses, 20% responderam que leram apenas 1 livro, enquanto 18% afirmaram que não leram nenhum; este dado também surpreende quando comparados com outros municípios. Observa-se que em São Luís 25% informaram não ter lido nenhum livro nos últimos três meses e em Timbiras este número é de 47%. Em Codó 15% alegaram que leram 2 livros.
No quesito em relação à frequência de leitura dos materiais listados no questionário, os resultados mais expressivos revelaram que 30% dos entrevistados responderam que leem revistas/jornais uma vez por semana; 30% leem 1 vez por mês livros de literatura; 38% afirmaram que leem todos os dias os livros indicados pela escola; 37% alegaram que não possuem tempo para ler histórias em quadrinhos; 64% declararam que os textos na internet são lidos todos os dias; para livros digitais/áudio livros e livros técnicos 42% e 32% declararam não ter tempo de ler esses tipos de materiais respectivamente.
Em referência aos títulos que os codoenses leram nos últimos três meses, a Bíblia foi o título mais citado pelos entrevistados, seguindo o padrão das repostas obtidas na pesquisa Retratos da Leitura no Brasil (2020). Em relação às motivações dos entrevistados para lerem o livro, 45% responderam que pelo fato de considerarem a leitura uma atualização cultural e uma fonte de conhecimento geral, outros 35% afirmaram que leem por prazer, gosto e necessidade espontânea. A seguir o gráfico com os demais dados referentes a essa questão:
No que corresponde a quais os fatores que determinam sua escolha por um livro, a maioria, 73%, dos respondentes alegaram ser por causa do tema/assunto, seguido de 21% que afirmaram ser devido à indicação de alguém e 21% declaram ser em virtude do título do livro. Com relação ao local onde os codoenses costumam ler, 83% dos respondentes declararam ser em casa, enquanto 22% disseram ler em sala de aula, 16% alegaram ser em bibliotecas. Quando estimulados a indicar a pessoa que mais os influenciou ao hábito da leitura, 39% afirmaram que foram os professores, subsequente de 25% que declararam que foi mãe ou responsável do sexo feminino e 15% disseram que foi outro parente ou amigo.
Quanto à principal forma de acesso aos livros, 31% dos respondentes revelaram que compram os livros que adquirem, pegam emprestados de bibliotecas e de outras pessoas representam 40% dos entrevistados, 18% afirmaram que baixam na internet. Quando questionados se emprestam os livros que possuem, 51% dos indivíduos responderam que sim, enquanto 49% disseram que não. Com referência ao local onde são comprados os livros, 23% declaram ser em livraria, enquanto 40%responderam que não compram livros, como exposto, fato que leva a inferir que adquirem nas bibliotecas da escola e universidade. No gráfico a seguir é possível perceber as respostas através dos dados:
No que se refere à existência de uma Biblioteca pública, comunitária ou escolar na cidade ou no bairro, 68% dos codoenses alegaram que existe, enquanto 11% disseram que não sabiam e 10% declararam que não existia. Observa-se que o número de informantes que atestam a existência de uma biblioteca pública é elevado, embora, como informaram anteriormente, muitos não a frequentem.
Posteriormente os respondentes foram questionados sobre o que a biblioteca representa para eles: 52% consideram-na como um lugar para estudar, seguido de 20% que afirmaram que ela se caracteriza como um lugar para pesquisar. Poucos conseguem ver a biblioteca como um lugar de lazer ou um lugar para emprestar livros. Talvez por conta de que muitas bibliotecas tenham fechado o acesso a empréstimos, dado a perda acentuada de acervos e a falta de política de renovação de livros, tendo em vista que a maioria das bibliotecas não tem orçamento para aquisição de livros, como demonstrado no gráfico:
Os codoenses, quando questionados com que frequência iam à Biblioteca, 26% disseram que não a utilizavam, enquanto 22% declararam que iam de vez em quando em bibliotecas da escola ou da universidade, 21% alegaram que frequentavam de vez em quando a biblioteca pública, ao passo que 18% afirmaram que iam frequentemente à biblioteca da escola e da universidade.
Os respondentes foram questionados o que os faria frequentar ou visitar mais a biblioteca; os resultados mais expressivos demonstraram que 42% alegaram que a melhor disposição dos livros e 19% declararam que haveria um maior interesse se a biblioteca possuísse internet. Para os respondentes frequentadores das Bibliotecas, foi inquerido como estes avaliam as bibliotecas que utilizam, e os resultados explicitaram que 42% das pessoas afirmaram ser bem atendidas, enquanto 35% alegaram que a biblioteca é bem cuidada, como o gráfico a seguir certifica:
Diante das informações evidenciadas na pesquisa, percebe-se que a realidade encontrada no município de Codó não se difere, resguardada por diferenças pontuais, dos outros municípios maranhenses e próximos em algumas respostas ao cenário nacional apontado na mais recente pesquisa Retratos da Leitura no Brasil.
4 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A construção de uma sociedade capaz de pensar a realidade em diferentes contextos e de intervir nessa realidade, buscando transformá-la, somente será possível, quando informação e conhecimento estiverem presentes na vida dos grupos sociais para nortear suas decisões. É certo que essa perspectiva faz parte do Plano Nacional do Livro e da Leitura - PNLL, considerado uma política pública de Estado de grande importância, na medida em que visa:
[...] assegurar e democratizar o acesso à leitura e ao livro a toda a sociedade na época contemporânea para que o ser humano possa desenvolver plenamente, com base na compreensão de que a leitura e a escrita são instrumentos indispensáveis suas capacidades, seja no nível individual, seja no âmbito coletivo. (BRASIL, 2011, p. 25).
Porém, o que se observa é que esse Plano ainda não conseguiu atingir os objetivos a que se propõe, tendo em vista que o número de espaços de informação criados não conseguiu suprir as necessidades de leitura e informação da sociedade brasileira e maranhense. Se essa realidade era desafiadora em 2006, quando foi criado o PNLL, no atual contexto (2021), quando estamos discutindo isso, nesta mesa, se constitui um desafio muito maior, tendo em vista os resultados da pesquisa Retrato da Leitura no Maranhão, que confirma o esvaziamento do Plano Nacional do Livro e da Leitura e, consequentemente, reflete na desarticulação das políticas de bibliotecas, livro e leitura. Essa situação provocada no Governo de Jair Bolsonaro se constitui um dos maiores retrocessos dos projetos culturais implantados no Brasil nas últimas décadas.
Para criar uma cultura da leitura no Brasil e uma sociedade movida pelo conhecimento, torna-se importante investir em espaços de leitura e informação. Para tanto, é necessário “[...] ampliar o número de bibliotecas e/ou salas de leitura, abrir livrarias e criar espaços de cultura que possam envolver a comunidade como um todo” (FERREIRA, 2015, p. 23). É importante, também, investir em pessoal qualificado que possa sistematizar as informações, indicar e orientar as leituras, disponibilizando livros, jornais, revistas e informações (disponíveis) com a finalidade de criar uma cultura de leitura, visto que a mesma é considerada um processo que não se estabelece de forma passiva; mas sim, como um processo de interação entre texto e leitor, configurando-se como um meio de aquisição de saber, dando aos homens e às mulheres, maior capacidade de reflexão para interagir com o meio social e cultural.
Pensar uma política de leitura que leve em conta a realidade de cada cidade e de cada localidade é papel do Estado, uma vez que criar e pensar uma sociedade da informação ou uma sociedade leitora, subtende-se ouvir os diversos setores para pensar caminhos que possam transformar, gradativamente, as realidades dos municípios. Este estudo possibilita esse encontro, uma vez que aqui está transcrito o que pensam os leitores do Maranhão, suas expectativas de leitura e os livros que gostariam de ler. A pesquisa aponta a total ausência de profissionais da informação nos municípios, fato que inviabiliza a construção de um projeto de uma cultura da leitura neste Estado.
REFERÊNCIAS
BOBBIO, Norberto. Teoria Geral da Política: a filosofia política e as lições dos Clássicos. Rio de Janeiro: Campus, 2000.
BOBBIO, Norberto. O futuro da democracia: uma defesa das regras do jogo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1992.
BRASIL. Ministério da Cultura. Programa Mais Cultura. Brasília, 2007. http://www.cultura.gov.br/upload/Programa%20Mais%20Cultura. Acesso em 23 mar. 2021.
DELGADO, Márcia Cristina. Cartografia sentimental de sebos e livros. Belo Horizonte: Autêntica, 1999. 167p.
__________. Sociedade da Informação e as contradições das políticas de leitura no Maranhão/Brasil. In: CONGRESSO DA ASSOCIAÇÃO INTERNACIONAL DE CIÊNCIAS SOCIAIS E HUMANAS EM LÍNGUA PORTUGUESA. Atas... Lisboa, Universidade Nova de Lisboa, v. 1, p. 10035-10046, 2015. Disponível em: http://www.omeuevento.pt/Ficheiros/Livros_de_Actas_CONLAB_2015.pdf. Acesso em: 23 de novembro de 2018.
_________________. O Maranhão No Século XXI: Pobreza extrema, trabalho escravo e os desafios e dramas de um Estado arcaico. Texto síntese da Pesquisa Registro Civil do Nascimento. São Luís, 2012. 75 fl (mimeo).
LAFARGE-HORELLOU, Chantal; SEGRÉ, Monique. Sociologia da Leitura. Tradução Mauro Gama. São Paulo: Ateliê Editorial, 2010. cap. 1, p. 13-43.
ONARDO NETO, O efeito da covid no livro digital. Publishnews, 12 maio 2020. Disponível em: https://www.publishnews.com.br/materias/2020/05/12/o-efeito-da-covid-no-livro-digital. Acesso em 20 fev. 2021.
Notas