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FEDERALISMO E DESCENTRALIZAÇÃO TERRITORIAL os governos estaduais no pacto federativo brasileiro
Revista de Políticas Públicas, vol. 26, núm. 2, pp. 598-615, 2022
Universidade Federal do Maranhão

Artigos - Dossiê Temático


Recepción: 25 Julio 2022

Aprobación: 01 Noviembre 2022

DOI: https://doi.org/10.18764/2178-2865.v26n2p598-615

Resumo: Em países federativos e com altas desigualdades socioeconômicas regionais, o debate sobre a descentralização territorial é central no que diz respeito à implementação de políticas públicas. Com o objetivo de contextualizar os governos estaduais dentro do pacto federativo brasileiro em termos de competências, distribuição de recursos e autonomia decisória, este artigo faz uma revisão das relações interfederativas e da descentralização territorial desde a Constituição Federal de 1988. A revisão é feita com base em trabalhos de estudiosos do tema no Brasil. Entende-se que, ao olhar para essas questões é possível compreender a construção estrutural das potencialidades e impasses dos governos estaduais para além de suas particularidades recentes.

Palavras-chave: Federalismo brasileiro, descentralização territorial, governos subnacionais, governos estaduais.

Abstract: In federative countries with high regional socio-economic inequalities, the debate on territorial decentralization is central to public policies implementation. With the aim of contextualizing state governments within the Brazilian federative pact in terms of competences, distribution of resources and decision-making autonomy, this paper reviews the interfederative relations and of territorial decentralization since the 1988 Federal Constitution. This review is based on works by federalism scholars in Brazil. It is understood that, by examining these questions, is possible to comprehend the structural potentialities and constraints of state governments beyond their particularities.

Keywords: Brazilian federalism, territorial descentralization, subnational governments, state governments.

1 INTRODUÇÃO

Em contexto de altas desigualdades socioeconômicas regionais, a discussão sobre as relações interfederativas e a descentralização territorial tem fundamental importância no que diz respeito à implementação de políticas públicas. Nesse debate, o papel dos governos subnacionais, sobretudo dos governos estaduais, é central. Isso ficou bem claro com a irrupção da pandemia da Covid-19 no Brasil que, para além de suas implicações sanitárias, sociais e econômicas, demonstrou o protagonismo dos governos estaduais em uma situação de conflitos e ausência de coordenação por parte do ente central (ABRUCIO et al., 2020).

Algumas interpretações sobre a formação federalista brasileira recente compreendem o movimento da constituinte nos anos 1980 como um processo de limitação dos poderes da União e de expressiva descentralização em direção aos governos subnacionais. A previsão de medidas tais como o aumento do montante das transferências constitucionais e a restauração da representação política subnacional indicaram elementos que caminharam nesse sentido. Todavia, é possível notar que a Constituição Federal de 1988 (CF/88) institui no Brasil uma estrutura muito mais complexa e multifacetada no que diz respeito à descentralização territorial. Nesse sentido, vários estudos destacam a fraca autonomia e capacidade dos governos estaduais no âmbito do federalismo brasileiro (ARRETCHE, 2007; 2009; 2013; ARRETCHE; SCHELEGEL, 2014; ISMAEL, 2013; MONTEIRO NETO, 2014; OLIVEIRA; CHIEZA, 2018).

Com o objetivo de contextualizar os governos estaduais dentro do pacto federativo atual em termos de competências, distribuição de recursos e autonomia decisória, este artigo faz uma revisão das relações interfederativas desde a Constituição Federal de 1988. A revisão é feita com base em trabalhos de estudiosos do tema, especialmente Marta Arretche (2007; 2009; 2013), Arretche; Schelegel (2014) e Fabrício de Oliveira e Rosa Chieza (2018). Entende-se que, ao olhar para essas questões é possível compreender a construção estrutural das potencialidades e impasses dos governos estaduais para além de suas particularidades recentes. É nesse sentido que a próxima seção dedica-se à análise das disposições constitucionais que regulamentam a federação brasileira do ponto de vista da autonomia legislativa, administrativa, fiscal e tributária dos entes subnacionais. Nas seções seguintes, observamos como estas questões evoluem nos contextos de reformas neoliberais nos anos 1990 e de retomada do papel da União em relação a projetos de investimentos em infraestrutura e políticas sociais nos anos 2000.

2 A COMPLEXA DESCENTRALIZAÇÃO TERRITORIAL DA FEDERAÇÃO BRASILEIRA

Em termos de autonomia legislativa e administrativa, nota-se que, apesar de a CF/88 prever jurisdição normativa concorrente (art.24º) e execução de competências comuns (art.23º) para a esfera subnacional, ela também concentra ampla autoridade privativa (art.22º) e exclusiva na União (art.21º) para, respectivamente, regulamentar e executar determinados encargos. Ainda que os governos subnacionais tenham autonomia para a execução de determinadas políticas públicas e integrem o escopo das competências concorrentes, a significativa extensão da responsabilidade privativa da União constitui um fator limitante aos estados e municípios do ponto de vista da formulação de diretrizes e normas sobre suas próprias atividades (ARRETCHE, 2007; 2013).

As regras para concessões, licitações, contratação de servidores, remuneração e subsídios de governadores e prefeitos, composição dos legislativos municipais são definidas pela legislação federal. [...] Até mesmo para suas próprias eleições estão as unidades constituintes limitadas para fazer legislação própria! [...]

Por fim, a União também pode legislar sobre os gastos de estados e municípios, prerrogativa esta que autorizou a aprovação da Lei de Responsabilidade Fiscal, o Fundef, o Fundeb, bem como a vinculação de recursos para saúde [...] (ARRETCHE, 2013, p.50).

Os estados situam-se em uma posição de maior indefinição na trama das relações interfederativas. O texto constitucional lhes reserva como competência tudo aquilo que não lhes for vedado – as chamadas competências residuais (art.25º). Diante da extensão da autoridade legislativa e administrativa da União, a aplicação deste dispositivo encontra-se limitada e apenas cabe exclusivamente aos estados a instituição de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões e o papel de intermediador entres as iniciativas cooperativas federais (SOUZA, 2005; ARRETCHE, 2013).

Do ponto de vista das instituições federativas, outro fator interessante diz respeito aos trâmites legislativos. O processo de emenda à constituição do sistema brasileiro exige mínimas maiorias, as câmaras federais constituem a única arena de veto possível e as decisões deliberadas nas suas instâncias são o suficiente para serem aplicadas sobre todo o território nacional. Nesse sentido, a ampla autoridade legislativa concedida à União foi combinada com as limitadas oportunidades de veto concedidas às demais unidades federativas, reforçando mais uma vez o fortalecimento da União em termos de autonomia normativa (ARRETCHE, 2007; ARRETCHE; SCHLEGEL, 2014).

Outro elemento determinante para a configuração do nível de autonomia legislativa dos entes subnacionais diz respeito ao comportamento político das suas bancadas. Como bem observou Arretche (2009), embora o Senado e a Câmara sejam arenas destinadas à representação equilibrada de todos os estados da nação, a esfera central de governo não é constrangida pelas demandas subnacionais. A segmentação dos plenários se dá muito mais pela orientação ideológica do que pela representatividade territorial, mesmo que a matéria em análise diga respeito a questões de interesse estritamente regional.

Sendo assim, percebe-se ao longo dessa trajetória histórica matérias legislativas prejudiciais aos estados sendo aprovadas com relativa facilidade e ampla anuência dos seus representantes. O posicionamento das bancadas em termos estaduais é muito mais episódico e a regra de atuação se dá mais comumente pela via ideológica, ou seja, “[...] a disciplina partidária prevalece sobre a coesão da representação regional” (ARRETCHE, 2013, p.54). Tal comportamento não aparenta estar em vias de modificação, pois as dinâmicas legislativas atuais parecem atuar cada vez mais na reafirmação e polarização dessa realidade.

No que diz respeito à autonomia tributária, a análise também requer um maior cuidado para qualificar o nível de descentralização. A CF/88, de fato, trouxe avanços no sentido da descentralização política, jurisdicional e de competências, sobretudo se tomarmos como referência os governos da ditadura civil-militar. No entanto, as suas configurações de aspecto centralizador não podem ser ignoradas, tornando-se importante o olhar mais atento sobre a disposição constitucional desta dimensão da autonomia dos entes subnacionais.

A previsão de medidas como o aumento do montante das transferências constitucionais, a ampliação da base de cálculo do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e a instituição de competência para fixar alíquotas tributárias próprias, por exemplo, são interpretadas por parte da literatura como medidas que revelam a aquisição de ampla autonomia tributária por parte dos entes subnacionais. A União perde participação relativa no bolo tributário nacional diante da descentralização de recursos para estados e municípios (Tabela 1), mas, em termos de autonomia, os constituintes ainda reservaram à esfera do governo central poder decisório sobre questões como as condições de arrecadação e previsão das bases de incidência (ARRETCHE, 2007; 2009).

Tabela 1
Distribuição Federativa das Receitas (1988-2000)

Oliveira e Chieza (2018).

De maneira geral, segundo Arretche (2009), a CF/88 já era dotada de dispositivos que, mais tarde, confeririam margem de ação à União para a recuperação de receitas através das reformas dos anos 1990, como veremos mais à frente. Em geral, quando se fala em descentralização – porque, de fato, os municípios adquiriram maior aumento de participação relativa no bolo tributário nacional (Tabela 1) –, trata-se de uma descentralização regulada que distribui recursos, mas centraliza decisões normativas sobre o modo de instituição dos mesmos.

Por outro lado, no que diz respeito aos gastos e encargos dos entes subnacionais, as normativas para esses campos foram instituídas de maneira paradoxal. A CF/88 estabeleceu um cenário de autonomia de gasto para estados e munícipios, mas, em contrapartida, concentrou na União um expressivo conjunto de competências exclusivas e não apresentou regulamentação equivalente no que diz respeito à responsabilização fiscal e meios práticos de cooperação intergovernamental (SOUZA, 2005; ARRETCHE, 2007; SOARES; MACHADO, 2018).

A sinalização dessas nuances acerca da configuração da autonomia dos entes federados a partir da CF/88 não tem como objetivo refutar o caráter descentralizador do avanço democrático. No entanto, não é possível ignorar as medidas centralizadoras previstas e as lacunas deixadas em aberto que reservaram à União papel expressivo dentro do pacto federativo e que, em grande medida, explicarão os caminhos por onde se deram as reformas federativas dos anos 1990. Para Arretche (2007, p. 32) “[...] maximizamos os aspectos descentralizadores da CF 88, ignorando as opções centralizadoras de seus formuladores”.

Nas próximas seções, observamos como estas questões evoluíram nos contextos de reformas nos anos 1990 e de retomada do papel da União em relação a projetos de investimentos em infraestrutura e políticas sociais nos anos 2000.

3 O DESAFIO DOS ANOS 1990: conciliação entre autonomia e ajuste?

Durante os mandatos presidenciais dos anos 1980, algumas matérias de interesse federativo estiveram em votação, mas não foram centrais na agenda política. O fortalecimento da regulação federal sobre as políticas, gastos e arrecadações dos entes subnacionais apareceram de forma bem mais expressiva na gestão de Fernando Henrique Cardoso, onde a agenda presidencial mostrou-se mais empenhada na estruturação da organização federativa segundo a agenda do ajuste neoliberal (SOUZA, 2005; ARRETCHE, 2007).

Sob a urgência em obter equilíbrio econômico através do adensamento das suas receitas e do controle da dívida estatal, a agenda do governo federal progrediu rumo à significativa revisão constitucional voltada para a adaptação do País à agenda da austeridade fiscal e da globalização (ARRETCHE, 2006; OLIVEIRA; CHIEZA, 2018).

Conforme afirma Arretche (2007), o esforço do governo federal para a obtenção de receitas adicionais se deu por meio de duas estratégias principais: a criação de novos impostos não sujeitos à repartição e a desvinculação dos seus gastos e receitas. A partir da disposição constitucional, que previa as contribuições sociais enquanto instrumento tributário, foram criadas a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins), o Imposto Provisório sobre Movimentação Financeira (IPMF) – que, mais tarde, transformou-se na Contribuição sobre Movimentação Financeira (CPMF) – e a Contribuição sobre a Intervenção no Domínio Econômico (CIDE).

Aprovadas e prorrogadas entre as gestões Sarney e Lula, as contribuições tornaram-se uma das principais fontes de arrecadação do governo central durante esse período. Também apresentaram constante progressão ao longo do tempo, saltando “[...] de 0,88% do PIB (em reais) em 1995, primeiro ano do governo FHC, para 10,66% em 1998, 14,38% em 2002 (último ano do seu governo) e chegou a 16,09% em 2006, no fim do primeiro mandato do governo Lula” (BRANCO, 2007, p.146).

A desvinculação de receitas, por sua vez, surgiu através da criação de fundos provisórios. Em 1994, ainda no governo Itamar Franco, foi instituído o Fundo Social de Emergência (FSE) que desvinculava os gastos da União e previa a retenção de 20% da receita dos fundos constitucionais. Com duração prevista de dois anos, o fundo representava a obtenção de uma maior margem de manobra fiscal do governo central, mas, em compensação, impactava diretamente no orçamento dos estados e municípios, sobretudo os das regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste (OLIVEIRA; CHIEZA, 2018).

Apesar de ter sido concebido em caráter transitório, o fundo foi renovado, em 1996, sob o nome de Fundo de Estabilização Fiscal (FEF1). Apesar de o FEF não trazer mudanças significativas, para além da prorrogação por mais dois anos, ele explicitava seu real objetivo: a flexibilização do orçamento federal e a conquista do equilíbrio das finanças públicas. Por outro lado, a terceira prorrogação do fundo (FEF2), em 1997, trouxe a previsão de regras de ressarcimento para os municípios em razão do seu direito sobre o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural. Por fim, entre 2000 e 2011, o fundo foi renovado mais três vezes sob o nome de Desvinculação de Receitas da União (DRU). Porém, com o objetivo de evitar o crescente desgaste político, as novas edições já não previam mais a dedução da base de cálculo das transferências constitucionais (ARRETCHE, 2009; TOBALDINI; SUGUIHIRO, 2011).

Além dessas estratégias mais gerais, outro fator de impacto na composição de receita dos entes subnacionais foram as políticas da União de desoneração dos impostos partilhados. Tendo em vista que a CF/88 prevê a partilha de 10% do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) com os estados e o Distrito Federal – de maneira proporcional ao valor das exportações de industrializados – e a destinação de 46% do produto da arrecadação do Imposto de Renda (IR) e IPI aos fundos de participação, o domínio da União sobre esses dois impostos expõe parte da receita dos estados a determinações centrais.

Durante a gestão de Fernando Henrique Cardoso, os lucros e dividendos foram desonerados do IR através da instituição da Lei nº 9.249/95. De acordo com as estimativas de Gobetti e Orair (2015), tal isenção – considerando as alíquotas atuais do imposto (7,5% a 27,5%) – representou uma perda na receita pública de R$ 58 bilhões repartidos da seguinte forma: R$29,6 bi a União, R$12,5 bi aos estados e R$14,3 bilhões aos municípios. Somados os decréscimos dos entes subnacionais, os estados e municípios foram afetados com 49% dessa perda devido ao impacto nos repasses aos fundos.

A autonomia para arrecadar os impostos de competência subnacional também sofreu mudanças durante o período. Sob os ânimos do ímpeto municipalista da CF/88, os governos locais compreenderam a sua constituição como entes federativos autônomos também sob a ótica da autonomia tributária plena. A partir desse entendimento, muitos municípios ampliaram a cobrança do ISS sobre os pedágios e fixaram taxas de iluminação pública.

Os desdobramentos, entretanto, foram surpreendentes e entraram em disputa judicial no Supremo Tribunal Federal, onde prevaleceu a interpretação, fundamentada no art. 156º da CF/88, de que caberia à União regulamentar a base de incidência da tributação exclusiva dos municípios. Do mesmo modo, de acordo com o art. 145º, estariam os municípios vedados de instituir taxas sobre a base de impostos. Diante de tal decisão, as prefeituras só estiveram autorizadas a instituir a cobrança do ISS sobre o pedágio após a aprovação da Lei Complementar nº 100/99. As taxas de iluminação pública foram declaradas inconstitucionais e os municípios só estiveram autorizados a instituir algum tipo de custeio sobre a prestação do serviço após a aprovação da Emenda Constitucional nº 39/02, que criava a Contribuição de Iluminação Pública (CIP) (ARRETCHE, 2009).

A partir dos esforços de enfrentamento ao déficit da balança comercial brasileira após a valorização do câmbio na implementação do Plano Real, a União empreendia sua energia em promover uma maior entrada de dólares no País. Foi assim que, em 1996, a Lei Complementar nº 87, conhecida como Lei Kandir, foi aprovada com o objetivo de regulamentar a cobrança do ICMS e conferir maior competitividade à produção nacional ao desonerar a cobrança do imposto para as exportações de produtos primários, semielaborados e serviços (ARAUJO NETO, 2018).

Como resultado de tal determinação seriam consideráveis as perdas de receita para os estados e municípios. Portanto, a saída encontrada para a remediação do impasse foi a determinação do estabelecimento de mecanismos de ressarcimento a serem regulamentados em lei complementar. No entanto, na falta de regulamentação, o governo federal deixava os cálculos de compensação a serem permanentemente negociados com os entes subnacionais. Para Arretche (2007; 2009), a situação se mostrava problemática na medida em que, embora a desoneração fosse permanente, os ressarcimentos eram negociados de forma periódica.

Nesse sentido, conforme afirmam Oliveira e Chieza (2018), o mecanismo de ressarcimento da União sempre foi deficiente no estabelecimento de medidas de compensação aos entes subnacionais. Ademais, tendo em vista que a metodologia de cálculo ainda não foi regulamentada, o impasse entre a União e os estados sobre o ICMS se estende até os dias atuais.

De acordo com Araújo Neto (2018),

Para a Fundação Amazônia Paraense de Amparo à Pesquisa (Fapespa) (2017), a metodologia utilizada pela União para compensar os estados com a desoneração do ICMS na exportação de produtos primários e semielaborados não corresponde às perdas reais. Em estudo, a Fundação aponta perdas líquidas reais de R$25,06 bilhões, em 2016, e de R$268,99 bilhões, no acumulado de 1997 a 2016 (ARAÚJO NETO, 2018, p. 598).

De maneira geral, apesar de a Lei Kandir ser interpretada por alguns como uma ruptura no pacto federativo, a sua aprovação representava a continuidade das expectativas constitucionais acerca da centralização jurisdicional sobre impostos estaduais e municipais. Como bem apontado por Arretche (2007), a Lei Kandir, apesar das suas polêmicas, resolvia a ausência de normatização da CF/88, que havia instituído de maneira provisória aos estados a responsabilidade de dispor sobre a cobrança do imposto.

Do ponto de vista da autonomia decisória, as competências dos entes subnacionais sobre a execução das políticas públicas também foram alvo da agenda neoliberalizante de Fernando Henrique Cardoso. Ao aprovarem legislações que regulamentam desde o ordenamento urbano até as formas de concessão do serviço público – como, por exemplo, a Lei de Concessões, o Estatuto da Cidade e a Lei de Diretrizes e Bases –, as formas pelas quais os estados e municípios executariam os seus encargos estariam submetidas ao detalhamento federal (ARRETCHE, 2007). Sendo assim, ainda que os entes subnacionais fossem dotados de autonomia para executar as suas competências (policy making), eles não possuíam poder decisório para a definição das normativas gerais (policy decision making). Nesse sentido, conforme afirma Arretche (2009), tais medidas apenas dão continuidade àquilo que era previsto pelos constituintes em termos de centralização decisória.

Por outro lado, se a CF/88 previa expressiva autonomia para a alocação das despesas dos entes subnacionais, a partir de 1995, as reformas do governo de Fernando Henrique reverteram tal configuração ao estabelecerem uma significativa regulação federal sobre os gastos dos estados e municípios. Segundo Arretche (2007) e Oliveira e Chieza (2018), as medidas foram encaminhadas sob as seguintes estratégias gerais:

  • I. Fixação de limites das despesas com o funcionalismo público e previsão de punições em caso de descumprimento, estabelecido pela Lei Complementar nº 82/95, conhecida como Lei Camata, e pela Lei Complementar nº 96/99, Lei Camata II.

    II. Estabelecimento da vinculação de parte da receita com objetivo de garantir a manutenção e desenvolvimento de políticas públicas. No caso da educação, foi disciplinada a obrigatoriedade de investimento de, no mínimo, 25% das receitas dos entes subnacionais, sendo 60% vinculado à aplicação no Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do ensino Fundamental e Valorização do Magistério (Fundef), regulamentado pela Lei 9.424/96. No setor da saúde, a Emenda Constitucional nº 29/00 assegurou a vinculação de 12% das receitas dos estados e 15% dos municípios para serem destinados ao financiamento da prestação do serviço.

    III. Instituição da obrigatoriedade aos estados e municípios para a criação de respectivos fundos dedicados ao combate à pobreza através da definição de alíquotas de 2% sobre a arrecadação do ICMS, no caso dos estados, e de 0,5% do ISS sobre serviços supérfluos no caso dos municípios, conforme regulamenta a Emenda Constitucional nº 31/00.

Além disso, Oliveira (2007) e Arretche (2007) concordam ao identificar a aprovação da Lei Complementar nº 101/00, chamada Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), como o ápice do processo de ordenamento fiscal posto em marcha no País durante os anos 1990. Ao instituir novos padrões de responsabilização fiscal, criminalizar práticas contrárias ao princípio da transparência, definir limites para operação de créditos e níveis de gastos com funcionalismo público, a LRF traz um novo paradigma de comportamento para todos os entes federativos. Paralelamente, sinaliza a sistematização de um novo nível de controle hierárquico normativo sobre a estruturação das finanças públicas subnacionais e execução das suas respectivas atividades.

A seguir, no Quadro 1, é apresentada uma síntese das medidas legislativas adotadas entre o final da década de 1980 e o início dos anos 2000 que reconfiguraram as autonomias dos entes federados dentro do pacto federativo brasileiro.

Quadro 1
Reformas de Repercussão Federativa (1988-2002).

Elaboração própria com base em Arretche (2009) e Araújo Neto (2018).

O impacto dessas estratégias na autonomia dos entes subnacionais, sobretudo os estados, é indiscutível. Por outro lado, é importante ressaltar que tal fato não é suficiente para classificar a totalidade dos acontecimentos como o início do enfraquecimento dos estados. Como foi dito anteriormente, as disposições constitucionais já traziam consigo aspectos centralizadores que não devem ser negados.

O período, portanto, deve ser compreendido como um contexto de ruptura e continuidade: há reversão na medida em que a autonomia de gasto subnacional passa a ser limitada e as transferências constitucionais são retidas em certo nível. Em contrapartida, há um ambiente de continuidade diante da manutenção da autoridade legislativa da União para regular as diretrizes de execução das obrigações dos estados e municípios. As leis aprovadas não só não alteraram a distribuição de autoridade em algumas matérias previstas constitucionalmente, como, majoritariamente, representaram a normatização das expectativas constitucionais.

4 FEDERAÇÃO EM LITÍGIO NO SÉCULO XXI?

Os anos 2000 foram marcados por significativas mudanças no contexto político-econômico do País, sobretudo na gestão de Luís Inácio Lula da Silva. Diante da conjuntura internacional favorável, a agenda do Estado deslocou-se do cerne das reformas estruturais para a promoção de políticas macroeconômicas anticíclicas e investimento na agenda social e de infraestrutura, acionando as instituições financiadoras e de planejamento do Estado em favor do crescimento.

De maneira geral, a federação permaneceu no caminho da centralização ao longo desses últimos quinze anos: se nos anos 1990 a agenda do ajuste fiscal justificou o protagonismo da União, nos anos 2000 tal configuração foi mantida sob o discurso da necessidade de ampliação do gasto social. Seja do ponto de vista da regulação e execução das competências concorrentes ou da centralização de recursos, o fato é que o governo federal deu continuidade à conformação federalista da década anterior (ISMAEL, 2013; MONTEIRO NETO, 2013).

Com um crescimento econômico nacional de 4% ao ano, os entes federativos testemunharam uma relativa folga nas finanças públicas diante da expansão das suas receitas entre 2003 e 2010. Sendo assim, a pauta federativa não ocupou com relevância a agenda central. Conforme afirmam Oliveira e Chieza (2018), o mote das discussões estava no programa social e dava a questão federativa como resolvida.

Nesse sentido, entre 2003 e 2010, o que se nota é uma continuidade da regulamentação das autonomias subnacionais através da edição de medidas significativas, tais como a criação, em 2007, do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), em substituição ao FUNDEF. No FUNDEB, a alíquota de vinculação dos estados e municípios foi ampliada para 20% e outros aspectos básicos foram mantidos. Isso, mais uma vez, reafirmava a regulação federal sobre a margem decisória dos entes subnacionais sobre os seus próprios gastos. Além disso, a aprovação da Lei de Consórcios Públicos, das Parcerias Público Privadas (PPPs) e a reforma previdenciária do funcionalismo público significaram a manutenção da ação federal em atender às expectativas constitucionais quanto à normatização da autonomia decisória dos entes subnacionais (ABRUCIO, 2005; ARRETCHE, 2007; 2009).

Do ponto de vista tributário, Brami-Celentano e Carvalho (2007) afirmam que as reformas de impacto federativo do início dos anos 2000 foram marcadas por alterações pontuais na legislação. De maneira geral, as medidas do governo central permaneceram orientadas pela estratégia do adensamento da receita federal através da desvinculação de recursos e da prorrogação dos impostos não partilhados. Dentro dessa lógica, instrumentos como a DRU[1] e a CPMF foram prorrogados até 2007 e 2008, respectivamente, por meio da promulgação da Emenda Constitucional nº 42/03.

Outros dispositivos como a CSLL e a CIDE também permaneceram ativos, alvos, com frequência, de disputas políticas e como meios de barganha da União para a obtenção de apoio aos seus projetos. A título de exemplo, temos o caso da determinação da partilha de 29% da arrecadação da CIDE-combustíveis com os estados e municípios. Segundo Oliveira e Chieza (2018), isso representou uma medida inédita do governo central ao compartilhar a receita de uma contribuição social com as esferas subnacionais.

No que diz respeito à questão fiscal, o Governo federal manteve as decisões acerca da regulação da capacidade de endividamento dos entes subnacionais, sobretudo dos estados. A participação relativa dos estados na distribuição de receitas permaneceu em declínio (Tabela 2). Porém, as disputas por maior autonomia orçamentária foram deixadas em segundo plano, de maneira que as críticas aos limites da LRF e aos compromissos da dívida eram arrefecidas e tais embates só encontrariam lugar de novo na agenda nacional durante a fase de declínio econômico (OLIVEIRA; CHIEZA, 2018).

Tabela 2
Distribuição Federativa das Receitas (2003-2014)

Oliveira e Chieza (2018).

Ao final da gestão de Lula, a economia já apresentava um quadro de desaceleração, que se aprofundou no segundo semestre de 2014. Em um contexto de incapacidade para cumprir com os compromissos da dívida, honrar folhas de pagamento e garantir a prestação de serviços públicos, governadores e prefeitos começaram uma corrida para a mobilização de recursos adicionais através de diversas fontes. Dentro de uma nova onda de instabilidade política e econômica, a ruptura temporal em relação aos feitos do primeiro decênio foi sinalizada e abriu espaço para reacender o debate em torno das disputas federativas no campo nacional (MONTEIRO NETO, 2014; OLIVEIRA; CHIEZA, 2018).

A gestão de Dilma Rousseff foi marcada por sucessivos desafios políticos e econômicos impostos pela tentativa de conciliação entre uma agenda de ajuste econômico recessivo, conservação política da base aliada e manutenção do pacto federativo, culminando com o seu afastamento do cargo por meio do processo de impeachment, em 2016, durante o seu segundo mandato. Nesse contexto, a agenda federativa foi marcada por uma ampla disputa em torno da reconfiguração da distribuição de autonomias e recursos entre os entes federados.

A influência das políticas tributárias da União na composição de receitas dos entes subnacionais também aparece como item marcante na discussão federativa desse período. Diante da crise internacional de 2008 e da recessão econômica nacional a partir de 2014, o governo federal tomou os benefícios e as renúncias fiscais como estratégias de estímulo à economia, que, de acordo com Araújo Neto (2018), concederam ao setor produtivo, entre 2011 e 2015, desonerações de cerca de R$ 342,3 bilhões sobre tributos tais como IPI, IRPJ e CSLL. Segundo esse autor, a estratégia da União era baseada na desoneração dos impostos partilhados com os estados e municípios, o que fazia com que estes carregassem o ônus da política tributária nacional, chegando a arcar com 58% das desonerações sobre o IRPJ e IPI e abdicar cerca de R$ 190,1 bilhões em repasses aos fundos constitucionais entre 2008 e 2012. Nesse sentido, o impacto das volumosas desonerações sobre tais impostos refletia diretamente sobre as principais fontes de receitas estaduais e municipais. Na primeira década dos anos 2000, isso levou a discussões nacionais sobre a transferência do ônus das ações da União para os estados e municípios, tal como no debate acerca da regulamentação dos critérios de partilha do Fundo de Participação dos Estados (FPE).

O FPE é composto por 21,5% das receitas oriundas da arrecadação do IR e do IPI, sendo previsto na CF/88 como um instrumento de caráter redistributivo criado para a mitigação das desigualdades regionais brasileiras e a promoção do equilíbrio fiscal na federação. Os critérios de partilha provisórios do fundo foram, inicialmente, regulamentados pela Lei Complementar nº 62/89, com base nos dados demográficos da época, e previam a seguinte distribuição: 85% dos recursos destinados aos estados das regiões Norte, Nordeste e Centro Oeste e outros 15% caberiam aos do Sudeste e do Sul.

No entanto, apesar das mudanças conjunturais pelas quais a sociedade brasileira passou ao longo do tempo, aquilo que havia sido aprovado com caráter transitório tornou-se permanente. Diante da fixidez dos critérios de repartição para um objetivo que é composto por uma variável dinâmica, o impacto da aplicação do instrumento se encontrava limitado pelo congelamento da avaliação das disparidades. Tal situação, por sua vez, só foi questionada a partir da impetração de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), em 2010, por parte dos governos do Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rio de Janeiro e Goiás. O questionamento dos estados acerca das normas de repartição da LC nº 62/89 foram acolhidos pelo STF, que julgou a norma inconstitucional e deu um prazo de três anos para que o Congresso Nacional aprovasse uma nova legislação.

Em 2013, o Congresso apresentou uma nova normativa, com vigência prevista para 2016, que instituía uma nova distribuição dos recursos do fundo. Entretanto, a disputa acerca do ônus das desonerações fiscais não passou despercebida pelos legisladores, onde previram no art. 5º a exclusão das desonerações concedidas pela União do cálculo dos repasses dos fundos de participação. O Governo federal, por sua vez, embora tenha aprovado a Lei Complementar nº 143/13, vetou apenas o artigo citado. Contudo, de acordo com Oliveira e Chieza (2018), os novos critérios apenas apresentavam mudanças marginais em relação à antiga normatização, motivando o Estado de Alagoas a entrar com uma nova ADI no STF que ainda aguarda julgamento.

Outro ponto de repercussão federativa que marca o período é a disputa sobre a revisão do marco regulatório da exploração petrolífera nacional. Em um contexto de descoberta do pré-sal e alta do preço internacional do petróleo, as disputas entre estados e municípios no que se refere à partilha das receitas dos royalties já se acirravam em 2009 e ainda permanecem em pauta.

Diante das expectativas sobre o potencial econômico da exploração marítima do pré-sal, as discussões acerca do marco regulatório da atividade e da divisão das compensações governamentais entrariam em debate, tendo o protagonismo dos estados não produtores pela reivindicação da revisão das antigas normas e a sua inclusão na partilha dos royalties (OLIVEIRA; CHIEZA, 2018). A divisão da federação entre estados produtores e não produtores evidenciava a disputa dos entes. De um lado, debatia-se pelo aumento das suas receitas através da revisão distributiva de recursos petrolíferos e, de outro, pela conservação dos seus benefícios vigentes.

Ainda em 2009, Lula encaminhou ao Congresso a proposta de um novo marco regulatório, o Regime de Partilha, demonstrando-se a favor de uma distribuição mais igualitária do recurso, mas não logrou sucesso. Diante da pressão de estados produtores, sobretudo o Rio de Janeiro e Espírito Santo, o presidente voltou atrás na sua proposta. No ano seguinte, a pressão dos estados não produtores chegou a resultar na aprovação da Lei nº 12.351, que os incluía como beneficiários da partilha das compensações. No entanto, a medida foi vetada pelo presidente, transferindo a discussão para a gestão de Dilma Roussef.

Tal imbróglio só encontraria um relativo desfecho a partir de 2012, quando o novo marco regulatório da exploração foi aprovado por meio da Lei nº 12.734/12, prevendo a instituição do Regime de Partilha[2] e alterando a distribuição dos royalties e participações especiais entre os entes da federação. Apesar da aprovação dessa lei, a presidente Dilma Rousseff vetou alguns pontos da medida, como, por exemplo, a implementação da vigência das novas normas para contratos novos e antigos. Roussef encaminhou ao Congresso Nacional a Medida Provisória nº 592/12, que previa a destinação de 100% da quota da União sobre os royalties do pré-sal para o investimento em projetos de desenvolvimento, educação e combate à pobreza.

Todavia, os parlamentares não entraram em acordo com os vetos da presidência e, em 2013, os derrubaram e restituíram o conteúdo original da Lei. Em reação, os estados produtores recorreram ao STF por meio da denúncia de inconstitucionalidade da Lei nº 12.734, o que levou à concessão da liminar e suspensão dos efeitos da medida até o julgamento. No mesmo ano, o governo federal encaminhou um projeto para o Congresso, que foi aprovado e transformado na Lei nº 12.858, que previa a destinação de 100% dos recursos dos royalties e participações especiais arrecadados pelos entes da federação para a aplicação na saúde (25%) e na educação (75%).

Os conflitos que envolvem a distribuição dos royalties não se deram por resolvidos. Após oito anos de suspensão parcial dos seus dispositivos, a constitucionalidade da Lei 12.734 ainda não foi julgada. De um lado, governadores dos estados produtores sustentam o discurso de que a nova regulação da distribuição ameaçaria os seus respectivos direitos adquiridos constitucionalmente. De outro, visando garantir a sua participação na distribuição de royalties, os estados não produtores pressionam o STF para o rápido julgamento da liminar.

Apesar das semelhanças com o ciclo anterior, a atual fase do federalismo brasileiro tem sido marcada por um viés de disputa federativa institucional relativamente mais expressivo. Diante dos pilares político e econômico abalados, os entes federativos parecem recorrer a medidas para a garantia da salvação individual. De um lado, estados e municípios buscam garantir a legitimação de garantias que carecem de regulamentação há anos, mas também disputam entre si a captação de um maior volume de determinados recursos. De outro, o governo federal se mostra rígido nas negociações, na tentativa de manter a integralidade do seu orçamento e a fonte de recursos para o pagamento das suas dívidas. A cooperação entre os entes federados tem sido cada vez mais frágil e a arena de discussão tem se dado cada vez mais pela via judicial.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O caos financeiro no qual se encontram alguns estados da federação e a sua consequente incapacidade em cumprir com os seus encargos básicos têm mobilizado a atenção da sociedade para a discussão e solução do problema. No entanto, os discursos mais recorrentes encaram a situação a partir de motivações exclusivamente conjunturais, que ignoram processos estruturantes e creditam os “males da década” a eventos situacionais como, por exemplo, a corrupção e/ou o mercado internacional. De fato, tais eventos contribuíram para a deterioração da situação financeira e administrativa dos entes subnacionais, mas não são capazes de explicar por si só a origem do problema. Torna-se necessário observar os aspectos estruturais para uma análise com maior profundidade.

Nesse sentido, essa breve recuperação histórica da descentralização territorial no federalismo brasileiro permitiu a identificação das questões estruturais que permeiam o pacto federativo e influenciam na configuração atual das autonomias e capacidades dos entes subnacionais. Em síntese, é possível notar que a situação dos estados não é apenas fruto de impactos conjunturais. Segundo os estudiosos do tema, a CF/88 já designava um papel coadjuvante para os estados dentro do pacto federativo. Como resultado de agendas político-econômicas, houve cerceamento da capacidade financeira dos entes subnacionais, o que, por sua vez, contribui para a dificuldade em construir capacidades institucionais fortes o suficiente para a execução das suas funções.

A partir dessa reflexão, conclui-se que é impossível discutir um novo formato de distribuição de autonomias sem passar pela via da reestruturação das capacidades governativas dos estados, do ponto de vista particular, e do fortalecimento da União como ente coordenador, do ponto de vista geral. Em um País de dimensões continentais, encarar a questão federativa como apenas um desnível na distribuição de competências é ignorar e reafirmar as desigualdades regionais abissais que marcam a história brasileira.

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Notas

[1] Regulamentada pela Emenda Constitucional nº 93/16, a DRU permanece em vigência atualmente e, por enquanto, com previsão estendida até 2023.
[2] Neste regime, os campos de pré-sal são leiloados e a operação dos contratos se dá entre o consórcio ou empresa vencedora – podendo a Petrobras integrar o bloco de exploração ou não. Como medida compensadora da exploração, a empresa deve realizar repasses de 15% em royalties para a União e de óleo excedente, cuja alíquota é definida durante o leilão inicial (ANP, 2018).


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