Resumo: Como consequência da interferência do uso e cobertura do solo no processo erosivo, conhecer a dinâmica de uma bacia hidrográfica que é utilizada como fonte de água destinada ao abastecimento urbano, é essencial. Devido à sua complexidade e a necessidade de fazer estimativas, o desenvolvimento de modelos matemáticos é fundamental para tomadas de decisão assertivas. Dentre os modelos existentes, o modelo (Soil & Water Assessment Tool) SWAT é um dos mais utilizados no mundo. Neste contexto, o objetivo do trabalho é comparar o uso do solo no manancial do Ribeirão do Feijão, localizado no sudeste do Brasil, entre períodos distintos e estimar a produção de sedimentos relacionando com o uso do solo da bacia, utilizando o SWAT +, assim como definir áreas prioritárias para melhoria do cenário de qualidade da água. A simulação foi realizada dividindo a bacia em sub-bacias e atribuição de múltiplas Unidade de Resposta Hidrológica (HRUs). As métricas utilizadas para analisar a eficiência do modelo indicam que os resultados satisfatórios, com Nash-Sutcliffe (NSE) de 0,53 e 0,54, para calibração e validação da vazão, respectivamente. O modelo representado nesse estudo pode contribuir para orientar futuros planejamentos do uso e cobertura do solo, viabilizando a previsão de distintos cenários e possíveis impactos na produção de água.
Palavras-chave: Erosão, Balanço hídrico, SWAT + Uso e cobertura do solo.
Abstract: The change of natural landscapes by anthropic activities is the main reason for the erosion deepening. Thus, it is necessary to know the processes that determine the hydrological balance to avoid erosion in this context. Due to the complexity of a basin and the need of making predictions, the development of mathematical models is essential for decision making. Among the existing models, the Soil and Water Assessment Tool (SWAT) is one of the most utilized models worldwide. Thus, the present study aims to compare the land use between different periods and quantify the soil loss in a basin (Feijão River, in the Brazilian southeast), using the SWAT + model, as also to provide guidance to decision making by determining priority areas to improve water quality. The simulation was performed by dividing the basin into sub-basins and assigning multiple HRUs. The metrics used to analyze the model's efficiency indicate that the results were satisfactory, Nash-Sutcliffe (NSE) of 0.53 and 0.54 for calibration and validation of streamflow, respectively. The model represented in this study can help guide future planning for land use and occupation of the basin, enabling the forecast of different scenarios and their possible impacts on water production.
Keywords: Erosion, Water balance, SWAT + Land use and land cover.
Artigos
Impactos do uso e cobertura do solo na produção de sedimentos em área de manancial peri-urbano tropical
Impacts of land use and land cover on sediment production in a tropical peri-urban water source area
Recepção: 10 Fevereiro 2022
Aprovação: 13 Abril 2022
Publicado: 21 Junho 2022
Os desafios quanto à disponibilidade hídrica e desastres ambientais relacionados ao uso e cobertura do solo são preocupações no mundo todo. No Brasil, a expansão urbana desordenada e sem adoção de critérios técnicos (COSTA et al., 2012), intensificou a alteração na cobertura natural e no uso do solo, ocasionando sérios problemas nas áreas de mananciais (ALVIM et al., 2015). Neste sentido, é necessário planejar para ocupar racionalmente as bacias hidrográficas como uma forma de proteger e recuperar essas áreas e seus recursos hídricos (BAIHUA FU et al., 2019).
Os efeitos da ocupação desordenada do espaço numa bacia hidrográfica podem modificar a cobertura do solo que é um fator de grande importância no controle da erosão hídrica (DECHEN et al., 2015; FAO, 2015) e determinante nas mudanças hidrológicas da bacia (ZHANG et al., 2020), além de favorecer o transporte de sedimentos, ocasionando assoreamento dos rios e reservatórios (ANJINHO et al., 2021), e comprometendo a quantidade e a qualidade das águas (ACCORSI et al., 2017).
A magnitude dos processos erosivos é determinada por diversos fatores, como a intensidade da chuva, passando pela capacidade de infiltração e escoamento superficial do solo, até a declividade do terreno (VEIGA, 2014). Alguns fatores localizados, também podem ser determinantes na quantificação da erosão e consequente produção de sedimentos nos corpos hídricos (CASADO et al., 2002).
A compactação e a redução da espessura do solo reduz a capacidade de infiltração, gerando maior escoamento superficial e ainda maiores taxas de erosão (COSTA et al., 2012; OLIVEIRA et al., 2020). Desta forma, sedimentos, fertilizantes e agroquímicos são arrastados para os cursos d’água potencializando os processos de eutrofização e assoreamentos, reduzindo a seção de vazão e comprometendo a perenidade e a qualidade de suas águas, afetando suas características físicas, químicas e biológicas (PINHEIRO, 2004; VANZELA et al., 2010).
A cobertura vegetal, ao contrário, protege o solo contra a erosão e a perda de sedimentos (CUIABANO et al., 2017). Em países em desenvolvimento como o Brasil, a agricultura e pecuária são fontes importantes de renda, movimentando a economia, no entanto, quando não possuem boa gestão, geram efeitos adversos. Assim, os recursos hídricos são afetados, necessitando de estudos que reduzam a vulnerabilidade associada aos impactos do uso e cobertura da terra, seu manejo, e consequentes processos erosivos.
O conhecimento e o planejamento da dinâmica de uso e cobertura do solo e a compreensão dos processos que determinam o equilíbrio sedimentológico permitem a integração de ações visando o melhor aproveitamento do solo, aprimorando a resiliência do ecossistema (KEESSTRA et al., 2018).
A complexidade de uma bacia hidrográfica abrange os usos múltiplos do solo e a diversidade do meio físico e biótico, influenciando o comportamento hidrológico que também é controlado pelas características climáticas e pelas atividades humanas que resultarão nas alterações da paisagem (PORTO; PORTO, 2008).
Esta complexidade e a necessidade de se fazer previsões sobre cenários de desenvolvimento impulsionaram, a partir dos anos 70, o desenvolvimento de modelos matemáticos que tornam-se importantes ferramentas de tomadas de decisão para o manejo sustentável da terra.
A modelagem computacional é uma forma de representar os fenômenos naturais e/ou antrópicos mais complexos, com o objetivo de realizar simulações que estimem varáveis importantes para os diversos estudos ambientais, colaborando com futuras ações de tomadas de decisões.
Nesta perspectiva, o modelo SWAT (Soil and Water Assessment Tool), desenvolvido pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) e Texas A&M Agrilife Research, consegue integrar as técnicas de Sistema de Informações Geográficas (SIG), com o ciclo hidrológico e a equação MUSLE, tornando-se um dos modelos mais utilizados no mundo (TAN et al., 2020; BRESSIANI et al., 2015; GASSMAN et al., 2014). A modelagem em ambiente SIG, fornece dados valiosos e com resolução mais fina (ROUHOLAHNEJAD et al., 2012) tornando-se uma ferramenta fundamental para os estudos ambientais.
A falta de monitoramento de variáveis ambientais, com qualidade, precisão e boa resolução espacial dificulta a aplicação de modelos SWAT no Brasil. Além disso, muitos dos dados disponíveis estão em formatos não utilizável pelo SWAT, determinando a ausência de alguns parâmetros. Isso requer ajustes e parametrização dos dados, como no caso específico dos parâmetros físico hídricos dos solos, que necessita de funções de Pedo-Transferência para estimar parâmetros faltantes. Essas restrições e a dificuldade de encontrar uma série temporal de dados para executar o modelo, impõe ao modelador ter que adaptar informações por meio da avaliação dos dados disponíveis necessários para a bacia que será estudada (BRESSIANI et al., 2015).
Mesmo assim, o SWAT foi aplicado em diversas bacias hidrográficas brasileiras com as mais diferentes finalidades, destacando: estudos de vazão, manejo da terra e transporte de sedimentos, qualidade da água e mudanças climáticas (NETO, 2017; BRESSIANI et al., 2015; CARVALHO, 2014; LOPES, 2008). Vários estudos também foram desenvolvidos aplicando esta ferramenta para analisar os efeitos das mudanças de uso e cobertura do solo sobre os fluxos hidrológicos (ZHANG et al., 2020; PASSOS, 2017; BRESSIANI et al., 2015; PERAZZOLI et al., 2013; BLAINSK et al., 2011).
Os recursos hídricos são bens públicos e reservas estratégicas para o abastecimento público e podem ser comprometidos diante de usos e coberturas do solo, configurando sério risco à saúde pública e ao meio ambiente. Diante disso, conhecer o comportamento da bacia perante o uso do solo é fundamental para orientar estudos e tomadas de decisões que assegurem a proteção da qualidade das águas superficiais e subterrâneas e as funcionalidades dos solos.
Neste contexto, o objetivo deste trabalho é comparar o uso do solo na Bacia Hidrográfica do Ribeirão do Feijão entre os períodos de 2011 e 2020; estimar a vazão e geração de sedimentos da bacia hidrográfica por meio de modelagem hidrológica com o novo modelo SWAT +; e estabelecer áreas prioritárias na bacia para conservação de acordo com o atual uso do solo e com a produção de sedimentos simulada. Este trabalho contribuirá para orientar estudos de planejamento do uso e cobertura do solo, viabilizando a prevenção dos impactos que ocorrem de forma negativa na água e no solo.
A Bacia hidrográfica do Ribeirão do Feijão, localizada no estado de São Paulo, abrange os municípios de São Carlos, Analândia e Itirapina, Figura 1, tem área de 243,16 km². O Ribeirão do Feijão é responsável por abastecer parte da cidade de São Carlos de 243 mil habitantes, representando 27% do abastecimento. Os outros municípios apresentam populações menores, Analândia conta com 4.789 e Itirapina 17.377 habitantes (IBGE, 2017).

A ocupação da bacia é predominantemente rural, possuindo também áreas consideráveis de floresta e cerrado, sendo a pecuária uma atividade característica e praticada de maneira extensiva, seguida das culturas de cana-de-açúcar e laranja, além da presença de florestas plantadas de Pinus sp e Eucalyptus sp.
O clima da região é caracterizado como tropical com verão úmido e inverno seco, estando entre as classificações Cwa e Aw, de acordo com a classificação de Köppen (ALVARES et al., 2013). Os maiores volumes de precipitação ocorrem entre os meses de outubro e março, sendo janeiro o mês mais chuvoso, já o período com menores precipitações acontece entre abril e setembro (INMET, 2019). A temperatura média é em torno de 21°C, com uma pluviosidade média anual de 1404 mm (CLIMATE.DATA.ORG, 2020).
A bacia está situada em área de recarga do Aquífero Guarani, o qual representa a mais importante reserva hidrogeológica da região sudeste do Brasil, a mais desenvolvida. O Ribeirão do Feijão é afluente do Rio Jacaré-Guaçu desaguando no Rio Tietê, e está localizado na região entre as Bacias Hidrográficas do Tietê-Jacaré.
Em escala geológica continental, a área estudada localiza-se na Província Estrutural do Paraná, disposta no flanco nordeste da Bacia Sedimentar do Paraná. Do ponto de vista litoestratigráfico, são encontrados representantes litológicos que vão da Era Mesozóica (arenitos das formações Botucatu e Itaqueri e intrusivas básicas da formação Serra Geral) até a Cenozóica (sedimentos aluvionares) (ZUQUETTE, 1981; NISHIYAMA, 1991).
O solo predominante na bacia é o Neossolo Quartzarênico, um solo muito profundo, bastante permeável e com baixo potencial nutricional, sendo comum a presença da vegetação primária representada pelo cerrado (OLIVEIRA, 1984), além do Latossolo Vermelho-Amarelo com textura variando de arenosa a argilosa. Em áreas de solos ricos e de textura argilosa as florestas semidecíduas se tornam mais presentes. Ao longo da margem do Ribeirão do Feijão predominam os campos higrófilos, em solos hidromórficos (COSTA et al., 2018).
Com as transformações que ocorreram na bacia, vegetações primárias deram lugar ao avanço das pastagens, comum em solos pobres e de textura arenosa, assim como o cultivo de florestas artificiais que ocorre nessas áreas. Nos solos argilosos e mais produtivos, é trivial o avanço de práticas agrícolas, como o cultivo de cana-de-açúcar, café, milho e laranja.
O mapa de uso e cobertura do solo para o ano de 2011 foi obtido de Costa (2017), o qual foi elaborado a partir de imagens do satélite GeoEye com resolução espacial de 0,5m. Em seguida foi feito o processamento do mapa no ArcGIS e o agrupamento das classes dos diferentes usos do solo em 10 classes.
Para a elaboração do mapa de uso e cobertura do solo de 2020 foram utilizadas as imagens do Satélite Sentinel-2A, sensor MSI (Multispectral Instrument), composições coloridas RGB (4,3,2) e falsa cor (8,4,3), com resolução espacial de 10m (EUROPEAN SPACE AGENCY, 2020). Com base no conhecimento da área e das imagens de alta resolução do Google Earth e do Satélite Sentinel-2A foi realizada a classificação e vetorização poligonal manual dos usos do solo em tela (heads-up) (JENSEN, 2009; LONGLEY et al., 2013) da bacia no ArcGIS (CUNHA, 2021; JOVINO, 2021). Por fim, obteve-se o mapa de uso e cobertura do solo para o ano de 2020.
O SWAT foi inicialmente desenvolvido pelo Dr. Jeff Arnold para o Serviço de Pesquisa Agrícola (ARS) do USDA (NEITSCH et al., 2009), passando por melhorias contínuas durante os anos com a contribuição de diversos trabalhos e pesquisadores (ARNOLD et al., 1995; NEITSCH et al, 2004; 2005). Diante das grandes modificações e melhorias que o SWAT passou, uma versão completamente revisada do modelo foi gerada, o SWAT +, que foi utilizado neste trabalho. O SWAT + é muito mais flexível, apesar dos algoritmos usados para calcular os processos do modelo continuarem os mesmos, a estrutura e organização teve mudanças consideráveis (BIEGER et al., 2016).
O SWAT é capaz de diagnosticar o impacto das alterações do uso, tipo e manejo do solo no escoamento, erosão e produção de sedimentos, transporte de poluentes e qualidade da água em bacias hidrográficas, além de incluir o crescimento de plantas e detalhes dos manejos do solo (GASSMAN et al, 2007). Independentemente do tipo de problema que se pretende diagnosticar, o balanço hídrico precisa estar de acordo com a bacia hidrográfica em estudo. Com isso, o modelo baseia-se na equação do balanço hídrico (em dias):
Em que:
SWt representa o volume final de água no solo no dia (mm);
SW0 é o volume inicial de água no solo no dia (mm);
Ri é a precipitação no dia (mm);
Qsup é o escoamento superficial no dia (mm);
Ei é a evapotranspiração no dia (mm);
Pi é a percolação (mm), ou seja a infiltração de água no perfil do solo no dia;
Qret é o fluxo de retorno (mm), ou seja a ascensão capilar no solo no dia.
O modelo requer dados topográficos, do tipo de solo, do uso e cobertura do solo e do clima (Tabela 1). As informações e dados para construção do modelo foram coletadas na web, fornecidos por órgãos do governo e agências de pesquisas. Os dados meteorológicos diários foram obtidos do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET, 2019) para os anos de 1988 a 2019; e pelo Centro de Recursos Hídricos e Estudos Ambientais da Universidade de São Paulo (CRHEA, 2020). Os dados históricos mensais relacionados à vazão para o Ribeirão do Feijão foram obtidos da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA, 2012) para os anos de 1977 a 2013.

O Modelo Digital de Elevação (MDE) (Figura 2a) foi obtido a partir do satélite Alos Palsar com pixel de 12,5m x 12,5m (JAXA/METI, 2011). O mapa de tipos de solos utilizado é o da quadrícula de São Carlos do levantamento pedológico do estado de São Paulo (Figura 2b) (PRADO et al., 1981).

O mapa de uso e cobertura do solo utilizado foi referente ao ano de 2020, elaborado a partir da imagem do Satélite Sentinel-2A. O modelo foi rodado no passo de tempo diário, mas as saídas foram extraídas no passo de tempo mensal para o período de 1988 a 2013, com um período inicial de aquecimento do modelo de 3 anos.
O processo de calibração consiste na alteração dos parâmetros de entrada do modelo, considerados mais sensíveis, para que os valores simulados se aproximem ao máximo dos valores observados, dentro de uma faixa significativa para o estudo. O método de calibração escolhido para esse estudo foi o manual, sendo o modelo calibrado para o intervalo de tempo mensal e para a variável vazão. Para avaliar o desempenho do modelo durante a calibração foram utilizadas as seguintes métricas estatísticas: o Nash-Sutcliffe (NSE), o coeficiente de determinação (R²), o percentual de erro/bias (PBIAS), o erro padrão médio normalizado (RSR) e o coeficiente de eficiência de Kling-Gupta (KGE).
A etapa final é a validação do modelo que consiste no processo de verificar o desempenho de um modelo usando os mesmos parâmetros adotados na calibração e realizar uma comparação para um período independente. Os resultados obtidos são importantes para testar se o modelo é eficaz em diferentes condições climáticas (ARNOLD et al., 2012). Os critérios de avaliação de desempenho para a validação foram os mesmos do que os utilizados na calibração. Para os sedimentos não foi realizada calibração por falta de dados monitorados.
A classificação manual do uso do solo gerou dez classes que foram agrupadas levando em consideração os diferentes usos do solo da bacia: Vegetação (mata ciliar e vegetação primária); Pastagem (criação extensiva de gado, lotes sem vegetação ou com vegetação rasteira); Área agrícola diversificada (cana-de-açúcar, citricultura e outras culturas); Área urbana (casas, loteamentos, complexos industriais e comerciais, terminal intermodal); Silvicultura (plantação de eucaliptos e pinus); Solo exposto (solo em preparo para plantio, lixão, solo exposto e solo utilizado para extração de minerais metálicos); Água (lagos, lagoas e piscicultura); Chácara (granjas e chácaras); Rodovia e Ferrovia. O uso do solo em 2011 e 2020 (Figura 3, Tabela 2) mostra uma baixa diferença entre os anos.


A criação do modelo resultou na formação de 31 sub-bacias e 5.898 Unidades de Resposta Hidrológica (HRU’s), como nenhum limite foi definido para a criação dos HRUs, obteve-se um número relativamente grande.
Os parâmetros utilizados para calibração da vazão do modelo (Tabela 3) foram alterados e simulados diversas vezes para tentar atingir resultados métricos satisfatórios.


Com base na classificação de desempenho e estatísticas para o intervalo de tempo mensal (MORIASI et al., 2007), o valor de NSE foi classificado como satisfatório (NSE=0,53), para calibração, o mesmo para a estatística RSR. Para o PBIAS o resultado foi considerado muito bom para a calibração. Além disso, o KGE, que vem sendo amplamente utilizado em modelos hidrológicos (LIU, 2020), apresentou resultado satisfatório com valor acima de 0,5. Alguns trabalhos publicados com o uso do SWAT utilizaram essa métrica estatística para avaliar a eficiência do modelo e apresentaram bons resultados (BRIGHENTI et al., 2017; FRANCO, 2017).
As métricas estatísticas para o período da validação foram consideradas satisfatórias, obtendo para o NSE = 0,54, RSR = 0,68 e KGE = 0,60, indicando a eficiência do modelo para simulação da vazão na bacia. Os resultados continuaram sendo considerados “muito bom” para as demais métricas, em detalhes, o coeficiente de determinação (R²) = 0,79, o coeficiente de Pearson (r) = 0,89 e PBIAS = -3,5%. O valor negativo do PBIAS para a validação indica uma pequena superestimativa da vazão durante os anos de 2002 até 2013.
Para o cenário de uso do solo de 2020, utilizado nesse modelo, os resultados médios de produção de sedimentos para todo o período simulado indicam uma baixa produção de sedimentos na maioria dos canais presentes na bacia do Ribeirão do Feijão (Figura 5).

A média anual de sedimentos que são carreados para os rios da bacia variou em torno de 0,27 toneladas, com mínima de 0,231 toneladas e máxima de 0,313 toneladas por ano, apresentando uma produção de sedimentos aproximada de 0,025 ton/km².
A precipitação também é um fator de influência para o carreamento de sedimentos, sendo observado que a maior quantidade de produção de sedimentos foram nos anos mais chuvosos (Figura 6). O coeficiente de correlação de Pearson obtido para precipitação e produção de sedimentos foi de 0,56.

O modelo foi aplicado em uma área onde não existem dados observados de sedimentos disponíveis, o que impossibilitou a realização da calibração e validação, para a produção de sedimentos. Desta forma os resultados apresentados acima são de simulações não calibradas para a produção de sedimentos.
As diferenças de uso do solo entre os anos 2011 e 2020 (Figura 3) não são drásticas (Tabela 2). Uma das categorias de uso que mais se alterou de 2011 para 2020 foi a área urbana, com um aumento de aproximadamente 50%, e de chácaras com mais de 100%. A ocupação da bacia é caracterizada principalmente por vegetação composta de mata ciliar e vegetação primária (28,9%), área agrícola diversificada (23,3%) e pastagem (21,6%). Apesar do aumento urbano, houve também um aumento das áreas naturais e de florestas artificiais em consequência das atividades de recuperação ambiental que já ocorrem na bacia, com a Silvicultura aumentando 23,70%.
Ao longo da calibração realizada, de forma manual e utilizando as funções objetivo (NSE, KGE e R²) para avaliar a eficiência do modelo, os parâmetros CN2 (Número da Curva SCS), RCHRG_DP (Coeficiente de percolação da água da zona de raízes para o aquífero profundo) e LAT_TTIME (Tempo de deslocamento do fluxo lateral) tiveram grande influência quando alterados na calibração, melhorando significativamente as métricas utilizadas. Para a simulação da vazão, os dados simulados estavam sendo superestimados no período chuvoso e subestimados no período seco.
Durante a calibração foi observado uma diminuição no escoamento superficial e aumento nos índices de infiltração e armazenamento de água nos solos, podendo ser explicado pela presença de Latossolos, os quais são caracterizados por sua profundidade, alta permeabilidade e condutividade hidráulica, além do aumento de área de vegetação na bacia.
Um dos desafios para alcançar resultados satisfatórios na modelagem hidrológica com o SWAT e SWAT+ é a gama de dados e informações necessários para inserir no modelo com o objetivo de melhor representar a realidade, assim como a quantidade de parâmetros que podem ser alterados, além da grande quantidade de interações durante a calibração para os resultados convergirem com os dados observados, demandando um elevado tempo de processamento.
Neste modelo em específico algumas informações importantes impactantes nos processos físicos da bacia hidrográfica não puderam ser incorporadas e consideradas por falta de acesso, tempo necessário para processamento ou a inexistência de dados que demonstrassem melhor a realidade local. Como por exemplo, o manejo das culturas agrícolas, aplicação de agroquímicos e quantidade de água utilizada para irrigação, além dos parâmetros internos para as culturas que não foram alterados. Ainda assim, os resultados foram considerados satisfatórios (Figura 4) e podem ser utilizados e melhorados para futuros trabalhos e simulações de cenários para tomada de decisão.
As sub-bacias 6, 9 e 16 (Figura 5) foram as que apresentaram maior produção de sedimentos carreados para os mananciais. São áreas onde se tem uma maior predominância de pastagem e uso agrícola, presentes em Latossolos que são profundos e bem drenados. No período chuvoso esses solos possuem uma maior susceptibilidade a erosão, além de necessitarem de fertilização corretiva frequente para os usos agrícolas cultivados nessa área. As sub-bacias 6 e 9 também são de cabeceira e possuem maior declividade e portanto maior suscetibilidade à erosão. Em área mais plana encontra-se a sub-bacia 16, recebendo muitos dos sedimentos erodidos.
Nas áreas agrícolas há um maior aporte de nutrientes, como no cultivo da cana-de-açúcar, que são também carreados e podem ocasionar um decréscimo da qualidade da água dos mananciais, representando riscos à saúde pública e ambiental.
Nas áreas de Neossolo Quartzarênico foi observada uma baixa produção de sedimentos, sendo a profundidade e boa capacidade de infiltração características desse tipo de solo, o que contribui em um menor escoamento superficial (FURQUIM, 2002), além de estarem em áreas de relevo com menor declividade. Apesar disso, é também um solo vulnerável à erosão (IAC, 2016), a presença de vegetação primária e floresta artificial nessas áreas são fatores que influenciaram menores perdas de solo.
É importante considerar que o uso e cobertura de solo utilizado na modelagem foi referente ao ano de 2020, o qual apresentou um aumento da área de vegetação e floresta artificial. Isto contribui de forma positiva, pois as condições de cobertura do solo são fatores determinantes para estimar o transporte e desprendimento das partículas do solo que chegam aos canais das bacias.
Na bacia do Ribeirão do Feijão, as áreas de vegetação apresentaram um aumento, comparando os anos de 2011 e 2020, entretanto, o uso pelas atividades de agronegócio continua intenso. Um manejo do solo adequado e usos menos impactantes atenuaria os processos erosivos, diminuindo as perdas do solo e transporte de poluentes que degradam a qualidade das águas dos rios. Além dos usos agrícolas predominantes da bacia necessitarem de uma grande quantidade de água para irrigação, são atividades geradoras de poluentes, afetando a água utilizada para abastecimento público. Em um estudo sobre a expansão da mancha urbana no Ribeirão do Feijão verificou-se que o manancial se encontra localizado entre os vetores de crescimento dessa mancha (COSTA, 2010) alertando-nos da necessidade de estudos como este para melhor planejar o uso e ocupação do solo na região e seus possíveis efeitos.
A produção e fornecimento de água da região de São Carlos (SP) é uma atividade e serviço essencial que precisa ser mantido. É necessário minimizar ao máximo a produção de sedimentos que chega aos canais para não comprometer esse serviço. Para isso é preciso que as áreas de vegetação continuem aumentando e culturas menos “agressivas” ao solo sejam instauradas. A Lei Municipal nº 13.944 de 12/12/2006, a qual dispõe sobre a criação das Áreas de Proteção e Recuperação dos Mananciais do Município de São Carlos (SÃO CARLOS, 2006) foi criada com o intuito de preservar e recuperar as margens dos rios e córregos, mantendo a produção de água da região.
As Áreas de Preservação Permanente (APP) são protegidas por lei, sendo necessária a adoção de boas práticas de conservação do solo e da água. Desse modo, é necessário ter fiscalização e um planejamento adequado para que essas áreas não sejam ocupadas indevidamente a partir de interesses econômicos. A proteção é fundamental para o interesse ecológico da população de São Carlos que depende do manancial para obter água para o seu consumo (COSTA, 2017).
O Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) é uma forma de compensar a renda dos produtores rurais pela substituição das suas atividades agrícolas e pecuárias por um uso e cobertura do solo que represente uma menor degradação e produção de sedimentos. Os recursos financeiros seriam provenientes da cobrança pelo uso da água, outra medida de proteção ao uso adequado dos recursos hídricos. A implantação de programas e políticas públicas de incentivo aos produtores rurais para possíveis mudanças nas atividades e cobertura do solo das suas terras é uma forma de maior aceitação e interesse pela proteção dos mananciais da bacia. Dupas (2001) propôs o PSA para incentivar aos produtores rurais a transformação das suas terras para usos e coberturas menos “agressivas”, podendo tornar as fazendas da região zonas de produção de água.
As áreas prioritárias para a aplicação do PSA seriam as sub-bacias 6 e 9, principalmente nos atuais usos do solo por pastagem, minimizando a quantidade de sedimentos que chegam até os mananciais da bacia. O PSA aliado com a Lei Municipal nº 13.944 de 12/12/2006 seria uma forma de priorizar áreas que estão impactando de forma negativa, prevendo a recuperação e proteção dos mananciais.
A produção de sedimentos na bacia variou em torno de 0,27 toneladas por ano. As áreas com maior produção de sedimentos foram nas sub-bacias 6, 9 e 16 que apresentam usos de pastagem e produção agrícola. Para a implementação do PSA essas áreas seriam prioritárias, visto que minimizaria o carreamento de sedimentos para os rios, protegendo os mananciais.
Em geral, as incertezas do modelo são devido às simplificações, não inclusão de processos que ocorrem na bacia hidrográfica, como: manejo, irrigação e aplicação de agroquímicos. A limitação e falta de dados monitorados também é um problema, a disponibilidade desses dados com alta resolução gratuitamente é essencial para a construção de modelos. No Brasil, uma melhor disponibilidade tornaria as projeções dos modelos mais precisas e minimizaria as incertezas.
O modelo representado para bacia do Ribeirão do Feijão com o SWAT pode ser utilizado como uma ferramenta de gestão de recursos hídricos empregada em outros mananciais e em futuros estudos e planejamentos. A ferramenta permite simular diferentes cenários de uso e ocupação do solo e verificar seus impactos na produção de água e sedimentos.
Estephania Silva Jovino agradece a bolsa de mestrado do CNPq recebida junto ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia Sanitária e Ambiental da UFRN.








