Resumo: O presente artigo procura usar a regressão logística e técnicas de SIG, como forma de compreender a influência da política florestal na dinâmica da cobertura florestal, na área de estudo. Para isso, escolhemos as seguintes variáveis: Dinâmica da cobertura florestal como a variável dependente; a precipitação, a temperatura, licenças simples, concessão florestal, volume de carvão vegetal explorado, áreas agrícolas, povoações e dinâmica da população como variáveis independentes. Da correlação, as variáveis que demonstraram ter significância no modelo são: licença simples, temperatura e volume do carvão vegetal explorado. Mas, o modelo de regressão logística mostrou que as variáveis licença simples e a temperatura são significativamente importantes para o modelo. Mas, isto não descarta a existência de outras variáveis que possam explicar o fenômeno. Deste modo, o modelo de regressão logística construído, aponta que a preditora licença simples é estatisticamente mais significativa para explicar a variação da cobertura florestal, se comparado com a temperatura. Licença simples, é uma das modalidades que a política florestal em Moçambique adotou para licenciamento florestal. E muitos dos operadores preferem este tipo de licença florestal. A temperatura influencia de forma inversa a dinâmica da cobertura florestal, provocando nas plantas o stress hídrico. Enquanto que a variável volume de carvão explorado a sua influência é significativamente menor.
Palavras-chave: Regressão logística, Dinâmica da cobertura florestal, Política florestal.
Abstract: This article seeks to use logistic regression and GIS techniques as a way to understand the influence of forest policy on the dynamics of forest cover in the study area. For this, we chose the following variables: Dynamics of forest cover as the dependent variable; precipitation, temperature, simple license, forest concession, volume of charcoal exploited, agricultural areas, villages, and population dynamics as independent variables. From the correlation, the variables that showed significance in the model are simple license, temperature, and volume of charcoal exploited. But the logistic regression model showed that the simple license and temperature variants are significantly important for the model. This does not rule out the existence of other variables that may explain the phenomenon. Thus, the constructed logistic regression model points out that the simple license predictor is statistically more significant in explaining the variation in forest cover compared with temperature. Simple licensing is one of the modalities that forestry policy in Mozambique has adopted for forest licensing. And many of the operators prefer this type of license. Temperature inversely influences the dynamics of forest cover, causing water stress in plants. While the variable volume of coal explored, its influence is significantly smaller.
Keywords: Logistic regression, Forest cover dynamics, Forest policy.
Artigos
Uso de regressão logística e técnicas de SIG na análise da dinâmica da cobertura florestal, na área de estudo, Inhambane, sul de Moçambique
Use of logistic regression and GIS techniques in the analysis of forest cover dynamics in Mabote and Funhalouro, Inhambane, southern Mozambique
Recepção: 10 Fevereiro 2022
Aprovação: 04 Agosto 2022
Publicado: 07 Outubro 2022
A degradação da cobertura florestal, principalmente na região tropical, preocupa o mundo (CARRERE, 2002; MORAN, 2010; FAO, 2020). A região deveria contribuir para o sequestro do carbono, mitigando os efeitos do aquecimento global, mas este serviço ecossistêmico local está comprometido, devido à atividade de exploração florestal intensiva. Em Moçambique, trabalhos de Macqueen e Falcão (2017), Mackenzie (2009), de Sitoe et al. (2012), de Sheila de Menezes Advogados (2017), Banco Mundial (2018) e de FAO (2020) evidenciam este problema ambiental. No inventário florestal de 2007, o país possuía uma área de floresta nativa que ocupava cerca de 45% do seu território (MARZOLI, 2007), mas esta percentagem diminuiu nos últimos dez anos, dada a perda média anual de 222 mil hectares de floresta (FAO, 2020).
É importante conservar e monitorar os ecossistemas florestais pois estes providenciam bens ecológicos e serviços ecossistêmicos para outras plantas e animais, e para os humanos (MORAN, 2010; SONG et al., 2011).
A utilização de produtos de sensoriamento remoto constitui um meio viável para estudos sobre a dinâmica da cobertura florestal, sobretudo para a análise temporo-espacial em diferentes escalas (INPE, 2002). A deteção de mudanças, tanto no tempo como no espaço, permite analisar o comportamento dos fenómenos na terra (MALDONADO; DOS SANTOS, 2005; LIU et al., 2004).
As imagens de sensores ópticos, principalmente as da série de satélites Landsat, devido à sua resolução temporal, possibilitam captar a dinâmica dos fenómenos (CAPANEMA, 2017; SONG et al., 2011), enquanto os métodos estatísticos ajudam a determinar a importância das variáveis que influenciam a dinâmica da cobertura florestal.
Estudos relacionados com a dinâmica da cobertura florestal, usando as tecnologias de informação espacial e os modelos estatísticos (BAVAGHAR, 2015, CRONEMBER; VICENS, 2015; KUMAR et al., 2014; RODRIGUES, 2005) ganham importância, atualmente.
Kumar et al. (2014) estudaram a situação da conversão da cobertura florestal no distrito de Kanker, em Bhanupratppur, província indiana de Chhattisgarh. Na metodologia, os autores aplicaram as tecnologias de informação espacial e o modelo de regressão logística. Bavaghar (2015), por sua vez, estudou a degradação florestal em Hyrcanian, a oeste de Gilan, no Irã, e usou uma metodologia semelhante. Ambos estudos utilizaram variáveis, de carácter natural e antropogénico.
A adoção da técnica de sensoriamento remoto e de métodos estatísticos ajudam a ampliar o leque de fatores que influenciam a dinâmica da cobertura florestal.
O objetivo principal do presente trabalho é de analisar a associação das variáveis explicativas, de carácter natural e antropogênico, à análise da dinâmica da cobertura florestal, usando o modelo de regressão logística binária.
A área de estudo, constituída pelos distritos de Mabote e de Funhalouro, localiza-se a noroeste da província de Inhambane, na Região Sul de Moçambique, sendo limitada, à Norte, pelo Parque Nacional de Zinave (Figura 1).
A área possui uma superfície de 28.943 km2 (MOÇAMBIQUE, 2005) e se encontra numa grande planície sedimentar, caracterizada por solos de idade recente e com constantes alterações no seu perfil (MUCHANGOS, 1999).

Na Altimetria, tem-se que as altitudes variam de 32 a 270 metros (Figura 2). As classes hipsométricas [90-135] e [135-180] são as que ocupam as maiores áreas, situadas na parte central, sendo relativamente elevadas. Mais elevada é a classe hipsométrica [180-225], predominante em Mabote. A classe hipsométrica [45-90], constituem superfícies de inundação.

A formação vegetal predominante é o miombo (MUCHANGOS, 1999). Moçambique tem estação quente e chuvosa que inicia em outubro e termina em março, a precipitação chega a alcançar, em média, 600 mm por ano, e os meses de dezembro e de janeiro têm as temperaturas mais altas (de 30ºC a 40ºC), e a outra, estação seca e fresca, na qual a precipitação é rara e atinge uma média anual de 430 mm, e os meses de junho e de julho têm as menores temperaturas.
Em Moçambique, as florestas e a terra são propriedades do Estado. Para a exploração das florestas, os operadores requerem licenciamento florestal, que pode ser licença simples ou concessão florestal. Para o uso da terra, os usuários precisam requerer o documento “Direito do Uso e Aproveitamento da Terra” (DUAT), porém existem outras formas de acesso à terra: o direito consuetudinário e a ocupação de boa-fé, em que o acesso à terra é outorgado, quando a pessoa utiliza a terra há dez anos, pelo menos.
Conhecer a informação sobre a cobertura da terra é essencial para a gestão, o planejamento e o monitoramento corretos dos recursos naturais. Imagens de satélites são uma fonte viável de informação sobre a cobertura da terra (YACOUBA et al., 2009). A partir do site do projeto Earth Resources Observation and Science (EROS), da United Stated Geological Survey - USGS (2018), foram baixadas imagens dos satélites Landsat TM 4 e 5, sensor TM C1 nível 1, que correspondem às datas de 10/07/1989, de 03/07/1998 e de 07/09/2008, enquanto do Landsat 8, sensor OLI/TIRS C1 nível 1 são de 28/09/2018. As bandas utilizadas das imagens dos satélites Landsat 4 e 5 foram 5, 4 e 3 e, para a do Landsat 8, foram 6, 5 e 4. As imagens são dos meses de julho e de setembro, pois estes coincidem com o período seco, na área de estudo.
As imagens estavam georreferenciadas na projeção cartográfica Datum WGS 1984, UTM, zone 36S, e possuíam resolução espacial de 30 metros. O shapefile foi obtido na base de dados do Centro Nacional de Teledetecção e Cartografia (CENCARTA), instituição pertencente ao atual Ministério da Terra, Ambiente e Desenvolvimento Rural moçambicano. Com a ajuda das ferramentas dos softwares de SIG (ArcGIS, versão 10, e QGIS, versão 2.6), foi possível processar as imagens. Houve, sucessivamente, a calibração radiométrica das imagens, o empilhamento das bandas e, com o objetivo de realçar o alvo em análise - a floresta -, usamos a técnica do Índice de Vegetação por Diferença Normalizada (NDVI), para depois classificar as imagens, usando duas classes: floresta e não floresta.
A informação espectral nas imagens de satélite Landsat TM e ETM+ é determinada, a partir das bandas espectrais do vermelho (RED) e do infravermelho próximo (NIR), pois é nestas faixas que a vegetação reflete melhor a luz do Sol (SONG et al., 2011).
Na visita de campo, observamos a cobertura florestal e, com a ajuda do GPS, coletamos 100 pontos para validar os mapas, considerando o processo descrito por Maldonado e Dos Santos (2005). Os 100 pontos amostrais, sorteados aleatoriamente sobre os mapas verificamos um a um no campo.
A análise exploratória consistiu na descrição dos padrões ou características dos dados constantes nas imagens (INPE, 2002), a partir dos quais levantamos hipóteses, que para as explicar requereu análises confirmatórias (ROGERSON, 2012), como modelos estatísticos.
Regressão é uma distribuição condicional da variável-resposta. Esta muda, quando uma ou mais variáveis independentes também sofrem alterações (HOSMER et al., 2013; WASSERMAN, 2004). O método é importante em qualquer análise preocupada com a descrição da relação entre a variável-resposta e uma ou mais variáveis explicativas (HOSMER et al., 2013).
Esta preocupação tem fundamento, pois, segundo primeira lei de Tobler, todas as coisas estão relacionadas com todas as outras, mas coisas próximas estão mais relacionadas do que coisas distantes (TOBLER, 1970, p. 234 apud FISCHER; WANG, 2011), e, além disso, Rogerson (2012, p. 2) esclarece que “[...] o estudo de fenômenos geográficos requer a aplicação de métodos estatísticos para produzir uma nova compreensão”.
Destes fundamentos, deduzimos a hipótese de que a dinâmica da cobertura florestal, na área de estudo, é uma resposta à nova política florestal, o aumento de áreas agrícolas do setor familiar, a produção de carvão vegetal, as dinâmicas da população, de povoações em áreas de florestas e do clima (precipitação e temperatura).
O processo da explicitação dos relacionamentos entre as variáveis se baseia em modelos. Estes proporcionam uma visão simplificada das relações entre as variáveis (ROGERSON, 2012). Nesse sentido, podemos destacar: regressão simples, regressão múltipla e regressão logística.
Quando há apenas uma variável-resposta e uma variável explicativa, a relação é linear e conhecida como modelo de regressão simples (CRONEMBER; VICENS, 2015; HOSMER et al., 2013). A equação que descreve esta linearidade é:
Nesta equação, Y é o valor predito da variável dependente, x é o valor observado da variável independente, a é o intercepto e β é a inclinação da reta. As quantidades a e β representam os parâmetros que descrevem a reta.
Na regressão linear múltipla, mais de uma variável independente afeta a variável dependente. A equação que traduz esta preposição é (ROGERSON, 2012):
No modelo de regressão logística, a variável-resposta é categórica e pode ser explicada por mais de uma variável independente, algumas das quais, em escalas diferentes, por exemplo, variável discreta e variável nominal. O relacionamento é representado pela Equação 3 (ROGERSON, 2012):
Aqui, Y é o valor predito da variável dependente. O problema e a solução são idênticos aos da regressão bivariada, em termos de conceito, exceto por existirem mais parâmetros a estimar e pela interpretação geométrica, ser realizada em um espaço dimensional maior.
O valor de β 1 descreve o quanto o valor de y muda no plano, quando x1 é aumentado em uma unidade, ao longo de qualquer linha, em que x2 é constante. De forma semelhante, o valor de β 2 descreve a mudança em y, quando x2 varia uma unidade, enquanto x1 se mantém constante (ROGERSON, 2012; WASSERMAN, 2004).
Para o presente trabalho, vamos usar o modelo de regressão logística binária ou dicotómica. A variável dependente toma dois valores (0 e 1), em que “0” representa a ausência do fenômeno e “1”, a presença. No presente trabalho, a variável dependente assume que “0” é não floresta e que “1” é existência da floresta (BAVAGHAR, 2015; KUMAR et al., 2014).
Para que a variável dependente e as várias independentes se relacionem de forma linear, é preciso que haja transformação logística (HOSMER et al., 2013; ROGERSON, 2012). Esta consiste em transformar a variável resposta em linear, seguindo a expressão ȳ/(1-ȳ). Essa expressão é conhecida como chances (a favor do evento), segundo Rogerson (2012), assim a nova variável é conhecida como “logaritmo das chances”. Usando Z para definir a nova variável, temos a Equação 4:
Nesse caso, a interpretação do coeficiente de inclinação ocorre a cada mudança da função logit (Z=ln ȳ/(1- ȳ), que corresponde a cada unidade de mudança da variável independente (HOSMER et al., 2013).
A regressão logística binária avalia a probabilidade de ocorrência de determinado evento, assim como a influência de cada variável independente no evento.
Os dados das variáveis foram processados no software estatístico SPSS versão 21.
Analisamos as variáveis explicativas dentro da matriz da correlação, para vermos se existe multicolinearidade ou não (ROGERSON, 2012) entre elas. Para Salvian (2016) e para Rogerson (2012), multicolinearidade é definida como a presença de um alto grau de correlação entre as variáveis independentes. A inexistência de multicolinearidade significa que se avança com o modelo, mas, no caso de duas variáveis explicativas estarem altamente correlacionadas, não é possível estimar os coeficientes (ROGERSON, 2012). Este autor acrescenta que uma tolerância baixa e um fator de inflação da variância (VIF) alto, próximo de cinco, indicam a existência de multicolinearidade.
Para levantar a multicolinearidade, deve-se excluir uma ou mais variáveis altamente correlacionadas (HOSMER et al., 2013; ROGERSON, 2012).
Os modelos permitem construir uma visão simplificada da realidade, mas é necessário observar sua qualidade (HOSMER et al., 2013, ROGERSON, 2012). O levantamento da multicolinearidade constituiu uma das etapas para observar a qualidade do modelo.
O ρ-value permite avaliar a importância e o ajuste da variável ao modelo. Hosmer et al. (2013) recomenda que se use um nível de significância entre 0,2 ou 0,25, pois este permite que as variáveis sejam adequadas ao modelo. Porém, para o presente trabalho, adotamos o nível de significância de 0,05, que é usualmente utilizado. A variável independente mais importante é aquela que apresenta o menor valor de ρ-value (HOSMER et al., 2013).
Os testes são igualmente importantes para aferir a adequação do modelo. O teste Wald é para aferir o grau de significância de cada coeficiente da equação de regressão logística, incluindo a constante (HOSMER et al., 2013).
O teste da razão da máxima verossimilhança auxilia na análise da significância geral dos coeficientes independentes (WASSWERMAN, 2004).
O coeficiente de determinação R2 permite interpretar, de forma percentual, a relação entre a variável dependente e as variáveis independentes (WASSWERMAN, 2004).
A curva Receiver Operator Characteristic (ROC) é um teste que consiste em, de forma mais completa, classificar a acurácia do modelo (HOSMER et al., 2013). A curva ROC se tornou o padrão para avaliar a qualidade de ajuste do modelo. A área da curva é composta por duas linhas perpendiculares: sensibilidade e especificidade (HOSMER et al., 2013).
As variáveis que utilizamos são: dinâmica da cobertura florestal; precipitação; temperatura; licença simples; concessão florestal; volume de carvão vegetal explorado; áreas agrícolas; povoações nas florestas; e dinâmica da população (Tabela 1).

A dinâmica da cobertura florestal, constitui um indicador, quantifica as mudanças na cobertura florestal, ocasionadas por fatores naturais ou antropológicos.
A precipitação (mm) e a temperatura (°C) afetam a vegetação pois, a forte insolação na região tropical, principalmente no clima tropical seco, leva as plantas a experimentar o fenômeno de stress hídrico (CHAZDON, 2016).
A dinâmica populacional e das povoações dentro das florestas, com tendência de crescimento, contribui para aumentar a pressão sobre os recursos naturais (CRONEMBERGER; VICENS, 2005).
Quanto às áreas agrícolas, Cronember e Vicens (2005) reconhecem que as variações florestais têm alguma correlação com a dinâmica das áreas agrícolas.
O volume de carvão vegetal explorado induz a distúrbios, que, gradualmente, vão degradando a cobertura florestal.
Os regimes de exploração de licença simples e de concessão florestal constituem modalidades de licenciamento florestal inseridas na política florestal em Moçambique.
Da matriz da correlação de Pearson se obtiveram os seguintes coeficientes: a variável licença simples (LS) possui r = 0,898, r = 0,919 e r = 0,890, com relação as variáveis áreas agrícolas, dinâmica da população e povoações dentro de áreas de florestas, respectivamente.
A variável dinâmica da população possui r = 0,901 e r = 0,949, com relação às variáveis volume de carvão vegetal explorado e povoações dentro de áreas das florestas, respectivamente, e a variável áreas agrícolas é altamente correlacionada com as variáveis volume de carvão vegetal explorado e povoações dentro de áreas das florestas (r = 0,806 e r = 0,885, respectivamente).
Verificando-se a existência da multicolinearidade, removemos as variáveis altamente correlacionadas, que são dinâmica da população, áreas agrícolas, concessão florestal e povoações dentro de áreas das florestas, usando o método stepwise do software estatístico SPSS. As variáveis (Tabela 2) são potenciais para a qualidade do modelo.

Para a exclusão de variáveis, observamos a tolerância e o índice da inflação da variância. Uma tolerância inferior a 0,1, e valores próximo a 5 no fator da inflação da variância (VIF), indicam problemas com multicolinearidade (ROGERSON, 2012).
Em seguida, rodamos o modelo de regressão logística binária, com as variáveis da Tabela 2 para verificar se têm poder de explicação do fenômeno em análise.
Para analisar a qualidade do modelo, partimos do pressuposto de que o nível de significância é de 0,05. Os coeficientes que tiverem ρ-value menor do que aquele têm maior importância estatística para o modelo enquanto que os coeficientes com ρ-value maior têm menor importância para o modelo (HOSMER et al., 2013).
Os coeficientes dos modelos LS e temperatura possuem ρ-values menores do que 0,05 (0,021 e 0,013, respectivamente), o que revela a associação estatisticamente significativa entre estas duas variáveis e a variável-resposta - a dinâmica da cobertura florestal. Destes valores de coeficientes, rejeita-se a hipótese nula (H0).

Os valores do teste Wald são: Wald = 5,368 e grau de liberdade (gl) = 1 para LS; Wald = 6,136 e gl = 1 para temperatura; e Wald = 2,515 e gl = 1 para volume de carvão vegetal explorado (Tabela 3). Estes valores revelam o nível de significância individual dos coeficientes e, também, para o modelo em geral (HOSMER et al., 2013).
Para ver a adequação do modelo, usou-se ainda o teste Hosmer-Lemeshow, por meio do qui-quadrado (χ2) (BAVAGHAR, 2015). A classificação correta dos coeficientes é alta (63,3%) e indica que o modelo é perfeito para explicar a relação entre a variável dependente e as variáveis independentes (Tabela 3).
Outra avaliação do modelo passou pela utilização do coeficiente de determinação Nagelkerke (R2). Segundo Bavaghar (2015), seu valor é menor no modelo de regressão logística, por causa da variável resposta binária. Segundo Kumar et al. (2014), um valor de R2 maior do que 0,2 indica que o modelo é relativamente bom. A variável Licença Simples tem R2 = 0,229, a variável volume de carvão vegetal explorado, R2 = 0,240 e a variável temperatura, R2 = 0,385.
Já a área da curva ROC delineia a descriminação do modelo. Para ROC = 0,5, a discriminação é pobre; entre 0,5 e 0,7, melhor; entre 0,7 e 0,8, aceitável; entre 0,8 e 0,9, excelente; e uma ROC ≥ 0,9 representa uma discriminação excepcional (HOSMER et al., 2013). A área da curva ROC para o presente modelo é de 0,72, que significa uma acurácia de 72% dos preditores, sendo uma discriminação aceitável.
Kumar et al. (2014), citando Loza (2006), afirmam que um modelo com uma curva ROC de 71.5% é de boa capacidade de discriminação. Já no estudo de Bavaghar (2015), sobre a degradação florestal em Hyrcanian, a curva de ROC do modelo foi de 0,807, o que significa uma acurácia de 80,7%.
O coeficiente da variável temperatura indica uma probabilidade significativamente negativa de influência na dinâmica da cobertura florestal. Os coeficientes de variáveis LS e volume de carvão vegetal explorado indicam uma probabilidade significativamente positiva (Tabela 3).
O coeficiente de LS (β = 1,307) mostra ser um preditor com importância significativa na variação da cobertura florestal, enquanto que o coeficiente da variável do volume de carvão vegetal explorado (β = 0,12) indica uma importância menor. A interpretação é de que, a cada aumento de uma unidade da variável Licença Simples ou da variável volume de carvão vegetal explorado, também aumenta a mudança da cobertura florestal. Enquanto que o coeficiente da variável temperatura (β = -0,001) significa que, a cada aumento de uma unidade de temperatura, há probabilidade de diminuição da variação da cobertura florestal. A partir da coluna Exp (β) (Tabela 3) temos a probabilidade das chances acontecerem.
A variação da cobertura florestal se caracterizou ora pela redução, ora pelo aumento de áreas de florestas, ao longo dos 30 anos de observação (1989 a 2018) (Tabela 4). A classe de floresta perdeu uma área de 1.645 km2, porém, de 1998 a 2018, tem se observado uma recuperação da área coberta pela classe. Nesse período, são cerca de 1.137 km2 de superfície ganha.

Essa variação da cobertura florestal acompanha o comportamento da temperatura, da precipitação e da dinâmica da política nacional de floresta.
Inhambane possui o maior número de árvores por hectare (856/ha) (MAGALHÃES, 2018). A existência de uma floresta traz muitos benefícios, como captura do carbono, melhora do clima, reciclagem da água, proteção das bacias hidrográficas e dos solos e a diversidade de recursos econômicos (…) (MORAN, 2010; PORTO-GONÇALVES, 2017).

O fenômeno descrito na Figura 3 e na Tabela 4 se reflete, também, nos mapas da variação da cobertura florestal. As informações sobre a dinâmica da cobertura florestal validam a acurácia dos mapas, que é demostrada, a partir dos pontos sobrepostos à área de cobertura florestal.
Na figura 4D, observa-se a distribuição espacial dos licenciamentos florestais, tanto por licença simples como por regime de concessão florestal, em 2018. A Norte da área de estudo possui mais operadores florestais do que a Sul. Até 1999, uma empresa explorava as florestas, através da licença simples: a Madeira de Moçambique.


O modelo de regressão logística destaca as variáveis LS e temperatura como sendo importantes para explicar a situação da variação da cobertura florestal. Porém, há outras variáveis que possam explicar o fenômeno. Inclusive, na análise da cobertura florestal no país, as literaturas nacional (MACQUEEN; FALCÃO, 2017, MACKENZIE, 2006, MAGALHÃES, 2018; SITOE ET AL., 2012; BANCO MUNDIAL, 2018) dão relevância a outros fatores, como agricultura itinerária, queimadas descontroladas, caça e pobreza.
A preditora LS é estatisticamente significativa para explicar a variação da cobertura florestal na área de estudo e, mesmo, no país inteiro. A Licença Simples é uma das modalidades da exploração florestal, juntamente com a Concessão Florestal (CF) adotadas pela Política de Floresta e Fauna Bravia de 1999, para licenciamento florestal. Em 2012, a modalidade sofreu alterações: o período da exploração florestal passou de um ano para cinco e a extensão, de 500 m3 para 10.000 hectares (MOÇAMBIQUE, 2012).
Os operadores florestais, estimulados pela política, preferem a LS. A lei de florestas exige que os eperadores tenham responsabilidade ambiental, implementando o plano de manejo, mas a fiscalização deficiente da atividade florestal não assegura o cumprimento das exigências legais.
A LS é passada para os nacionais, para explorarem três produtos florestais: madeira, estacas e produção de carvão vegetal, mas existem casos em que os nacionais usam esta licença para atuarem em parceria com estrangeiros.
De 2013 a 2018, a direção dos Serviços Provinciais de Florestas e Fauna Bravia (SPFFB) de Inhambane recebeu 134 pedidos para licenciamento florestal por LS, contra seis por regime de CF. De 2017 a 2020 os SPFFB registraram de 16 à 18, operadores por LS, apenas na área de estudo (Figura 6). A modalidade é responsável por 80% da exploração florestal na área de estudo.

De acordo com Chazdon (2016), distúrbios antrópicos variam muito em extensão, em frequência e em intensidade. Os operadores se aproveitam do fato de a terra e as fllorestas serem propriedade do Estado e da ineficácia da fiscalização da atividade florestal para se eximir das suas responsabilidades ambientais.
A ação extrativista descontrolada de espécies florestais, tanto por nacionais quanto por estrangeiros, levou o Estado a realizar a reforma da política florestal (MOÇAMBIQUE, 2012).
A variabilidade climática nas regiões tropicais, durante o Holoceno Inicial e Médio, relaciona-se fortemente às alterações na distribuição das florestas e das savanas (CHAZDON, 2016, p. 44). Na África, desde Madagascar até a África Ocidental, onde Moçambique se enquadra, as secas do período encolheram as florestas pluviais e expandiram as savanas.
O comportamento da temperatura influencia na variação da cobertura florestal de forma inversa, quando a temperatura média passa dos 25,4°C, a taxa de crescimento das plantas está em patamar alto, e a longevidade diminui (LOCOSSELLI et al., 2020). A disponibilidade hídrica influencia, pois, quando o local seca, cria um estresse na planta, então ela atinge tamanhos menores e morre mais jovem. As taxas de crescimento das árvores em florestas tropicais podem estar diminuindo, por causa do estresse fisiológico causado pelas altas temperaturas e pelas secas severas em determinados anos (CHAZDON, 2012).
No mapa de 1998, observamos que a cobertura florestal regrediu substancialmente, e, por associação com a Figura 7, notamos que a área de estudo registrou precipitação abaixo de 400 mm anual e temperatura média anual de quase 25°C, durante 1992 e 1996, o que pode ter levado as plantas à situação de estresse hídrico (LOCOSSELLI et al., 2020). Porém, nos anos seguintes (de 1997 a 2001), registrou-se períodos de precipitação média anual acima de 700 mm, o que explica o aumento da cobertura florestal (ver figuras 4A-4D).

Considerar a possibilidade de a dinâmica da cobertura florestal estar relacionada com o comportamento da temperatura é importante, porque a vegetação, principal fator de influência nos processos atmosféricos, na área de estudo, é cada vez menos presente. Nos trópicos, a floresta funciona como um duto para o movimento da água dos solos para a atmosfera, e a ciclagem de água dos solos florestais de volta para a atmosfera é interrompida, após desmatamentos ou distúrbio da vegetação (CHAZDON, 2016). A LS explica a intensidade dos desmatamentos. A extração de árvores, cria condições para que a temperatura tenha variações positivas, isto é, de aumento.
Esta variável tem influência estatisticamente não significativa, para o nosso nível de significância, mas observamos que, à medida que há aumento no volume de carvão vegetal explorado, verifica-se o aumento na variação da cobertura florestal. Estudos comprovam que, quanto mais distante dos principais centros urbanos consumidores do carvão vegetal e das principais vias, menor é a exploração deste combustível (BANCO MUNDIAL, 2018). A distância da área de estudo, em relação a um dos principais centros urbanos de Inhambane, a cidade de Maxixe, é de cerca de 400 km, dos quais perto de 150 km são percorridos em estrada de chão. Isto faz com que a comercialização do carvão vegetal seja onerosa. Porém, o carvão é vendido ao longo das vias secundárias e terciárias da área de estudo.
Não é objetivo do presente trabalho apontar conclusões definitivas acerca das variáveis explicativas que têm influência na dinâmica da cobertura florestal, mas, sim, buscar outras variáveis que ajudem a trazer informações úteis para a gestão e o monitoramento das paisagens florestais.
As variáveis do presente modelo não são as únicas; pode-se aperfeiçoar o modelo, introduzindo novas, que possam melhorá-lo.
A análise da dinâmica da cobertura florestal, usando as tecnologias de informação espacial e o modelo de regressão logística, foi útil, porque permitiu trazer novas dimensões para interpretar a dinâmica da cobertura florestal. O modelo mostrou que as variáveis LS e temperatura possuem um peso estatisticamente significativo para a explicação do modelo, mas a variável LS foi a que melhor se ajustou ao modelo, pois seu valor-p e seu teste Wald indicaram um desempenho melhor da variável no modelo. A capacidade de discriminação do fenômeno em estudo, observada a partir da curva ROC, foi de 72%, que revela uma acurácia boa.
Assim, os resultados do presente trabalho podem servir de base para a elaboração de políticas florestais. Também, trazem a necessidade de apontar outras causas para a dinâmica florestal e, não nos prendermos aos fatores frequentemente apontados como causadores da degradação florestal como agricultura itinerária, as queimadas descontroladas, a caça e a pobreza. Não invalidamos estes fatores, mas cremos na necessidade de buscar outros fatores, para ampliarmos a compreensão do problema da variação da cobertura florestal em Moçambique.
Agradecemos ao CNPq, pela concessão da bolsa de estudo, que permitir desenvolver a presente pesquisa.
Manuel Madeira Macandza concebeu o estudo, analisou os dados e redigiu o texto. Ulisses Bremer teceu comentários sobre os dados.










