Articles of Research

Percepções de gestantes acerca da atuação dos parceiros nas consultas de pré-natal*

Iarlla Silva Ferreira
Universidade Federal do Ceará, Brasil
Ana Fátima Carvalho Fernandes
Universidade Federal do Ceará, Brasil
Karísia Karen Ricarte
Universidade Federal do Ceará, Brasil
Thaissa Pinto de Melo
Universidade Federal do Ceará, Brasil
Altamira Mendonça Félix Gomes
Universidade Federal do Ceará, Brasil
Ivna Silva Andrade
Universidade Federal do Ceará, Brasil

Percepções de gestantes acerca da atuação dos parceiros nas consultas de pré-natal*

Revista da Rede de Enfermagem do Nordeste, vol. 17, núm. 3, pp. 318-323, 2016

Universidade Federal do Ceará

Recepção: 11 Novembro 2015

Aprovação: 25 Abril 2016

Resumo

Objetivo: compreender as percepções de gestantes acerca da atuação de parceiros nas consultas de pré-natal.

Métodos: estudo qualitativo com 15 gestantes coletados por observação não participante e entrevista semiestruturada, sendo organizados e analisados com base na Análise de Conteúdo.

Resultados: os discursos foram agrupados em três categorias: presença do pai durante as consultas como um fator de adesão ao pré-natal, participação do homem nos cuidados da gestante e da criança, e parceiro como agente promotor de segurança.

Conclusão: as mulheres relataram sentimentos de segurança e confiança aumentados, quando acompanhadas pelos parceiros nas consultas.

Palavras chave: Cuidado Pré-Natal+ Paternidade+ Gravidez.

Introdução

A atenção materno-infantil é considerada uma área prioritária para o Ministério da Saúde, de modo que, estabeleceu como principal prioridade para o pré-natal o acolhimento desde o início da gestação, para garantir o nascimento de uma criança saudável e o bem-estar materno e neonatal(1).

Nesse período, a mulher apresenta maior sensibilidade aos acontecimentos intrínsecos e extrínsecos à gravidez. As modificações físicas e emocionais inerentes ao seu estado lhe causam necessidades que, para serem atendidas, requerem a participação e compreensão de pessoas de seu convívio, principalmente a do companheiro(2).

Como a gestante costuma frequentar as consultas de pré-natal desacompanhada, consequentemente ela torna-se a única responsável por aderir ao serviço, às orientações e aos exames. Uma das causas para este aspecto é as instituições de saúde ainda manterem rotinas e estruturas físicas concebidas para atender às necessidades dos funcionários e da política interna, objetivando apenas quem recebe o atendimento(3).

A experiência do homem no processo de gestação de sua mulher perpassa pela interação estabelecida com ele mesmo, com a gravidez, com a companheira e com a família. E, para falar sobre o papel do homem no contexto da contemporaneidade têm que ser considerados aspectos que compõem sua concepção e vivência sobre a paternidade, entre eles está a questão de gênero, os modelos transgeracionais e a coexistência de novas demandas sociais(4).

A participação nas consultas de pré-natal constitui uma oportunidade para os pais se sentirem mais próximos, acompanhando a gestação do bebê, de forma que possa acontecer a materialização da criança, pois sem essa vivência apresentam apenas uma percepção subjetiva por meio das informações obtidas pela mãe(3).

De maneira geral, as circunstâncias que envolvem o mundo masculino, nas quais ele se apresenta como provedor, cuidador e chefe da família, podem representar um risco à harmonia do convívio conjugal(4).

A inserção do homem em espaços destinados à compreensão de si e dos outros, de novos papéis sociais, como aqueles que dizem respeito ao ser mãe e ao ser pai, apresenta influência positiva nas suas experiências, principalmente no que diz respeito a uma vivência mais consciente e plena de seus papéis. Por isso, justifica-se a necessidade de proposição de políticas públicas e ações permanentes nesta conjuntura nas instituições de saúde(5).

No contexto da gestação, ter atenção ao outro, tendo como foco a análise de suas respostas bem como a problemática emocional e social do homem, necessita de uma técnica avaliativa que considere os significados e as simbologias construídos, perpassando pela experiência de vida do casal que está sob seus cuidados(2).

O Ministério da Saúde traz como um dos dez passos para um pré-natal de qualidade o direito do parceiro de ser cuidado, que inclui ter acesso a informações, antes, durante e depois da gestação(6). No entanto, há lacuna na literatura no que se refere à opinião das gestantes sobre o assunto, se as mulheres consideram importante a presença do pai no momento da consulta e, caso considerem, como elas gostariam que eles participassem.

Do exposto, o presente estudo objetivou compreender as percepçõesde gestantes acerca da atuação dos parceiros nas consultas de pré-natal.

Métodos

Estudo qualitativo, desenvolvido no período de janeiro a abril de 2015. Caracterizando-se como cenário o Centro de Desenvolvimento da Família da Universidade Federal do Ceará, localizado no município de Fortaleza, Brasil.

Os sujeitos da pesquisa foram 15 mulheres, escolhidas de acordo com o seguinte critério de inclusão: gestantes em acompanhamento pré-natal na referida instituição. As mulheres menores de idade participaram apenas com autorização de um responsável.

As gestantes foram identificadas pela letra G, seguida do número sequencial correspondente à ordem das entrevistas – 1 a 15.

A coleta de dados ocorreu em duas etapas: observação não participativa na consulta de pré-natal realizada por enfermeiros; e entrevista semiestruturada gravada, realizada após a consulta, composta por aspectos sociodemográficos e econômicos (idade, estado civil, ocupação e renda, dentre outros), além das questões específicas do objeto de estudo.

As entrevistas foram transcritas na íntegra para a confiabilidade e fidedignidade dos relatos.

Os depoimentos foram organizados e analisados com base nas etapas da Análise de Conteúdo: pré-análise e a organização do material; exploração desse material mediante a classificação e codificação ou categorização; e interpretação dos resultados(7).

O estudo respeitou as exigências formais contidas nas normas nacionais e internacionais regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos.

Resultados

A partir da análise dos dados foram identificadas três categorias: presença do pai durante as consultas como um fator de adesão ao pré-natal; participação do homem nos cuidados da gestante e da criança; e parceiro como agente promotor de segurança.

Presença do pai durante as consultas como um fator de adesão ao pré-natal

As mulheres relataram se sentirem sobrecarregadas de responsabilidades e informações durante o atendimento.

Quando questionadas sobre qual seria a atuação dos companheiros durante as consultas de pré-natal, a maioria das gestantes afirmou que o homem poderia participar de forma ativa naquele momento, para o esclarecimento de dúvidas e da agregação de novas informações, já que durante uma consulta de pré-natal, o profissional de saúde realiza inúmeras orientações e esclarecimentos sobre a saúde do bebê e da mulher.

Dessa forma, é evidente que as gestantes sentem a necessidade de distribuir as responsabilidades do pré-natal. Então, a presença do marido representa também um incentivo para as gestantes comparecem as consultas recomendadas.

Apesar de as mulheres terem o conhecimento que a assistência pré-natal é um modo de prevenir ou evitar complicações durante a gravidez, elas se mostram receosas e esperam um apoio, que venha principalmente por parte do companheiro. Perguntando às coisas que eu esqueço. Eu sou envergonhada, então, às vezes, na consulta ele fazia a pergunta por mim. Já é uma ajuda a mais, um incentivo para a gestante querer vir nas próximas consultas (G7). Quando a gente vem para as consultas a doutora fala muita coisa, passa muita informação sobre a gente e sobre o bebê. E o pai da criança vindo é um estímulo pra gente vir (G13). Muito importante, por que tem muita coisa que a gente não sabe e vindo para o pré-natal a gente se informa. Às vezes não tenho vontade de vim, então se ele viesse comigo já seria outra coisa (G3 e G14).

Participação do homem nos cuidados da gestante e da criança

As gestantes percebem que, se os companheiros frequentassem as consultas de pré-natal, compreenderiam os processos fisiológicos e patológicos que perpassam pela gravidez, então saberiam como agir e teriam mais atitude em situações de emergência, por exemplo.

E, principalmente que, quando a criança nascesse, o homem estaria mais presente no sentido de cuidar e dar assistência ao recém-nascido. Visto que os pais normalmente não têm experiência e conhecimento sobre como cuidar de um bebê e, participando do pré-natal, isso poderia melhorar.

Então, as mulheres acreditam que à medida que o parceiro participasse das consultas, o processo da gestação e cuidados com o bebê iriam se esclarecer e a atenção e o desvelo do homem seriam maiores. Por que ele saberia mais coisas e me ajudaria também. Então, é uma forma dele participar e ficar atento (G4 e G1). Eu gosto que ele fique sabendo das coisas. Fique informado! Ele compreenderia mais as coisas que fosse acontecendo comigo, entenderia mais. Ele já dá atenção, então se ele me acompanhasse, o cuidado e a atenção seriam maiores (G6). É importante porque ele também aprende e tira as dúvidas dele (G11). Porque ele vai aprender e se acontecer alguma coisa ele já vai saber mais ou menos (G14).

Parceiro como agente promotor de segurança

A maioria das mulheres relatou que a presença do companheiro durante as consultas de pré-natal proporcionaria sentimentos de segurança e confiança.

Gestantes, primíparas ou não, expressaram comumente medo e insegurança em relação ao período gestacional e aos cuidados com o recém-nascido. Logo, concordaram que a presença do pai durante esse processo é de fundamental importância, de forma que proporciona credibilidade para as gestantes. Só de você saber que a pessoa quer participar, quer estar presente já te dá uma segurança (G1). Acho importante, para acompanhar a mãe e o bebê, a gente fica mais segura (G2). É bom porque passa confiança. E é importante para a mulher se sentir mais segura (G3 e G8).

Discussão

Embora exista uma tendência atual para que os pais se identifiquem como um casal grávido desde o início da gravidez, procurando ter um papel ativo na participação das consultas de vigilância de gravidez ou nas aulas de preparação para o parto(8); ainda não é uma realidade na maioria dos casais, principalmente os que apresentam nível socioeconômico e escolaridade baixos.

Corroborando com os resultados, mulheres grávidas e puérperas revelaram que a ausência do homem dos processos de gestação e de parto gerava sentimentos de solidão e vazio(3). Por isso, o envolvimento do homem com a gravidez deve ser incentivado desde o início do período gestacional para que este incorpore atitudes participativas diante das particularidades que envolvem a gestação(4).

Os homens são capazes de cuidar e isso é significativo para eles, porque apresentam como concepção para o cuidado: estar perto, acompanhar, preocupar-se, zelar, ser recíproco, gozar o lazer, dialogar, conviver com a família e ter atitudes de fé e religiosidade(9).

Além disso, pode-se perceber que o envolvimento paterno tem uma influência positiva no pré-natal em alguns aspectos, como, quanto à abstinência de álcool e tabaco, e redução no baixo peso ao nascimento e crianças pequenas para a idade gestacional(10).

O pai também pode contribuir com a prática do aleitamento materno através da sua atitude em relação ao filho, à esposa e aos trabalhos domésticos. Mas, para isso, há a necessidade de alguns assuntos serem aprofundados para haver maior compreensão por parte dos pais sobre o processo de aleitamento materno(11). Questões como esta que devem ser abordadas e discutidas com o casal durante as consultas de pré-natal.

Há a necessidade da inserção do pai nesse contexto, pois a falta de compreensão acerca de alguns fenômenos característicos da gravidez, sobretudo sobre os fundamentos fisiológicos do surgimento de diferentes sinais e sintomas orgânicos, contribui para não haver manutenção da tranquilidade em relação aos pais e trazendo, assim, uma das justificativas para eles não se envolverem profundamente com esse processo(6).

Por isso, o conhecimento dos homens sobre os cuidados relacionados à gravidez e uma atitude positiva de gênero melhora a tomada de decisão das mulheres sobre seus cuidados de saúde e da criança(12).

No entanto, o pai deve ser acessível e engajado durante a gravidez e começar a demonstrar responsabilidade para com a vinda da criança, ajudando a mãe. Pois, como todo o envolvimento é através da mãe, que carrega a criança, então a relação entre os dois é relevante e determinante no nível de envolvimento paterno(13).

Além da ausência do parceiro nos atendimentos pré-natal causar insegurança e medo, como aponta este estudo; pode-se concluir que a falta do companheiro nos atendimentos de pré-natal, de acordo com a realidade que cerca o casal no contexto da reprodução, predispõe também às grávidas ao fortalecimento dos desconfortos advindo da gravidez, e consequentemente, vai de encontro ao bem-estar das gestantes, além de guardar a possibilidade de desajuste no relacionamento do casal(4).

Percebe-se que a questão de gênero ainda é um fator preponderante, o que remete à paternidade tradicional, uma vez que está arraigada à cultura masculina. Observa-se que a maioria ainda está vinculada à concepção do homem como provedor(14).

Mas, em experiências nas quais os pais participaram ativamente de trabalhos grupais desenvolvidos durante o pré-natal, compartilharam experiências e puderam perceber que os outros homens também viveram situações semelhantes, houve promoção da qualidade do relacionamento entre o casal e o envolvimento com a gravidez e o papel de pai(6). Intensifica-se, assim, a percepção das gestantes de que a participação dos homens durante esse período contribui para o bem-estar da família como um todo. Tal compreensão remete à necessidade dos profissionais da saúde, que prestam cuidados às mulheres durante a gravidez, valorizarem e estimularem a inclusão dos homens no pré-natal, como preconiza o Ministério da Saúde(4).

Logo, é primordial que os homens tenham facilidade de acesso a esses serviços, sintam-se acolhidos e motivados a participar das consultas e de grupos educativos, e apresentem justificativas concretas para incentivar que outros pais também participem(6). Então, deve-se considerar a importância dos profissionais de saúde como facilitadores dessa participação, enfatizando a necessidade do homem/pai na gravidez, afastando a ideia do homem exclusivamente provedor das necessidades materiais, além de fazer com que este se sinta parte do integrante do processo gravídico(5).

Como o Brasil tem investido em uma política de atenção pré-natal qualificada e humanizada, o reconhecimento acerca da importância do homem no acompanhamento do pré-natal deve ser reconhecido e amplamente divulgado e estimulado(15).

Considerando que o acompanhamento do período gestacional demanda cuidados com a mulher, cônjuge e família, a abordagem do comportamento do companheiro, no que diz respeito à gravidez, deve ser valorizada enquanto fator de contribuição direta no bem estar da gestante(3), concordando, assim, com a compreensão das mulheres acerca da participação dos homens durante a gestação.

Conclusão

Para as gestantes, a importância do pré-natal firma-se no preceito de que a consulta é o momento de avaliar a saúde da criança, da mulher e de obter informações sobre alimentação, cuidados com o recém-nascido, dentre outros assuntos.

No que se refere à presença do parceiro durante o atendimento, a maioria das gestantes prefere ter a presença dos parceiros durante os atendimentos de pré-natal.

Referências

1. Shimizu HE, Lima MG. As dimensões do cuidado pré-natal na consulta de enfermagem. Rev Bras Enferm. 2009; 62(3):387-92.

2. Silva FCB, Brito RS. Percepção de gestantes acerca das atitudes do companheiro diante da ausência no pré-natal. Rev Rene. 2010; 11(3):95-102.

3. Pesamosca LG, Fonseca AD, Gomes VLO. Percepção de gestantes acerca da importância do envolvimento paterno nas consultas pré-natal: um olhar de gênero. Rev Min Enferm. 2008; 12(1):182-8.

4. Oliveira SC, Ferreira JG, Silva PMP, Ferreira JM, Seabra RA, Fernando VCN. A participação do homem/pai no acompanhamento da assistência pré-natal. Cogitare Enferm. 2009; 14(1):73-8.

5. Reberte LM, Hoga LAK. A experiência de pais participantes de um grupo de educação para saúde no pré-natal. Cienc Enferm. 2010; 16(1):105-14.

6. Ministério da Saúde (BR). Atenção ao pré-natal de baixo risco. Brasília: Ministério da Saúde; 2012.

7. Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 2011.

8. Nogueira JDF, Ferreira M. O envolvimento do pai na gravidez/parto e a ligação emocional com o bebé. Rev Enf Ref. 2012; 3(8):57-66.

9. Silva SO, Budó MLD, Silva MM. Care concepts and practices from men’s viewpoint. Texto Contexto Enferm. 2013; 22(2):389-96.

10. Alio AP, Salihu HM, Kornosky JL, Richman AM, Marty PJ. Feto-infant Health and Survival: Does Paternal Involvement Matter? Matern Child Health J. 2010; 14(6):931-7.

11. Jeneral RBR, Bellini LA, Duarte CR, Duarte MF. Aleitamento materno: uma reflexão sobre o papel do pai. Rev Fac Ciênc Med Sorocaba. 2015; 17(3):140-7.

12. Chattopadhyay A. Men in maternal care: evidence from India. J Biosocial Sci. 2012; 44(1):129-53.

13. Alio AP, Lewis CA, Scarborought K, Harris K, Fiscella K. A community perspective on the role of fathers during pregnancy: a qualitative study. BMC Pregnancy Childbirth. 2013; 13(60):2-11.

14. Oliveira EMF, Brito RS. Ações de cuidado desempenhadas pelo pai no puerpério. Esc Anna Nery. 2009; 13(3):595-601.

15. Ferreira TN, Almeida DR, Brito HM, Cabral JF, Marin HA, Campos FMC, et al. A importância da participação paterna durante o pré-natal: percepção da gestante e do pai no município de Cáceres-MT. Rev Eletr Gestão Saúde [Internet]. 2014 [citado 2015 set 20]; 5(2):337-45. Disponível em:http://gestaoesaude.unb.br/index.php/gestaoesaude/article/view/622/pdf

Notas

* Extraído da monografia “Percepção de gestantes acerca da atuação dos parceiros nas consultas de pré-natal”, Universidade Federal do Ceará, 2015.

Autor notes

Colaborações

Ferreira IS, Melo TP e Lô KKR contribuíram para a coleta dos dados de campo. Andrade IS contribuiu para análise e interpretação dos dados. Gomes AMF e Fernandes AFC contribuíram na redação do artigo, revisão crítica relevante do conteúdo intelectual e aprovação final da versão a ser publicada.

Autor correspondente: Iarlla Silva Ferreira. Rua Alexandre Baraúna, 1115 - Rodolfo Teófilo. CEP: 60430-160. Fortaleza, CE, Brasil. E-mail: iarlla@live.com

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