Resumo:
Objetivo do estudo: Este estudo teve como objetivo examinar a evidenciação sobre stakeholders nas análises de risco das empresas do setor de saúde atuantes no Brasil.
Metodologia/abordagem: Foram examinados os Formulários de Referência publicados entre os anos 2013 e 2017 de 13 empresas do setor de saúde listadas na bolsa de valo res brasileira, a B3. Utilizou-se análise de conteúdo para evidenciar os stakeholders presentes nos formulários de referência.
Originalidade/Relevância: Apesar da gestão de riscos e a gestão de stakeholders já terem uma literatura abundante, esta pesquisa trás evidências empíricas de como os formulários de referência das empresas do setor da saúde evidenciam seus stakeholders. Até o momento, não foi possível identificar trabalhos que discutem esse tema tanto na literatura brasileira como na literatura internacional.
Principais resultados: Os resultados constataram que os stakeholders mais citados, como esperado, foram os Clientes (apareceram em 98% dos formulários), Funcionários e Concorrentes (cada um em 95% dos documentos analisados). Por outro lado, os menos mencionados foram Parceiros (68%), Mídia (65%) e Comunidade (37%). Por fim, o resultado mais relevante diz respeito à quantidade absoluta de menções aos stakeholders listados. Os Clientes foram citados 867 vezes, os Investidores em 851 oportunidades e os Funcionários em 811 ocasiões. Os stakeholders menos citados foram Mídia, com 106 alusões, e Comunidade, com 53 menções.
Contribuições teóricas/metodológicas: Pode-se concluir que, no que se refere à gestão do risco, as organizações dedicam grande atenção aos stakeholders Clientes, Funcionários e Concorrentes, pois estes são bastante mencionados nos documentos analisados.
Palavras-chave:StakeholdersStakeholders,RiscoRisco,Formulário de referênciaFormulário de referência,SaúdeSaúde.
Resumen:
Objetivo del estudio: Este estudio tuvo como objetivo examinar la divulgación sobre stakeholders
en los análisis de riesgos de las empresas del sector de salud que actúan en Brasil.
Metodología/enfoque: Se examinaron los formularios de referencia publicados entre 2013 y 2017 de 13 empresas del sector de la salud que cotizan en la bolsa de valores brasileña a B3. Se utilizó análisis de contenido para destacar a los stakeholders presentes en los formularios de referencia.
Originalidad/relevancia: Aunque la gestión de riesgos y la gestión de stakeholders ya tienen una abundante literatura, esta investigación proporciona evidencia empírica sobre cómo los formularios de referencia de las empresas de salud divulgan a sus stakeholders. Hasta ahora, no ha sido posible identificar trabajos que discutan este tema en la literatura brasileña e internacional.
Principales Resultados: Los resultados constataron que los stakeholders más citados, como se esperaba, fueron los Clientes (aparecieron en el 98% de los formularios), Empleados y Competidores (cada uno en el 95% de los documentos analizados). Por otro lado, los menos mencionados fueron los Socios (68%), los Medios (65%) y la Comunidad (37%). Por último, el resultado más relevante se refiere a la cantidad absoluta de menciones a los stakeholders listados. Los Clientes fueron citados 867 veces, los Inversores en 851 oportunidades y los Empleados en 811 ocasiones. Los stakeholders menos citados fueron los Medios, con 106 alusiones, y la Comunidad, con 53 menciones.
Contribuciones teóricas/metodológicas: Se puede concluir que, con respecto a la gestión de riesgos, las organizaciones prestan gran atención a los stakeholders Clientes, Empleados y Competidores, ya que estos se mencionan bastante en los documentos analizados.
Palabras clave: Stakeholders, Riesgo, Formularios de referencia, Salud.
Abstract:
Objective: This study is intended to examine the disclosure about stakeholders in the risk analysis of health sector companies operating in Brazil.
Method: We examined reference Forms published between 2013 and 2017 of 13 health sector companies listed on the Brazilian stock exchange, B3 (Brazil, Bolsa, Balcão). The content analysis proposed by Bardin (2016) was used to highlight the stakeholders present in the reference forms.
Originality / relevance: Despite the risk management and stakeholder management already have an abundant literature, this research provides empirical evidence on how health companies' reference forms highlight their stakeholders. So far, it has not been possible to identify papers that discuss this theme in Brazilian and international literature.
Results: The results showed that the most cited group of stakeholders, as expected, were Clients (appeared in 98% of the forms), Employees and Competitors (each in 95% of documents analyzed). On the other hand, the least mentioned were Partners (68%), Media (65%) and the Community (37%). Finally, the most relevant result refers to the absolute amount of mentions to the listed stakeholders. Clients were cited 867 times, Investors in 851 opportunities and Employees in 811 occasions. The least cited stakeholders were Media, with 106 allusions, and Community, with 53 mentions.
Theoretical/Methodological Contributions: It can be concluded that, as regard to risk management, organizations devote great attention to Customers, Employees and Competitors, as these are most mentioned in the analyzed documents.
Keywords: Stakeholders, Risk, Reference forms, Health.
Articles
AEVIDENCIAÇÃO DOS STAKEHOLDERS NOS FORMULÁRIOS DE REFERÊNCIA - UMA ANÁLISE DO FOCO DAS EMPRESAS DO SETOR DE SAÚDE QUANDO REPORTAM SEU RISCO
LA DIVULGACIÓN DE LOS STAKEHOLDERS EN LOS FORMULARIOS DE REFERENCIA - UN ANÁLISIS DEL ENFOQUE DE LAS EMPRESAS DEL SECTOR DE LA SALUD AL INFORMAR SU RIESGO
STAKEHOLDER DISCLOSURE IN REFERENCE FORMS - AN ANALYSIS OF THE FOCUS OF HEALTHCARE COMPANIES ON REPORTING THEIR RISK
Recepção: 06 Janeiro 2019
Aprovação: 19 Março 2019
Os stakeholderssão indispensáveis para a gestão e controle das atividades de qualquer organização, sendo ela privada, pública, terceiro setor, sem fins lucrativos e/ou esportiva (Ribeiro & Costa, 2017). Além disso, segundo Freeman (1984), os stakeholders são agentes influenciadores ou que são influenciados por uma instituição.
Com isso, alguns conceitos sobre o termo definem os grupos relevantes de acordo com os interesses econômicos, e as maiores definições são baseadas na questão de serem agentes influenciadores, tendo como realidade de que forma as organizações podem ser influenciadas ou podem influenciar (Boaventura et al., 2009).
Diante dessa realidade, uma característica importante de tais agentes é o quanto eles influenciam o comportamento e os riscos de uma organização por conta de sua participação (Bakker, Hond & van der Plas, 2002).
A gestão de riscos nos meios gerenciais é recente e tem ocorrido de forma intensa. As empresas estão incrementando suas práticas gerenciais com técnicas que possibilitam antecipar e mensurar potenciais perdas, para trabalhar sua mitigação, refletindo seus valores nas demonstrações contábeis, com transparência aos acionistas (Peleias et al., 2017).
Essa gestão de risco considera diversas atividades do homem, e pode-se dizer que existe desde o momento em que ele começou a decidir, planejar e executar várias atividades. (Aleksic et al., 2009). Além disso, de acordo com Maruyama & Freitas (2016), os riscos são variáveis e determinantes à evolução humana. O risco tem seu princípio em valores que antes eram abstratos e que atualmente é possível ser quantificado. Desenvolver mecanismos para a gestão dos riscos operacionais é imprescindível para a sobrevivência da empresa. Se estes forem quantificados e controlados, se torna possível uma melhora nos resultados futuros a serem alcançados pelos seus respectivos gestores.
Assim, para que os objetivos da gestão de riscos corporativos possam ser atingidos em sua plenitude, o conhecimento destes é essencial para a empresa e seus stakeholders. A disponibilidade de informação, transparência e divulgação das informações são fundamentais para a tomada de decisão da empresa e seus stakeholders. Uma instituição, ao evidenciar de forma adequada e suficiente tais informações, tende a oferecer um maior nível de confiança e segurança ao definir uma alternativa em detrimento de outra (Leite et al., 2016).
Pensando nisso, surgiu a necessidade de as empresas de capital aberto divulgarem informações referentes à gestão do risco, o que se oportuniza pela publicação de diferentes relatórios ao longo do ano. Esses relatórios mostram resultados e objetivos das empresas, sendo importantes para a tomada de decisão de investidores. O movimento mundial inclui, nesses relatos, os aspectos socioambientais, além dos econômico-financeiros, demonstrando o entendimento de que governança corporativa e o tripé da sustentabilidade também são elementos-chave para a decisão de investimentos e a precificação dos ativos financeiros (B3, 2018). Aragão e Cavalcante (2014) baseando-se principalmente nas publicações da CVM, apresentam o formulário de referência como um importante relatório a ser enviado pelas empresas à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). De acordo com a CV
De acordo com a instrução normativa 480 de 2009 o formulário de referência é um relatório que deve ser emitido anualmente e é composto por: a) Identificação das pessoas responsáveis pelo conteúdo do formulário; b) Auditores; c) Informações financeiras selecionadas; d) Fatores de risco; e) Política de gerenciamento de riscos e controles internos; f) Histórico do emissor; g) Atividades do emissor; h) Negócios extraordinários; i) Ativos relevantes; j) Comentários dos diretores; k) Projeções; l) Assembleia geral e administração (CVM, 2009)
Especificamente no que se refere ao setor de saúde, as empresas possuem um amplo relacionamento, seja com fornecedores, clientes, governo, funcionários, dentre outros stakeholders. Além disso, as organizações sofrem influência de fatores internos e externos, os quais tornam incerto o alcance dos objetivos. O efeito de tal incerteza é chamado de “risco”. Embora a prática de gestão de riscos tenha sido desenvolvida com o passar do tempo e em muitos setores a fim de atender às necessidades diversas, a adoção de processos consistentes em uma estrutura abrangente pode ajudar a garantir que o risco seja gerenciado de forma eficaz, eficiente e coerentemente em uma organização (ABNT, 2009).
Assim, este estudo procura responder à seguinte pergunta: Quais são os stakeholders mencionados nas análises de risco dos formulários de referência das empresas do setor de saúde listadas na B3?
Sendo assim, o objetivo central desta pesquisa é examinar a evidenciação sobre stakeholders nas análises de risco das empresas do setor de saúde atuantes no Brasil. Como objetivo secundário, busca-se compreender quais são os stakeholders considerados mais importantes na gestão de risco das empresas do setor de saúde.
Na sequência do artigo, aborda-se a Revisão da Literatura, a qual aborda os conceitos de stakeholders e gestão de risco. A seção seguinte contempla o Delineamento Metodológico do estudo. Dando prosseguimento, é apresentada a Análise dos Resultados e uma seção para discussão dos resultados denominada “A Gestão de Riscos e os Stakeholders Evidenciados”. A seção de Conclusões encerra o estudo.
Stakeholders podem ser internos ou externos à organização (Burgess, 2012). Matuleviciene & Stravinskiene (2015) classificam os stakeholders em interno e externo; primário e secundário; normativo, funcional, difuso e clientes; regulamentar, organizacional, comunitário e de mídia; grupos na ordem de poder e interesse.
Além das classificações apresentadas, há estudos empíricos que sugerem que os três atributos dos stakeholders (poder, urgência e proximidade) e os quatro tipos de comportamentos (potencial cooperativo, ameaça competitiva, posição oposta e atitude neutra) são considerados como importantes pelas instituições para lidar com as reivindicações dos stakeholders (Yang, Wang & Jin, 2014).
Dentre os stakeholders, os que possuem apenas um atributo são considerados de baixa saliência, ou “latentes”. Estes podem ser classificados em “adormecidos”, quando possuem apenas poder como seu atributo; “arbitrários” se possuem somente legitimidade; ou “reivindicadores”, se seu único atributo é a urgência. Já os stakeholders que possuem dois atributos podem ser considerados de saliência moderada ou “expectantes” (Boaventura et al., 2017).
A capacidade dos stakeholders em influenciar a empresa está altamente correlacionada com seus atributos, enquanto que a disposição dos stakeholders está relacionada às suas atitudes ou comportamentos em direção à empresa (Yang, Wang & Jin, 2014).
Segundo Boaventura et al. (2017), os stakeholders podem ser divididos também em três grupos: o “dominante”, que tem sua influência na empresa assegurada pelo poder e pela legitimidade; o “perigoso”, pois possui poder e urgência, mas sem legitimidade; e o “dependente”, que tem alegações de legitimidade e urgência, mas depende do poder de outros stakeholders para ter suas reivindicações consideradas. Os stakeholdersque têm todos os atributos são os altamente salientes, denominados “definitivos”.
Essa informação corrobora Brammer & Millington (2003), que diz que em primeiro lugar as empresas, para identificar seus stakeholders, precisam entender seus atributos. Em segundo lugar, as empresas devem indagar o que suas partes interessadas desejam e anseiam.
O modelo de saliência tem base na percepção dos gestores quanto à posse dos atributos Poder, Legitimidade e Urgência pelos stakeholders. Um dos caminhos para a realização de pesquisas sobre saliência é a análise de conteúdo de relatórios corporativos. Esses relatórios, sejam eles prospectos de distribuição de ações, relatórios de sustentabilidade social empresarial, ou ainda relatórios contábeis, são ricos em informações sobre a empresa e podem conter informações que demonstrem a percepção dos gestores sobre os stakeholders das organizações (Boaventura et al., 2017).
Em termos gerais, as organizações se beneficiam de uma melhor compreensão e apreciação dos tipos de vulnerabilidades de diferentes stakeholders e os tipos de informações que mais claras podem sinalizar confiabilidade (Pirson & Malhotra, 2011).
O ambiente organizacional sofre muitas influências do seu ambiente interno, uma vez que engloba inúmeras informações vindas de seus stakeholders, sejam eles funcionários ou dirigentes; mas também é influenciado pelo ambiente externo, por intermédio de informações macroambientais que podem ser demográficas, político-legais, tecnológicas, econômicas, socioculturais e naturais. São considerados stakeholders primários os acionistas, investidores, empregados, consumidores, fornecedores, clientes, e também aqueles que estabelecem e fazem cumprir as leis e regulamentações. Já os secundários são aqueles cujo relacionamento não é regulamentado por meio de contratos, podendo, porém, ser crítico para a empresa, dependendo do momento. São considerados stakeholders secundários uma entidade de bairro ou grupo de sociedade que pode gerar uma forte pressão sobre uma instituição e afetar suas atividades (Dalfovo et al., 2016).
O estudo de Sarturi, Seravalli & Boaventura (2015) concluiu que a distribuição de valor para os stakeholders inclui uma combinação de resultados tangíveis e intangíveis e que os critérios utilizados para esta distribuição envolvem aspectos de meritocracia. Os autores constataram que os stakeholders mais estudados são os funcionários, acionistas, fornecedores e compradores.
Por fim, o envolvimento dos stakeholders nos processos de desenvolvimento organizacional e implementação de estratégias requer tempo, recursos humanos e financeiros, bem como esforços de gestão para satisfazer seus interesses (Wubben & Nuhoff-Isakhanyan, 2011).
A Tabela 1 enumera diversos estudos e apresenta os stakeholders identificados em cada um deles.
O risco está presente nos mais diversificados setores e atividades; o objetivo do seu gerenciamento é fazer com que as entidades possam prevenir perdas e aproveitar de melhor forma as oportunidades oferecidas dentro do contexto do mercado no qual estão inseridas. O gerenciamento de riscos está junto aos ganhos e às perdas e pode ser definido como um evento, esperado ou não, que pode causar impacto no capital ou nos ganhos de uma organização (Leite et al., 2016).
Todas as atividades de uma instituição envolvem risco. As organizações gerenciam o risco, identificando-o, analisando-o e, em seguida, avaliando se o risco deve ser alterado a fim de atender a seus critérios. Ao longo de todo este processo, as empresas comunicam, consultam, monitoram e analisam criticamente o risco e os controles que o alteram, com a finalidade de assegurar que nenhum tratamento de risco adicional seja necessário (ABNT, 2009).
Na mesma linha de pensamento, Abdullah, Shukor & Rahmat (2017) afirmam que o gerenciamento de riscos é essencial para a sobrevivência futura das empresas. Segundo Leite et al. (2016), além das motivações legais, a sociedade tem cobrado um maior grau de transparência das informações por parte das companhias, que têm por motivação o fato de que os stakeholders formam a imagem da empresa a partir do que conseguem visualizar nas informações fornecidas pela mesma.
Um exemplo disso são os gestores políticos e os reguladores, os quais são obrigados a tomar decisões, apesar de existir a incerteza substancial quanto aos resultados das suas proposições. Entender as visões dos stakeholders é parte essencial para abordar esta incerteza, pois fornece informações sobre as possíveis reações e tolerâncias sociais de riscos imprevisíveis (Capon et al., 2015).
É natural que incertezas econômicas e prevenções de controle também estejam presentes em empresas não financeiras. Para que os gestores sintam segurança na tomada de decisões é importante que tenham suportes instrumentais que propiciem informações tempestivas e adequadas, assegurando menores erros e exposições ao risco. Entende- se que a gestão de risco não consiste na eliminação do risco, mas em sua identificação, mensuração e controle (Guimarães et al., 2009).
Alguns estudos defendem o surgimento do gerenciamento de riscos corporativos (ERM), o qual possui uma visão mais holística e integrada com foco em governança, aprimorando os sistemas de gerenciamento de riscos anteriores. O ERM deve teoricamente reduzir a volatilidade dos fluxos de caixa, risco de agência e risco de informação – em última análise, reduzindo o risco padrão de uma empresa (Demidenko & McNutt, 2010; Lundqvist, 2015; Lundqvist & Vilhelmsson, 2016).
De acordo com Martin, Santos & Dias Filho (2004), os riscos empresariais podem ser classificados em três áreas, cada uma delas com grupos de risco envolvidos. Essas três principais classes do risco empresarial são chamadas de riscos funcionais. São elas:
Riscos de propriedade: são ligados à mobilização, aquisição, manutenção e disposição dos ativos (exceto os ativos humanos)
Riscos de processo: são os que têm origem no uso ou na operação dos ativos para alcançar os objetivos empresariais
Riscos comportamentais: atrelados à aquisição, manutenção, utilização e disposição dos ativos empresariais da base humana, onde se encontra a capacidade de gestão.
Essa pesquisa é classificada como descritiva pois o estudo analisa os formulários de referência de um grupo de empresas, bem como revisa a literatura sobre stakeholders e gestão de risco com base em artigos científicos. Pesquisas descritivas podem ser elaboradas a fim de identificar relações possíveis entre variáveis, além de descrever as características de determinada população. A maior parte desse tipo de pesquisa é realizada com objetivos profissionais. Algumas dessas pesquisas vão além de identificar a relação existente entre variáveis e determinam a natureza dessa relação (Gil, 2010).
Quanto aos procedimentos, trata-se de um estudo documental. De acordo com Gil (2010), é um procedimento utilizado em praticamente todas as ciências sociais e é um tipo de pesquisa que se vale de toda sorte de documentos, elaborados com finalidades diversas. Esse estudo se difere do bibliográfico pela natureza das fontes, uma vez que a fonte documental é o material interno da organização e a bibliográfica é obtida em obras e publicações. O documento é um objeto de estudo que pode comprovar algum fato ou acontecimento. Neste estudo, o documento a ser analisado é o Formulário de Referência publicado pelas empresas de capital aberto, o qual apresenta a situação econômico- financeira do emissor, os riscos inerentes às suas atividades e os valores mobiliários emitidos. É enviado anualmente à CVM, em até cinco meses contados da data de encerramento do exercício social da companhia.
No que se refere à amostra do estudo, optou-se por estudar empresas de capital aberto do setor de saúde, as quais totalizavam 31 no site da B3. Na sequência, verificou-se quais delas haviam publicado Formulário de Referência nos anos de 2013 a 2017 em seus respectivos sites. Optou-se por esse recorte pois esperava-se observar a evolução dos últimos anos e até o momento da pesquisa muitas empresas ainda não haviam disponibilizados os relatórios de 2018. Com isso, chegou-se a um total de 13 empresas:
Advanced Digital Health Medicina Preventiva;
Biomm;
Brasil Pharma;
Cremer;
Diagnosticos da America;
Dimed;
Fleury;
Hypermarcas;
Nortec Química;
Odontoprev;
Profarma;
Qualicorp;
Raia Drogasil.
Para a coleta dos dados, foi utilizada a técnica de análise de conteúdo. De acordo com Bardin (2016), caracteriza-se como uma técnica de análise de comunicação que busca obter descrição nos conteúdos de mensagens, por meio de procedimentos sistemáticos sejam estes, indicadores (quantitativos ou não), que admitam inferências relativas a essas mensagens. As fases propostas por Bardin (2016) são 1) pré-análise, 2) exploração do material e 3) tratamento dos resultados, inferência e interpretação.
Na fase de pré-análise, um dos pontos relevantes é o contato com os documentos e a escolha e identificação do que será analisado. Como o intuito do estudo era analisar a evidenciação sobre stakeholders no que se refere ao risco da empresa, optou-se por buscar os termos nas seções “Fatores de risco” e “Gerenciamento de riscos e controles internos” dos Formulários de Referência das empresas que compõem a amostra.
Os de stakeholders buscados nos formulários são os stakeholders apresentados na Tabela 1. Contudo, há diversos sinônimos e termos correlatos, os quais também foram considerados na análise, e que são evidenciados na Tabela 3. Esses sinônimos foram identificados por meio de uma leitura inicial dos formulários. A mesma abordagem foi ulizada por Lugoboni e Goto (2018). Tal procedimento é proposto por Bardin (2016) quando explica que esta atividade faz parte também da pré-analise e é chamada de “a referenciação dos índices e a elaboração dos indicadores”.
A coleta de dados se deu pela leitura de cada Formulário de Referência interpretando o conteúdo dos mesmos e categorizando/tabulando em planilha eletrônica os termos identificados. Dois autores realizaram esta leitura e categorização de forma independente. As divergências significativas destas duas evidenciações foram discutidas entre os autores desta pesquisa. Esta etapa seria a segunda etapa proposta por Bardin (2016) denominada “exploração do material”. A terceira etapa “tratamento dos resultados, inferência e interpretação” proposta por Bardin (2016) é apresentada no próximo capítulo.
Na Tabela 4, é possível observar a evidenciação sobre stakeholders nos Formulários de Referência analisados. O número 1 (um) indica menção (presença) do respectivo stakeholder no formulário, enquanto que o 0 (zero) indica ausência.
A coluna ‘Total’ evidencia quantos stakeholders foram mencionados por cada empresa em cada ano de publicação do Formulário de Referência. A coluna “% de Evidenciação”, por sua vez, apresenta a porcentagem de stakeholders mencionados, levando- se em conta o máximo de 9 (nove).
A última linha da tabela, denominada ‘Total Geral’, representa o percentual de menções do respectivo stakeholder considerando todos os formulários analisados.
Pode-se afirmar que os stakeholders mais importantes são os Clientes, que apareceram em 98% (64) dos formulários analisados, seguido de Concorrentes e Funcionários, os quais foram evidenciados em 95% (62) dos formulários. Tal resultado corrobora os achados de Dalfovo et al. (2016) e de Sarturi, Seravalli & Boaventura (2015) – estes últimos afirmam que os stakeholders mais mencionados são os funcionários, acionistas, fornecedores e compradores, estes classificados como primários.
Por outro lado, os stakeholders menos citados nos formulários das empresas analisadas foram: Parceiros, com 68% (44) de evidenciação, Mídia com 65% (42) e Comunidade com 37% (24).
No que se refere às empresas, destaca-se que sete delas mantiveram o mesmo nível de evidenciação ao longo dos anos: Advanced Digital Health Medicina Preventiva, Brasil Pharma, Diagnósticos da America, Fleury, Hypermarcas, Qualicorp e Raia Drogasil. Vale mencionar que duas destas obtiveram 100% de evidenciação, ou seja, mencionaram todos os 9 (nove) stakeholders listados em todos os anos analisados.
As empresas Dimed e Odontoprev apresentaram uma queda em seu nível de evidenciação no período analisado, sendo que a primeira deixou de mencionar a Mídia e a segunda não apresentou informações sobre Parceiros e Mídia.
Três das empresas que fazem parte do estudo exibiram certas mudanças no que se refere à evidenciação dos stakeholders durante os anos analisados. A Biomm apresentou um disclosure crescente ao longo do tempo na medida em que mencionou 44% (4) dos stakeholders em 2013 e a totalidade (9) em 2017. Já a Cremer e a Profarma não mostraram tendências de aumento ou diminuição de menções, pois oscilaram bastante no período analisado.
A Tabela 5 apresenta a quantidade de menções por stakeholder (número de vezes em que cada stakeholder é citado ao longo do formulário), bem como calcula a média por página, dividindo a totalidade de menções pela quantidade de páginas do documento.
As colunas referentes aos stakeholders analisados neste estudo apresenta a quantidade total de menções por formulário para cada ano. Já a coluna ‘Total’ evidencia o número total de menções dos stakeholders por empresa para cada ano. A coluna ‘Stakeholder por página’, como já mencionado anteriormente, foi obtida a partir da divisão entre a coluna ‘Total’ e a coluna Nº de páginas’.
A partir da quantidade absoluta de menções de cada stakeholder, é possível obter-se algumas inferências. Abaixo foram transcritos alguns parágrafos advindos de formulários analisados, com o intuito de exemplificar as menções feitas aos stakeholders.
Primeiramente, percebe-se que os Clientes foram os mais citados (867 alusões).
A integração das operações de empresas já adquiridas e das que venhamos a adquirir no futuro pode não ocorrer com a velocidade ou benefícios esperados, incluindo o risco de perda dos principais clientes ou empregados da empresa alvo e o risco de alcançar sinergias inferiores aos esperados (Fleury, 2016).
O segundo stakeholder mais citado nos formulários foi o Investidor, com 851 citações.
Poderemos precisar captar recursos adicionais no futuro e, no caso da indisponibilidade de financiamento público ou privado ou por decisão de nossos acionistas, poderemos emitir novas ações ordinárias. Qualquer emissão adicional de ações poderá resultar na diluição da participação de investidores em nosso capital social (Qualicorp, 2017).
Os Funcionários foram os terceiros mais mencionados (811 citações).
Nossa capacidade de manter uma posição competitiva e de desenvolver a estratégia traçada depende significativamente das contribuições da nossa alta administração e de nossos operadores regionais. Contudo, não podemos assegurar que conseguiremos reter nossos atuais membros do conselho de administração e diretoria ou atrair novos profissionais qualificados. Ademais, grande parte desses profissionais colaboram ou são vinculados aos nossos acionistas com participação acionária significativa (Profarma, 2014).
Por fim, o quarto stakeholder mais citado foram os Concorrentes (635 alusões).
Operamos no mercado brasileiro de drogarias, um setor altamente competitivo. Concorremos com redes de drogarias nacionais, regionais e locais, drogarias independentes, serviços devenda por telefone, empresas de venda direta, farmácias de manipulação, fornecedores de produtos farmacêuticos e de beleza pela internet e demais varejistas, tais como supermercados, perfumarias e lojas de conveniência. Ademais, novos varejistas poderão ingressar no nosso mercado e também se tornar nossos concorrentes (Brasil Pharma, 2014).
Essas informações corroboram, em parte, o estudo de Dalfovo et al. (2016), que classificaram como stakeholders primários os acionistas, investidores, empregados, consumidores, clientes e fornecedores. Apenas o stakeholderFornecedores apresentou resultados diferentes do estudo mencionado, pois tal stakeholdernão foi um dos mais mencionados nos formulários analisados.
No que se refere aos stakeholders menos citados, o primeiro é a Comunidade, com 53 citações, seguido pela Mídia com 106 citações.
Adicionalmente, tem o compromisso de reduzir os impactos ambientais de seus processos, produtos e serviços, incentivar a pesquisa de novas tecnologias, processos e insumos que minimizem esses impactos e está empenhada na manutenção de um diálogo aberto com a comunidade, clientes e fornecedores, com vistas a troca de informações sobre temas ambientais relevantes (Odontoprev, 2017).
Os negócios da Companhia dependem em larga escala da reputação de suas marcas junto a clientes, fontes pagadoras e a comunidade médica das áreas geográficas em que atua. Caso a Companhia não seja capaz de manter a reputação das marcas por ela utilizadas, os seus negócios poderão ser adversamente afetados (Diagnósticos da América, 2016).
Em termos absolutos, as cinco empresas que mais citam os stakeholders analisados são, nesta ordem, Qualicorp (698), Diagnósticos da América (466), Odontoprev (451), Brasil Pharma (354) e Raia Drogasil (344).
Com relação à quantidade de menções por página, é possível observar que, em média, as empresas evidenciaram 5,16 stakeholders por página, sendo que o primeiro quartil (19 relatórios) apresenta menos de quatro stakeholders por página. Já o último quartil (os 20 relatórios que mais mencionaram stakeholders por página) evidenciou mais de 6,5 stakeholders por página.
O gerenciamento de risco procura auxiliar as entidades na prevenção de perdas e no melhor aproveitamento das oportunidades que surgem (Leite et al., 2016). Embora não seja possível fazer inferências a partir da pesquisa realizada, os dados indicam que a gestão de riscos das empresas atuantes no Brasil no setor de saúde está mais relacionada aos stakeholders Clientes, Investidor, Funcionários e Concorrentes. Da mesma forma, embora não seja conclusivo, há evidencias de que os stakeholders menos relacionados à gestão de riscos das empresas do setor de saúde são Comunidade e Mídia.
Esta pesquisa contribui com a teoria quando apresenta, para o setor de saúde, os stakeholders mais evidenciados, além de complementar o que já foi discutido com relação à Teoria de Saliência (Mitchell, Agle & Wood, 1977 e Sarturi, Seravalli & Boaventura, 2015). O estudo também contribui para a identificação dos stakeholders primários que, de acordo com Dalfovo et al. (2016) e Sarturi, Seravalli & Boaventura (2015), são os mais importantes para a organização.
O objetivo deste estudo era examinar a evidenciação sobre stakeholders nas análises de risco das empresas do setor de saúde atuantes no Brasil. Como objetivo secundário, buscou-se compreender quais são os stakeholders considerados mais importantes na gestão de risco das empresas do setor de saúde.
A partir da análise dos Formulários de Referência de 13 empresas do setor de saúde listadas na B3, pode-se concluir que, no que se refere à gestão do risco, as organizações possuem grande preocupação com seus stakeholders, pois estes são bastante mencionados nos documentos analisados. Os stakeholders Clientes foram os stakeholdersmais mencionados, seguidos de Funcionários e Concorrentes. Por outro lado, as empresas analisadas não parecem dar muita importância para stakeholders como Parceiros, Mídia e Comunidade.
Aparentemente há um direcionamento das análises de riscos das empresas do segmento analisado para alguns stakeholders específicos. Assim como o conteúdo desses relatórios não aborda alguns stakeholders da mesma forma, provavelmente por não ser fonte de risco com a mesma intensidade. De acordo com a metodologia proposta por Bardin (2016), a análise de conteúdo em sua terceira etapa deve fazer inferências com relação aos resultados encontrados.
Do ponto de vista gerencial, esta pesquisa auxilia as empresas do setor de saúde a avaliarem seu planejamento e gestão do risco, e quais stakeholders os afetam mais, indicando possíveis pontos para melhoria.
Com relação às limitações, a interpretação dos autores e a utilização da técnica de análise de conteúdo para coleta dos dados – apesar da dupla checagem – podem influenciar os resultados. Outra limitação está relacionada à quantidade de empresas analisadas, pois o setor é pequeno e muitas empresas foram excluídas por não terem publicado o Formulário de Referência no período analisado.
Como sugestão para futuras pesquisas, uma análise qualitativa pode gerar grandes inferências. Um exemplo é uma simples matriz de correlação entre empresa e stakeholder. Outra possível abordagem é a análise de outros segmentos para comparação dos resultados com o setor da saúde.