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Prevalência da síndrome de Burnout em diferentes áreas acadêmicas e a relação com as características sociodemográficas
Prevalence of Burnout syndrome in different academic areas and the relationship with sociodemographic characteristics.
Revista Argentina de Ciencias del Comportamiento, vol. 14, núm. 1, pp. 82-90, 2022
Universidad Nacional de Córdoba

Artículos Originales



Recepción: 29 Mayo 2020

Aprobación: 10 Diciembre 2020

Resumo: Objetiva-se, neste estudo, estimar a prevalência da síndrome de Burnout em diferentes áreas acadêmicas, verificando a associação entre essa síndrome e as características sociodemográficas e os cursos de graduação, bem como suas dimensões. Desenvolveu-se um estudo transversal, com 650 estudantes de um centro universitário catarinense. Utilizaram-se um questionário sociodemográfico e o Maslach Burnout Inventory Student Survey - (MBISS). Após a análise no SPSS versão 20.0, os resultados indicaram a prevalência de 10.9% dos acadêmicos com sintomas da síndrome de Burnout e a associação com as variáveis sexo, satisfação com o curso, experiência profissional na área do curso, tempo de deslocamento até a faculdade, e tempo de estudo, realização do estágio supervisionado. Entre a síndrome de Burnout e os cursos de graduação, ocorreram associações nas dimensões exaustão emocional e eficácia profissional.

Palavras-chave: burnout, esgotamento profissional, estudantes, universidades.

Abstract: The aim of this study is to estimate the prevalence of Burnout syndrome in different academic areas, verifying the association between this syndrome and sociodemographic characteristics and undergraduate courses, as well as its dimensions. A cross-sectional study was carried out with 650 students from a university center in Santa Catarina. A sociodemographic questionnaire and the Maslach Burnout Inventory Student Survey - (MBISS) were used. Upon analysis in SPSS version 20.0, the results indicated the prevalence of 10.9% of students with the symptoms of Burnout syndrome and the association with the variables gender, satisfaction with the course, professional experience in the course area, travel time until college, and study time and supervised internship. Between Burnout syndrome and undergraduate courses, associations occurred in the dimensions of emotional exhaustion and professional effectiveness.

Keywords: burnout, professional burnout, students, universities.

Introdução

Compreendida como um estado de exaustão emocional vinculado ao ambiente de trabalho, a síndrome de Burnout é resultante de um processo crônico de estresse. Ela se exterioriza em comportamentos negativos que causam danos emocionais e práticos ao trabalhador e à organização, implicando diretamente a perda de entusiasmo pela atividade laboral (Azevedo et al., 2019; Benevides-Pereira, 2003; Maslach, Schaufeli, & Leiter, 2001). Essa síndrome é considerada pelo Ministério da Saúde do Brasil uma doença cujo agente etiológico configura uma resposta prolongada ao estresse crônico decorrente do trabalho, diferente do estresse tradicional que consiste no esgotamento pessoal, interferindo na vida do indivíduo, não estando, porém, necessariamente relacionado ao trabalho. A síndrome de Burnout ou síndrome de exaustão profissional está incluída na lista de Classificação Estatística Internacional de Doenças e Saúde Relacionada Problemas (CID-10) (Azevedo et al., 2019).

Estudos alertam que a universidade, que tem como missão a formação integral de futuros profissionais, representa um potencial campo para o desenvolvimento da síndrome, pois o período de transição dos alunos para o ensino superior é por eles vivenciado com sentimentos de ansiedade frente às novidades e às exigências institucionais e acadêmicas, sendo pautado por desafios e expectativas carregados de cobranças, constantes avaliações, pressões do tempo, dentre outros fatores (Mota, Marinho, Both, Veiga, & Farias, 2019; Moura et al., 2019). Em estudantes universitários, a síndrome de Burnout caracteriza-se pela tríade: exaustão emocional, descrença, eficácia profissional. Entende-se exaustão emocional como a percepção de estar esgotado em decorrência das demandas dos estudos. A descrença é marcada pelo desinteresse em relação aos estudos e pelo distanciamento deles. Compreende-se eficácia profissional como a percepção de estar sendo incompetente como estudante (Carlotto & Câmara, 2006; Martínez, Pinto, & Silva, 2000). Investigações acerca desta temática têm sido conduzidas com estudantes de graduação de distintas áreas do conhecimento, tanto no contexto nacional (Campos, Jordani, Zucoloto, Bonafé, & Maroco, 2012; Carlotto, Câmara, Otto, & Kauffmann, 2010; Peleias, Guimarães, Chan & Carlotto, 2017; Tomaschewski-Barlem et al., 2014) quanto no cenário internacional (Hongchun et al., 2018; López, Almaraz-Celis, Maciel, Valenzuela, & Marcos, 2016; Njim et al., 2018; Rosales, 2012; Wolf & Rosenstock, 2017). Seu foco direciona-se essencialmente para a saúde, pois os resultados revelam que as demandas do ensino superior podem influenciar negativamente o desempenho e a qualidade de vida dos acadêmicos (Almeida, G. C., Souza, Almeida, O., Almeida, B., & Almeida, G. H., 2016; Barbosa, Silva, Ferreira, & Severo 2016; Campos, et al., 2012; Carlotto et al., 2010; López et al., 2016; Peleias et al., 2017; Tomaschewski-Barlem et al., 2014).

A síndrome em universitários, no entanto, também evidencia relação com fatores sociodemográficos, como sexo, estado civil, número de filhos, idade, vínculo laboral. Nível de estudo, satisfação com o curso, realização de estágio supervisionado, geram igualmente tensão aos estudantes e, consequentemente, o surgimento da síndrome (Njim et al., 2018; Peleias et al., 2017).

Nesse contexto, torna-se imprescindível que ocorram mais investigações com estudantes de distintas áreas de conhecimento, considerando as diferentes características e exigências de ensino e formação profissional dos cursos. Buscar dimensionar como as relações acadêmicas e pessoais são estabelecidas, nesse cenário, e detectar quais fatores desencadeiam a síndrome de Burnout tornam-se relevantes visando ao zelo com a saúde e o bem-estar dos estudantes (Mota et al., 2019; Moura et al., 2019).

O presente estudo tem por objetivo estimar a prevalência da síndrome de Burnout em diferentes áreas acadêmicas, verificando a associação entre essa síndrome e as características sociodemográficas e entre os cursos de graduação, bem como sua dimensão concernente à saúde em estudantes universitários.

Materiais e métodos

Trata-se de um estudo com delineamento transversal correlacional, com amostragem probabilística e estratificada, desenvolvido em um Centro Universitário, localizado em São José – Santa Catarina – Brasil. Ele foi aprovado no Comitê de Ética em Pesquisas envolvendo Seres Humanos (CEPSH) da Universidade do Estado de Santa Catarina, processo n° 1.839.913/2016. O Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foi assinado por todos os voluntários.

A população de estudantes na instituição de ensino superior (IES) analisada era de 1058 discentes. Considerando este número, foi realizado o cálculo amostral proposto por Barbetta (2005), sendo esperado para representativa total da população o mínimo de 282 estudantes. O cálculo amostral foi realizado para cada um dos cursos de graduação, que constituíram os subgrupos amostrais, tendo-se atingido a representatividade necessária. A amostra final foi constituída por 650 estudantes. Verificou-se perda amostral de 2.8% referente aos alunos que não preencheram de maneira adequada os instrumentos de pesquisa.

Foram incluídos no estudo os universitários que estavam regularmente matriculados nos cursos selecionados, em todos os semestres, e que tivessem idade igual ou superior a 18 anos. Considerou-se como critérios de exclusão: estudantes que apresentassem alguma deficiência que impossibilitasse responder os instrumentos de coleta de dados; a não assinatura do TCLE; instrumentos preenchidos de maneira inelegível.

Previamente, foi realizado contato com a Reitoria do Centro Universitário, para apresentação da pesquisa e seus objetivos. Após a autorização do estudo, os coordenadores dos cursos foram contatados e, mediante sua concessão, foram ajustados os horários para coleta dos dados e aplicação dos instrumentos, processo que ocorreu no mês de março no ano de 2017.

Objetivando a uniformização da aplicação dos instrumentos de pesquisa foi realizado um treinamento com os pesquisadores envolvidos na coleta de dados. No momento da coleta, inicialmente, foram explanados aos estudantes o tema, o objetivo e os procedimentos da investigação, enfatizando-se os cuidados e as garantias para a preservação da integridade física, mental e emocional dos participantes. Os instrumentos foram preenchidos pelos estudantes com orientação dos pesquisadores, de modo presencial, em sala de aula. A aplicação ocorreu de forma independente por curso e por semestre.

Para subsidiar a coleta, os autores desenvolveram um questionário envolvendo informações sociodemográficas: idade, sexo, situação conjugal, filhos, moradia, experiência profissional na área do curso, satisfação com o curso, vínculo empregatício, tempo de deslocamento até a instituição, tempo dedicado aos estudos fora do horário acadêmico, realização de estágio supervisionado, curso de graduação, semestre atual. Para a coleta de dados sobre a síndrome de Burnout, foi utilizado o instrumento Maslach Burnout Inventory Student Survey (MBISS), adaptado para estudantes por Schaufeli, Salanova, González-Romá, e Bakker (2002) e validado para estudantes brasileiros por Carlotto e Câmara (2006).

A versão brasileira do inventário apresenta boa consistência interna e validade fatorial, com escores satisfatórios nos fatores de exaustão emocional e eficácia profissional (0.81 e 0.74, respectivamente). No fator de descrença apresenta escore moderado (0.59), atendendo a sua utilidade na avaliação da síndrome de Burnout em estudantes universitários. O instrumento consiste em 15 questões subdivididas em três subescalas: exaustão emocional, a qual compreende cinco itens que expressam a dimensão de estar desgastado em relação aos estudos e às atividades acadêmicas; eficácia profissional, contendo seis itens que se referem à percepção de não estar sendo competente na situação de estudante; descrença, a qual focaliza, por meio de quatro itens, os aspectos indicativos de distanciamento em relação aos estudos. O instrumento avalia índices da síndrome de Burnout de acordo com os escores de cada dimensão que o compõe, por conseguinte altos escores em exaustão emocional e descrença e baixos escores em eficácia profissional indicam a presença da síndrome (Carlotto & Câmara, 2006).

Todos os itens são avaliados em escala Likert de cinco pontos (0 = nunca; 1 = algumas vezes por ano; 2 = uma vez por mês ou menos; 3 = algumas vezes por mês; 4 = uma vez por semana; 5 = algumas vezes por semana; 6 = todos os dias), sendo as variáveis da síndrome classificadas em baixo, médio ou alto risco, calculado a partir do tercil para categorizar as médias das pontuações de acordo com as três dimensões (Carlotto & Câmara, 2006).

Para este estudo os participantes foram assim categorizados: a) ausência da síndrome de Burnout – participantes que apresentavam simultaneamente baixa exaustão emocional, baixa descrença e alta eficácia profissional; participantes que apresentavam uma das três dimensões (baixa eficácia, alta exaustão ou alta descrença); participantes que apresentavam duas das três dimensões (baixa eficácia, alta exaustão e/ou alta descrença); b) presença da síndrome de Burnout – participantes que apresentavam simultaneamente baixa eficácia, alta exaustão emocional e alta descrença.

A análise estatística foi realizada por meio do programa The Statistical Package for the Social Science (SPSS®) versão 20.0. Incialmente, foi realizada a análise descritiva para caracterização da amostra e o teste Qui-quadrado para análise de associação das variáveis sociodemográficas e acadêmicas à síndrome de Burnout e para análise da associação existente entre cursos de graduação e dimensões da síndrome. A variável dependente do estudo foi a síndrome de Burnout e suas dimensões isoladamente (eficácia profissional, exaustão emocional e descrença). As categorias de referências foram: ausência da síndrome de Burnout e presença da síndrome de Burnout. As variáveis independentes foram as questões sociodemográficas e acadêmicas e os cursos de graduação.

Para estimar as razões de prevalências (odds ratio) e os respectivos intervalos de confiança entre a variável dependente e independente (cursos de graduação), utilizaram-se regressões logísticas binárias, tanto na forma bruta quando na ajustada. As variáveis que compuseram o modelo ajustado foram aquelas que alcançaram p < .20 (sexo, satisfação com o curso, experiência profissional, tempo de deslocamento para a instituição, tempo dedicado aos estudos, realização de estágio supervisionado).

Resultados

A maioria dos estudantes investigados eram do sexo feminino (65.0%), solteiros (64.2%), sem dependentes (84.7%), moravam com os pais (93.0%), possuíam vínculo empregatício (64.9%), apresentavam experiência profissional na área do curso (52.6%). Do total da amostra, 91.0% relataram a satisfação para com o curso realizado, apesar de 64.1% não terem realizado estágio supervisionado obrigatório inerente ao curso.

Ao analisar a associação da síndrome de Burnout com as variáveis sociodemográficas (Tabela 1), observou-se significância com as variáveis: sexo (p = .002), satisfação com o curso (p < .001), experiência profissional da área do curso (p= .011), tempo de deslocamento até a faculdade (p = .017), tempo de estudo (p = .002), realização do estágio supervisionado (p = .013).

Os resultados evidenciaram que houve maior associação da síndrome de Burnout entre estudantes do sexo feminino (81.7%) e entre aqueles que estavam insatisfeitos com o curso (30.0%), que possuíam experiência profissional na área do curso (67.1%), que, para se deslocar até a instituição, despendiam tempo superior a 30 minutos (42.6%), que estudavam de uma a duas horas diárias fora do horário acadêmico obrigatório (43.7%); que realizavam estágio supervisionado (50.7%).

Na associação do constructo da síndrome de Burnout com os cursos de graduação, evidenciou-se associação significativa entre exaustão emocional (p< .001) e eficácia profissional (p = .003) (Tabela 2).

Tabela 1.
Descrição da associação entre a síndrome de Burnout e as variáveis sociodemográficas e acadêmicas

Tabela 2.
Associação entre a síndrome de Burnout e os cursos de graduação.

A análise bruta pormenorizada evidenciou que os alunos do curso de Análise e Desenvolvimento de Sistemas apresentaram menores chances de desenvolver exaustão emocional quando comparados aos discentes dos demais cursos. Os integrantes do curso de Pedagogia apresentaram maiores chances de desenvolverem exaustão emocional quando comparados aos do curso de Ciências Contábeis. A análise ajustada dessa dimensão indicou que os alunos do curso de Análise e Desenvolvimento de Sistemas apresentaram menores chances de desenvolver exaustão emocional quando comparados aos dos cursos de Pedagogia e Administração (Tabela 3).

Quanto à dimensão da eficácia profissional, constatou-se, na análise bruta, que os estudantes do curso de Pedagogia apresentaram maiores chances de serem profissionais mais eficazes quando comparados com os dos cursos de Administração, Análise e Desenvolvimento de Sistemas e Ciências Contábeis. Ressalta-se que, na análise ajustada, identificou-se que os estudantes do curso de Pedagogia apresentaram maiores chances de eficácia profissional que os dos cursos de Administração e Ciências Contábeis. Verificou-se, na análise ajustada, que os estudantes de Administração apresentaram maiores chances de descrença que os discentes de Análise e Desenvolvimento de Sistemas (Tabela 3).

Tabela 3.
Razões de chances brutas e ajustadas entre as dimensões da síndrome de Burnout e cursos de graduação.

Legenda Administração; OR: odds ratio

Legenda. Adm.: Administração; OR: odds ratio.

Discussão

Na consecução do objetivo deste estudo, identificou-se a prevalência da síndrome de Burnout em 10.9% dos estudantes investigados. Todavia, os resultados demonstraram a associação da síndrome com as variáveis: sexo, satisfação com o curso, experiência profissional com o curso, tempo de deslocamento até a IES, tempo de estudo, realização de estágio supervisionado. Quanto às dimensões, observou-se associação entre a exaustão emocional e a eficácia profissional nos diferentes cursos investigados.

O sexo feminino apresentou maior prevalência (81.7%) das dimensões da síndrome de Burnout, corroborando os estudos de Korompeli, Chara, Chrysoula, e Sourtzi (2013) e Rotenberg, Silva, e Griep, (2014), que, ao investigarem a saúde mental de profissionais da saúde, encontraram associações com as questões de gênero, evidenciando a vulnerabilidade das mulheres às doenças. Extrapolando as questões de gênero, estes dados podem estar relacionados ao fato de os cursos analisados ocorrerem no período noturno e de os estudantes que estavam mais expostos à síndrome também possuírem experiência profissional, caracterizando a dupla jornada de trabalho, favorecedora do estresse crônico (Bosqued, 2008), preditor da síndrome de Burnout.

Outro fator que prevaleceu, no grupo de alunos, na exposição à síndrome foi o tempo superior a 30 minutos para deslocamento até a IES, evidenciado como uma dificuldade pelos universitários investigados. Silveira, Câmara, e Amazarray (2014) mencionam que o tempo de deslocamento na cidade representa um fator estressante, que pode expor os sujeitos ao Burnout, levando a crer que o tempo dispendido para deslocamentos, no dia a dia, torna-se algo negativo e causa a diminuição de produção. O tempo de dedicação aos estudos fora do horário acadêmico demonstrou uma exposição maior (43.7%) do grupo de universitários que estudavam entre uma e duas horas diárias. Até o presente momento não se encontraram, na literatura, pesquisas que relacionem o tempo de dedicação extracurricular com a síndrome. Contudo, pesquisas demonstram que a sobrecarga de estudos e as exigências da vida universitária favorecem a exposição ao Burnout (Barbosa et al., 2016; Hongchun et al., 2018; Maslach et al., 2001; Mota et al, 2019; Moura et al. 2019; Tomaschewski-Barlem et al., 2014).

A realização do estágio supervisionado obrigatório do curso também apresentou influência na exposição à síndrome. Isso confirma os achados de Christofoletti, Trelha, Galera, e Feracin (2007) e Rudnicki e Carlotto (2007) que, ao investigarem o impacto do estágio supervisionado na saúde mental dos alunos, constataram que quem havia realizado o estágio supervisionado estava mais exposto à síndrome, pois, além de experimentar a prática profissional, submetia-se às exigências da supervisão e da avaliação docente. De certo modo, a forma de lidar com essas novas exigências deflagra preocupações, ansiedade e desajuste na vida pessoal (Mota et al., 2019; Moura et al. 2019).

Quanto aos cursos de graduação e a exposição às dimensões da síndrome de Burnout, o curso de Análise e Desenvolvimento de sistemas apresentou menores chances de exposição à exaustão emocional, quando comparado ao curso de Pedagogia. Explicando esse resultado, pode-se considerar que a maioria dos estudantes do curso de Pedagogia havia tido contato com a prática profissional de ser professor. O estudo de Goebel e Carlotto (2019) revelou que a multiplicidade de papéis desempenhada pelos professores, a dificuldade em conciliar trabalho e lazer, as relações estabelecidas com os alunos podem ser estressores profissionais que fomentam inclusive o abandono profissional. De fato, a síndrome de Burnout pode ser desencadeada em razão do estresse crônico estabelecido no ambiente de trabalho (Gil-Monte, 2003).

Os dados deste estudo revelaram que os estudantes mais satisfeitos com seus cursos de graduação estavam menos expostos aos fatores da síndrome. Nessa perspectiva, Müller Saleme de Sá, de Oliveira Martins-Silva e Funchal (2014) revelaram que profissionais satisfeitos com o ambiente de trabalho estão menos expostos às dimensões da síndrome de Burnout, pois a satisfação no ambiente de trabalho está diretamente relacionada com a redução da exaustão emocional e da despersonalização e com o aumento da realização profissional.

As análises evidenciaram que, entre os cursos de graduação analisados, os estudantes do curso de Análise e Desenvolvimento de Sistemas têm menores chances de desenvolverem a exaustão emocional em relação aos alunos dos cursos de Pedagogia e Administração. O curso de Pedagogia contém o maior percentual (48.6%) de estudantes com exaustão emocional, quando comparado com todos os outros cursos analisados.

Brandão e Pardo (2016), ao investigarem estudantes de Pedagogia de uma universidade na região nordeste do Brasil relataram que a insatisfação com a escolha do curso, em razão das condições de trabalho e da desvalorização social da profissão docente, contribui para o aumento da exaustão emocional. Isso corrobora os achados da presente pesquisa, na qual os estudantes de Pedagogia demonstraram maiores chances de apresentar exaustão emocional. Verificou-se, porém, que os estudantes da área de pedagogia eram os que se sentiam mais eficazes (79.9%) na profissão em relação aos dos outros cursos. Tal fato pode estar relacionado à percepção pessoal sobre o grau de importância representado pela profissão.

Ainda quanto à exaustão emocional, evidenciou-se que os alunos do curso de Administração apresentaram maiores chances de desencadear essa dimensão em relação aos alunos de Análise e Desenvolvimento de Sistemas. Prevalências semelhantes foram encontradas por Campos et al., (2012), ao investigarem estudantes nas fases finais dos cursos de Administração e Ciências Contábeis: 16.4% dos homens e 25.0% das mulheres apresentaram exaustão emocional, fator que pode ser explicado pelas longas horas de estudos decorrentes da carga horária desses cursos e pela pressão por parte dos familiares e professores.

No curso de Ciências Contábeis, a prevalência de estudantes acometidos pela síndrome foi de 11.4 %, corroborando os estudos de Peleias et al. (2017) que, ao investigarem estudantes do curso de Ciências Contábeis de diferentes instituições, relataram a existência da exposição à síndrome quando eles tinham a percepção de não se sentirem capacitados para o exercício profissional.

Os estudos diferenciaram-se em relação aos participantes e às metodologias aplicadas, percebeu-se que a maioria das pesquisas encontradas investigaram uma área de conhecimento e relacionaram as variáveis entre seus pares. As evidências encontradas neste estudo revelam a prevalência da síndrome de Burnout em diferentes cursos com suas distintas realidades.

Como limitação no desenvolvimento desta pesquisa, destaca-se seu delineamento metodológico como estudo transversal, não permitindo inferir, por meio de análise longitudinal, um nexo causal entre a síndrome e as condições acadêmicas dos universitários. Por conseguinte, novos estudos são necessários para obtenção de parâmetros mais amplos acerca do acometimento da síndrome em alunos da graduação, visando fomentar o planejamento de ações estratégicas nas instituições de ensino superior, a fim de amenizar impactos negativos e estabelecer situações de aprendizagem mais favoráveis.

Referências

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Notas de autor

Enviar correspondencia a: Mota, I. D.: irisdantas83@gmail.com

Información adicional

Citar este artículo como: Mota, Í. D. da et al. (2022). Prevalência da síndrome de Burnout em diferentes áreas acadêmicas e a relação com as características sociodemográficas. Revista Argentina de Ciencias del Comportamiento, 14(1), 82-90

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