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Os desafios da governança da inovação nas empresas mais inovadoras do sul do Brasil
Tamiris Giacomelli Dinkowski[1]; Luís Carlos Pertile1
Tamiris Giacomelli Dinkowski[1]; Luís Carlos Pertile1
Os desafios da governança da inovação nas empresas mais inovadoras do sul do Brasil
The challenges of innovation governance in the most innovative companies of the south of Brazil
Revista Base (Administração e Contabilidade) da UNISINOS, vol. 16, núm. 2, pp. 256-288, 2019
Universidade do Vale do Rio dos Sinos
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Resumo: O presente estudo buscou identificar quais são as práticas de governança da inovação utilizados por algumas das empresas mais inovadoras do Sul do Brasil, assim como os maiores desafios para a sua implantação e manutenção. Para tanto, a técnica de pesquisa utilizada foi a entrevista em profundidade com participação do entrevistador, onde foram entrevistados os Presidentes de Conselho de três empresas componentes do ranking Campeãs da Inovação do Sul, publicado pela Revista Amanhã. A realização das entrevistas possibilitou o entendimento sobre o funcionamento da gestão da inovação destas empresas, o funcionamento da estrutura de governança corporativa, assim como o papel dos Conselhos de Administração e a relação que ambos possuem entre si, a fim de formar uma estrutura de governança da inovação, cumprindo, dessa forma, os objetivos propostos pelo estudo. Posteriormente, através do método de pesquisa comparativo foram relacionados os resultados das entrevistas a fim de verificar semelhanças e dessemelhanças entre as sistemáticas de trabalho destas empresas. Com o estudo pode-se perceber que, apesar de não estar formalizado, as três empresas utilizam os preceitos da governança da inovação, objetivando manter fortalecida a cultura da inovação. Ainda, pode-se constatar que o maior desafio para a implantação e manutenção da temática está no perfil das pessoas que ocupam os cargos de liderança, que precisam ter internalizado a importância da inovação para então garantir sua perpetuidade dentro da organização.

Palavras-chave:Governança CorporativaGovernança Corporativa, Inovação Inovação, Conselho de Administração Conselho de Administração, Gestão Gestão, Governança da Inovação Governança da Inovação.

Abstract: The present research investigated the innovation governance practices used by the most innovative companies in the South of Brazil, as well as the main challenges for its implementation and maintenance. Therefore, the research technique used was the interview, with the Council Presidents of three of the most innovative companies of the South of Brazil. The interviews allowed the understanding about the functioning of the innovation management of these companies, the functioning of the corporate governance structure, as well as the role of the Boards of Directors and the relationship that both have among themselves in order to form a structure of innovation governance. Subsequently, through the comparative research method, the results of the interviews were related in order to verify similarities and dissimilarities between the work systematics of these companies. The study shows that, although it’s not formalized, the three companies use the precepts of innovation governance, aiming to keep the culture of innovation strengthened. Also, shows that the greatest challenge for the implementation and maintenance of the innovation governance in these companies is the profile of the leadership, who must have internalized the importance of innovation and then guarantee its perpetuity within the organization.

Keywords: Corporate Governance, Innovation, Boards of Directors, Management, Innovation Governance.

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Os desafios da governança da inovação nas empresas mais inovadoras do sul do Brasil

The challenges of innovation governance in the most innovative companies of the south of Brazil

Tamiris Giacomelli Dinkowski[1]
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul-PUCRS, Brasil
Luís Carlos Pertile1
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul-PUCRS, Brasil
Revista Base (Administração e Contabilidade) da UNISINOS, vol. 16, núm. 2, pp. 256-288, 2019
Universidade do Vale do Rio dos Sinos

Recepção: 15 Agosto 2018

Aprovação: 05 Junho 2019

Introdução

O ambiente empresarial acirrado encontrado atualmente no mundo, onde o nível de exigência por parte dos consumidores apresenta constante crescimento, impõe às empresas a buscarem mecanismos que fomentem sua competitividade, aliando o acesso à alta tecnologia com alto desempenho financeiro. Para tanto, a inovação tem sido destacada como uma força renovadora e propulsora de empresas e, consequentemente, do crescimento sustentável das nações.

A inovação é uma técnica orientada pela habilidade de estabelecer relações, detectar oportunidades e tirar proveito delas. No entanto, vai além de apenas apresentar ao mercado novos produtos, envolve a cultura organizacional e as ações desenvolvidas pela empresa, a criatividade atrelada ao processo juntamente com a forma de resolver os problemas e a própria postura frente ao tema inovação (Sander, Theis & Schreiber, 2014; Tidd & Bessant, 2015).

Apesar das diversas definições encontradas sobre o termo na literatura, sabe-se que sua natureza é fundamentalmente o empreendedorismo, que envolve elementos como conhecimento técnico, conhecimento em gestão e cultura empreendedora, fazendo com que a inovação passe a ser um dos principais temas para a competitividade empresarial. Tidd e Bessant (2015, p.7) reforçam que “a inovação tem se transformado no elemento central da política econômica mundial”.

Não obstante, há 10 anos, é publicado pela Universidade de Cornell em parceria com a escola de negócios Insead e a Organização Mundial de Propriedade Intelectual, o Índice Global de Inovação, qual fornece, através de 81 indicadores, métricas detalhadas sobre o desempenho da inovação em 127 nações. Países como Suíça, Suécia, Noruega e Estados Unidos ocupam, há sete anos, as primeiras posições. O Brasil, apesar de ser considerado um país com potencial criativo, está estagnado na posição 69º há três anos, atrás dos vizinhos latino americanos Chile (46º), Costa Rica (53º), México (58º), Panamá (63º), Colômbia (65º) e Uruguai (67º). No ranking das 50 empresas mais inovadoras no mundo, publicado pelas mesmas organizações, não consta nenhuma brasileira.

Corroborando com os dados expostos, Sander et al. (2014) reforçam que a gestão empresarial pode ser um inibidor interno da inovação se não conseguir equilibrar a gestão diária, pautada em processos e rotinas, com a gestão de futuro, qual desenvolve cenários e cria novas ideias. Portanto, para garantir a sustentação necessária que a gestão da inovação requer, cada vez mais, tem-se utilizado os princípios da governança corporativa.

A governança corporativa é um dos sistemas de gestão mais inovadores presente no mercado, pelo qual as entidades são dirigidas e monitoradas, envolvendo o relacionamento entre todas as partes interessadas. As boas práticas de governança convertem princípios em diretrizes objetivas, alinhando os interesses a fim de aumentar o valor da sociedade, facilitar o acesso ao capital e contribuir para sua perenidade.

Em seus primórdios, a governança corporativa existiu basicamente para sanar os conflitos de interesse entre o proprietário do capital e o gestor da empresa, o chamado conflito de agência. No entanto, com a evolução ao longo dos anos, passou a ser uma série de práticas que possibilitam que as empresas sejam mais valorizadas e tenham maior perspectiva de desenvolvimento sustentável.

Ademais, recentemente outro termo passou a ser discutido no meio acadêmico e empresarial, a governança da inovação, qual reorganiza os princípios da governança corporativa alinhados à gestão da inovação, desburocratizando processos e tornando a tomada de decisão mais rápida. Para Deschamps (2012a) um modelo de governança da inovação descreve como a equipe de gerenciamento de uma empresa opta por alocar responsabilidades para a inovação. Para o autor, embora o termo governança da inovação ainda não seja tão comum, a maioria das empresas gerencia a inovação segundo um modelo organizacional que vai além de um simples modelo de gestão. Envolve a filosofia empresarial e o comprometimento do pessoal do topo, requisitos que são garantidos apenas com estruturas de governança.

Dessa forma, assumindo que a governança corporativa define a estrutura organizacional da empresa, as relações que a mesma possui e suas diretrizes estratégicas de competitividade; que a inovação envolve a cultura dessa organização e; que a governança da inovação é o alinhamento dos princípios de ambas as temáticas, construiu-se a seguinte questão de pesquisa: quais são os maiores desafios da governança da inovação para a garantia da competitividade nas empresas mais inovadoras do sul do Brasil?

O objetivo geral do presente estudo foi o de identificar as práticas de governança da inovação utilizadas por algumas das empresas mais inovadoras do sul do País, assim como os principais desafios para sua implementação e manutenção. Para tanto destacam-se os objetivos específicos que tornam possível o alcance do objetivo geral: 1) compreender a gestão da inovação das empresas; 2) entender o sistema de governança e funcionamento do Conselho de Administração das mesmas; 3) identificar as principais práticas de governança da inovação e; 4) verificar quais os principais desafios encontrados para a garantia da competividade em inovação destas empresas.

A estratégia metodológica utilizada para sanar o problema do presente estudo e seus objetivos, apoia-se na pesquisa qualitativa e descritiva, com as pesquisas bibliográfica e documental como forma de obtenção da informação. O método utilizado foi o comparativo, valendo-se dos dados coletados pela técnica de entrevistas em profundidade, quais foram realizadas com os Presidentes do Conselho de algumas das empresas mais inovadoras do Sul do Brasil, segundo o ranking publicado pela Revista Amanhã.

Dessa forma, o presente estudo traz, no capítulo 2, os conhecimentos e teorias já existentes sobre os temas analisados: inovação, governança corporativa e governança da inovação. Logo após é apresentada a estratégia metodológica seguida pela análise dos resultados e as conclusões obtidas pelos autores do estudo. Para encerramento, são apresentadas as limitações da pesquisa, assim como as sugestões para pesquisas futuras.

A Inovação

A inovação pode ser definida como a combinação de conhecimentos, técnicas e tecnologias aplicados a um processo organizacional ou a um público específico, onde resulte em um produto ou processo novo ou fortemente modificado, que gere valor econômico para a empresa ou ente que concebeu a ideia (Manual de Oslo, 2009; Sander et al., 2014; Terra et al., 2012).

Tidd e Bessant (2015), complementam afirmando que a inovação é muito mais do que ter boas ideias, é o processo de fazê-las evoluir para um uso prático dentro das possibilidades já existentes. Citam como exemplo de que nada adiantaria a invenção da lâmpada de Thomas Edison, se não houvesse a eletricidade para fazê-la acender.

Segundo Moré e Gonçalo (2016), o processo de inovação se baseia em ações comportamentais desenvolvidas pelas empresas que, potencializadas pelo ambiente, resultem na criação de novos produtos, serviços ou ainda na melhoria em processos. Sander et al. (2014), complementam afirmando que a inovação deve ser um processo continuado e não apenas ideias repentinas. O assunto deve fazer parte das estratégias da empresa, pensando no objetivo a ser atingido e nos riscos decorrentes dele.

A última edição do Manual de Oslo, publicado pela OCDE[2] em 2005, que orienta o tema inovação ao redor do mundo, reconhece quatro tipos de inovação: de produto ou serviço, de processo, de marketing e organizacional. As inovações de produto envolvem mudanças significativas nas potencialidades de produtos ou serviços, resultando em produtos ou serviços totalmente novos ou fortemente modificados. As inovações em processos envolvem mudanças significativas nos métodos de produção ou distribuição. As inovações organizacionais envolvem mudanças no modelo de negócios, nas práticas mercadológicas, na organização do local de trabalho ou nas relações externas da empresa. Já as inovações em marketing, incluem as mudanças no design do produto ou em sua embalagem, na promoção dele ao mercado e nas relações com os consumidores finais.

Não existe na literatura uma data onde demarca o nascimento da inovação, no entanto, desde o domínio do fogo e a invenção da roda que demarcaram a transição do período paleolítico para o neolítico, a evolução trazida pela inovação passa a fazer parte da vida do ser humano e, posteriormente, das empresas. Acontecimentos como o lançamento da Ford Company em 1903, o primeiro voo de Santos Dumont em 1906, o surgimento da televisão em 1930, a criação do telefone e posteriormente do telefone móvel em 1973, a primeira música a ser lançada apenas para download em 2006 e, o anúncio do primeiro smartphone em 2007, são revoluções que demarcam o histórico da inovação e demonstram que a velocidade com que as mesmas impactam a sociedade é cada vez mais crescente (Polydoro, 2015; Tidd & Bessant, 2015).

No entanto, segundo Tidd e Bessant (2015), foi apenas com o advento da internet, o surgimento das redes sociais e das empresas de crescimento exponencial – startups, que a inovação passou a ser amplamente discutida e se tornou o assunto principal em todos os setores da economia mundial. Para os autores, a tecnologia da informação possibilitou a criação de novos mercados e alterou significativamente aqueles já existentes. O Facebook®, com 800 milhões de usuários, representa a mudança nas formas de consumo e de convivência, consequentemente influencia também nos diferenciais competitivos que o setor empresarial precisa apresentar ao mercado.

Corroborando com a ideia, Terra et al. (2012) salientam que o cenário competitivo mudou nas últimas décadas, tornando-se mais complexo, interdependente e com mudanças bruscas ocorrendo em ciclos cada vez menores. Não apenas produtos e serviços novos são lançados de forma mais rápida e intensa, mas a configuração dos modelos de negócios, modelos de cooperação e sourcing de recursos também tem se transformado rapidamente.

Embora a inovação seja, cada vez mais, vista como uma importante maneira de assegurar a vantagem competitiva de um empreendimento, o sucesso não é sempre garantido. Pelo contrário, apostar em inovação, é também correr inúmeros riscos, muitos dos quais não são possíveis de mapear no início do processo. Saber lidar com o fracasso de uma ideia exige muita maturidade e resiliência na gestão das empresas, por isso, torna-se importante se atentar para a gestão da inovação (Polydoro, 2015; Tidd & Bessant, 2015).

Para Polydoro (2015) a inovação não pode ser apenas discurso, a gestão da empresa precisa fazer a temática transbordar em todas as áreas, com métodos e práticas e uma forte ancoragem em capital humano. Ainda, ressalta que é preciso estar conectado a três pilares essenciais: apresentar relevância para o consumidor, apresentar um diferencial competitivo frente aos concorrentes e apresentar resultados para os acionistas da empresa. Tidd e Bessant (2015) contribuem afirmando que a administração da empresa precisa garantir quatro fases na gestão da inovação: 1) a busca por ideias; 2) a seleção das ideias nas quais serão investidos os recursos; 3) a execução destas ideias e; 4) a captura de valor, onde serão medidos os retornos, financeiros ou não, das inovações criadas.

Dessa forma, pode-se considerar a inovação como um processo, qual pode ser planejado e gerenciado, possuindo ações específicas, alocação de recursos e tomada de decisão próprias. No entanto, este processo não é linear, e sim combinatório, onde a interação é o fator crítico. Ou seja, o contexto organizacional com valores, cultura e crenças são essenciais para a inovação. Dessa forma, o desafio dos gestores é eliminar burocracias e estruturas inúteis que bloqueiam a comunicação e boas ideias, mas sem instituir o caos de organizações não regradas (Moré & Gançalo, 2016; Tidd & Bessant, 2015).

Terra et al. (2012) reforçam que é preciso entender qual o mercado de atuação da empresa para então definir qual a orientação para a gestão da inovação. Mercados mais maduros, como metal-mecânico, moveleiro e de vestuário, tendem a implementar inovações mais voltadas a processos e possuírem uma cultura mais rígida. Mercados emergentes, como tecnologia, energia alternativa e biotecnologia, tendem a lançar inovações mais disruptivas e possuírem uma cultura mais livre. Não existe uma fórmula para a implementação da inovação, é necessário analisar o ambiente da empresa, identificar as oportunidades e saber aplicar o seu know-how. Os autores ainda salientem que, a história das grandes invenções e expansões empresariais que resultaram em fracassos, está ligada às organizações que buscaram mercados e/ou tecnologias que eram pouco familiares com sua realidade.

No Brasil, alguns esforços na esfera governamental buscam incentivar a gestão da inovação dentro das empresas. Alguns marcos como a criação do fundo setorial de ciência e tecnologia[3] em 1999, a promulgação da Lei da Inovação[4] em 2004, o aperfeiçoamento dos incentivos fiscais em prol da inovação em 2005 com a Lei do Bem[5], o lançamento de diversos programas para financiamento da inovação pela Financiadora de Estudos e Projetos- FINEP, são alguns passos importantes para estimular os investimentos privados na inovação das empresas (Cavalcante & De Negri, 2011).

Além disso, o IBGE realiza, a cada três anos, o PINTEC, uma pesquisa que leva em consideração os fundamentos trazidos pelo Manual de Oslo para avaliar a capacidade inovativa atrelado ao PIB brasileiro. Segundo Cavalcante e De Negri (2011) estes dados são usados para traçar as políticas em prol do incentivo à inovação, além de traçar comparativos setoriais e internacionais.

No entanto, apesar de todos estes esforços governamentais em prol do incentivo à inovação, o Brasil ainda se encontra na posição 69º no ranking de países mais inovadores do mundo, com uma pontuação média de 34,95. A Suíça, primeira colocada no ranking, possui pontuação de 68,30. Um dos pontos de maior destaque para a pontuação baixa do país neste ranking é a falta de gestão orientada à inovação nas empresas brasileiras. E, em termos de gestão, o maior esforço deve vir da esfera empresarial e não governamental.

Polydoro (2015) ressalta que para ser eficiente, a inovação precisa estar no DNA da empresa e fazer parte das estratégias de todos os setores, a época em que apenas o setor de inovação falava sobre a temática já não existe mais. Para o autor, não adianta lançar um ótimo produto se o vendedor não quer vende-lo ou se o setor de investimentos tem outras prioridades.

Sander et al. (2014) corroboram afirmando que, o maior desafio das organizações é manter a inovação organizacional, pois, segundo os autores, é somente com a excelência em gestão e com a orientação adequada à inovação, que as demais esferas da inovação poderão acontecer. Ou seja, apostar em mudanças e novas ideias, assumir riscos e valorizar as pessoas são pilares fundamentais para uma estratégia voltada à inovação. Isso significa modificar a forma de pensar e redesenhar a estrutura organizacional e gerencial das empresas, e este tipo de modificação somente é possível quando a estrutura de governança corporativa é sólida e orientada à gestão da inovação.

A Governança Corporativa

A governança corporativa tem como objetivo definir regras e padrões de relacionamento dentro das empresas. É o sistema pelo qual as mesmas são dirigidas e monitoradas, envolvendo o relacionamento entre acionistas, Conselho de Administração e gestão, convertendo princípios em diretrizes objetivas e alinhando interesses, a fim de aumentar o valor da sociedade, facilitar o acesso ao capital e contribuir para sua perenidade (Canto, 2016; IBGC, 2015; Moré & Gonçalo, 2016).

Terra et al. (2012) complementam afirmando que a governança se refere aos processos, sistemas e estruturas de autoridade pelos quais as organizações alocam seus recursos e coordenam suas atividades. Para os autores, o grande objetivo da governança corporativa é garantir que os indivíduos da corporação atuem de maneira adequada para atingir objetivos maiores, relacionados a todas as partes interessadas. Dessa forma, a governança define os papeis e responsabilidades de todos os envolvidos no processo, incluindo direção, articulação, comunicação, processos decisórios, alocação de recursos, políticas e práticas.

Birk (2012), explica que o termo governança deriva do latim gubernare, que significa conduzir, comumente usado na condução de um navio, o que implica que a governança envolve a função de direção e não de controle. Segundo a autora, a governança é algo voltado à estratégia da organização e não puramente em sua execução.

Apesar de não haver uma data específica para o surgimento dos estudos em governança corporativa, a necessidade da implementação de seus princípios é decorrente de seis processos históricos: 1) o desenvolvimento do capitalismo e do mundo corporativo, ocorrido após as duas primeiras revoluções industriais; 2) o agigantamento e poder das empresas, decorrentes do grande aumento da riqueza do mundo corporativo e do rápido desenvolvimento tecnológico; 3) a dispersão do capital de controle, decorrente do crescimento e desenvolvimento das sociedades por ações e o surgimento das bolsas de valores; 4) a separação da propriedade e gestão, oriunda da profissionalização do corpo executivo das empresas; 5) o conflito de agência, onde ocorre a disparidade de interesses entre gestão e propriedade e; 6) o surgimento da necessidade de mecanismos que organizassem o novo formato de empresas, fortalecendo os relacionamentos e alinhando os interesses, despertando, desta forma, o conceito de governança corporativa (Rossetti & Andrade, 2014).

No Brasil, a temática começou a ser fortemente estudada apenas após a criação do, hoje, denominado Instituto Brasileiro de Governança Corporativa- IBGC, em 1995. A partir desta data, o IBGC assumiu o papel de formular e debater questões do universo dos Conselheiros de Administração, componentes do principal órgão da estrutura de governança, o Conselho de Administração. Ainda, marcos como a criação da Comissão de Valores Mobiliários- CVM e a categorização dos níveis diferenciados de governança pela Bolsa de Valores de São Paulo- BM&BOVESPA, contribuíram para a evolução das melhores práticas de governança no país e colocaram a temática como um fator de desenvolvimento das organizações (Canto, 2016; IBGC, 2015; Rossetti & Andrade, 2014).

O Conselho de Administração é mundialmente reconhecido como o principal órgão na estrutura de governança corporativa, pois ele é diretamente relacionado à construção estratégica da empresa. Segundo o Manual de Boas Práticas em governança corporativa, publicado pelo IBGC em 2015, o Conselho de Administração é o guardião do objeto social da empresa e sua estrutura de governança, portanto, é ele quem define os rumos do negócio, conforme o melhor interesse para a organização.

Dessa forma, conforme Moré e Gonçalo (2016), o Conselho de Administração precisa pensar a estrutura de governança de maneira com que os problemas atuais e futuros possam ser solucionados com maior agilidade e sem burocracias desnecessárias, tornando a empresa mais competitiva e abrindo espaço para que a inovação seja possível. Os autores ainda reforçam que, instituições lentas e com processos decisórios morosos implicam em empresas menos inovadoras e com menor grau de competitividade.

Na prática, os mecanismos de governança precisam combinar a capacidade de pensar estrategicamente com um papel de mediação entre as partes interessadas, possibilitando um alinhamento entre os objetivos de todos os envolvidos. Em se tratando de inovação, a governança não pode ser apenas a controladora, mas sim a facilitadora da direção a ser seguida. O papel do Conselho pode não ser o de decidir o que fazer com a temática, mas deverá empoderar alguém para a tomada desta decisão (Arnold et al., 2003).

Para Pacheco e Gomes (2016) a principal contribuição que a governança pode trazer para a inovação é criar ambientes favoráveis para o despertar da criatividade, fazendo com que o novo não seja temido e sim perseguido.

A Governança da Inovação

A governança da inovação pode ser definida como a estrutura que define a missão, foco e implementação da inovação na empresa, definindo as políticas da inovação e abordando o conteúdo dos projetos e os processos para que eles sejam executados (Deschamps, 2012a).

Polydoro (2015) ressalta que, sendo a criatividade um dos principais motrizes da inovação, incentivar a mesma dentro da organização deve ser primordial, para isso, é necessário que os funcionários estejam à vontade em expressar suas ideias e sugestões. Esta abertura por parte da alta gerência somente será possível quando a cultura organizacional estiver alinhada para tal e essa é a missão principal da governança da inovação.

Segundo Nagano, Stefanovitz e Vick (2014) é na concepção inteligente de rotinas, na configuração de poderes e responsabilidades e na cultura estabelecida que reside os pontos chaves para a consistência da inovação. O nível de capacidade das lideranças em compreender a complexidade da inovação e saber governá-la é o grande desafio da estrutura de governança, mais precisamente, da governança da inovação.

Terra et al. (2012) acrescentam que, sendo a inovação um tema transversal e com impacto em praticamente todos os departamentos, empresas de médio e grande porte precisam estabelecer regras bem definidas para a cultura da inovação, de modo que estejam alinhadas com as estratégias futuras dela. O autor cita que, nestas empresas, o principal ponto da governança da inovação é o estabelecimento de comitês de inovação, normalmente formados pela alta gerência.

Nestas empresas, principalmente, onde há um histórico de operações estáveis, a inovação não ocorre de forma espontânea, é necessário poder organizacional para facilitar, coordenar e decidir. Ela envolve esforços multifuncionais e forte orquestração entre as funções. E esta orquestração apenas ocorre quando a organização das equipes, a divisão de papeis e responsabilidades sejam aderentes ao desafio de inovar. Para Nagano et al. (2014) são necessários três eixos para a construção da estrutura de inovação numa empresa: políticas de recursos humanos, estilo de liderança e orientação estratégica. Todos os três são responsabilidades diretas de quem orienta a governança dentro da organização, ou seja, o Conselho de Administração.

Deschamps e Nelson (2014) complementam afirmando que o Conselho de Administração tem papel fundamental na definição do processo de inovação das organizações, pois é este órgão o responsável por estabelecer a estratégia de inovação, definir o risco adequado, auditar as capacidades de inovação, avaliar o desempenho da gestão da inovação e selecionar o CEO que tenha perfil voltado à temática.

Apesar de não haver uma definição exata para o termo, de modo geral, a governança da inovação é “o jeito de fazer as coisas aqui”, ou seja, a maneira como a empresa se estrutura para incentivar que todos os processos relacionados à inovação possam ser cumpridos e controlados. De maneira simplista, é a rotina estipulada para incentivar a inovação (Tidd & Bessant, 2015). Esta rotina pode passar pela definição de um departamento de pesquisa e desenvolvimento, pela flexibilidade de horários dos colaboradores, pelas paredes do ambiente de trabalho serem pintadas de cores vibrantes, pela caixa de sugestões de melhorias, etc. Independentemente das ações ou estruturas a serem criadas, elas formarão a cultura organizacional da empresa, qual definirá como os processos para inovação ocorrerão na mesma. Esta estrutura é denominada governança da inovação (Deschamps, 2012b; Terra et al., 2012; Tidd & Bessant, 2015).

Os professores Jean-Phillippe Deschamps e Beebe Nelson, do Instituto Internacional de Desenvolvimento em Gestão- IMD[6], desenvolveram uma pesquisa durante o ano de 2014 com as 133 empresas mais inovadoras dos Estados Unidos, Europa e Ásia, buscando reconhecer os modelos de governança da inovação mais utilizados em cada uma dessas empresas. A pesquisa resultou em 8 diferentes modelos, que serão utilizados pelos autores do presente artigo como referências para a análise das empresas mais inovadoras do Sul do Brasil. Os modelos são resumidamente explicados a seguir:

1) A alta administração sendo o comitê de inovação: neste modelo quem exerce a responsabilidade pela inovação da empresa é um grupo formado pela alta administração, fazendo com que a inovação seja tratada de forma multidisciplinar e orientada do topo. Dessa forma, a governança tende a enfatizar mais fortemente a criação de novos produtos e serviços, deixando os processos como secundários na gestão da inovação. Empresas como Nestlé, Lego e IBM se utilizam deste modelo de governança da inovação.

2) O CEO da empresa como precursor da inovação: neste modelo destaca-se a figura da liderança principal da empresa, normalmente seu fundador, como sendo o precursor e orientador da inovação. Dessa forma, a inovação representa a prioridade máxima da empresa e a cultura organizacional é totalmente orientada em prol da inovação. Empresas como Apple e Facebook são exemplos que se utilizam deste modelo.

3) A formação de um comitê de inovação: neste modelo é formado um comitê de inovação que será responsável pelo tema dentro da organização. Difere do modelo 1, pois as pessoas são escolhidas conforme seu entusiasmo pela temática, independentemente do cargo dentro da empresa. Neste caso, as inovações são mais incrementais do que disruptivas. Empresas como Philips, Tetra Park e Roche são exemplos da utilização deste modelo.

4) O Diretor de P&D ou Diretor de Tecnologia como responsáveis pela inovação: este modelo é encontrado em empresas que investem fortemente em pesquisa e desenvolvimento, principalmente para a criação de novos produtos, por isso, o departamento de P&D ou de tecnologia se tornam os responsáveis pela temática inovação. Este modelo de governança é amplamente utilizado em países com forte tradição em tecnologia e engenharia como Japão, Alemanha, Suécia e Suíça, sendo comum entre montadoras de automóveis.

5) O departamento de inovação: é o modelo menos utilizado, onde existe um departamento específico dentro da organização servindo como catalizador do tema. É responsável por servir de suporte para todas as demais áreas, organizando as ações que incentivem e promovam a inovação dentro da empresa, além de medir os esforços e resultados destas ações. Este modelo trabalha mais o processo da inovação do que propriamente a aplicação da mesma. Um dos exemplos mais interessantes da aplicação deste modelo de governança é da empresa holandesa DSM.

6) Os intraempreendedores ou campeões da inovação: neste modelo a inovação não é propriamente delegada a alguém ou a algum grupo, são os próprios gerentes e colaboradores que, por inciativa própria, iniciam projetos inovadores dentro da empresa. Não há um regramento ou um processo formal, apenas a cultura organizacional é orientada e incentivada para a geração de ideias por parte dos colaboradores. Empresas como 3M e PepsiCo são exemplos que utilizam este modelo.

7) Nenhuma estrutura: este modelo possui dois vieses. O primeiro, acontece em empresas nas quais o DNA empresarial já é totalmente voltado à inovação, dessa forma, a inovação acontece naturalmente, sem a necessidade de uma estrutura formal para gerenciamento da inovação, ou a empresa ainda não encontrou o melhor modelo para se adequar, são os exemplos das startups. O segundo viés, são empresas extremamente tradicionais, que acreditam que a inovação não é um fator crítico, portanto, não trabalham com nenhuma estrutura orientada para a temática.

8) O duo da inovação: este é o segundo modelo menos utilizado, onde são escolhidos apenas dois Diretores para serem responsáveis pelas ações da inovação na empresa. Normalmente são traçados planos de ação de curto prazo para a realização de inovações incrementais, principalmente nos processos. Empresas de logística são as que mais se utilizam deste modelo.

Dessa forma, buscando atingir o objetivo geral desta pesquisa, que é de identificar as principais práticas de governança da inovação utilizados por algumas das empresas mais inovadoras do Sul do País, assim como os principais desafios para sua implantação e manutenção, os autores utilizaram como parâmetros os oito modelos apresentados pelo estudo de Deschamps e Nelson, fazendo um comparativo entre as principais diferenças e semelhanças apresentadas pelas empresas estudadas.

Método

A estratégia metodológica do presente estudo se divide em quatro partes: a primeira apresenta os tipos de pesquisa, a segunda descreve o método utilizado, a terceira apresenta a técnica de coleta de dados e, por conseguinte, a quarta parte descreve o grupo amostral utilizado para análise.

Os tipos de pesquisa descriminam a abordagem do pesquisador quanto a forma de obtenção e processamento da informação. No caso deste estudo, foram utilizadas as pesquisas documental, bibliográfica e qualitativa para a busca de informação a fim de embasar a estrutura teórica do artigo.

Segundo Fachin (2006) a pesquisa bibliográfica é um conjunto de conhecimentos já existentes sobre determinado assunto, que visa complementar os outros tipos de pesquisa. Tal procedimento permite ao estudioso relacionar o presente com o passado e projetar o futuro, com o objetivo de entender mais sobre os assuntos pesquisados.

No presente estudo, a pesquisa bibliográfica foi utilizada como forma de descobrir as teorias, dados e informações já existentes sobre os assuntos abordados, se utilizando de autores e obras consagradas nas temáticas de governança e inovação.

Por conseguinte, foi também utilizada como fonte de informação a pesquisa documental, que possui como maior característica a análise de documentos que ainda não receberam um tratamento analítico, ou seja, é uma pesquisa realizada em fontes primárias.

Documento é todo objeto que se torna suporte material para alguma informação, transformando-se numa fonte durável e compartilhável (Severino, 2007). Desta forma, a pesquisa documental busca identificar informações factuais que não tiveram influência de qualquer outro pesquisador, diferenciando-se da pesquisa bibliográfica através das fontes utilizadas. Enquanto a pesquisa bibliográfica se utiliza de fontes científicas, a pesquisa documental se utiliza de fontes sem nenhuma intervenção científica, requerendo maior atenção e análise por parte do pesquisador (Sá-Silva, Almeida, & Guindani, 2009).

Para o presente estudo, foram utilizados os documentos que transcrevem a governança corporativa e a gestão da inovação das empresas analisadas, como regimento interno, relatórios e demonstrações. Tal pesquisa foi utilizada para que se pudesse ter um entendimento prévio sobre as organizações a fim de embasar a técnica das entrevistas.

Por fim, como o último tipo de pesquisa quanto aos procedimentos técnicos para a busca da informação, utilizou-se a pesquisa qualitativa. Segundo Flick (2009) a pesquisa qualitativa se dirige à análise de casos concretos e suas peculiaridades, partindo das expressões e atividades das pessoas em seus contextos locais. Rey (2005) corrobora afirmando que este tipo de pesquisa envolve a imersão do pesquisador no campo de pesquisa, entendendo o local e os elementos que compõem o conjunto dos fenômenos estudados. Dessa forma, a pesquisa qualitativa busca saber quais são as razões que levam as pessoas a tomarem determinadas decisões e como isso influencia nos fenômenos da sociedade. O uso deste tipo de pesquisa no artigo em questão, se justifica pelo fato de que o objetivo foi o de entender a relação entre os temas abordados e os desafios que a governança da inovação representa nas empresas, considerando a opinião e percepção dos entrevistados.

Quanto aos objetivos pretendidos com o estudo, o tipo de pesquisa utilizado foi a pesquisa descritiva que, segundo Rodrigues (2006), busca descrever fenômenos ou estabelecer relações entre variáveis, onde o pesquisador busca analisar estas informações ao tempo em que elas acontecem, sem manipulá-las.

O método utilizado no presente estudo foi o comparativo, qual permite que, através da observação das semelhanças e dessemelhanças dos fenômenos, o pesquisador possa analisar a relação entre as variáveis estudadas. Segundo Fachin (2006), este método se manifesta como uma forma de investigação indireta, permitindo a análise de dados concretos que partem da dedução de elementos constantes, abstratos e gerais.

Rodrigues (2006) ressalta que, o método comparativo permite o estudo de grupos em diferentes estágios de desenvolvimento, uma vez que é possível analisar e comparar as diferenças e equivalências dentro do grupo, sem que ele seja homogêneo.

Dessa forma, o método comparativo foi utilizado para analisar os pontos de semelhanças na governança da inovação das empresas mais inovadoras do Sul do País quais, apesar de comporem o ranking das mais inovadoras, possuem segmentos e estágios de desenvolvimento discrepantes.

Conforme Rodrigues (2006), enquanto o método estabelece o que fazer, a técnica estabelece como fazer, ou seja, são as técnicas que operacionalizam os métodos. Desta forma, a técnica utilizada para operacionalizar o método comparativo foi a técnica da entrevista, em sua natureza semiestruturada, com participação do pesquisador.

A entrevista é uma técnica de coleta de dados verbal, sendo uma das principais abordagens da pesquisa qualitativa, onde o pesquisador busca a maior abertura possível com o entrevistado, a fim de suprir com os objetivos do tema estudado (Flick, 2009).

Severino (2007), complementa afirmando que pelo fato de permitir a interação entre pesquisador e pesquisado, a técnica da entrevista permite analisar o que os sujeitos pensam, sabem e representam frente aos assuntos abordados. Isso permite a obtenção de grande riqueza informativa e a facilidade na compreensão dos dados coletados.

A entrevista semiestruturada, também chamada de entrevista em profundidade, por sua vez, se apresenta como uma subdivisão da técnica da entrevista, onde as questões são formuladas de forma a permitir que o entrevistado verbalize seus pensamentos, tendências e reflexões, propiciando que o entrevistador tenha liberdade para introduzir assuntos que não estariam previamente elencados se utilizado um questionário padrão (Flick, 2009).

Santos (2000) alerta que, apesar da entrevista semiestruturada permitir maior liberdade e, por consequência, maior riqueza de informações, ela pode dificultar a organização e análise dos dados coletados. Para contornar esta dificuldade, no presente artigo, foi utilizado o software Nvivo[7] como recurso auxiliar na organização e análise das entrevistas realizadas.

Com a finalidade de cumprir com os objetivos elencados na pesquisa, foram entrevistados os Presidentes do Conselho de Administração de algumas das empresas mais inovadoras do Sul do País, com um roteiro semiestruturado produzido pelos autores. A escolha em entrevistar apenas os Presidentes do Conselho é justificada pois são eles os detentores da responsabilidade pelo bom funcionamento e aplicação dos princípios da governança corporativa de suas organizações e, sendo a governança da inovação uma ramificação da governança corporativa, a opinião e relatos dos entrevistados complementam a análise documental anteriormente realizada.

O grupo de empresas escolhidas para a pesquisa em questão, são aquelas que compõem o ranking “Campeãs de Inovação do Sul” produzido e divulgado pela Revista Amanhã durante o primeiro semestre de 2017, com dados do ano de 2016. O ranking é formado através das 500 maiores empresas do Sul, considerando os estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná e é medido através do indicador Valor Ponderado de Grandeza[8]. Cada companhia componente deste ranking recebeu uma carta para preencher o questionário da inovação, sendo o aceite optativo. Tal questionário é formulado pelo Center for Innovation, Excellence and Leadership – IXL, sediado em Cambridge nos Estados Unidos, e se utiliza da metodologia do Global Innovation Management Institute – GIMI[9], sediado na mesma cidade.

O questionário é formado por 30 questões, em inglês, sendo focado em aspectos como processos, estratégias e recursos voltados à inovação. Após preenchidos, os questionários foram processados na Central do IXL, nos Estados Unidos. Cerca de 200 empresas preencheram o questionário e, destas, foi elaborado o ranking das 50 mais inovadoras.

Para o presente artigo, os pesquisadores utilizam as dez primeiras empresas do ranking, contatando os Presidentes de Conselho destas empresas e entrevistando aqueles que se dispuseram, durante o período de coleta de dados, a contribuir com a mesma. Foram três entrevistados, entre novembro e dezembro de 2017. Todas as entrevistas foram gravadas com o consentimento do entrevistado e, posteriormente, analisadas com o auxílio do NVivo.

As empresas entrevistadas são multinacionais de grande porte com sede no estado do Rio Grande do Sul. Uma é fabricante de calçados, atuando no mercado B2B e B2C[10]. A segunda é a maior fabricante de carrocerias de ônibus do mundo, atuando no mercado B2B. E, a terceira é a maior fabricante de reboques, semirreboques e vagões da América Latina, também atuando no mercado B2B.

Cabe destacar que, neste estudo, o tipo de amostra escolhida é a amostra não-probabilística qual, conforme explicado por Santos (2000), é quando o tipo randômico não é possível, por isso, sob responsabilidade do pesquisador, é selecionado um determinado número de casos para formar a amostra desejada, se atentando a não ferir a legitimidade, cientificidade e credibilidade do trabalho de investigação. Rey (2005) ainda reforça que, não é o tamanho do grupo que define a construção do conhecimento em uma pesquisa qualitativa, mas sim, a exigência da informação construída pelo pesquisador.

Análise e Discussão dos Resultados
A Inovação

A inovação, nas últimas décadas, tem sido considerada a força motriz de empresas e nações, visto que configura as mudanças que as organizações precisam adotar a fim de continuarem competitivas em um mercado cada vez mais exigente. Para as empresas entrevistadas é unânime a importância que a inovação tem para a condução de seus negócios, visto que é apenas lançando novos produtos, se utilizando de novas tecnologias e novos modelos de gestão que as mesmas conseguem se manter na liderança de seus setores.

O entrevistado 3, ainda reforça a importância que o lançamento de novos produtos e algumas mudanças organizacionais tiveram para que a empresa se mantivesse sólida no mercado, apesar da crise que se instaurou no país nos últimos anos. Segundo o mesmo, muitas empresas do seu setor tiveram que decretar falência, devido a não estarem preparadas para terem uma nova leitura do mercado e inserir no mesmo produtos que, no momento da crise, fizessem sentido e fossem financeiramente viáveis. “Nós criamos um comitê para tratar especificamente das ações que a empresa tomaria para passar pela crise e ainda se manter na liderança” (Entrevistado 3).

Diversos autores reforçam que são em momentos de crise que são criadas as melhores oportunidades para a inovação e onde se pode perceber o real potencial para este tema dentro das organizações. No entanto, mesmo que a crise tenha forçado as empresas a buscarem novas formas de inovar e continuarem no mercado, o Brasil ainda se mantém na 69ª posição do ranking mundial de inovação, ficando atrás de vários países vizinhos como Chile, Uruguai e Colômbia.

Quando questionadas sobre a influência que a posição do Brasil no ranking mundial da inovação tem sobre seus negócios, todas as empresas afirmaram não ter influência alguma, visto que as mesmas já têm um espaço consolidado no mercado internacional. Este espaço também foi um fator decisivo para que as mesmas não fossem tão abaladas com a crise brasileira, visto que os produtos de exportação mantiveram os níveis, aliados a cotação mais alta do dólar, o que representou ganhos financeiros.

No entanto, o entrevistado 1 salienta o problema da burocracia brasileira como sendo um dos maiores entraves para que a inovação seja melhor trabalhada dentro das empresas. O mesmo questiona:

Você sabe quanto tempo eu demoro para conseguir uma patente para meus produtos? Dez anos! Não posso esperar dez anos para lançar algo novo e ter a certeza que ninguém vai copiar. Além disso, o que hoje é novo, inovador, em dez anos não será mais. Então, o que eu posso fazer é lançar o produto já preparado que em seis meses vão existir inúmeras outras cópias, porque eu não consigo resguardar a minha ideia, a minha inovação (Entrevistado 1).

O entrevistado 2 também concorda que a burocracia brasileira é um entrave para a inovação. Retrata que a mesma, juntamente com decisões políticas que visam o individual e não o coletivo, atrasam o país em diversos aspectos. Segundo o entrevistado:

Em nosso setor especificamente, a tecnologia que existe no exterior é a mesma que existe no Brasil. O Brasil não tem problema de acesso à tecnologia, tem problema nas decisões políticas que são tomadas que não favorecem a melhoria da nossa infraestrutura como país. Sem infraestrutura, não posso lançar o produto mais inovador e tecnológico por aqui, porque não haverá possibilidade de rodagem. Então, lançamos estes produtos lá no Canadá (Entrevistado 2).

Pode-se perceber com as colocações acima, que as empresas entrevistadas possuem capacidade inovativa a nível de competitividade internacional, no entanto, por questões de regulamentação e burocracias brasileiras acabam não investindo todo seu potencial no mercado interno.

Por conseguinte, quando questionadas se o fato de serem reconhecidas como empresas inovadoras gera alguma vantagem competitiva para seus negócios, todas afirmam que não. Ter um DNA voltado para a inovação, lançar novos produtos e promover mudanças organizacionais são os fatores que geram vantagem competitiva. O reconhecimento disto, gera marketing espontâneo e motivação interna, que também são fatores importantes, mas que não estão diretamente ligados ao aumento de vendas ou ganho de market share.

O fator motivação interna também foi levantado quando os entrevistados foram questionados sobre como tratam os fracassos da inovação, visto que, segundo Polydoro (2015), apostar em inovação é também correr inúmeros riscos, muitos dos quais não irão gerar resultados positivos para a organização.

Todos os entrevistados reforçaram o papel da alta administração quando alguma ideia em que estavam apostando não ocorre da maneira planejada. São eles que precisam encontrar mecanismos para manter a equipe motivada e resiliente, focada em encontrar novas soluções que sejam aceitas pelo mercado. O entrevistado 3 ainda retrata “fracassos no lançamento de produtos sempre ocorreram e vão continuar ocorrendo, então a gente deixa a poeira baixar, e então insere um outro novo produto no mercado. Simplesmente, seguimos em frente”.

O entrevistado 1 ainda ressalta o programa para incentivo à inovação que possuem junto aos seus funcionários. Tal programa busca fazer com que o pessoal do chão da fábrica também possa ser ouvido nas sugestões de melhorias para seus produtos ou processos. Todo ano, as melhores sugestões são premiadas. Para o entrevistado, este programa gera uma aproximação entre empresa e funcionários, além de reforçar a motivação de toda a equipe quando são reconhecidos pelo trabalho desenvolvido e pelas ideias sugeridas. Além disso, as ideias trazidas pelos funcionários auxiliam na meta que a empresa tem em lançar um novo produto a cada seis meses.

A empresa do entrevistado 1 é a única que trabalha diretamente com uma meta para a inovação, as demais trabalham com projetos de pesquisa e desenvolvimento voltados às melhorias incrementais de seus produtos. No entanto, o entrevistado 3 salienta que a inovação na empresa não está apenas focada no lançamento de novos produtos, mas também na melhoria dos processos, na adoção de novos modelos de gestão e na organização interna. Para ele, a inovação está diretamente ligada a fazer mais e melhor com menos recursos.

Quando questionados sobre a utilização de modelos para a gestão da inovação, todos os entrevistados afirmaram que a mesma fica à cargo da gestão executiva da organização. Nas empresas dos entrevistados 1 e 2, há comitês de inovação focados no assunto, que são diretamente ligados ao Conselho de Administração. Na empresa do entrevistado 3, há um comitê executivo, composto por membros da gestão executiva e membros do Conselho de Administração, onde um dos pilares de trabalho é a temática inovação.

A seguir se encontra a Tabela 1 com comparativo do assunto inovação entre as empresas participantes deste estudo:

Tabela 1.
Visão geral sobre a sistemática da inovação nas empresas entrevistadas.

A Governança Corporativa

A governança corporativa é considerada um dos mais inovadores modelos de gestão, representando uma sistemática pela qual as organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas, envolvendo o relacionamento entre as partes interessadas, objetivando a otimização dos seus resultados (IBGC, 2015).

As três empresas entrevistadas possuem uma estrutura de governança bem delimitada, com Conselhos de Administração atuantes de forma ativa na formulação e acompanhamento das estratégias de curto e longo prazo. Os três Conselhos são formados por representantes das famílias fundadoras e por membros independentes, assim como sugerido pelo Código de Boas Práticas em Governança Corporativa, publicado pelo IBGC. O entrevistado 3, ainda reforça a importância desta composição no Conselho de sua empresa para promover a troca de informações e experiências. Para ele “principalmente os membros do Conselho que são externos, conseguem trazer informações de outras empresas, outras organizações, isso nos auxilia a enxergar as coisas de maneira diferente”.

Por conseguinte, outro ponto de destaque comum a todas as empresas entrevistadas, é o fato dos Presidentes de Conselho serem pessoas distintas dos Presidentes Executivos, fazendo com que não haja sobreposição de funções, além de garantir que a Presidência Executiva seja ocupada por profissionais devidamente qualificados. O entrevistado 1 compartilha sua experiência em relação a este assunto “eu sou bom criando produtos e não administrando a empresa, por isso, deixei a gestão executiva para quem está melhor preparado para isso e, foi a partir dessa decisão - que foi difícil de ser tomada - que a empresa conseguiu decolar e ocupar o espaço que tem hoje”.

As empresas dos entrevistados 2 e 3 já trabalham com governança corporativa há mais de dez anos, visto que são empresas de capital aberto com ações negociadas na Bolsa de Valores de São Paulo- BM&BOVESPA. A empresa do entrevistado 2 está inserida no nível 2 de governança da listagem da BM&BOVESPA, já a empresa do entrevistado 3, está inserida no nível 1. Estes níveis, assim como o Novo Mercado, foram criados em 2005 para diferenciar as empresas que se preocupam em possuir uma gestão mais transparente, adotando os princípios de governança corporativa. A adesão aos níveis é opcional para as empresas que possuem ações negociadas na Bolsa de Valores.

Por outro lado, a empresa do entrevistado 1, passou a trabalhar com a sistemática de governança recentemente, devido a problemas de sucessão após o falecimento do sócio majoritário. Segundo o entrevistado, a estrutura de governança foi uma das grandes inovações institucionais que a empresa já teve, encontrando bastante resistência interna frente a esta mudança. O mesmo ressalta que, toda a estrutura de governança ainda está em processo de amadurecimento, visando a melhor adaptação possível. Por não possuir ações negociadas na Bolsa de Valores, a empresa não se enquadra em nenhum nível de governança sugeridos pela BM&BOVESPA.

A empresa do entrevistado 3 ainda possui um Conselho de Família atrelado à sua estrutura de governança. Este conselho é responsável pela organização dos negócios da família e por fazer a interface dos interesses da mesma junto aos interesses empresariais, fazendo com que problemas familiares não interfiram na gestão dos negócios.

Após o entendimento sobre a estrutura de governança corporativa de cada empresa, os entrevistados foram questionados sobre como o assunto inovação é tratado dentro do Conselho de Administração. Todos afirmaram que não existe uma pauta específica sobre a temática inovação nas reuniões do Conselho, no entanto, o assunto é tratado conforme a necessidade do momento.

Na empresa do entrevistado 1, devido ao fato de possuírem uma meta para a inovação de seus produtos, o Conselho acompanha o andamento das operações para que seja possível o cumprimento desta meta, por isso, a pauta desenvolvimento de novos produtos está presente na maioria das reuniões.

Já na empresa do entrevistado 2, o Conselho atua analisando as propostas vindas da diretoria executiva para o desenvolvimento de novos produtos, delimitando o orçamento e prazo para desenvolvimento, ponderando as estratégias de longo prazo da empresa e salvaguardando a rentabilidade para os investidores. Pode-se perceber, neste caso, o papel fundamental do Conselho no equilíbrio do conflito de agência, visto que a gestão executiva busca maiores investimentos para o desenvolvimento de novos produtos, enquanto os acionistas buscam maiores retornos aos seus investimentos.

No caso da empresa do entrevistado 3, quando a inovação é relacionada à gestão ou processos, o Conselho apenas é informado sobre as mudanças que irão ocorrer. Quando for uma inovação de produto, havendo a necessidade de orçamento para o desenvolvimento é necessária a aprovação do Conselho, caso contrário, assim como as inovações de gestão e processos, o Conselho é apenas informado sobre tais mudanças.

Quando questionados sobre o órgão que possui maior poder sobre o assunto inovação dentro de sua empresa, os três entrevistados afirmaram ser a diretoria executiva, personificada principalmente na figura do Presidente Executivo, visto que as ideias, os planos de ações, a participação em feiras e eventos, o contato direto com os clientes e todos os demais insights para a inovação estão diretamente ligados à operação das empresas. O Conselho atua na supervisão e no alinhamento das ideias com as estratégias de longo prazo da empresa.

Em decorrência deste fato, há uma preocupação nos Conselhos quanto a escolha dos Presidentes Executivos e demais membros da diretoria, para que sejam pessoas que possuam um perfil voltado a mudanças e com capacidade de pensarem fora da zona de conforto, fazendo com que a cultura de inovação, já estabelecida dentro destas empresas, seja perpetuada e constantemente aperfeiçoada.

Adiante, um dos facilitadores para a inovação, citado pelo entrevistado 1, está relacionado à auditoria externa. Segundo o mesmo, a auditoria consegue levantar vários pontos que passam despercebidos àqueles que estão diretamente envolvidos na operação da empresa. Tais pontos, normalmente resultam em ações que visam modernizar a sistemática de controle e gestão, e para o entrevistado, este tipo de mudança também representa inovações importantes na maneira como as coisas são feitas internamente.

Quando questionados se a atual estrutura de governança da empresa facilita ou prejudica a inovação, o entrevistado 3 relata que às vezes atrapalha, principalmente pela necessidade de mapear todos os riscos. Para ele, a inovação requer ousadia, requer apostar em ideias, que às vezes não irão dar certo, e ser criterioso demais no mapeamento de riscos pode tornar o processo de inovação moroso e burocrático, desestimulando a prática dentro da empresa.

Deschamps e Nelson (2014) ressaltam que um dos grandes desafios de médias e grandes empresas, que já possuem uma sistemática de trabalho solificada, é despertar a inovação através de mecanismos menos complexos, por isso, o órgão máximo dentro da estrutura da empresa, normalmente o Conselho de Administração, precisa estar fortemente engajado em fazer a estrutura num todo funcionar, sendo este um dos primeiros passos para a construção da governança da inovação.

Seguindo nesta linha de pensamento, o entrevistado 1 afirma que a estrutura de governança, por si só, foi uma das maiores inovações para a empresa e serviu para incentivar ainda mais a cultura da inovação internamente, pois demonstrou que sempre há a possibilidade de evolução, e atestou que a alta administração está focada nisso.

Dessa forma, o próximo subcapítulo busca analisar a temática governança da inovação nas empresas entrevistadas. No entanto, para findar o presente subcapítulo, na Tabela 2, a seguir, se pode analisar o comparativo entre as estruturas de governança corporativa nas empresas entrevistadas.

Tabela 2.
Visão geral sobre a sistemática de governança nas empresas entrevistadas.

A Governança da Inovação

Segundo Deschamps e Nelson (2014) a governança da inovação trata da estrutura onde são alinhados um modelo de gestão estratégico, processos e pesquisa e desenvolvimento, a fim de incentivar a inovação dentro das empresas. Para os autores, não existe um modelo padrão para que a governança da inovação seja implantada, cada organização precisa conhecer a sua operação e ajustar a inovação conforme as peculiaridades de sua cultura organizacional e do mercado ao qual atende.

Por ser uma temática bastante nova, tanto no âmbito acadêmico como no meio empresarial, as empresas entrevistadas afirmaram não possuir nenhuma sistemática padronizada para a governança da inovação, apesar de confirmarem que é importante que a mesma seja implementada, para que a cultura da inovação seja, cada vez mais, incentivada e aprimorada dentro das mesmas. O entrevistado 2 complementa: “talvez até trabalhemos com a governança da inovação, mas sem identificar o nome ou sem estar totalmente claro para a empresa num todo”.

Nagano et al. (2014) afirmam que a governança da inovação deve estar pautada em três eixos principais: políticas de recursos humanos, estilo de liderança e orientação estratégica, sendo o grande responsável por esta estrutura o Conselho de Administração. Em todas as empresas entrevistadas, o Conselho participa ativamente na definição estratégica da empresa, executando o papel de guardião dos objetivos de longo prazo. Além disso, são responsáveis pela escolha do Presidente Executivo, principal liderança da operação, onde é unânime entre os entrevistados, a necessidade deste líder possuir um perfil inovativo. Quanto às políticas de recursos humanos, em todas as empresas as mesmas são de responsabilidade da diretoria executiva, o Conselho apenas acompanha as mudanças nos modelos de gestão. No entanto, em todas as empresas tais políticas estão bem definidas conforme a cultura organizacional de cada uma.

O entrevistado 1 pondera que, apesar de ele não ser mais a liderança principal da empresa, as pessoas continuam se inspirando em sua figura, visto que foi o mesmo quem introduziu o conceito de inovação dentro da empresa e trabalhou por diversos anos para que a mesma se tornasse o grande diferencial da entidade. Através deste relato, é possível identificar a aplicação do modelo dois de governança da inovação proposto por Deschamps e Nelson, onde o fundador da empresa é o precursor da inovação.

Este modelo é adotado por empresas como Facebook e Apple, onde seus fundadores foram responsáveis por conceber a ideia principal do produto ou serviço, qual representou um novo conceito no próprio mercado, os chamados negócios disruptivos. Neste modelo, a inovação é a prioridade máxima da empresa e a cultura organizacional é orientada para a temática.

A empresa do entrevistado 1, apesar de hoje considerar que a inovação trabalhada seja mais incremental do que radical, quando a ideia de seus produtos foi lançada ao mercado há quase 20 anos, houve uma mudança nos hábitos dos próprios consumidores, gerando a necessidade de compra e mudando as prerrogativas da concorrência. Apesar de, na época, o termo disruptivo não estar presente no dia-a-dia empresarial, a inserção dos produtos da empresa no mercado representou uma disrupção no seu segmento de atuação. Não obstante, o trabalho com metas para a inovação e os programas para incentivo dos funcionários em prol da temática, demonstram a orientação da cultura organizacional para a inovação, corroborando para que, mesmo sem formalização, a empresa trabalhe com os parâmetros da governança da inovação.

Por conseguinte, o entrevistado 2 afirma que a grande responsável pela inovação dentro de sua empresa é a alta administração, visto que é o conjunto dos diretores, principalmente das áreas de marketing, vendas e engenharia, que verificam as necessidades dos clientes, a demanda do mercado e as tendências internacionais para aprimorarem seus produtos.

Diante do exposto, pode-se considerar que a empresa também trabalha com um dos modelos de governança da inovação propostos por Deschamps e Nelson, o modelo número um, onde a alta administração é o próprio comitê de inovação. Neste modelo, a inovação é tratada no topo, tornando-se multidisciplinar e tendendo a enfatizar a criação de novos produtos ou serviços, deixando os processos como demandas secundárias.

A empresa do entrevistado 2, é bastante focada nas melhorias incrementais e tecnológicas de seus produtos, buscando sempre analisar o mercado onde cada produto será inserido para então oferecer soluções que estejam alinhadas aos problemas que aquele local precisa resolver. Segundo o entrevistado:

Podemos até criar inovações disruptivas, mas sempre dentro daquilo que é o escopo da empresa. Não nos consideramos uma empresa disruptiva, mas sim altamente inovadora no que nos propomos a desenvolver (...) introduzimos uma nova tecnologia em nossos produtos sempre que isso faça sentido, não apenas para dizer que o mesmo é altamente tecnológico (Entrevistado 2).

O mesmo ainda complementa sinalizando o papel do Conselho de Administração quando o assunto é a melhoria dos seus produtos:

Quando a diretoria chega até o Conselho com o projeto de uma melhoria significativa nos produtos, priorizamos três coisas: qualidade, competitividade e que atenda a realidade. Nós já erramos em colocar um produto muito sofisticado em um mercado que não estava preparado. Ele reconhece os benefícios, reconhece a qualidade, mas não tem condições financeiras para adquiri-lo, portanto não está condizente com a realidade. Se o projeto não cumprir com estes três requisitos, não será aprovado um orçamento para a execução do mesmo (Entrevistado 2).

Dessa forma, pode-se perceber que a empresa do entrevistado 2, assim como o próprio comentou, apesar de não formalizar uma estrutura de governança da inovação, a mesma já existe de maneira bastante organizada e focada em suas estratégias de curto e longo prazo, tendo no Conselho de Administração a segurança para que, de fato, esta estrutura funcione de maneira eficaz.

Já na empresa do entrevistado 3, a responsabilidade pela inovação dos produtos é exclusivamente do departamento de Pesquisa, Desenvolvimento e Tecnologia, já as inovações organizacionais e de mercado são promovidas pelo comitê executivo, formado por membros da diretoria executiva e ligado ao Conselho de Administração. Dessa forma, a empresa trabalha com duas estruturas distintas para promover a inovação internamente, podendo ser enquadrada em dois dos modelos propostos por Deschamps e Nelson: o modelo número quatro, onde o diretor de P&D e tecnologia é o responsável direto pela inovação e o modelo número um, onde, assim como a empresa do entrevistado 2, a alta administração é o próprio comitê de inovação.

Empresas que trabalham com a estrutura do modelo quatro, investem fortemente em pesquisa e desenvolvimento, por isso que este departamento se torna o ponto central da inovação dentro destas empresas. Este modelo é bastante comum em países como Japão, Alemanha, Suíça e Suécia onde existe uma forte tradição em tecnologia e engenharia, sendo bastante utilizado em empresas do ramo automotivo. Estando a empresa do entrevistado 3 inserida no ramo automotivo, justifica-se a utilização deste modelo de governança da inovação.

O entrevistado 3 ainda ressalta a importância que despendem para a aproximação com grandes universidades, buscando trabalhar conjuntamente com os grupos de pesquisas a fim de coletar experimentos que possam ser utilizados para a melhoria de seus produtos. O mesmo reforça que recentemente estão também buscando se aproximar das startups, visto que este tipo de empresa pode lançar ao mercado produtos ou serviços que podem mudar radicalmente um segmento. O entrevistado justifica:

Olha o caso do Uber, o mercado de táxis já existe há tantos anos, aí chega um “cara” e simplesmente muda todo o mercado. Nós não estamos isentos disso acontecer também, por isso precisamos acompanhar o que tem acontecido neste mundo (Entrevistado 3).

Findando as entrevistas, fora questionado sobre quais seriam os maiores desafios para a governança da inovação dentro das empresas e os três entrevistados foram unânimes em suas respostas: o maior desafio é encontrar pessoas que tenham o ímpeto da mudança, que não tenham medo de arriscar e buscar a inovação.

O entrevistado 3 ainda ressalta que não é necessário que todos os bons e novos produtos sejam criados dentro da empresa, eles podem ser cocriados, podem ser utilizadas tecnologias já existentes e de forma inteligente adaptar para a realidade da empresa, mas para que isso seja possível, as lideranças precisam estar imergidas na cultura da inovação e precisam estar cientes de que são elas as responsáveis por manter esta cultura atuante.

Dessa forma, pode-se constatar que, apesar de não existir formalmente, as três empresas entrevistadas, que compõe o ranking Campeãs da Inovação do Sul, trabalham com modelos de governança da inovação, cada qual adaptado às suas necessidades, a sua cultura organizacional e ao tipo de mercado que atende. Segundo Deschamps e Nelson (2014), não existe o melhor modelo para a governança da inovação, cada empresa precisa adaptar o mesmo conforme sua realidade, visto que a capacidade de adaptação é a maior inovação.

Para finalizar, a Tabela 3 a seguir demonstra um resumo sobre a sistemática de governança da inovação apresentada pelas empresas.

Tabela 3.
Visão geral sobre a sistemática de governança da inovação nas empresas.

Conclusão

Após a apresentação da análise dos resultados, propiciada pela relação entre as entrevistas realizadas e o referencial bibliográfico, passa a ser possível responder aos objetivos específicos do presente estudo, que levam, consequentemente, ao cumprimento do objetivo geral do mesmo, que foi o de identificar os modelos de governança da inovação utilizados por algumas das empresas mais inovadoras do sul do País, assim como os principais desafios para sua implantação e manutenção.

Obtendo uma visão geral sobre a sistemática da gestão da inovação das empresas, pode-se perceber que todas as entrevistadas atribuem grande valor à temática, principalmente atrelada ao lançamento ou melhorias significativas de seus produtos. Por isso, se utilizam de mecanismos de gestão, como os comitês de inovação, para garantir que o tema tenha a devida atenção junto às equipes executivas. Apesar disso, todas afirmam que serem reconhecidas como empresas inovadoras não gera vantagem competitiva frente aos seus concorrentes, apenas marketing espontâneo e motivação interna para continuar com os trabalhos em prol da inovação. Um ponto de disparidade entre as mesmas em relação ao assunto, é que apenas a empresa do entrevistado 1 trabalha com metas formais para o tema inovação, enquanto as demais trabalham mais focadas em pesquisa e desenvolvimento.

Por conseguinte, considerando a posição do Brasil no ranking mundial da inovação, todas afirmam que este fato não gera nenhuma influência, pois as mesmas já mantêm sua liderança no mercado interno e já conquistaram também o mercado internacional. No entanto, é unânime entre as mesmas que a burocracia brasileira somada às más decisões políticas são entraves para a inovação das empresas e, consequentemente, do país.

Em relação à governança corporativa, pode-se perceber que todas as empresas possuem estruturas de governança consolidadas e Conselhos de Administração ativos na formulação das estratégias das mesmas. Enquanto as empresas dos entrevistados 2 e 3 possuem esta estrutura há mais de dez anos em decorrência de terem iniciado a venda de ações na bolsa de valores de São Paulo, a empresa do entrevistado 1 iniciou o trabalho com governança corporativa recentemente, devido a problemas de sucessão. No entanto, todas seguem as principais recomendações e princípios do IBGC.

No que concerne o tema inovação, pode-se perceber em todas as empresas que o órgão com maior responsabilidade sobre o assunto é a diretoria executiva, principalmente no papel do Presidente Executivo. Aos Conselhos cabe o acompanhamento dos projetos e a aprovação dos investimentos financeiros dos mesmos. No entanto, a principal função dos Conselhos nestas empresas é a contratação do Presidente Executivo e demais diretores com perfis orientados à inovação, que possam fortalecer esta cultura dentro das organizações.

Por conseguinte, adentrando no assunto governança da inovação, pode-se perceber que, apesar de não trabalharem formalmente com uma estrutura, todas as empresas aplicam conceitos dos modelos de governança da inovação propostos por Deschamps e Nelson. Cada empresa se utiliza de sistemáticas de gestão, políticas de liderança e processos de pesquisa e desenvolvimento, levando em consideração sua cultura interna, seus produtos e o mercado o qual atende. Além disso, estão próximas às Universidades e Startups para acompanhar os novos desenvolvimentos em suas áreas de atuação.

Em relação aos maiores desafios para a manutenção da estrutura de governança da inovação, todos os entrevistados relataram ser o perfil das pessoas, principalmente daquelas que ocupam cargos de liderança. A inovação requer ousadia e criatividade, que possibilite a resolução de problemas de maneiras diferentes, melhorando a eficiência da empresa e mantendo a cultura da inovação, por isso, os perfis dos colaboradores das mesmas precisam estar alinhados a estes princípios.

Diante de todo o exposto, pode-se concluir que o objetivo geral do presente estudo fora cumprido de maneira satisfatória, mesmo possuindo como limitação o estudo de três empresas bastante discrepantes entre si. Visto que a temática ainda requer muitos estudos, os autores sugerem para pesquisas futuras um estudo de caso específico em uma única empresa, a fim de conhecer mais profundamente o tratamento do assunto governança da inovação, ainda, sugerem que o assunto seja pesquisado no âmbito público, verificando como os governos lidam com a temática que influencia tanto no desenvolvimento econômico do país.

Por conseguinte, o problema da presente pesquisa também fora solucionado de maneira satisfatória, sendo que os maiores desafios para a implantação da governança da inovação estão pautados na construção de um modelo de gestão estratégico e orientado à inovação, em políticas de recursos humanos voltados para a formação de lideranças orientadas para a temática, e no fortalecimento dos departamentos de pesquisa, desenvolvimento e tecnologia para a criação de produtos cada vez mais adequados às demandas do mercado. Todos estes critérios devem estar diretamente ligados à estrutura de governança corporativa, sob supervisão do Conselho de Administração.

Material suplementar
Referências
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Notas
Notas
[1] Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul – Avenida Ipiranga, 6681 – CEP 90619-900 – Porto Alegre (RS) – Brasil. Este é um artigo de acesso aberto, licenciado por Creative Commons Atribuição 4.0 Internacional (CC BY 4.0), sendo permitidas reprodução, adaptação e distribuição desde que o autor e a fonte originais sejam creditados.
[2] OCDE- Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico. É formada por 30 países com intuito de promover políticas internacionais que visem o desenvolvimento econômico e bem-estar social ao redor do mundo.
[3] Instrumentos de financiamento para projetos de pesquisa, desenvolvimento e inovação em empresas ou instituições científicas e tecnológicas- ICTs. Os fundos são geridos pela FINEP e as fontes de receitas são oriundas de incentivos fiscais, empréstimos de instituições financeiras, royalties sobre a produção de petróleo e gás e doações de instituições públicas e privadas.
[4] Lei 10.973/04 regulamenta a interação entre Universidades e empresas, estimula a criação de fundos de investimentos e estimula a criação de ambientes especializados e cooperativos em inovação, como Parques Tecnológicos e Incubadoras.
[5] Lei 11.196/05 cria incentivos fiscais para pessoas jurídicas que investirem em pesquisa, desenvolvimento e inovação tecnológica.
[6] O IMD – International Institute for Management Development é uma escola de negócios de alto nível localizada na Suíça. Foi fundada por grandes empresas que buscavam uma formação mais competitiva para seus principais executivos. Hoje, é responsável pela formação dos líderes empresariais de cerca de 98 países. Se auto intitula como sendo uma escola formada por grandes executivos para grandes executivos.
[7] Software que auxilia na transcrição, organização e análise de pesquisas qualitativas que utilizam diversas fontes e formatos de arquivos, como pdf, fotos, áudio, etc. No software são criados os chamados “nós”, que são os assuntos ou elementos principais da pesquisa, posteriormente cada fonte é distribuída entre os nós. Dessa forma, o software gera automaticamente as ligações que cada fonte e cada elemento da pesquisa possui em comum, demonstrando isso numa matriz relacional.
[8] O Valor Ponderado de Grandeza resulta da soma de patrimônio líquido, com peso de 50%, junto à receita bruta, com peso de 40% e do lucro líquido com peso de 10%.
[9] GIMI é uma organização mundial, sem fins lucrativos, criada por executivos, acadêmicos e consultores especialistas em inovação, que auxilia pessoas, empresas e regiões a desenvolver competências na gestão da inovação de nível mundial, com métricas, protocolos de testes e certificações globais.
[10] Siglas que representam o formato de vendas. B2B- Business to Business significa a venda para outra empresa, e B2C- Business to Consumer significa a venda direta ao consumidor final.
Tabela 1.
Visão geral sobre a sistemática da inovação nas empresas entrevistadas.

Tabela 2.
Visão geral sobre a sistemática de governança nas empresas entrevistadas.

Tabela 3.
Visão geral sobre a sistemática de governança da inovação nas empresas.

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