Recepção: 10 Setembro 2018
Aprovação: 31 Maio 2020
Resumo: O estudo objetiva averiguar como ocorre o uso dos Sistemas de Controle Gerencial (SCG) no equilíbrio da tensão dinâmica para implementar a estratégia de inovação como diferencial de competitividade em empresa familiar. Caracteriza-se como descritiva com abordagem qualitativa, a partir de um estudo de caso em empresa de grande porte. As categorias de SCG, Estratégia de Inovação e Influência da Família foram extraídas da literatura e transformadas em roteiro de entrevista. As entrevistas foram analisadas e trianguladas com observação e fontes documentais. Os resultados revelam que a influência da família está nos valores familiares, na preparação da nova geração, transmissão de conhecimento e experiência entre gerações, na promoção da cultura de inovação no ambiente de negócios. Neste caso, o compromisso da nova geração com os negócios da família é essencial para o processo de continuidade e o alinhamento dos objetivos estratégicos e desempenho superior. A contribuição teórico-empírica é pela inserção de uma categoria de análise que sugere a entrada de novos membros familiares como fator de tensão dinâmica. A contribuição gerencial revela que o controle do orçamento e os desvios orçamentários são os artefatos mais utilizados de forma interativa (adaptar ao ambiente); o plano de negócios e o planejamento estratégico de forma diagnóstica (implementação da estratégia). Conclui-se, que as evidências dos valores familiares e da aprendizagem empreendedora reforçam as crenças e o uso dos controles interativos para adaptação ao ambiente de inovação e no equilíbrio da tensão dinâmica.
Palavras-chave: Sistemas de Controle Gerencial, Tensão Dinâmica, Estratégia de Inovação, Empresa Familiar.
Abstract: The study aims to investigate how the use of Management Control Systems (MCS) occurs in the balance of dynamic tension to implement the innovation strategy as a competitiveness differential in a family business. It is characterized as descriptive research with a qualitative approach, from a case study in a large company. The categories of MCS, Innovation Strategy and Family Influence were extracted from the literature and transformed into an interview script. The interviews were analyzed and triangulated with observation and documentary sources. The results reveal that the influence of the family is on family values, in the preparation of the new generation, transmission of knowledge and experience between generations, in promoting the culture of innovation in the business environment. In this case, the commitment of the new generation to the family business is essential for the process of continuity and alignment of strategic objectives and superior performance. The theoretical-empirical contribution is the insertion of a category of analysis that suggests the entry of new family members as a dynamic stress factor. The management contribution reveals that budget control and budget deviations are the most used artifacts interactively (adapt to the environment); the business plan and strategic planning in a diagnostic way (implementation of the strategy). It is concluded that the evidence of family values and entrepreneurial learning reinforce the beliefs and the use of interactive controls to adapt to the innovation environment and in the balance of dynamic tension.
Keywords: Management control systems, Dynamic Tension, Innovation strategy, Family Business.
Introdução
Um fluxo crescente de pesquisas na área gerencial revela que o uso dos Sistemas de Controle Gerencial (SCG) pode desempenhar um papel importante como facilitador da competividade (Henri, 2006; Bedford, 2015; Frezatti, Bido, Cruz, & Machado, 2017). O modelo Levers of Control (LOC) de Simons (1995), pressupõe que a estratégia dos negócios é atingida quando ocorre o equilíbrio das forças das quatro diferentes alavancas de controle, ou seja, controle de crenças, controle de limites, controle de diagnóstico e controle interativo ( Kruis, Speklé & Widener, 2016).
Os controles de crenças reforçam o senso coletivo e o alinhamento entre objetivos individuais e organizacionais. Os controles de limites possuem uma função mais restritiva, visando minimizar riscos. Os controles diagnósticos estabelecem metas, monitoram e corrigem desvios orçamentários. Por outro lado, os controles interativos respondem às situações de crise e mudança, educam os atores organizacionais para explorar estratégias emergentes impostas pelo ambiente dinâmico (Simons, 1995). O uso dos SCG de forma combinada pode contribuir para gerenciar e equilibrar as tensões dinâmicas inerentes à estratégia de inovação (Oyadomari, 2008; Zheng, 2012; Bedford, 2015).
A essência do controle (LOC) consiste em gerenciar a tensão entre a inovação criativa e a realização de objetivos estratégicos. O equilíbrio da tensão dinâmica pode melhorar a realização do objetivo organizacional, da aprendizagem e da capacidade de inovação (Henri, 2006). Atrelado a isso, Otley (2016) aduz a influência da tecnologia e da internet na prática dos negócios, aumentando a incerteza ambiental nos modelos preditivos, nos quais o controle está fundamentado.
A estratégia de inovação impõe desafios à gestão familiar, os quais podem ter implicações no uso dos SCG, em virtude de que a gestão precisa ser flexível para atender as necessidades dos clientes e responder às mutações do mercado (Widener, 2007; Heinicke, Guenther, & Widener , 2016). Assim como, para o uso interativo do SCG com a inovação de produtos e o desempenho (Bisbe & Otley, 2004). No ciclo de vida das empresas familiares, alguns fatores são determinantes para a continuidade, entre estes, a dualidade da gestão e o patrimônio da família. Hillen e Lavarda (2019) constataram que as características organizacionais e a sucessão influenciaram a necessidade do orçamento.
A influência da família tende a ser mais predominante na estratégia da organização para preservar os valores familiares, oriundos dos sistemas de crenças ( Oro & Lavarda, 2017; Oro & Lavarda, 2019). Lindow (2013) e Craig, Dibrell, & Garrett (2014) constataram que a influência familiar pode afetar a tomada de decisões estratégicas e o resultado das organizações, assim como ajuda a definir as oportunidades para ser mais proativa. Silva, Cruz, Barbosa e Machado (2017) revelaram que para uma empresa melhorar o desempenho, é necessário aprimorar o uso das alavancas de controle (LOC) para alinhar as estratégias emergentes e neste caso, sugerem os sistemas de crenças e interativo.
O estudo considera que empresa familiar é aquela que possui membros da família na propriedade e na gestão/empresa (Gersick, Davis, Hampton, & Lansberg, 1997). O contexto do estudo é uma indústria de grande porte do segmento de calçados e têxtil brasileira. A influência da família está no fundador, juntamente com os filhos, em posições de comando na organização. A partir do contexto, tem-se o seguinte problema de pesquisa: como ocorre o uso dos Sistemas de Controles Gerenciais no equilíbrio da tensão dinâmica para implementar a estratégia de inovação na empresa familiar? Dada esta questão de pesquisa, surge o objetivo deste trabalho, averiguar como ocorre o uso dos Sistemas de Controle Gerencial no equilíbrio da tensão dinâmica para implementar a estratégia de inovação como diferencial de competitividade na empresa familiar.
A contribuição deste estudo baseia-se na investigação de estudar o comportamento inovador na empresa familiar para entender como a família influencia a capacidade de inovação da empresa. Aliado a isso, investigar fatores que influenciam a tensão dinâmica. A contribuição teórico-empírica é pela inserção de uma categoria de análise que sugere a entrada de novos membros familiares como fator de tensão dinâmica. Adicionalmente, a investigação em profundidade promove o desenvolvimento de pesquisas empíricas sobre empresas familiares no Brasil. Mesmo que represente a maioria das organizações, trata-se de uma área carente de literatura e de estudos relacionados ao assunto.
Revisão da Literatura
Na estratégia de inovação duas formas de alocação de recursos são apontadas e consideradas distintas, exploitation e exploration (Bedford, 2015). Exploitation implica no aperfeiçoamento das competências atuais, enquanto, exploration indica a experimentação de novas alternativas (He & Wong, 2004). Quando os gestores precisam conquistar objetivos estratégicos para sua organização, buscam equilibrar estas demandas, cujo conceito está relacionado a ambidestria organizacional (Severgnini, Galdamez, & Vieira, 2019). Neste sentido, o uso desses recursos de forma conjunta pode favorecer e expandir o resultado da organização.
Utterback e Abernathy (1975) definem duas linhas de investigação na estratégia de inovação: processos e produtos. A estratégia de inovação de produtos tem como objetivo criar produtos que vão além do que os concorrentes podem oferecer. Enfatizam a pesquisa e o desenvolvimento (P&D), sendo eficazes na comercialização dos produtos. A liderança no mercado é sustentada pelas constantes maneiras de inovar, ou seja, inventando e comercializando novos produtos, demonstrando atitude proativa (Miller & Le Breton-Miller, 2006). De acordo com Organisation for Economic Co-operation and Development (OCDE, 2005), as inovações de produto e de processos estão atreladas ao conceito de produto tecnológico e processo tecnológico. A inovação de processos tem como desígnio melhorar a eficiência de criar ou estabelecer um produto ou serviço, mas também pode agregar valor para o cliente, como por meio da melhoria da qualidade e da confiabilidade (Gopalakrishnan, Bierly & Kessler, 1999).
Diversas funções têm sido atribuídas ao SCG, indicando que o uso desses sistemas pode orientar as organizações para atingir níveis decisórios mais elevados, como de inovação de produto (Bisbe & Malagueño, 2009) ou na relação de cumprir com os objetivos estratégicos (Marginson, 2002). Os controles gerenciais são meios de assegurar que os objetivos da organização sejam alcançados, já antevisto por Anthony (1965).
Os SCG, para Davila, Foster e Li (2009), compõem-se de controles formais, informação de rotinas e procedimentos usados por gestores para manter ou alterar os padrões das atividades organizacionais. O “SCG é um mecanismo facilitador da adoção das estratégias empresariais e um dos principais artefatos do processo gerencial.” (Beuren, Klein & Dal Vesco, 2015, p. 4).
O quadro LOC (Simons, 1995) tem sido empregado para investigar como as organizações controlam e implementam a estratégia e a renovação estratégica (Zheng, 2012). O alinhamento da organização, da estratégia de negócios e do comportamento humano provoca tensões e o equilíbrio consiste em essência na implementação da estratégia . Simons (1995) classifica a tensão em três dinâmicas: a) dinâmica de criação de valor; b) dinâmica de elaboração da estratégia; e c) dinâmica do comportamento humano. Cada uma dessas dinâmicas leva a organização a criar tensões que serão conciliadas e equilibradas para permitir o controle efetivo da estratégia de negócios. Oyadomari et al. (2011, p. 305) descrevem que a tensão dinâmica “são os dilemas organizacionais presentes na organização, representados pelos objetivos organizacionais aparentemente conflitantes, como, por exemplo, a busca de objetivos de longo prazo, sem perder o foco nos objetivos de curto prazo.”
Para Henri (2006), os gerentes usam medidas de desempenho em ambos os controles, diagnóstico e interativo, que resulta em tensão dinâmica que visa melhorar as capacidades organizacionais. Mundy (2010) constatou que a alavanca de controle interativo desempenha papel significativo na obtenção e manutenção do equilíbrio entre o controle e o uso dos SCG.
Simons (1995) menciona que nas empresas que incentivam a inovação, a tendência é gerar muitas oportunidades, mas são limitadas pela atenção dos gerentes que precisam tomar decisões em diversas situações. As tensões são geradas pela inovação e controles; entre lucratividade e crescimento; entre seus objetivos e dos seus funcionários (e outros que têm interesse no negócio); e entre as várias oportunidades de criar valor no mercado.
Os sistemas de limites e controles diagnósticos geram efeitos negativos, que se concentram, principalmente, no controle, enquanto os sistemas de crenças e controle interativos geram efeitos positivos, que enfatizam a inovação (Simons, 1995). Estudos sugerem que o equilíbrio e a combinação dos dois papéis permitem o controle e a flexibilidade ao mesmo tempo (Oyadomari, 2008; Zheng, 2012; Pletsch & Lavarda, 2016).
Estudos relacionados a empresas familiares têm repetidamente ressaltado que o comportamento estratégico de inovação das empresas familiares difere das empresas não familiares (Craig et al., 2014; De Massis, Frattini, Pizzurno, & Cassia, 2015), além de evidências de que a influência familiar pode afetar a tomada de decisões estratégicas e o resultado das organizações (Chen & Hsu, 2009; Kellermanns, Eddleston, & Sarathy 2012; Alves, 2015). Estudos anteriores revelaram que o envolvimento da nova geração e desempenho é um tema inconclusivo, com resultados positivos e negativos (Bennedsen et al., 2007; Kellermanns et al., 2012; Alves, 2015).
Com base na literatura e estudos anteriores, depreende-se que o desenvolvimento de ações com base na estratégia de inovação pode gerar tensão dinâmica por vincular a necessidade do alinhamento dos interesses empresariais aos da família. Assim como, de explorar novos negócios ao crescimento da empresa e ao controle do risco, da pressão por resultados, de controlar os funcionários, pela inserção de novos membros da família na gestão das empresas. Estudos confirmam maior grau de complexidade da empresa familiar quando a posse e a gestão do negócio são compartilhadas ou transferidas para gerações futuras (Galve-Górriz & Salas-Fumás, 2011; Kellermanns et al., 2012). Para Machado (2005, p. 318), “o aumento da complexidade se dá não somente pela dificuldade em compreender os novos arranjos familiares, mas também porque coexistem diferentes tipos de estruturas familiares dentro de uma mesma cultura.”
Metodologia
Esta pesquisa caracteriza-se como descritiva, com abordagem qualitativa, realizada por meio de um estudo de caso. Na sequência, o detalhamento dos procedimentos utilizados no estudo.
Constructos e instrumento de pesquisa
No Quadro 1, o constructo de pesquisa com as categorias e subcategorias de análise.
Compreende-se que as categorias de análise e os autores refletem o posicionamento teórico seguido pelo estudo. Todavia, por se tratar de um estudo de caso, a investigação em profundidade foi fundamental para entender o significado e a experiência das pessoas no cotidiano, cujas informações, somente foram possíveis confirmar em razão dos métodos e dos procedimentos utilizados na coleta e na análise dos dados.
Para investigar como ocorre o equilíbrio da tensão dinâmica no uso dos SCG em empresa familiar, desenvolveu-se questões no roteiro de entrevista a partir da fundamentação teórica (Quadro 1), em sintonia com o contexto de análise. No Quadro 2, a quantidade e o teor das questões para cada categoria.
Coleta e tratamento dos dados
Para validação do instrumento de pesquisa, realizou-se um teste piloto com um comitê gestor de uma empresa familiar de pequeno porte que atua no segmento de automação desenvolvimento de equipamentos industriais. Foram entrevistados os gestores familiares e não familiares que integram o comitê gestor e respondem concomitantemente pelos departamentos de administração, contábil, produção e P&D. A partir do caso piloto, foram incluídas novas subcategorias com o intuito de alinhar os objetivos e responder o problema de pesquisa. Nesta etapa, observou-se a profundidade e abrangência e compreensão das questões. O roteiro de entrevista sofreu ajustes quanto a linguagem utilizada e ordem das questões que integram o SCG.
O objeto de estudo consistiu em uma empresa familiar que opera no segmento de indústria de calçados e têxtil, denominado neste estudo, como Grupo SPORT (nome fictício). A seleção do caso decorreu da autorização de acesso para a realização da pesquisa em profundidade. Também pela postura estratégica da empresa, estrutura operacional, setor de atuação e pelos indicativos do modelo de negócios e de inovação em produtos, necessários para a efetivação da pesquisa.
A realização do estudo em profundidade (Yin, 2010) foi possível pelo emprego dos seguintes procedimentos metodológicos: a) entrevistas semiestruturadas com o corpo diretivo e gerência correspondendo a cinco gestores, sendo três do núcleo familiar; e b) análise dos documentos da empresa; c) registros organizacionais; d) mídias impressas, como jornais e sites de internet. Os dados coletados permitiram a abrangência da profundidade desejada do tema, pois envolveram o relato de pessoas nos diversos níveis hierárquicos da empresa. Para a discussão dos resultados da pesquisa, foi necessário triangular os dados coletados. A triangulação ocorreu pela análise do texto das entrevistas, dos documentos, dos registros internos e observação não estruturada.
As entrevistas ocorreram com cinco pessoas, sendo três membros da família e dois funcionários não familiares. Quanto aos três membros familiares, dois são gerentes de desenvolvimento de produtos e um membro do conselho, diretor e CEO. Quanto aos dois funcionários, gerente de informações estratégicas e diretor de contabilidade e controladoria.
Entende-se que os gestores entrevistados, reúnem as atribuições e qualificações necessárias para contribuir para o escopo desta pesquisa. As entrevistas foram realizadas nas unidades administrativas (Santa Catarina e Rio Grande do Sul) da empresa, com duração média de 1h30m cada, gravadas mediante autorização dos entrevistados, e norteadas por um roteiro de questões, elaborado a partir da revisão da literatura (Quadro 1). Após, o conteúdo da gravação foi transcrito. Depois da transcrição, o texto com o relato dos entrevistados foi submetido aos gestores para aprovação. As entrevistas foram realizadas em junho e julho de 2014. As demais informações, como documentos e registros organizacionais, referentes ao período de 2011 a 2013, foram cedidos de agosto a novembro de 2014.
Os documentos representam uma fonte de informação válida para os estudos de caso. Os documentos utilizados foram: histórico de evolução; relatórios anuais das demonstrações financeiras completas referentes aos anos de 2011 a 2013, publicadas no Diário Oficial do Estado, com parecer de auditores indepen dentes; código de conduta; reportagens publicadas em sites na internet; informações da empresa extraídas do site do Grupo SPORT; e-mails trocados com os entrevistados. Além destes, foram utilizados registros organizacionais que constam de planilhas ou arquivos, cedidos para uso desta pesquisa. Buscaram-se, junto aos responsáveis de setores, informações utilizadas no processo decisório.
As observações aconteceram durante as visitas de campo, concomitante com a coleta de dados das entrevistas. Foram registradas em notas no diário de campo. As notas de campo geraram informações complementares, para registrar palavras, frases, expressões e pontos relacionados ao ambiente investigado, como local e apresentação visual. Durante os encontros para entrevistas, foram visitadas unidades produtivas, os locais de trabalho dos entrevistados e as salas de reuniões.
A operacionalização ocorreu por meio do software Nvivo 10 que gerou relatório, por categoria codificada, com os extratos das entrevistas, que foram codificados em cada uma das categorias e subcategorias utilizadas, conforme Quadro 1. Além de auxiliar na articulação dos dados, o software ajudou na codificação e nas relações entre as categorias e subcategorias de análise. Posteriormente ao processo de categorização, promoveu-se a análise dos dados, tendo como base os conteúdos e os trechos selecionados (Strauss & Corbin, 2008).
Após a organização inicial dos dados, foi possível identificar os principais pontos do texto para orientar a análise. Inicialmente, a leitura foi embasada pela proposição teórica e pelas categorias de análise indicadas a partir da literatura. Na sequência, a descrição, a interpretação e análise do conteúdo informacional, assim como a triangulação dos dados foi utilizada para a construção do texto, interagindo com a visão dos entrevistados. Experiências e práticas foram comparadas com a literatura, de maneira a proporcionar reflexões sobre o conteúdo de análise.
Caracterização do grupo SPORT
O caso que integra este estudo, denominado anonimamente como Grupo SPORT, representa um grupo de empresas de grande porte que industrializa artigos esportivos. Conta com, aproximadamente, 10.000 funcionários, distribuídos em dezesseis unidades de negócios no Brasil e no exterior. A empresa que deu origem ao Grupo tem mais de 40 anos de existência. A expansão ocorreu em duas áreas de negócios: a) gestão de marcas próprias ou licenciadas com indústria de calçados, confecções e acessórios e b) private label. Consta que 65% dos negócios do grupo familiar em 2015 concentravam-se na gestão de marcas próprias ou licenciadas, sendo uma marca própria e duas marcas internacionais licenciadas. O segmento de private label agrupava 35% dos negócios com parceiros líderes no mercado de artigos esportivos, parcerias que tiveram início há mais de 20 anos. Destacam-se também a ampliação e a internacionalização das atividades, características que contribuíram para a continuidade e a consolidação dos negócios.
Análise e Discussão dos Resultados
Influência da família na gestão dos negócios
A propriedade do Grupo SPORT está sob o controle do proprietário/fundador e filhos (99%) e outros acionistas (1%). Nas empresas de primeira geração, um dos desafios encontra-se no equilíbrio entre autonomia do proprietário e as participações de outros membros no controle, assim como a passagem do controle e da propriedade aos filhos. No caso em estudo, os filhos estão sendo preparados formalmente, em funções consideradas estratégicas, para a continuidade das empresas que integram o grupo. A transição com a entrada de novos membros familiares gera oportunidades de reavaliar o curso que a empresa está seguindo para realizar mudanças fundamentais. A mudança (transição) e o crescimento (estabilidade) são essenciais para o sucesso e a continuidade do negócio familiar.
Percebe-se, nos relatos, que o processo de transição acontece de modo consensual, com duas gerações (pai e filhos) exercendo papéis diferentes na gestão, mas alinhados ao planejamento dos negócios e aos interesses do grupo familiar. Nota-se que a geração mais antiga no poder exerce o papel de Chief Executive Officer (CEO) e possui controle acionário, envolvimento no conselho de administração e responsabilidade pelo desempenho financeiro do grupo, enquanto a segunda geração ocupa posições-chave em gerências intermediárias. A responsabilidade dos gerentes familiares (filhos) recai sobre questões administrativas, operacionais e sobre o desenvolvimento de produtos e criação de novos produtos.
O Grupo SPORT busca diversificar os mercados e estabelecer linha de produtos (calçados, confecções e acessórios) consistentes com os propósitos da organização. Em virtude da expansão e da diversificação (fusão das duas principais empresas), surgiu a necessidade de reestruturação e adequação dos processos operacionais. A partir desse reordenamento, a estratégia e a capacidade de estrutura oportunizaram a demanda por novos mercados. Constata-se, nesta pesquisa, a influência do fundador, além dos valores, da história, das metas e do compromisso da família, que constituem elementos indissociáveis no desenvolvimento da propriedade, da família e da gestão/empresa.
Estratégia de inovação no Grupo SPORT
A estratégia de inovar nos produtos e processos iniciou em 2009, como resultado da necessidade de mudanças e de adequação de fatores contingenciais identificados no ambiente competitivo: aumento da concorrência, reposicionamento das marcas, melhoria na qualidade do produto, melhoria na eficiência dos processos e nas operações. No Quadro 3, as principais características da estratégia de inovação.
O Quadro 3 mostra que a inovação de novos produtos é um fator que sempre esteve presente no relacionamento com os parceiros, sendo busca constante de projetos que demandam maior investimento em inovação, maquinário e na formulação de materiais nos produtos, e “tudo isso fez com que todo processo de desenvolvimento fosse ganhando notoriedade e conhecimento, assim como as fábricas foram preparadas para atender a um nível muito alto de tecnologia aplicado aos produtos.” (Gestor 2).
Outro aspecto, ressaltado pelo Gestor 3, consiste no relacionamento com parceiros internacionais, “visto que há muitos inputs ou materiais que integram os produtos elaborados que são oriundos do exterior”, contudo, “quando não se tem esses materiais no mercado nacional, a empresa faz uma parceria com o fornecedor nacional para produzi-los.” Nesse quesito, destaca-se a inovação colaborativa. Para Bigliardi e Galati (2018), a opção pela inovação colaborativa ocorre por meio da formação de alianças, joint ventures, troca de tecnologia a acordos contratuais por meio de licenciamentos e parcerias.
A “inovação para explorar produtos que não existem no mercado é o tipo de inovação mais difícil de ser desenvolvida” (inovação radical), presume o Gestor 2, pois envolve “maior quantidade de horas de pesquisa, conhecimento mais específico do público consumidor, capacidade criativa diferenciada e, principalmente, interação entre as diversas áreas” – comercial, industrial e da estrutura da empresa. Em relação a quesito, segue relato do Gestor 2: “A inovação é uma coisa que é perseguida pela empresa e não acontece somente no âmbito fabril ou de processos que existem no desenvolvimento, mas também em nível de percepção do consumidor, que é importante do ponto de vista comercial.”
Informações identificadas na pesquisa constam que o Grupo SPORT registrou 122 patentes de novos produtos no período de análise – 2011 a 2013 –, sendo mais representativo o ano de 2011, correspondendo a 80 registros de novos produtos, e o menor registro foi no ano de 2013, com dois registros de novos produtos .
Em uma visão de inovação na melhoria dos processos, a ferramenta amplamente destacada por todos os gestores é lean manufacturing. Na concepção do Gestor 2, “comparado há alguns anos, os níveis de eficiência de produção de calçados aumentaram. [...] A companhia fez um projeto, em torno dos processos, tanto em calçados, quanto em confecções, para melhorar a eficiência das fábricas tinha eficiência de 40 a 50%, hoje, de 90 a 100%.”
O lean é uma ferramenta avançada no processo de desenvolvimento do produto, e o principal resultado é o ganho em termos de eficiência, como destacam os gestores 4 e 5. Em termos de tecnologia de desenvolvimento de produtos, o Grupo SPORT está cada vez mais focado em desenvolver formas e processos de produção que sejam mais eficientes, tomem menos tempo e sejam mais baratos, e isso envolve automatização (Gestores 1, 2 e 3).
A tensão dinâmica e o uso dos Sistemas de Controle Gerencial
A tensão dinâmica consiste em gerenciar a articulação entre a inovação criativa e a realização dos objetivos estratégicos. No Quadro 4, as evidências empíricas do caso.
Quanto à criação de valor, os relatos focam na expansão e na busca de novos mercados e, regularmente, assumem riscos nas operações de seus produtos. Conforme relato do Gestor 4, “a gestão de riscos é uma pergunta que faz pensar. Quando se toma decisões, avalia-se os prós e contras; entretanto, a gestão de riscos é bem mais abrangente.” O Gestor 4 cita o exemplo de uma unidade industrial instalada em outro país da América Latina em 2012: “[...] montamos a fábrica, um ano e meio depois nós fechamos. Acabou ocorrendo um problema cambial e causou uma série de problemas em termos de custos.”
Constatou-se, a preocupação dos entrevistados em ressaltar o atingimento de metas, o orçamento, os indicadores e as reuniões para medir o desempenho em consonância com o planejamento estratégico, sendo enfaticamente pronunciados nas entrevistas. De acordo com o Gestor 4, os valores instituídos na empresa são valores defendidos “em casa” e guardam relação com os valores e princípios observados no ambiente de negócios. Percebe-se a influência da família para promover uma cultura de inovação, considerada pelos gestores como diferencial competitivo, contudo, existe dificuldade de realizar mudanças para introduzir novos valores na organização porque “mudar uma cultura é extremamente difícil”, resume o Gestor 4.
O uso dos sistemas de controles interativos encontra evidências na resolução de problemas por iniciativa dos funcionários; é motivado e instituído por intermédio de projetos com foco no desenvolvimento de novos produtos, na qualidade do produto, na eficiência das operações e na redução de custos das operações. Os resultados encontram consistência com os estudos de Diehl (2006), Bisbe e Malagueño (2009) e Mundy (2010).
Quanto ao crescimento do grupo, o Gestor 3 indica que, na sua visão: “o grupo cresceu de forma bem estruturada e consistente, nunca teve um crescimento repentino.” Contudo, esse mesmo gestor relata que “quando a empresa iniciou os investimentos em clubes de futebol [...] no clube Alfa, na década de 90, aconteceu o maior crescimento do grupo em um curto espaço de tempo [...] Aí foi o maior crescimento em um curto espaço de tempo.” Para o Gestor 4, o maior crescimento ocorreu pela fusão com outra empresa do segmento de calçados.
Em relação à entrada da nova geração na empresa, os Gestores 1, 4 e 5 manifestam-se mencionando que os cargos são ocupados por quem tem competência para “administrar e habilidade para fazer. Não tem uma situação para administrar esse ponto, é diferente de outras empresas que têm vários sócios e filhos e acaba sendo um problema. Não é muito o nosso caso.” (Gestor 4). Outro ponto é a hierarquia estabelecida na empresa; os gerentes familiares não são subordinados diretamente a outra pessoa da família, mas a outros profissionais não pertencentes a ela. Outrossim, não existe distinção em termos salariais e gestores familiares estão sujeitos às mesmas faixas salariais e aos critérios igualmente estabelecidos no plano de cargos e salários.
Para o Gestor 3, a entrada de novos membros da família na empresa resulta da preparação, do conhecimento do negócio familiar e, acima de tudo, de conquistar espaços na gestão. Conforme seu relato, “precisa viver, entender a cultura, a vivência das pessoas que já passaram por aqui, os procedimentos, os processos. Então essa forma gradativa de entrar e conquistar as pessoas ao teu redor é a melhor forma” de o membro familiar entrar para o círculo de negócios. Para o Gestor 2, “cada um tem as suas responsabilidades nas suas funções e tem de cumprir com elas. Sem dúvida, você se cobra por estar à frente mais do que qualquer outro ou pelo menos atender às demandas que exigem o teu cargo, mas a responsabilidade acaba sendo um pouco maior.”
Quanto à continuidade e à perpetuidade da empresa (longo prazo), essa é uma situação que precisa ser discutida e resolvida, pois pode ser uma abertura de capital ou uma profissionalização direta, e, nesse caso, o presidente fundador fica somente no conselho de administração. Nesse sentido, o Gestor 4 manifesta-se indicando que “a empresa estava bem mais avançada nesse ponto, mas algumas circunstâncias fizeram com que a empresa recuasse e voltasse atrás nesse foco.”
A pressão por resultados em curto prazo ocorre de acordo com o planejamento. Os “diretores recebem as informações e monitoram e cobram dos gerentes administrativo, comercial, vendas, etc.”, declara o Gestor 1. A cobrança é com base na gestão das metas do período, em conformidade com os Gestores 4 e 5. Os gerentes são cobrados com base no orçamento e a remuneração está atrelada aos bônus.
No que se refere à distinção entre gerentes familiares e não familiares e à cobrança existente sobre eles, não há diferença e nem algum tipo de benefício para os gestores pertencentes à família. O tratamento é o mesmo, ou seja, existem iguais pressão e cobrança para o cumprimento dos objetivos e das metas, declaram os gestores 2, 3 e 5. Todavia, o Gestor 2 ressalta: “A cobrança é a mesma, mas a responsabilidade acaba sendo maior [...]” em razão do envolvimento do gestor nas várias atividades e funções. E complementa: “Por mais que não seja parte do meu trabalho, eu me envolvo em várias outras coisas, porque elas vêm até mim. É meio de forma automática, acaba se envolvendo, de forma muito natural.” Na concepção do Gestor 3, o peso da palavra é maior: “As pessoas pelo menos tentam fazer, e tem um atendimento 100% [...] eu acredito que é pela cultura da empresa.”
Os depoimentos destacam os mecanismos integrativos do sistema ERP, quanto à flexibilidade e controles da organização, que foi ajustado às necessidades da empresa. De acordo com o Gestor 5, os maiores desafios do sistema ERP foram a implantação e a adaptação do sistema em outros países, principalmente, na parte tributária, para incluir todas as ferramentas, porque foi preciso criar novos processos para assegurar principalmente a questão do faturamento, emitindo o documento 100% alinhado à legislação em vigor. Outro controle de consenso dos gestores refere-se à utilização do orçamento concomitantemente com outros controles internos citados no decorrer das entrevistas. O custo padrão é definido no orçamento e depois é realizado um complemento do padrão e comparado o resultado com o efetivo (Gestor 5). Percebe-se, consoante os gestores, que os relatórios são adequados e ajustados conforme a sua função.
No que concerne ao centro de custo, o Gestor 4 salienta que no âmbito “comercial é todo separado por marca, por plano de negócios, ainda por área em cada plano de negócios. Em nível corporativo, gerências, financeiro, por grupo, eles são bem abertos os centros de custos.” A eficiência em custos, com a inclusão da ferramenta Lean e a tecnologia de inovação de processo, foi amplamente relatada pelo Gestor 2: “Para otimizar custos, desenvolver novos materiais, novas formas de construir o produto, tem máquinas que automatizam alguns processos, porque acho que pode ser relevante nesse nível é a automatização do processo produtivo para diminuir custos.”
Outro modo de integração da informação ocorre por meio de reuniões. As reuniões trimestrais para avaliação das metas e dos indicadores , conforme relata o Gestor 3, são “reuniões de planejamento estratégico [das quais] participam um gestor de cada marca e mais a diretoria.” Nessas reuniões, discute-se o cenário econômico para todas as marcas, com interação de informação com os seguintes tópicos: metas, dificuldades, previsões de mercado e concorrências. A reunião anual da Jornada de Operações, como afirma o Gestor 2, serve para “compartilhar muitas coisas, entre elas a inovação, que às vezes não se fica sabendo que diminui custo ou melhora processos.”
O Grupo familiar atua em ambiente com nível de incertezas estratégicas acentuado por dificuldade de previsão de demanda (inovação de produtos), liderança de tecnologia à frente dos concorrentes, investimento de risco em novos projetos e expansão de novos negócios (Startup). Para fazer frente ao cenário de incertezas estratégicas e manter a empresa adaptável ao cenário competitivo, acompanha o faturamento semanal, avalia o resultado e os desvios mensal e trimestralmente, com base no orçamento de cada uma das marcas, por meio de reuniões presenciais entre gestores familiares e não familiares.
Uso dos sistemas de controle gerencial em ambiente de inovação
O crescimento e a expansão da organização foi um dos pontos mais destacados pelos gestores e incluem as três parcerias de longo prazo com marcas internacionais (Private Label); licença de exploração de produtos de marcas internacionais; desenvolvimento e criação de marca própria; aquisição e fusão com empresa do setor de calçados; expansão para mercados internacionais; investimento em infraestrutura para desenvolvimento de produtos; e liderança em tecnologia e inovação para obter vantagem competitiva frente aos concorrentes.
Constatou-se, que o objetivo estratégico de ampliação e diversificação dos negócios criou problemas vinculados a: variação cambial; sourcing estratégico; estoques excessivos de produtos; investimentos de capital em startup; transferência de preços entre unidades gerando margens menores de lucros nos produtos; assim como inserção em mercados com características diferentes (México e Argentina, por exemplo) e alinhamento das questões fiscais.
Na estratégia competitiva de ampliação dos negócios, o risco é iminente ao processo. Identificou-se que a cultura de risco é um fator ainda não implementado e disseminado nesta organização. Contudo, possui uma estrutura de governança alicerçada em órgãos estatutários e diretivos, que oferecem instrumentalização consistente para maior segurança aos sistemas de gestão em todos os níveis da organização.
A entrada da nova geração na gestão das empresas representa o alinhamento dos interesses familiares; entretanto, pode gerar tensão na condução dos negócios na relação entre gestores familiares e não familiares. Todavia, nesse caso, os gerentes familiares não têm diferenças quanto às cobranças de resultado que são imputadas aos demais gerentes não familiares, mas a responsabilidade, por serem da família, revelou-se maior. Um dos principais desafios nessa transição é criar mecanismos de interação que permitam ao sistema familiar continuar operando de modo integrado diante da descentralização e da diversificação.
Percebe-se que, neste caso de estudo, há influência da família para estimular a estratégia de inovação como diferencial de vantagem competitiva. A configuração dos sistemas de controles interativos e dos sistemas de controles diagnósticos apresenta-se como complementar neste caso. Depreende-se que a tensão dinâmica é equilibrada pelo uso conjunto dos controles diagnósticos e interativos em quatro fatores: modelo de negócios, crescimento e riscos, resultados e comportamento dos funcionários. E predominantemente interativo para criação de valor, inserção de novos membros familiares na gestão e mudanças ambientais.
No modelo de negócios para implementação das estratégias competitivas, o uso diagnóstico ocorre no plano de negócios por área, por marca e na execução do planejamento estratégico. O uso orçamento de forma interativa e diagnóstica, coaduna Isidoro (2012), que um mesmo controle pode ser ora interativo, ora diagnóstico. O controle de lucros e resultados é utilizado de forma diagnóstica na melhoria e eficiência dos custos e dos processos, resultado também revelado por Diehl (2006). O uso de controles comportamentais tem função restritiva e é implementado, entre outros meios, pelo código de conduta, plano de cargos e salários e avaliação das metas, coadunando com Oyadomari (2008), pela implementação das regras de conduta. Os achados revelam semelhança com outros estudos (Widener, 2007; Acquaah, 2013) e Mundy (2010) coloca que em determinadas condições estratégicas os controles diagnósticos e interativos se complementam.
Percebe-se que o uso dos controles diagnósticos ocorre com maior tendência para controles de riscos, com ênfase para os controles internos, operações entre unidades e auditoria independente. O uso de controle interativo acontece na criação de novos produtos e nas mudanças ambientais, os resultados indicam a relação do uso interativo das alavancas gerenciais adequadas ao modelo de gestão de inovação influenciando de forma positiva a inovação. Resultados que remetem ao estudo de Bisbe e Malagueño (2009) no uso dos controles para inovar a atividade. A entrada de novos membros familiares, pela nova geração, também foi sinalizada como interativo, pela cultura de inovação, por introduzir novos conceitos de aprendizagem organizacional e na iniciativa dos funcionários para resolução de problemas operacionais e administrativos da empresa.
Considerações Finais
O propósito desta pesquisa consistiu em averiguar como ocorre o uso dos Sistemas de Controle Gerencial no equilíbrio da tensão dinâmica para implementar a estratégia de inovação em empresa familiar. A investigação foi realizada por meio de um estudo de caso com abordagem qualitativa. Na sequência, as inferências, implicações, limitações e sugestões de outros estudos.
Os resultados deste estudo revelam contribuições teóricas para a literatura. Os achados indicam que controles diagnósticos e controles interativos são complementares; porém, os controles personalizados a cada função e a análise dos desvios orçamentários são os artefatos mais utilizados de forma interativa (adaptar ao ambiente), o plano de negócios, o orçamento tradicional e o planejamento estratégico de forma diagnóstica (implementação da estratégia). O orçamento serve como um instrumento de controle e avaliação das metas, enquanto no uso interativo exerce a função de coordenar e comunicar as prioridades estratégicas, com os gerentes comprometidos por um sistema de bônus, interagindo os interesses da empresa com a responsabilidade e o comprometimento de interesses individuais.
Quanto as contribuições práticas deste estudo, a influência da família está na preparação da nova geração no ambiente de negócios; transmissão de conhecimento e experiência entre gerações e na promoção da cultura de inovação no ambiente de negócios. Os resultados revelam semelhança com Kellermanns et al. (2012), que a nova geração na empresa familiar pode ser um fator chave para compreender a importância da inovação para a sobrevivência e o sucesso da empresa familiar. Neste caso, o compromisso da nova geração com os negócios da família é essencial para o processo de continuidade e o alinhamento dos objetivos estratégicos e desempenho superior.
Nesse sentido, a influência da família promove a inovação na empresa, com base nas seguintes evidências: 1) interação entre os controles diagnósticos e interativos, de forma conjunta e complementar; 2) uso dos controles interativos na adaptação às mudanças ambientais e para criação de valor; 3) adaptação das rotinas e agenda dos gerentes e executivos para inclusão de novas reuniões e compromissos ao longo do dia; 4) priorizar mudanças estratégicas que atendam aos interesses da família e dos negócios; 5) interatividade da nova geração (trabalho conjunto) atribui novos conceitos gerenciais no núcleo de gestão; 6) estímulo da nova geração para a criação de novos projetos com iniciativa para aprendizagem organizacional; 7) criação de novos indicadores de desempenho para o monitoramento de projetos e produção.
Destaca-se que a principal contribuição teórico-empírica deste estudo de caso está na inclusão de um fator de tensão dinâmica relacionado à influência da família, que se refere à entrada de novos membros familiares na gestão de uma organização familiar. O estudo também contribui para a literatura de SCG, mais especificamente para o quadro LOC, ao apresentar uma discussão qualitativa, haja vista que a maioria dos estudos nesta temática são predominantemente quantitativos. Evidências dos valores familiares e da aprendizagem empreendedora reforçam as crenças e o uso dos controles interativos para adaptação ao ambiente q e no equilíbrio da tensão dinâmica.
O estudo também apresenta limitações e sugestões de estudos futuros. O entendimento pleno dos pesquisadores sobre o contexto da organização, fator este limitante, por não vivenciar o cotidiano dos sujeitos da pesquisa. Por se tratar de caso único, os resultados revelam indícios de ocorrência do fenômeno no contexto da empresa familiar. Outro aspecto que deve ser ressaltado, é que neste constructo, não se considerou outros fatores relevantes que a influência familiar pode causar com a tensão dinâmica, o que indica a possibilidade de novas pesquisas no âmbito da empresa familiar.
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Apêndice A. Roteiro de Entrevista
Influência da família
1) Como foi a evolução e desenvolvimento da empresa desde a sua fundação? (Surgimento, fundação, expansão, períodos marcantes, controle e propriedade da empresa)
2) Como está estruturada a organização societária da empresa? O controle da empresa está consolidado na família? (Casal/fundador, filhos e outros membros familiares)?
3) Como ocorre a entrada de novos membros familiares na gestão?
4) Como a nova geração está sendo preparada para assumir novos desafios na organização?
Inovação de produtos e processos
1) Com relação ao ambiente de inovação, a empresa possui um setor de P&D, projetos que trabalham a inovação de produtos?
2) O desenvolvimento de produtos possui ênfase na criação de novos produtos?
3) Qual o número de patentes no período de 2011 a 2013?
4) Qual o percentual do faturamento destinado a novos produtos e processos?
5) Como ocorre a implementação de novos processos e novas técnicas de produção?
6) A empresa realiza investimentos e faz uso de novas tecnologias para desenvolvimento do produto (avançada, possui liderança)?
Sistema de Crenças e Limites
1) Como a visão e missão e são divulgadas a todos os colaboradores?
2) A empresa possui valores declarados e são difundidos entre os gestores e colaboradores? (Crenças, valores, objetivos, orientações, comportamento, estratégias, mudanças).
3) Como o código de ética e de conduta orienta a forma de comportamento dos funcionários? (Formalização, regras claras, liberdade/autonomia, limites, conduta).
Sistema de Controles Diagnósticos
1) Como e para quem o planejamento estratégico é divulgado na organização?
2) Como a empresa faz para acompanhar as metas e os resultados?
3) Como e quando ocorrem as reuniões entre níveis hierárquicos para discussão das metas e resultados?
4) Como e quando os controles formais são utilizados no processo decisório?
Sistema de Controles Interativos
1) Como a empresa monitora as necessidades dos clientes? Como?
2) Como os funcionários são estimulados a propor novas ideias e soluções para os problemas da organização? (Resolver, opinar sobre incertezas estratégicas)
3) Como ocorre a discussão dos planos de ação e metas de desempenho entre superiores e subordinados? (Quando ocorre, participação de membros familiares e não familiares, competitividade)
4) A empresa possui indicadores de desempenho que acompanha no processo decisório? E quando são utilizados os indicadores de desempenho?
Tensão dinâmica
1) Como a empresa cria valor para o negócio familiar (objetivo de longo prazo objetivo de curto prazo, risco envolvido no negócio e entrada da nova geração na gestão das empresas)?
2) Como empresa cobra dos subordinados (gerentes familiares e não familiares) a pressão por resultados?
3) Como a empresa faz a interação das informações entre uma área e outra?
4) Ocorre necessidade de os sistemas de controle gerencial serem adaptados para atender as estratégias? Como e quando ocorre?