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Apresentação
Cláudia Regina Nichnig; Maise Caroline Zucco; Soraia Carolina de Mello
Cláudia Regina Nichnig; Maise Caroline Zucco; Soraia Carolina de Mello
Apresentação
Revista Tempo e Argumento, vol. 12, núm. 29, pp. 2-6, 2020
Universidade do Estado de Santa Catarina
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Apresentação

Apresentação

Cláudia Regina Nichnig
Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), Brasil
Maise Caroline Zucco
Universidade Federal da Bahia (UFBA), Brasil
Soraia Carolina de Mello
Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)., Brasil
Revista Tempo e Argumento, vol. 12, núm. 29, pp. 2-6, 2020
Universidade do Estado de Santa Catarina
Dossiê - Feminismos como objeto de pesquisa e matriz epistêmica: pensando a história do tempo presente

O presente dossiê reúne artigos de pesquisadoras que estudam os feminismos e movimentos de mulheres contemporâneos e suas principais agendas, abarcando discussões sobre identidades, ciências, demandas por políticas públicas e acesso à justiça. As reivindicações e práticas políticas de mulheres negras, indígenas, trans, encarceradas, trabalhadoras, dentre outros marcadores sociais, organizadas em coletivos ou instituições, protagonizam as análises apresentadas, complexificando as importantes e clássicas reivindicações de superação do universalismo masculino encampadas pela História das Mulheres. Os artigos nos apresentam diferentes aspectos desses grupos sociais marcados pela invisibilidade e pela negação de direitos, mas que, na contemporaneidade, atravessam profundas transformações em seu reconhecimento, nos espaços que ocupam, em suas lutas.

A (re)emergência dos debates feministas, tão evidente na História do Tempo Presente, em um contexto de avanços neoliberais e da chamada “onda conservadora”, é um fenômeno carregado de historicidade. Os artigos aqui reunidos nos contam histórias das mulheres e dos feminismos contemporâneos, de suas diferentes formas de articulação, conexão, agrupamento, comunicação e práticas políticas, que demonstram a multiplicidade e heterogeneidade dos feminismos como movimentos e como matriz epistêmica. Reafirma-se a importância do plural quando falamos em feminismos, ao mesmo tempo em que bases teóricas produzidas por esses próprios sujeitos são mobilizadas.

A questão das interseccionalidades e da decolonialidade dialogam com os feminismos na reunião de estudos – selecionados neste dossiê – que abordam demandas sociais de mulheres brasileiras e estrangeiras, do Sul e do Centro-Oeste do Brasil, em privação de liberdade, urbanas, indígenas, negras, trans e cisgêneras. Trabalhos com histórias de vida, observação de campo, análise de periódicos e debates epistêmicos criticamente preocupados com problemas sociais. Em síntese, esta seleção de artigos é atravessada pela crítica a uma perspectiva universalista de ciências, perspectiva esta que localiza no Norte Global, dentre homens brancos detentores de determinado status, o modelo de ciência que serviria para todo o mundo.

Iniciando a apresentação dos artigos, “Uma virada epistêmica feminista (negra): Conceitos e debates”, da professora Ana Maria Veiga, atravessa referenciais teóricos identitários, com centralidade étnico-racial, em diálogo com os movimentos sociais e os avanços dos estudos acadêmicos. Seu artigo perpassa o debate estadunidense sobre a articulação entre opressões sociais para um debate nacional e latino-americano dentro do que acabou se caracterizando como o campo interseccional. O texto apresenta desafios para a manutenção de uma proposta politicamente engajada diretamente ligada com sua gênese: as mulheres negras. Decolonialidade e interseccionalidade tornam-se o foco do artigo que encontra nas mulheres sertanejas um exemplo possível de uma análise comprometida com os dois conceitos.

O segundo trabalho, “Epistemologia insubmissa feminista negra decolonial”, de Ângela Figueiredo, nos traz um debate entre demandas sociais e saber acadêmico estruturado na união entre estas partes, historicizando os conceitos e mostrando a produção e a visibilidade recente da produção das autoras negras. A articulação dos diversos conceitos presentes no título do artigo estabelece uma mirada crítica à produção do conhecimento e faz um convite a outras formas de olhar para esse processo em diálogo com a sociedade. A perspectiva afrocentrada, consciente da posicionalidade dos sujeitos produtores de saber, desloca o centro dos debates teóricos historicamente hegemônicos. Nesse sentido, engajamento em torno da solução de problemas vivenciados na comunidade, e em uma ciência comprometida, estaria no cerne do modelo epistêmico proposto no trabalho.

Rosangela Celia Faustino, Maria Simone Jacomini Novak e Isabel Cristina Rodrigues, em “O acesso de mulheres indígenas à universidade: trajetórias de lutas, estudos e conquistas”, apresentam o resultado de uma coleta de entrevistas semidirigidas e observações de campo realizadas entre os anos de 2013 e 2015 com mulheres indígenas que ingressaram em cursos de graduação no estado do Paraná a partir dos programas de inclusão institucionais. Diferentes territórios e etnias compuseram esse levantamento que analisou elementos como a relação com a comunidade, a assistência estudantil e o sentido político desse processo educacional. Essas mulheres, que representam quatro quintos das pessoas indígenas formadas (2002-2019), passam a assumir espaços profissionais na comunidade antes ocupados por não indígenas, ampliando sua atuação política.

“Ler, escrever e libertar: Experiências que promovem a diminuição de pena para mulheres privadas de liberdade em Mato Grosso”, da professora Ana Maria Marques, traz os resultados de um projeto voltado a esse público, considerando o acesso ao letramento. As experiências voltadas à remição da pena de mulheres em situação de privação de liberdade da Escola Nova Chance e dos projetos em parceria com a Universidade de Mato Grosso (UNEMAT- Cácares) e Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT- Cuiabá e Rondonópolis) são analisadas. Leituras e resenhas fazem parte da estrutura metodológica da iniciativa que atende mulheres de diferentes níveis de escolaridade. As possibilidades diante da realização de ações dessa natureza, bem como os desafios materiais e institucionais, nos mostram os atravessamentos de gênero os quais constroem, como experiência feminina, um cenário de abandono.

No artigo “‘A gente é pessoa!’: Narrativas de mulheres trans sobre direitos humanos”, Marta Gouveia de Oliveira Rovai procura discutir a temática com base em quatro histórias de vida de mulheres do sul de Minas Gerais. Com um olhar orientado pelas preocupações em torno do sensível e das emoções, bem como um alinhamento com a História do Tempo Presente, o debate se situa na conjuntura brasileira contemporânea de ataque às pautas LGBT e posse de um governo federal contrário às mesmas. Em suas experiências particulares, Wall, Ana Luíza, Luana e Luciele buscam o reconhecimento identitário atravessado pela reivindicação quanto à integridade de seus corpos e do que identificam como liberdade. As transfobias vivenciadas e as imposições de modelos sociais baseados na cisgeneridade e na heteronorma produzem discursos de reconhecimento da existência cotidiana como ato político. Assim, temos no trabalho uma reflexão sobre as percepções de sujeitos históricos em meio à mudança, ou ainda ruptura, entre Estado e movimento LGBT.

Marlise Regina Meyer e Ronaldo Pires Canabarro integram os trabalhos com uma discussão, dentro dos estudos de análise de conteúdo, sobre o periódico Lampião da Esquina, referencial da imprensa alternativa não heterossexual em circulação no eixo sudeste do Brasil na segunda metade do século XX. Intitulado “Travesti: textos-vestígios na construção de uma identidade – Jornal Lampião da Esquina (1978-1981)”, o artigo foca na abordagem de uma identidade: a identidade travesti aparece como a “mariposa”, os “veados”, a “boneca” e as “bichas-biônicas”, montando um quebra-cabeça de significados que a constroem num espaço histórico específico. Os caminhos percorridos para a análise do Lampião exploram o sentido político do reconhecimento identitário fazendo ponte com as questões no presente.

A professora Géssica Guimarães, em “Teoria de gênero e ideologia de gênero: Cenário de uma disputa nos 25 anos da IV Conferência Mundial das Mulheres” faz um estudo histórico de dois termos que ocuparam o debate público nacional brasileiro na última década. Explorando a genealogia acadêmica dos estudos das mulheres e de gênero, e compreendendo sua relação com eventos históricos tanto ligados aos movimentos feministas como ao campo religioso, o trabalho direciona seu olhar para a conjuntura brasileira de ataques e o impacto para o ensino de história. Nesse sentido, os desafios passam pela ruptura diante do pânico moral criado em torno do termo gênero, em uma percepção inclusiva e democrática; mas também pelo reconhecimento e disputa interna ao saber historiográfico, que possui sua trajetória sediada nas narrativas e sujeitos masculinos.

O último artigo a compor este dossiê é “Triple presencia femenina en torno de los trabajos: mujeres de sectores populares, participación política y sostenibilidad de la vida”, de Juliana Díaz Lozano. O estudo sobre a situação laboral das mulheres argentinas organizadas a partir de bairros populares nos traz elementos para identificar as preocupações por parte do Estado, as articulações políticas e a própria noção de trabalho. A proposta, aqui apresentada, é resultado de uma pesquisa de campo realizada entre os anos de 2012 e 2017 que se aprofundou na entrevista de 20 mulheres e na observação das mesmas diante da participação de três assembleias de bairro. Acumulando funções, essas mulheres adentram o espaço público da militância rompendo as expectativas de gênero e borrando as fronteiras entre público e privado.

Os textos aqui reunidos abordam, portanto, uma pluralidade de temáticas espaciais, de sujeitos e de metodologias que lançam olhar para os saberes historiográficos e para o campo do ensino de história. Longe de esgotar o recorte adotado para a construção do dossiê, tais questões contribuem, cada uma a seu modo, para enriquecer o campo da História do Tempo Presente.

É preciso destacar que esta é uma série de debates preocupada com os estudos identitários, mas que se calça principalmente no engajamento com a transformação social. A crítica à posicionalidade hegemônica perpetuada nos campos científicos nos dá suporte para pensar outras Histórias que, ao reconhecer a existência de múltiplos pontos de vista, desestabiliza ou desloca os centros.

A pandemia do coronavírus, que transformou indubitavelmente o mundo nos últimos meses, tem afetado de forma mais acentuada os grupos aqui analisados, aprofundando desigualdades seculares. Buscar entender melhor esses grupos, a fim de construir propostas de futuro menos desiguais, fica como crucial contribuição das autoras aqui reunidas.

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