ENTREVISTA
Recepção: 08 Setembro 2020
Aprovação: 14 Dezembro 2020
“[...] toda transculturación, es un proceso [...] en el cual ambas partes de la ecuación resultan modificadas. Un proceso en el cual emerge una nueva realidad, compuesta y compleja; una realidad que no es una aglomeración mecánica de caracteres, ni siquiera un mosaico, sino un fenómeno nuevo, original e independiente.” (Branislaw Malinowski, Introdução ao livro de Fernando Ortiz, Contrapunteo Cubano del Tabaco y Azúcar, p. XVII.)
Hélène Rivière d´Arc é geógrafa e diretora emérita de pesquisa 2 do Centre National de Recherche Scientifique (CNRS) da França, e acumula mais de cinquenta anos de estudos urbanos e regionais em países da América Latina, na interface da Geografia Humana com outras disciplinas. Participou de programas de pesquisa e intercâmbio com pesquisadores brasileiros, liderando alguns, e orientou, na França, teses de doutorandos brasileiros, além de acolher pesquisadores do Brasil em missões de trabalho ou em programas de pós-doutoramento na França.
Embora sua experiência em pesquisa tenha se realizado em vários países da América Latina (especialmente México, Cuba e Brasil), essa entrevista trata de sua trajetória de pesquisa no Brasil. Explicita as razões acadêmicas de seu interesse pelo país, seus primeiros temas de pesquisa e suas interlocuções acadêmicas com várias equipes brasileiras na Bahia, em Recife, Belém, Brasília, Rio de Janeiro, São Paulo e Rio Grande do Sul. Suas diversas problemáticas de investigação, no Brasil, centram-se sobre a constituição dos territórios, seus atores e sua dinâmica, e seguem uma sensibilidade empírica baseada em estudos regionais e das cidades, nas seguintes temáticas: o estudo da fronteira na região do Centro-Oeste e da Amazônia (década de setenta); a formação dos distritos industriais (fim da década de setenta início de oitenta); os polos de desenvolvimento regional agrícola, associados a cidades de médio porte (anos oitenta); a descentralização, a participação e o poder local (meados da década de oitenta a dois mil); e os projetos de revitalização urbana e gentrificação (anos dois mil).
Esses temas integravam originalmente o eixo de estudos sobre o Tiers Monde (Terceiro Mundo) ou dos estudos latino-americanos 3 na França, e se renovaram em termos de pesquisas comparadas e análises sobre a circulação das ideias. Esse exercício de confrontar dinâmicas diferenciais entre países possibilita que a pesquisadora recorra, hoje, ao seu conhecimento sobre participação local em países latino-americanos (em especial, no Brasil) para os seus engajamentos ativos contemporâneos, fora do mundo acadêmico, como membro de uma associação de moradores de um distrito no centro de Paris ( IVème Arrondissement ), diante dos programas de revitalização da cidade que rompem o cotidiano dos seus moradores e cidadãos.
Sua trajetória de pesquisa segue, assim, diferentes contextos da agenda de estudos urbanos e regionais no Brasil, entendendo o(s) “território(s)” como o resultado de uma trama da ação dos homens, o lugar da emergência e da materialização de novas questões das cidades e das regiões, que convocam a uma reflexão no âmbito das ideias e de sua própria vivência, no presente.
DADOS BIOGRÁFICOS DA ENTREVISTADA
Hélène R. d´Arc diplomou-se em História e Geografia pela antiga Sorbonne e defendeu seu Diploma de Estudos Superiores ( Diplome d´Études Supérieurs ) em 1966, com uma monografia – Étude d´une banlieu de la Ville de Mexico , sob a direção de Pierre Monbeig. 4 Realizou seus estudos doutorais na Sorbonne, ainda sob a direção de Monbeig, com a tese Guadalajara et sa région. Influences et difficultés d’une métropole mexicaine (de 3ème. Cycle,1970). Suas atividades de ensino foram desenvolvidas no Institut des Hautes Études de l´Amérique Latine (IHEAL), da Université de Paris III, 5 onde foi Diretora-Adjunta nos anos setenta, e seus programas de pesquisa no CNRS, especialmente no laboratório associado Centre de Recherche et Documentation sur l´Amérique Latine (CREDAL), reestruturado como Centre de Recherche et Documentation sur les Amériques (CREDA). 6 No CREDAL, coordenou a “Equipe Brésil” (Bret, 1991), nos anos setenta e início dos anos oitenta, e dirigiu o Groupe de Recherche Coordonné – Greco 7 26 – Reseau documentaire Amérique Latine , vinculado ao CNRS, nos anos oitenta.
Na sua interface com a comunidade cientifica brasileira, Rivière d´Arc trabalhou com pesquisadores originários de diversos de centros universitários, em vários estados do Brasil. Orientou 21 teses de doutorado, 8 sendo 10 sobre o Brasil, e integrou juris de teses de doutorandos brasileiros em universidades francesas, especialmente sob a direção dos professores: Katia Mattoso (professora emérita de História do Brasil da Université Paris IV – Sorbonne); Michel Rochefort (professor emérito da Université de Paris I – Sorbonne Pantheon); e Henri Coing (professor emérito da Université de Paris XII- IUP, Cr é teil). Ademais, tem participado, na França, de vários comitês acadêmicos de revistas especializadas na América Latina e no Brasil, como o Cahiers des Amérique Latines (Institut des Hautes Études sur l´Amérique Latine) e o Cahier du Brésil Contemporain (Fondation Maison des Sciences de l´Homme) e se dedicou, também, à constituição de bases bibliográficas em temáticas específicas sobre a América Latina (Ver Rivière d´Arc, 1985). 9
Suas pesquisas e publicações se organizam em torno das seguintes temáticas: 10 (i) os usos dos territórios por atores e agentes do desenvolvimento (no México e no Brasil); (ii) descentralização e competitividade nos territórios; (iii) a noção de participação comunitária, como parte do programa “ Les mots de la ville ”; 11 (iv) processos de reestruturação urbana das cidades.
CONTEXTUALIZANDO: O INÍCIO DE UMA INTERLOCUÇÃO CIENTÍFICA
Hélène iniciou sua experiência de pesquisa no Brasil em meados da década de setenta, num estudo sobre a fronteira agrícola na região do Centro-Oeste brasileiro. Eu a conheci em junho de 1979, numa missão que ela fez à Bahia, quando visitou o Centro de Recursos Humanos (hoje Centro de Estudos e Pesquisas em Humanidades, CRH, da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia), buscando identificar fontes de estudos sobre o processo de industrialização na Bahia, 12 especialmente o complexo petroquímico de Camaçari. A pesquisa analisava “[...] os polos de desenvolvimento como instrumentos de ordenação do território, principalmente dos polos industriais [...]” (Bret, 1991).
Esse contato inicial e minha permanência na França, entre 1979 e 1980, permitiram a construção de um programa bilateral de cooperação científica internacional regular entre pesquisadores do Laboratório CREDAL, Centre de Recherche et Documentation sur l ´ Amérique Latine (Université de Paris III), e o Centro de Estudos e Pesquisa e Humanidades da Universidade Federal da Bahia (CRH-FFCH-UFBA), que durou cerca de uma década, apoiado inicialmente no Convênio CNPq/CNRS da Assessoria de Intercâmbio Internacional CNPq (1981-1985), e, em seguida, no Acordo Capes-Cofecub, em 1988, numa configuração tripartite. 13
Essa entrevista explicita a trajetória de mais de quarenta anos de investigação da pesquisadora no Brasil e constitui-se numa pequena contribuição à memória das ciências sociais brasileiras, especialmente das universidades no Nordeste, na medida em que resgata caminhos e identifica contextos de internacionalização do conhecimento, nas décadas de 1970 a1990. Ademais, recompõe núcleos temáticos de pesquisa e modalidades de colaboração bilateral entre pesquisadores franceses e brasileiros, no campo de estudos sobre o Tiers Monde (Terceiro Mundo )14 e dos estudos latino-americanos na França, especialmente dedicados à dinâmica regional e urbana. A expressão “terceiro-mundo” englobava o bloco de países considerados pobres e com graves problemas de integração social e desigualdades, classificados como “subdesenvolvidos” (da perspectiva da modernização das relações capitalistas), e recebeu inúmeras críticas sobre a dualidade estrutural desses países e as teorias da dependência. Yves Lacoste, cuja obra alcançou grande repercussão no Brasil (Lacoste, 1975), questionava os termos “desenvolvimento” e “subdesenvolvimento” como noções ideológicas que entendiam o subdesenvolvimento como uma fase a ser superada no percurso da modernidade do desenvolvimento capitalista de um conjunto de países. Para ele, o liberalismo do pós-guerra alimentou a ilusão de que o conceito de Terceiro Mundo pressupunha um outro mundo, ideologicamente pensado como “o mundo dos pobres, do atraso político, da miséria e do subdesenvolvimento” (Cf. Silva, 2012).
Essa entrevista, portanto, é um relato parcial da trajetória da professora Hélène Rivière d´Arc no Brasil e revela, ao mesmo tempo, a diversidade de fluxos e circuitos de pesquisadores franceses dedicados a estudar a realidade das sociedades e dos países da região da América Latina, tendo por referência, nesse caso, a formação e reconfiguração dos territórios (urbanos e rurais). O resgate de sua trajetória de pesquisa, nessa entrevista, pode, assim, oferecer, em termos mais amplos, pistas sobre o processo de internacionalização das ciências sociais no Brasil, na interface multidisciplinar com pesquisadores franceses, além de contribuir com estudos latino-americanos e com a agenda de estudos urbanos e regionais, no Brasil.
NOTAS PRÉVIAS SOBRE A ENTREVISTA
A entrevista realizou-se em 16 de outubro de 2019, na residência da entrevistada (Hélène Rivière d´Arc) em Paris. Como elementos preparatórios, encaminhei um esboço sobre a natureza da entrevista e as questões centrais que nela seriam tratadas. O objetivo era resgatar a experiência vivenciada pela pesquisadora em termos de temáticas de pesquisas, as interações cultivadas com pesquisadores e as instituições onde trabalhou, no Brasil, de forma a registrar sua extensa trajetória acadêmica e sua contribuição na dinâmica da relação entre pesquisadores brasileiros e franceses.
As perguntas seguiram uma linha cronológica, iniciando por sua formação original, passando pela experiência de formação em pesquisa, as missões e cooperações realizadas, e finalizando com suas perspectivas contemporâneas. A entrevista transcorreu num ambiente informal e de confiança, o que permitiu um diálogo entre entrevistadora e entrevistada. Hélène não se esquivou das análises sobre as diferentes tradições teóricas e metodológicas de pesquisa entre as equipes interdisciplinares, no Brasil.
A transcrição foi realizada por mim e guardou fidelidade às falas, mas foi traduzida e editada em favor da fluidez do texto escrito e da clareza das ideias, deixando-se, entre parênteses, sujeitos ou objetos dos argumentos, que, eventualmente, ficaram subentendidos nas falas. Ademais, dialoguei em notas complementares e inclui fontes documentais em notas de rodapé, de forma a colaborar e subsidiar pesquisas posteriores. As fontes bibliográficas referidas à entrevistada não são exaustivas, mas indicativas de uma produção existente. Tampouco resgatam a produção completa dos colaboradores, nos diferentes quadros de cooperação institucional em pesquisa.
ENTREVISTA
Anete B. L. Ivo (A.I.) – Hélène, boa tarde. A entrevista terá três blocos de questões: o primeiro trata de sua origem e formação e as circunstâncias que a levaram a se interessar pelo Brasil. O segundo bloco recupera a (sua) experiência de intercâmbio com o Brasil com várias equipes brasileiras. O terceiro e último bloco indaga sobre suas perspectivas atuais e sobre questões centrais que tocam os dois países.
Hélène Rivière d´Arc (H.R.A.) – Eu agradeço o convite. Acho essa proposta de entrevista muito clara e bem estruturada, e é uma oportunidade de eu recompor minha vida profissional. Mas o Brasil não foi o único país onde eu trabalhei (como pesquisadora) e realizei cooperações. Eu tive experiência em outros países da América Latina, sobretudo no México, em Cuba, um pouco na Argentina e um pouco na Bolívia. Mas o Brasil, de fato, (é o país a que) eu dediquei boa parte de minha vida profissional.
(A.I.)Podemos dizer que você se formou (inicialmente) como especialista em problemas da América Latina.
(H.R.A.) Sim. Mas, nos últimos 15 anos de minha vida profissional, eu tenho trabalhado muito sobre a circulação de ideias e de conceitos entre a Europa e a América Latina. E mais, na comparação das dinâmicas (de países) da Europa (especialmente nas questões urbanas) e da América Latina. Assim, eu tenho tido, também, a oportunidade de trabalhar sobre a Europa, Paris...
(A.I.)Fale um pouco sobre sua origem, sua formação escolar e universitária .
(H.R.A.) Iniciei meus estudos na minha pequena cidade Tarbes, nos Pireneus ( Pyrénées , França). Depois, eu vim para a Sorbonne, em Paris, antes do período em que ela se dividiu em várias universidades. Eu fiz uma graduação inicialmente em História. Na época, a gente cursava História e Geografia associadas. No início, eu me dediquei mais à História, mas, ao final, eu me orientei para a Geografia, porque acreditava que eu poderia ganhar em perspectiva (possibilidades). Eu achava que a (pesquisa) histórica me aprisionava muito nos arquivos, como uma espécie de “ petite main ” (pequena ajuda) a um grande historiador, em busca de documentação. Essa era a inquietação dos estudantes de História, à época, enquanto a Geografia permitia maior liberdade. 15 Na sequência, eu fiz o que se chamava Diploma de Estudos Superiores (Diplôme d´Études Supérieurs ) na Sorbonne e, só depois, é que eu me engajei num doutorado. Eu fiz um doutorado sobre a cidade de Guadalajara, México.
(A.I.)Você fez o seu doutorado lá?
(H.R.A.) Não, mas eu tive uma primeira bolsa – um acaso da vida! Na época, eu trabalhava enquanto estudava. E, certo dia, me cansei de trabalhar, fazendo, ao mesmo tempo, um pouco de pesquisa para o meu diploma de estudos superiores. Então, surgiu a oportunidade de uma bolsa para ir ao México. Mas eu poderia ir a qualquer lugar! Tratava-se mais de eu sair, eu precisava viajar! E, graças a essa bolsa, eu trabalhei no Colégio de México.
(A.I.)Sobre qual assunto?
(H.R.A.) Sobre uma nova periferia industrial na cidade do México. Esse foi o meu primeiro trabalho, e só depois é que eu defendi o meu DEA ( Diplôme d´Études Approfondies ).
(A.I.)Em que ano foi isso?
(H.R.A.) Entre 1965 e 1966, mais ou menos. Depois eu voltei (à França) e meu diretor de estudos, Pierre Monbeig, me propôs fazer o doutorado aqui (Paris). Ele já era Diretor de Pesquisas no CNRS e professor universitário na Sorbonne, e me ofereceu uma bolsa do CNRS para eu voltar ao México. Além do mais, eu tinha um grande desejo de retornar ao México e voltei, no mesmo tempo que Milton Santos.
(A.I.)Foi aí que você se encontrou com o Brasil? Então você conheceu o Brasil pelo México! (risos)
(H.R.A.) Sim, em Guadalajara, eu me encontrei com Milton Santos para fazer uma pesquisa sobre a zona de influência da metrópole. Mas uma metropolização “antes do seu tempo” ( avant l´ère ). Ou seja, antes de que (o fenômeno) fosse reconhecido como metropolização. Meu tema foi esse processo de metropolização de Guadalajara. Eu fiz entrevistas junto com Milton Santos, 16 e esse material serviu de matéria de pesquisa para meu doutorado 17 . Mas eu defendi meu doutorado aqui na Sorbonne, na Paris I, porque meu diretor de tese (Pierre Monbeig) era da Paris I. Foi ele quem, mais tarde, me propôs ir ao Brasil. Logo após (o doutorado), eu me candidatei ao CNRS e fui admitida imediatamente. E eu precisava, então, me integrar num programa de pesquisa e P. Monbeig 18 tinha uma equipe de pesquisa sobre o Brasil, com outros estudantes etc. E foi ele que me sugeriu um tema sobre o Brasil: ele queria que eu continuasse um pouco o que ele havia feito, ou seja, estudar o avanço das zonas pioneiras no Brasil, à época.
(A.I.)Naquela época, era um tema pouco conhecido da opinião pública em geral. Atualmente, é extremamente discutido no Brasil!
(H.R.A.) Sim. Assim, eu parti para o Mato Grosso.
(A.I.)Que idade você tinha, nessa época?
(H.R.A.) 28 anos.
(A.I.)Era jovem para enfrentar uma pesquisa de campo numa frente pioneira!...
(H.R.A.) Sim. Eu lembro a cidade de Sinop (MG), que hoje – pelas fotos que eu vi dos incêndios na Amazônia –, parece ser uma grande cidade... À época (da pesquisa), eu tomei um ônibus para ir a Sinop, mas logo depois houve uma pane (no ônibus) na (estrada) Cuiabá- Santarém, e eu cheguei a Sinop a pé.
(A.I.)Quando?
(H.R.A.) Em 1974, 75, por aí...
(A.I.)Quando nos conhecemos, você já tinha pesquisado sobre a fronteira da Amazônia!
(H.R.A.) Sim, deve ter sido um pouco mais tarde porque, entre os dois (México e Brasil), eu fiz o doutorado e passei um ano em Cuba.
(A.I.)Em Cuba você pesquisou sobre o mesmo tema?
(H.R.A.) Não! À época, a gente trabalhava em temáticas que nos eram impostas. A gente não dizia “eu vou trabalhar sobre isso”, mas se dizia: os pesquisadores devem fazer um estudo sobre tal assunto! Então, em Cuba, eu devia coordenar uma pesquisa sobre os trabalhadores urbanos enviados para trabalhar no campo, nos planos agrícolas. Isso significava que eles se transformavam em trabalhadores agrícolas, mas eram originalmente trabalhadores urbanos.
(A.I.)Um sentido inverso da experiência clássica que conhecemos, de saída do campo para a cidade .
(H.R.A.) Exatamente o inverso. Interessava verificar como ocorria essa transferência da mão de obra da cidade para o campo. Porque, em Cuba, o programa (governamental) era desacelerar a dinâmica urbana, reduzir o crescimento, ou seja, conter o crescimento urbano, em especial, da cidade de Havana. Então, territorialmente, o objetivo era desenvolver um plano agrícola em torno da cidade e, do ponto de vista populacional, conter o crescimento da cidade. Assim, promovia-se, inversamente, o desenvolvimento agrícola. Mas só depois disso (dessa passagem por Cuba) é que eu fui para o Brasil. Deve ter sido em 1976. É isso: fui para o Mato Grosso em 1976. Em seguida, fui a um congresso de Geografia muito importante em Belém, em plena época da ditadura. Foi minha primeira experiência brasileira de ir à Belém pela estrada Belém – Brasília! E de ônibus!
(A.I.)Você conhece melhor o Brasil que eu!
(H.R.A.) Em Belém, realizou-se, então, esse congresso de Geografia, que me impressionou muito, porque os expositores se autocensuravam demais. Eu acho que posso dizer isso! Eu fiquei bastante impressionada com essa autocensura! (Eu creio) que eles tentavam encobrir os problemas (políticos e sociais) através do uso de estatísticas.
(A.I.)Uma maneira, talvez, de contornar situações difíceis...
(H.R.A.) Enfim... Depois eu segui para Cuiabá...
(A.I.)Você conhecia outras pessoas que também foram a esse congresso?
(H.R.A.) Fui com vários colegas meus franceses: 19 Hervé Théry, Martine Droulers, e também estava presente Pierre Monbeig e talvez outros professores franceses, ou não professores, sem dúvida. Foi um colóquio em homenagem à Pierre Monbeig. Eu creio que se discutiu, sobretudo, a Amazônia, com os mesmos problemas que persistem ainda hoje: o desflorestamento, os incêndios, o cultivo das queimadas ( brulie ), a colonização...
(A.I.)A essa época, o governo brasileiro tinha um projeto para a ocupação da Amazônia, mas a discussão sobre a Amazônia era maior na França do que no Brasil .
(H.R.A.) Talvez sim. Realmente, naquela época, havia um grande programa implementado pela ditadura para a ocupação da Amazônia, para a colonização da Amazônia! Foi uma época em que vários grandes proprietários de terra... Não somente proprietários, mas também empresas industriais, compraram terras. Compraram gigantescas extensões de terras dos índios e as devastavam completamente. Mesmo havendo a proibição de não desmatar além da metade da propriedade, isso (esse limite) não era respeitado! E como eram pessoas extremamente poderosas... Portanto, foi sobre essa ocupação da Amazônia por grandes empresas e a implantação de grandes áreas para a pecuária e para a agricultura no Mato Grosso, foram essas as questões que eu pesquisei.
(A.I.)Retomando: essas foram suas primeiras experiências de pesquisa em países da América Latina: México, Cuba e depois o Brasil, na região de fronteira da Amazônia. Na sequência ...
(H.R.A.) A gente trabalhou muitos anos sobre a Amazônia, e existem várias publicações. 20 Nessa época, a gente participou de colóquios na Inglaterra, e também no Brasil. Enfim, foi a época da política para a Amazônia do governo militar, de colonização da Amazônia, e a gente acompanhou esse processo. Depois, Pierre Monbeig se aposentou e deixou o “ Programme Amazonie ”, que a gente conduziu durante muitos anos. Não é que (o programa) tenha se interrompido completamente, mas os pesquisadores vinculados a esse projeto, especialmente eu, se dispersaram. Hervé Théry e Martine Droulers continuaram a pesquisa sobre a Amazônia, mais do que eu. O novo diretor do Laboratório Credal – à época não se chamava Credal, mas um nome parecido 21 –, Revel-Mouroz, propôs alguns novos temas de pesquisa. Nesse contexto eu propus pesquisas comparativas – México e Brasil –, mas era necessário definir temas pertinentes, por exemplo, comparar o processo de industrialização ou questões demográficas, e foi disso que eu me ocupei, conduzindo um programa comparativo entre o Sul do México (meu primeiro programa), e a industrialização da Bahia 22 , uma região que me aconselharam a escolher. Ou seja, duas zonas, o Sul do México e a Bahia (Polo Industrial de Camaçari), que estavam, naquela época, em processo de industrialização acelerada em torno do petróleo. A industrialização no Sul do México também se baseava no petróleo. Bem, foi assim que eu a conheci no CRH, em meados de 1979. Um dia, eu decidi ir ver os pesquisadores da Universidade. Acho que tinham me sugerido alguns nomes (não lembro se tinham me dado seu nome, mas me deram, sobretudo, nomes de geógrafos, à época).
(A.I.)Sim, provavelmente Sylvio Bandeira de Mello ou Maria Auxiliadora da Silva, da Geografia, tenham sugerido o contato com o CRH.
(H.R.A.) Eu cheguei à Faculdade de Filosofia (da UFBA) e a encontrei, quando buscava o CRH, e começamos a conversar.
(A.I.)Você trabalhou nessa pesquisa também com Luciano Martins ?
(H.R.A.) Sim, nesse programa sobre a industrialização. Havia também Hervé Théry, e acho que Helena Hirata foi também. Embora esse programa de industrialização não fosse exatamente o programa de pesquisa do CRH, a gente (eu e você) pensou que poderíamos montar um programa de (pesquisa) conjunto. Talvez mais sobre as cidades de médio porte e o desenvolvimento agrário, em torno de certos produtos agrícolas. E foi isso: você fez uma proposição, quando passou um bom tempo na França, quase um ano.
(A.I.)Sim. Entre 1979 e 1980. Tentamos, eu e você ...
(H.R.A.) ... construir esse programa conjunto.
(A.I.)Mas, antes de sermos apoiados pelo Convênio CNPq - CNRS da assessoria internacional (1982), nós convidamos você, Bernard Bret e Christian Gros, pelo CNPq, como pesquisadores visitantes (1981). Nessa ocasião, a gente organizou uma pequena reunião com técnicos do Estado, que apresentaram as principais tendências do desenvolvimento agrário da Bahia.
(H.R.A.) Sim. Eu me lembro muito bem. Não lembro o contexto, mas lembro dessas reuniões. O Acordo durou três anos. No primeiro Programa, nós éramos as responsáveis. Mas o segundo foi com Christian Gros.
(A.I.)Sim. O primeiro (CNPQ-CNRS) nós coordenamos juntas. Mais tarde, uma colega da Geografia da UFBA me sugeriu que eu submetesse um projeto ao Acordo Capes –Cofecub, devido à repercussão positiva da primeira cooperação, que ela soube por Milton Santos. De fato, ele participou do colóquio final e fez uma avaliação positiva da nossa cooperação.23
(H.R.A.) Sim, porque Milton Santos tinha dúvidas sobre esse tipo de acordo que a gente construiu.
(A.I.)É verdade. Ele sempre alertava sobre a necessidade de se estabelecerem relações de reciprocidade entre as equipes.24
(H.R.A.) Isso! Havia sempre essa inquietude de que os europeus chegassem ao Brasil com ideias de colonização intelectual.
(A.I.)Sim, mas, apesar desses questionamentos, ele nos apoiou bastante .
(H.R.A.) É certo. Para o desenvolvimento do programa, nós definimos quatro polos produtivos regionais: 25 Ilhéus e Itabuna, produção do cacau; a região do café, Vitória da Conquista; a região de agricultura irrigada e produtos hortigranjeiros, em Juazeiro; e a de fronteira agrícola (Barreiras). 26 Foi extremamente interessante a dinâmica desse programa! Mas isso durou muitos anos!
(A.I.)Sim, três anos. Eu me lembro de algumas questões que vocês (equipe francesa) indagavam sobre a equipe do CRH ter escolhido trabalhar com dados secundários.27
(H.R.A.) Porque acho que, nas ciências sociais brasileiras, na época da ditadura, havia muita autocensura. Então, os pesquisadores e professores usavam como recurso o método estatístico. Mas já estávamos no fim da época dessa autocensura, e vocês, que tinham uma abordagem marxista, usavam o método estatístico para recompor conceitos e processos marxianos! 28 Disso eu me lembro. Nessa época, eu era menos sensível à abordagem marxista, pois minha formação em História e Geografia não tinha passado por essas questões (perspectiva analítica). 29 Foram os sociólogos que me levaram à abordagem marxista e me fizeram aprender algumas coisas.
(A.I.)Outra observação interessante sua, ao ler as teses brasileiras, era de que todas iniciavam com uma abordagem teórica para depois apresentar dados de campo .
(H.R.A.) Era como se houvesse um imperativo de sempre passar-se por uma abordagem teórica. Falo naquela época, porque agora isso não ocorre tanto.
(A.I.)Fizemos um grande colóquio ao final do Programa de cooperação (1985).30Ainda no plano metodológico, lembro da crítica de Milton Santos na conferência que ele fez, ao final do Colóquio.
(H.R.A.) Sim, foi muito, muito bom.
(A.I.)Milton Santos31fez uma conferência sobre os dois circuitos da economia urbana .
(H.R.A.) Que, de fato, era a sua teoria, que nós trouxemos para o debate ...
(A.I.)Sim, e Bruno Lautier32apresentou sua crítica à noção de informalidade, que era distinta da de Milton .
(H.R.A.) Lautier mostrava passagens frequentes (a fluidez) entre o formal e o informal.
(A.I.)Milton Santos questionou o uso genérico de categorias: “o capital”, o “proletariado!”. Num pequeno texto que eu escrevi sobre Milton Santos, eu registro esse comentário33crítico. Mas voltemos ao programa Capes-Cofecub.
(H.R.A.) O segundo Acordo, Capes-Cofecub, foi com Christian Gros 34 e Jan Bitoun (Universidade Federal de Pernambuco). Visava, sobretudo, à troca de estudantes. Não estava muito definida a parte da pesquisa. A gente podia (realizar missões) para completar pesquisas, de um lado ou de outro, mas não havia um programa (de pesquisas) verdadeiramente conjunto.
(A.I.)Mas, ao final do primeiro programa, a gente decidiu avançar em análises sobre processos políticos da transição. Então, foi a Reforma Agrária...
(H.R.A.) E, no plano político, nesse período pós-ditadura, emergiu a questão da descentralização 35 e da participação no meio urbano. Esses foram processos muito importantes na redemocratização brasileira.
(A.I.)A discussão sobre democracia direta foi um projeto com Jan Bitoun ?
(H.R.A.) Sim, ele tinha um programa sobre esse tema na Universidade (Universidade Federal de Pernambuco). Mas trabalhei também, com Brasilmar, que também se ocupava desse tema, em Brasília.
(A.I.)Na Bahia, Tânia Fisher36(NPGA/UFBA) pesquisava sobre descentralização e atores sociais .
(H.R.A.) Todos estavam interessados nessa transição da ditadura. Precisávamos captar o movimento (de redemocratização), que, naquele momento, avançava rapidamente e questionava tantas coisas! Tantas restrições impostas pela ditadura! É por isso que pensar no Brasil de hoje me impressiona tanto! Todo aquele progresso, aqueles avanços, aquelas teses tão inovadoras! Todo o debate que a gente conheceu na transição política para a democracia no Brasil...
(A.I.)É verdade. Portanto, a segunda etapa do Programa tomou por base a implantação da reforma agrária e a emergência dos novos atores urbanos. Publicamos um artigo na Caderno CRH, onde você analisa a democracia de base dos atores urbanos . 37
(H.R.A.) Eu publiquei esse texto também na Inglaterra. 38 Era uma época em que a transição democrática brasileira nos marcou muito. Além do mais, foi um período de retorno dos exilados ao Brasil.
(A.I.)A partir de então, você trabalhou com outras equipes39em outros estados do Brasil. Com Norma Lacerda em Recife, não? Você poderia apresentar essas experiências?
(H.R.A.) Eu fui convidada a Recife várias vezes para dar cursos – um mês de curso, por exemplo –, e, então, me interessei em participar de um programa num mestrado em urbanismo, acho que vinculado à Faculdade de Arquitetura. 40 Jan Bitoun participava e Norma Lacerda também. Mas, em Recife, eu continuei minhas pesquisas sobre a participação urbana. Também estive em Belém e lá também pesquisei sobre esse tema. Esse processo de participação de base me interessou muito, nessa época, e eu fui convidada a vários colóquios na Europa. Aliás, logo no início (desta entrevista) você me perguntou o que a experiência de estudos com (países) a América Latina me legou, e eu lhe respondo agora: sobretudo, a experiência da participação. Não na direção Europa –América Latina, mas no sentido América Latina – Europa. Eu fui convidada a muitos Colóquios e seminários para falar sobre o tema da participação (em países da) América Latina, e, em particular, no Brasil! Havia uma repercussão enorme da experiência do Partido dos Trabalhadores (PT) em Porto Alegre. Quando o PT conquistou as prefeituras das grandes cidades e estabeleceu programas participativos muito dinâmicos, isso foi extremamente interessante mesmo!
(A.I.)Em São Paulo, seu tema de pesquisa permaneceu o mesmo?
(H.R.A.) Sim, eu trabalhei sobre a participação. Eu estive algumas vezes com a antropóloga Ruth Cardoso 41 – esposa de Fernando Henrique Cardoso – porque ela era uma referência no tema (movimentos sociais urbanos e participação política). Eu a encontrei duas ou três vezes para discutir sobre processos participativos em São Paulo. Inclusive estivemos, ambas, num colóquio no Egito, que comparava o processo de participação implantada pelas ONGs. 42 No caso do Cairo, tratava-se de sociedades civis religiosas, de religião mulçumana, enquanto, no Brasil, elas eram laicas. Eu fui com Marion Aubrée. 43 Mais tarde, eu passei a estudar programas de renovação dos centros urbanos. Esse é o meu último programa de pesquisa, tanto no Brasil como no México, mas em Cuba também. Eu retornei a todas as primeiras cidades ... (que eu pesquisei).
(A.I.)É com esse tema que você participa da rede do Observatório das Metrópoles? E, em São Paulo?
(H.R.A.) Sim. Mas são dois programas diferentes: um com Luís Cezar (Ribeiro), no Rio e outro, em São Paulo, com Vera Telles. 44 Eu também participei de um programa com a Universidade de Campinas, integrado ao programa “ Les mots de la ville ” 45 (As palavras da cidade)
(A.I.)Qual a sua opinião sobre a recepção desses trabalhos, no Brasil. Por exemplo, vocês ajudaram na difusão de autores franceses ou na formação de uma agenda de pesquisas ?
(H.R.A.) Eu penso que, nos anos de 1990 a 2000, houve uma grande circulação de ideias nas ciências sociais, com uma grande liberdade de construção das problemáticas, nessas trocas. É muito difícil medir, mas acho que fomos bem recebidos de ambos os lados e colocamos, simultaneamente, questões que puderam ser construídas ao mesmo tempo, e que, enfim, possibilitaram comparar experiências entre Norte e Sul. Sim, eu creio que as ideias que eu tinha, no início de minha vida profissional, apoiavam-se mais sobre o que se pensava como Tiers Monde (Terceiro Mundo). Mas esse espaço (campo temático), Terceiro Mundo, desapareceu aos poucos, entre 1990-2000, e buscou-se entender, sobretudo, a circulação das ideias. A dimensão “terceiro mundo” deixou de ser a dimensão suporte ou o substrato do pensamento e (a perspectiva) a circulação de ideias se desenvolveu rapidamente. Bom! Mas, algumas vezes, é certo, eu escutei recriminações contra a presença de pesquisadores europeus, que me surpreenderam! Dizendo que a gente tinha um pensamento desinteressante e que o Brasil devia construir sua própria agenda de pesquisa. 46 Mas essa crítica não foi muito frequente.
(A.I.)Sim. Mas havia também uma certa decalagem entre temáticas das agendas. O tema do poder local,47por exemplo. Quando vocês propuseram essa temática, em início da década de oitenta, ela não foi imediatamente absorvida por pesquisadores brasileiros como relevante. Ou seja, vocês propuseram questões que avançavam na agenda, à época.
(H.R.A.) Sim, houve momentos de certa decalagem. Entretanto, as ideias circulavam. A gente não ignorava... A gente conhecia quais eram os conceitos e as experiências dos pesquisadores em ciências sociais.
(A.I.)Bem, você também tem uma contribuição importante na formação de pesquisadores brasileiros em pós-graduação na França.
(H.R.A.) Eu recebi estudantes de muitos países da América Latina, da Venezuela, do Peru. Mas, enfim, a maior parte deles foi mesmo constituída de brasileiros. Isso não significa que todos concluíram as suas teses. Mas a maioria, sim. A maior parte era bolsista da Capes. Mas alguns eram pessoas que moravam aqui, por exemplo: estudantes que estavam aqui acompanhando seus pais.
(A.I.)Havia, alguma proposta do IHEAL em termos de temas prioritários?
(H.R.A.) Sim, sim. Havia acordos, sobretudo com as universidades do Nordeste (do Brasil), 48 justamente. Porque quando eu comecei a dirigir teses, era uma época em que havia poucos doutorados nas universidades do Nordeste. Muito poucos! Acho que talvez tivesse um na Bahia, não sei. Depois, foram criados muitos programas de doutorado! 49
(A.I.)E os temas propostos eram nos seus campos de interesse?
(H.R.A.) A maior parte dos estudantes vinha com uma proposição de tema pronta. Só após muita discussão é que a gente estabelecia, em conjunto, a pertinência de seu tema. Não! Eu não me lembro de ter aceitado assim (automaticamente) um tema. Primeiro, a gente discutia longamente o assunto, o porquê de tal escolha: tal questão é difícil de ser trabalhada, tal questão não tem pertinência. Ademais, entre os professores do Institut de l´Amérique Latine – e eu também dirigi algumas teses na École des Hautes Études en Sciences Sociales –, havia uma preocupação de que os estudantes da América Latina não ficassem confinados em seus temas, estudos de caso, ou territórios de pesquisa latino-americanos, mas que as questões que eles traziam possibilitassem comparações com problemáticas europeias. Isso foi uma preocupação que a gente (professores orientadores) trabalhou bastante. Mas é certo que nem sempre a gente fez comparações pertinentes. Aliás, ultrapassar as comparações paralelas é muito difícil! O que se quer comparar, por quê? É muito difícil.
(A.I.)Mas você fez alguns estudos comparativos, como o Sul do México com a Bahia (nos distritos industriais).
(H.R.A.) No final da minha carreira profissional, eu participei da rede organizada por Luís Cezar (Queiroz Ribeiro), que justamente me convidou inúmeras vezes para refletir sobre a pertinência da comparação (entre cidades) da América Latina, pelo meu conhecimento de várias cidades da região. E eu mostrei que realmente existe um modelo de cidade latino-americana. Ou seja, que é pertinente falar-se num modelo de cidade latino-americana, mesmo considerando os deslocamentos e as diferenças no tempo. É evidente que existem enormes diferenças entre cidades muito ricas e bastante prósperas e outras muito pobres. Contudo, quando a gente toma algumas dimensões demográficas, por exemplo, elas passaram por processos migratórios que são contemporâneos em todos os países, uma transição demográfica com vários pontos comuns e bastantes diferentes do que ocorreu na Europa. Elas também foram capazes de “integrar” milhões de pessoas em muito pouco tempo – se é que a gente pode falar em integração –, enquanto esse processo, na Europa, durou 600 anos, ou seja, séculos.
(A.I.)Pensando sua experiência como orientadora de teses, quais as dificuldades maiores dos estudantes brasileiros em tese, na França?
(H.R.A.) De um lado, eles experimentam um pouco de nostalgia. Mas, basicamente é a língua. Eles têm alguma dificuldade em falar francês.
(A.I.)Dentre seus orientandos brasileiros quais os que se destacaram na vida acadêmica?
(H.R.A.) De alguma forma, eu sei que todos os que concluíram as teses estão trabalhando, e, em geral, no meio acadêmico. Talvez Norma Lacerda.
(A.I.)Ela foi presidente da ANPPUR (Associação Nacional de Programas de Pós-Graduação em Planejamento Urbano e Regional).
(H.R.A.) Sim, ela teve inúmeras responsabilidades acadêmicas nas instituições brasileiras. Eu não os esqueço (os doutorandos) ... Há uma que está em Natal e que fez uma tese muito boa. 50
(A.I.)Tinha também um da Bahia... Paulo Guimarães...
(H.R.A.) Sim, que faleceu, precocemente.
(A.I.)Você mantém contato com seus ex-orientandos ?
(H.R.A.) Com Norma, sim. Ocasionalmente, eu recebo mensagens de outros. Sei, por exemplo, que há um – eu esqueço os nomes–, em Recife, que edita uma revista de Geografia e é professor na Universidade Federal de Pernambuco. Mas, quando eu recebo uma mensagem, a lembrança volta imediatamente.
(A.I.)Você participou de muitas bancas de tese?
(H.R.A.) Eu participei de muitos júris de tese de pesquisadores brasileiros: em Nanterre, em Créteil, na Paris VII. Em termos de participação nos júris, foram mais de vinte. Algumas eu já não lembro. Mas há também teses sobre o Brasil realizadas por franceses.
(A.I.)Pensando nas problemáticas de pesquisa que você estudou no Brasil, em qual delas você considera que pôde colaborar, ou que contribuiu de forma pioneira?
(H.R.A.) Eu não sei responder a essa questão porque estamos falando de um longo tempo de pesquisa. Eu posso dizer que acompanhei temáticas que estavam na ordem do dia. Quando você reflete sobre a evolução das temáticas, percebe que participou das agendas da ordem do dia, que depois mudaram e se reconfiguraram. Mas, dizer quais foram as mais destacadas? Bem, eu diria que acompanhei muitas temáticas nas quais eu tive o meu pequeno papel e dei a minha contribuição.
(A.I.)Faço essa pergunta porque, quando a conheci, fiquei muito impressionada pelo fato de você, uma pesquisadora estrangeira jovem, ter realizado uma pesquisa de campo na região da fronteira agrícola da Amazônia! E acho que, à época (meados anos 70), foi um trabalho pioneiro.
(H.R.A.) Eu não era tão jovem! Na época, eu fui com Hervé Théry, que era bem mais jovem que eu. Eu devia ter 29 anos e Hervé uns 23 anos, mais ou menos.
(A.I.)Sim, ele era muito jovem! Lembro-me também de que você agregou muitos pesquisadores franceses de outros centros de pesquisa da França. E alguns foram ao Brasil como estudantes de doutorado.
(H.R.A.) Pesquisadores do Institut des Recherches sur le Développement (IRD), 51 sim. Houve um momento em que o IRD decidiu ampliar os seus estudos no âmbito do Terceiro Mundo, para além da África. Era um organismo de pesquisa muito orientado para a pesquisa na África e decidiu abrir mais o horizonte de suas pesquisas, na época “terceiromundista”, e me consultaram para onde ir. Disso me lembro bem.
(A.I.)Robert Cabannes já estava em S. Paulo! E Alain Morice na Universidade da Paraíba...
(H.R.A.) Sim, lembro que Cabannes me perguntou sobre São Paulo. Depois veio Michel Agier (UFBA) e Alain Morice (UFPB) e Jean Riveloir foi para Guadalajara (México).
(A.I.)Vieram também para a Bahia realizar suas pesquisas para o doutorado (numa estadia de quase dois anos no CRH) Pascal Metzger e Jean François Fritscher .
(H.R.A.) É, eu ajudei no estabelecimento dos contatos.
(A.I.)E criou também os meios de sustentação e mobilidade desses pesquisadores (com o Ministère des Affaires Étrangères).
(H.R.A.) Pode ser. Nesse caso, fiz um papel de mediadora, de identificação e contato entre as equipes.
(A.I.)Você manteve contatos com grandes intelectuais brasileiros, na França? Com Celso Furtado, por exemplo?
(H.R.A.) Posso dizer que segui o seu pensamento, em conferências, cursos. 52
(A.I.)Que outros professores brasileiros passaram pelo IHEAL?
(H.R.A.) Fernando Henrique Cardoso, Kátia Mattoso. Sim, e estive em vários júris de teses orientadas por Katia Matoso 53 sobre a Bahia. Em júris de tese de brasileiros dirigidas por Rochefort, e Henry Coing. Tive contato com Milton Santos Filho, no grupo IEDES, de Pierre Salama, Jaime Marques Pereira e outros, mas foi a partir de um estudo que eu desenvolvi no Norte do México.
(A.I.)Para encerrarmos, que tema você está pesquisando agora e qual tema você considera importante para uma agenda de pesquisa França–Brasil? Sei que a questão está muito ampla.
(H.R.A.) Difícil. Mas o último tema sobre o qual eu trabalho, e tenho publicado muita coisa (ultimamente), é o da renovação do centro das cidades, a memória das cidades, a recuperação da memória. Essa é uma questão que tem interessado o mundo inteiro: a mercadorização da cultura. Como as cidades se constroem nesse processo de mercadorização de suas culturas. Mas eu não penso (esse processo) de uma perspectiva apenas negativa. 54 Isso tem me interessado muito. A gente fez algumas comparações da (cidades da) Europa com (cidades da) a América Latina, realmente, muito interessantes. Aliás, alguns pesquisadores trabalharam sobre a Bahia, mas eu não, porque existem pesquisadores que já trabalharam essa questão na Bahia. A gente pesquisou Salvador, Recife, eu trabalhei São Paulo, Porto Alegre. Mas, retornando à questão da reabilitação de centros urbanos, quanto eu me aposentei, morando em pleno Centro de Paris, me interessei por essa transformação (atual) do Centro de Paris e, então, tudo o que eu havia aprendido na América Latina me serviu muito. Eu trabalhei sobre a gentrificação 55 ( gentrification ) e voltei da América Latina com ideias, especialmente sobre a participação, e sobre o que foi feito nos processos de participação nas várias cidades da América Latina; o programa do PT etc. e que agora eu vejo se desenvolverem aqui, evidentemente não da mesma forma. Aliás, hoje eu participo de uma associação (de bairro), e isso me dá um grande prazer. Nela, a gente discute sobre a gentrificação no centro de Paris, a desertificação de Paris, o programa de mercadorização da cidade, as propostas Air B&B etc. Atualmente, a gente (da associação) questiona muito a centralidade urbana e a especulação imobiliária que a acompanha. Nessa experiência, estou bastante satisfeita e me interesso bastante, mas com pessoas que não são exclusivamente intelectuais.
(A.I.)Você acha que seus estudos no Brasil contribuíram para suas reflexões e a ação concreta aqui?
(H.R.A.) Sim, eu creio. (Diante do incêndio da Notre-Dame, que a impactou enormemente, pela proximidade de sua residência, ela diz...) A minha ideia é propor, e eu espero que a Prefeitura nos apoie, um projeto de construção de uma “paisagem efêmera 56 ”! Porque essa situação (as obras de reconstrução) vai durar uns 20 anos! Então, o que se pode fazer, nesse entretempo, para tornar esse ambiente um pouco mais suportável? Isso porque, em relação à restauração da Notre-Dame a gente (a associação) não tem como intervir, porque são questões imensas, de âmbito nacional. E, ademais, (ainda pensando no bairro), quando a gente imagina que existe também um projeto em curso, do lado, para transformar o Hotel Dieu (que é um espaço enorme, na vizinhança)! Isso vai durar 20 anos!!!
(A.I.)É certo. São realmente mudanças muito radicais sobre um mesmo espaço, que repercutem fortemente sobre o cotidiano dos moradores e o seu futuro imediato.
Hélène, você gostaria de acrescentar algo mais ?
(H.R.A.) Não! eu estou muito contente de ter podido refletir sobre preocupações conjuntas de pesquisa. Foi um exercício muito interessante! Mesmo se, em alguns momentos, a gente tenha sido um pouco espontânea.
(A.I.)Sim, mas possibilitou recompor processos. E lhe agradeço muito por essa entrevista. Pensar essas trajetórias e experiências passadas hoje é importante, quando se fala de políticas de internacionalização do conhecimento. Por fim, eu gostaria de registrar um aspecto importante, como resultado dessa experiência, que é a interação interdisciplinar (Geografia e Sociologia) na construção das problemáticas de pesquisas nos territórios.
(H.R.A.) Sim, esse aspecto é extremamente importante, embora a gente não tenha chegado a aprofundá-lo suficientemente. Mas a experiência foi muito rica e muito importante.
(A.I.)Obrigada!
COMENTÁRIOS FINAIS
Numa avaliação a posteriori e utilizando-me de uma contextualização de períodos para os estudos latino-americanos feita por Otávio Ianni (1993, p. 122), poderíamos articular sua trajetória e produção em três grandes contextos de “colonialismo, nacionalismo e cosmopolitismo”. Colonialismo, quando prevaleciam, como questão central, as relações entre centro e periferia, e as teorias da modernização. Nacionalismo , abarcando questões relacionadas à formação dos Estados nacionais e discutidas em termos de integração nacional, os estudos de fronteiras, a modernização agrária e os polos de desenvolvimento regionais e, ainda, a democratização do Estado brasileiro via descentralização e a experiência da participação (cidadania) nas cidades. Finalmente, o cosmopolitismo , pela perspectiva de circulação das ideias e dos estudos comparados entre países, e a discussão de modelos de cidades latino-americanas.
As temáticas e caminhos percorridos refletem tanto as dinâmicas do conhecimento, que influenciaram a agenda urbana, no Brasil e na região, como a evolução de modelos de intercâmbio acadêmico, no âmbito institucional, numa política de internacionalização do conhecimento no Brasil. Do ponto de vista do conhecimento, destacam-se contribuições sobre: as condições de integração nacional (áreas de fronteira amazônica); polos de desenvolvimento e formação das cidades de porte médio; a metropolização em países do terceiro mundo; os dilemas entre centro e periferia, bem como as condições de circulação e transferência de conhecimentos no âmbito das relações entre Norte e Sul.
Observando-se as bases de operação dos intercâmbios entre equipes francesas e brasileiras, constatam-se algumas evoluções positivas de ampliação de redes de pesquisa e a contribuição ao ensino pós-graduado, além da integração da equipe Brasil do Credal com outras redes de pesquisadores franceses, o que repercutiu positivamente na capacitação das pós-graduações e centros de pesquisas no Brasil. Essa expansão acompanhou o amadurecimento das carreiras internacionais dos pesquisadores, ao mesmo tempo em que houve uma consolidação institucional do programa Capes-Cofecub, em termos de maior reciprocidade e parcerias mais simétricas de saberes, como assinalam diversas análises (Chonchol e Martinière, 1985; Canto e Hannah, 2006; Théry, 2011; Padilha, Brandenburg e Billaud, 2019).
Espero que essa recuperação biográfica possa contribuir para se entender as formas de transferência do conhecimento nos estudos sobre o Tiers Monde (Terceiro-Mundo) no Brasil, entre os anos sessenta e oitenta, e a dinâmica de recomposição do conhecimento no contexto da globalização, em termos de circulação de ideias e de maior integração das ciências. Os diálogos tecidos ao longo dessa entrevista demonstram a potencialidade desses registros para aprofundamentos futuros, especialmente na interface interdisciplinar no campo dos estudos urbanos e regionais.
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Notas
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