RECUPERAÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE EMOÇÃO EM VIGOTSKI: CONTRIBUIÇÃO PARA A TESE DA INDISSOCIABILIDADE DA EMOÇÃO NA ATIVIDADE HUMANA.
RECUPERAÇÃO HISTÓRICA DO CONCEITO DE EMOÇÃO EM VIGOTSKI: CONTRIBUIÇÃO PARA A TESE DA INDISSOCIABILIDADE DA EMOÇÃO NA ATIVIDADE HUMANA.
International Journal of Developmental and Educational Psychology, vol. 1, núm. 1, pp. 213-219, 2016
Asociación Nacional de Psicología Evolutiva y Educativa de la Infancia, Adolescencia y Mayores

Recepção: 19 Janeiro 2016
Aprovação: 15 Fevereiro 2016
Resumo: Considerando a emergência de publicações em periódicos no campo da “ciência afetiva” (Gross e Barrett, 2013) e sendo este um desafio aos estudos educacionais (Daniels, 2011) e organizacionais (Fineman, 2001), este trabalho consiste na primeira etapa da aproximação do conceito de emoção junto à Linha de Pesquisa Prática, Subjetividade e Organizações/ CAPES/ BRASIL e junto ao projeto de pesquisa Estudo de Práticas Educacionais: na promoção do desenvolvimento humano e na defesa da diversidade inserido na Linha Cognição, Aprendizagem e Desenvolvimento Humano/ CAPES/ BRASIL. Tratase de estabelecer o conceito de emoção na atividade a partir do referencial dos estudos baseados na prática (Nicolini, 2013) e dos teóricos que se fundamentam em uma perspectiva histórico-cultural da subjetividade (Vigotski, 1934/1993, 1935/1997, 1932/1999; Lane, 1995; Sawaia, 1987; Rey, 2004/2013). Tratase, assim, de um estudo teórico com objetivo de recuperar a concepção de emoção em Vigotski. Foram selecionadas para análise as últimas obras de Vigotski (1932/1999, 1934/1993, 1935/1997) que tratam do tema. O estudo concluiu que a dimensão da emoção humana na atividade, na perspectiva da psicologia concreta, deve ser, em primeiro lugar, considerada como uma categoria social, histórica e ideológica e não natural e biológica.
Palavras-chave: Emoção, Atividade, Prática Educacional, Prática Organizacional.
Abstract:
Considering the emergence of publications in journals in the field of “affective science” (Gross and Barrett, 2013) and being this a challenge to educational (Daniels,2011) and organizational (Fineman, 2001) studies, this work is the first step to conect the concept of emotion to the Practice, Subjectivity and Organizations / CAPES / BRAZIL line of research and to the Study of Educational Practices: the promotion of human development and the defense of diversity of Cognition, Learning and human development Line of Research/ CAPES / BRAZIL research project This is to establish the concept of emotion in the activity referenced by the studies based on practice (Nicolini, 2013) and by the works of theorists that are based on a historical and cultural perspective of subjectivity (Vigotski, 1934/1993, 1935/1997, 1932/1999; Lane, 1995; Sawaia, 1987; Rey, 2004/2013). It is thus a theoretical study that aims to recover the concept of emotion in Vigotski. Vigotski’s latest works were selected (1932/1999, 1934/1993, 1935/1997) for this analysis. This study has concluded that the scale of human emotion in the activity, with a view to concrete psychology, must first be considered as a social, historical and ideological category and not natural and biological.
Keywords: Emotion, Activity; Educational Practice, Organizational Practice..
O presente texto tem como objetivo retomar os estudos da ultima fase da obra de Vigotski (1934/1993, 1935/1997, 1932/1999) para estabelecer o realinhamento do conceito de emoção na atividade a partir do referencial dos estudos baseados na prática (Nicolini, 2013). O trabalho é fruto das discussões de pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento, como Administração, Educação e Psicologia, vinculados à Linha de Pesquisa Prática, Subjetividade e Organizações UP/CAPES/BRASIL e ao projeto de pesquisa Estudo de Práticas Educacionais: na promoção do desenvolvimento humano e na defesa da diversidade vinculado à Linha Cognição, Aprendizagem e Desenvolvimento Humano UFPR/CAPES/BRASIL. Tem como fundamento a perspectiva histórico-cultural da subjetividade e pesquisadores e teóricos do campo da Teoria da Prática (Bourdieu, 1983;Gherardi, 2000; Engeström, 2000; Wenger, 2011; Nicolini, 2012) .
Do ponto de vista dos estudos desenvolvidos nas Linhas de Pesquisa, a recuperação conceitual da emoção na atividade contribui para a conceituação de prática educacional e organizacional, os dois focos das Linhas de Pesquisa, a partir da perspectiva histórica e cultural. A categoria “prática” ou “práticas” tem sido cada vez mais apropriada pelos Estudos Educacionais e Organizacionais, às vezes denominada de Estudos Baseados em Prática (EBP) ou practice turn (“virada da prática”) (Schatzki et al., 2001). Esse movimento tem sido notado desde a década de 1970, especialmente após os anos 1990, contrapondose às concepções positivistas e racionalista presentes no campo da psicologia educacional e do trabalho. São várias as abordagens teóricas e não existe uma teoria unificada. O que é comum a essas abordagens é o foco na experiência humana e as atividades do cotidiano vistas como processuais (Nicolini, 2013). Compreendemos “prática” como atividade situada e como toda atividade humana a “prática” é sempre mediada pela emoção. E compreende- mos o homem como um ser ativo, histórico, constituído a partir de sua atividade e de acordo com as relações sociais e culturais onde esta inserido. Ressaltamos a importância do corpo, das emoções, dos objetos e das práticas nas questões sociais (Nicolini, 2013). Consideramos que as relações dos homens com o seu ambiente são sempre mediadas por significados culturais como os signos e os artefatos (Vigotski, 1993). Defendemos a concepção de prática organizacional e educacional segundo a qual o particular é considerado uma instância da totalidade.
ESTUDOS DA ULTIMA FASEDA OBRA DEVIGOTSKI (1934/1993, 1935/1997, 1932/1999)
Com o objetivo de compreender, na perspectiva da psicologia histórico cultural, a dimensão da emoção na atividade humana, voltamos à obra de Vigotski, aos trabalhos da terceira fase do desenvolvimento do seu pensamento que, segundo Minick (2002), está refletida nos escritos e conferências de 1933 e 1934. Durante esse período, a produção de Vigotski é marcada pela tentativa “de explicar o desenvolvimento psicológico em termos da diferenciação e do desenvolvimento de sistemas sociais de interação e ação em que o indivíduo participa” (Minick, 2002, p.32). Nesse período ele reduz a ênfase na relação das funções mentais em sistemas psicológicos e passa a análise de processos psicológicos em conexão com ações e interações concretas do indivíduo. A ênfase passa a ser na participação dos sujeitos em práticas sociais, mas, especificamente, na atividade social comunicativa (Minick, 2002). A terceira fase do seu pensamento é marcada pela mudança de argumentação na explicação sobre o desenvolvimento cognitivo. Se na fase anterior o conceito de sistema e inter- relações das funções psicológicas poderia sugerir um fechamento para a interação social e a comunicação, nessa segunda fase, a explicação que Vigotski (1932/1999,1935/1997) constrói para o desenvolvimento do pensamento e da linguagem, evidencia a ênfase dada. Assim, o desenvolvimento cognitivo passa a ser inseparável das formas particulares (sociais e culturais) “do modo como a palavra é usada na atividade social verbalmente mediada” (Minick, 2002, p. 53), ou seja, em conexão com a interação social ea prática social.
Importante lembrar que as formas particulares de atividades sociais mediadoras que compões as práticas sociais são marcadas pelas diferentes emoções que compõe a cultura onde elas se desenvolvem. Por exemplo, a prática social pode ser amalgamada por sentimentos de ressenti- mentos, de contentamento, de agradecimento, de medo, de ódio, de alegria, de vergonha, de orgu- lho, de aborrecimentos, de compaixão, de amor, de admiração etc. Como toda atividade humana, as práticas sociais são marcadas por emoções e sentimentos. As emoções constituem, tomam forma e se expressam nas atividades, nas relações, nos discursos e nos produtos das atividades de sujei- tos concretos. Exemplomaisvisível de expressão da emoçãonoproduto daatividade humana é a obra de arte. No entanto, toda atividade humana é marcada pela emoção.
No estudo “O problema do retardo mental”, de 1935, Vigotski (1935/1997) observa as diferenças no conteúdo e no significado dos sistemas psíquicos que se constroem em condições históri- cas específicas. Aponta os erros das interpretações metafísicas, isoladas das condições reais de existência e não submetidas a quaisquer modificações no curso de seu desenvolvimento. Nesse texto oautormarca, também, a ideia deunidade dointelecto e doafeto econsideraque“sóenquanto conservamos esta unidade como tal, conservamos também as propriedades inerentes a esta unidade. Na medida em que dividimos em elementos perderemos as propriedades inerentes ao todo e nos privaremos de toda a possibilidade de explicálos” (Vigotski, 1935/1997 p. 266). Ainda nesse trabalho volta a ideia já expressa no final do Pensamento e Linguagem, de 1934, e trazida de Spinosa (1979), de que nossas ações não nascem sem causa, mas que são movidas por determinados processos dinâmicos, necessidades e estímulos afetivos. Também nosso pensamento sempre é motivado, sempre está psicologicamente condicionado, sempre deriva de algum estimulo afetivo, pelo qual é posto em movimento e orientado. “O pensamento não motivado dinamicamente é tão impossível como uma ação sem causa” (Vigotski, 1935/1997 p. 266 ).
A argumentação de Vigotski (1935/1997) sobre a dinâmica da ação em dinâmica do pensa- mento e vice-versa revela as três fases fundamentais da dinâmica afetiva e expressa uma dimensão importante dasuaconcepçãoontológica, ouseja, anatureza consciente, voluntária elivredaativi- dade humana. Segundo o autor, a dinâmica afetiva corresponde: 1) à transformação da dinâmica do campo psicológico, da dinâmica da situação, na dinâmica do pensamento; 2) o desenvolvimento e o implantar dos processos dinâmicos do próprio pensamento, sua transformação inversa em dinâ- mica da ação. A ação refratada através do prisma do pensamento se transforma em outra ação, atri- buída de sentido, consciente e, portanto voluntária e livre que, segundo Vigotski (1935/1997), está em uma relação distinta com a situação e que a ação diretamente condicionada pela situação não passa por esta transformação. Uma função consciente é a expressão das funções psicológicas superiores e, portanto, está inserida na dinâmica semântica e adquire distintas possibilidades de ação. Tomar consciência significa em certa medida dominar. E o autor conclui que: “É próprio das funções psicológicas superiores uma natureza intelectual distinta e uma natureza afetiva distinta.Tudo reside no fato de que o pensamento e o afeto representam partes de um todo único – a cons- ciência humana” (Vigotski, 1935/1997 p. 273).
Outro aspecto importante do pensamento de Vigotski, e que revela sua concepção de sujeito ativo, é a diferença que ele faz entre situação social do desenvolvimento e o conceito de “ambiente objetivo”. O que marca essa diferença é que a pessoa significa esse ambiente e suas experiências nele. Portanto, não é uma relação passiva e sim um “relacionamento definido pelas necessidades e metas da pessoa, um relacionamento definido pelas formas de prática social que relacionam a pessoa com o ambiente e definem o que ele significa para ela” (Minick, 2002, p.57). Ou definem o significado de diferentes aspectos de seu ambiente.
Para continuar com o objetivo de compreender, na perspectiva da psicologia histórico cultural, a dimensão da emoção na atividade humana, analisase o texto Sobre a questão da psicologia do ator, publicado em 1932 e considerado por González Rey (2013) um importante trabalho de Vigotski do último período de sua produção. O autor, em seu estudo sobre a obra de Vigotski, faz uma divisão diferente das fases proposta por Minick (2002). Define a última fase como o período 1928 e 1934, caracterizada pelo retorno a muitos aspectos do início de sua obra, como, por exemplo, a volta aos temas das emoções e da arte (González Rey, 2013).
No trabalho “Sobre oproblema da psicologia do trabalho criativo do ator”(Vigotski 1932/1999), a posição da colocação do problema é fundamental para o estudo da emoção na atividade quando considerada na perspectiva da psicologia concreta que parte não de leis eternas e imutáveis, absolutas, mas de leis históricas que consideram as experiências da pessoa concreta. A emoção, quando estudada nessa perspectiva, expressa a prática social e a ideologia de sua época, que também mudam no processo histórico do homem, assim como mudam as formas de relações sociais e os conteúdos das ideias presentes nessas formas. (Vigotski, 1932/1999). Isto porque a emoção, se tem uma dimensão biológica, por outro lado, o que ela significa, para a pessoa que vivencia suas modificações fisiológicas, é de natureza social e histórica. O significado da emoção não é uma categoria biológica e natural, mesmo que sua manifestação física e motora se expresse como tal, como demonstram os estudos de Darwin (1989) A emoção como todo fato humano é por natureza significativo e uma vez retirada sua significação, retira-se também a natureza humana, escreveu Sartre (1938/1972).
Na sua interpretação da teoria de Vygotsky, Kozulin (1994), sustenta um foco no papel do indivíduo como mediador de significados. (Daniels, 2003) Em sua análise da história da psicologia soviética após a morte de Vygotsky, o autor ressalta os caminhos da “insistência na relação concreta com a realidade mediada por operações de caráter prático e não semiótico” (Kozulin, p. 233). Aponta como essa divergência que ocorreu entre os grupos que continuaram a pesquisar dentro do referencial histórico-cultural foi fundamental para a continuidade da teoria de Vygotsky após sua morte. Segundo Kozulin (p. 233), a consciência possuí um poder radical de transformação da realidade. No próprio texto de Vygotsky (1997), um dos últimos sobre o “Papel do atraso mental” de 1935, escreveu:
La dinâmica del pensamento no es la relación dinâmica, especularmente reflejada, que domina en la situación real. Si el pensamento no cambiara nada em la acción dinâmica sería absolutamente innecesario. Por cierto que la vida determina la consciência. Esta surge de la vida y forma sólo uno de sus momentos. Pero uma vez nacido, el próprio pensamento determina la vida o; más exatamente, la vida pensante se determina a sí misma a través de la conciencia. Em cuanto separamos el pensamento de la vida, de la dinâmica y la necesidad, lo privamos de toda actividad, nos cerramos todos los caminhos hacia la revelación y el esclarecimento de las propriedades y de la misión más importante del pensamento: determinar el modo de vida y de conduta, modificar nuestras acciones, darles uma dirección y liberarlas de la dominación de la situacón concreta. (Vygotsky, 1997, p.269).
Kozulin (1994) volta ao texto de Vigostki (1993) “Pensamento e palavra”, escrito em 1934, e retoma a importância do entendimento de que “os instrumentos primários da consciência são os “significados” e “sentidos” verbais e seu desenvolvimento depende fundamentalmente das interações sociais semióticas e interpessoais” (p. 233). Nessa concepção o signo mediador é decisivo na transformação da mente natural em cultural e o conceito de mediação permite três grandes classes de mediadores: signos e símbolos, atividade individual e relações interpessoais.
Entre as várias interpretações da importância da mediação na teoria histórico-cultural de Vygotsky, compartilha-se do entendimento que o principio de mediação semiótica é a pedra angular da teoria e representa o seu foco principal. No texto “El problema de la conciencia”, de 1933, Vygotsky ( 1991) escreveu na conclusão:
El análise semiótica es el único método adecuado para estudiar la estrutura del sistema y contenido de la conciencia. (p.129) [...] Nuestro planteamiento em psicologia: de la psicologia superficial – a la conciencia de que el fenómeno no es igual a la realidade. Pero tampouco no oponemos a la psicología de profundidad. Nuestra psicologia –es uma psicología de cumbres (no determina la “profundidad” sino la “cumbre” de la personalidade). (p. 130).
Como consequência, para definir emoção é necessário estudar o significado/sentido da emoção. E o que determina o significado/sentido e a vivencia emocional é o caráter da experiência singular da pessoa participante das práticas sociais concretas (históricas eculturais) e de sua atividade no contexto dessas práticas. Quando se fala de participação supõemse que a pessoa assume um lugar e uma posição do contexto das práticas sociais, que, por sua vez, também determina os senti- dos/significados que constrói sobre sua atividade.
Assim, compreende-se a importância da categoria de “configuração ”formulada por González Rey (2003) em sua Teoria Histórico Cultural da Subjetividade para referir-se às formas de organização da subjetividade social. Categoria por ele utilizada para definir a personalidade como forma de organização da subjetividade individual. “Configuração subjetiva” como o conjunto de elementos de sentido procedentes de diversas esferas da experiência que determinam o sentido subjetivo da atividade do sujeito. (GONZÁLEZ REY, 2003)
O que Vigotski (1932/1999) concluiu no estudo sobre a psicologia do ator, ou seja, de que “a psicologia do ator éumacategoria histórica e de classe, não umacategoria biológica”(p.13), é tam- bém premissa fundamental para a compreensão da emoção na atividade dentro da perspectiva das práticas. Consequentemente, parafraseando Vigotski (1932/1999), não são os padrões biológicos primariamente que determinam o caráter da vivência emocional da pessoa na atividade. As vivências emocionais abrangem uma complexa configuração se sentidos e significados que têm a função social de revelar a posição da pessoa no contexto da participação das práticas sociais historicamente estabelecidas pelo desenvolvimento dos significados ideológicos da época e do lugar da pes- soa no seio das práticas. Assim, as leis de configuração dos sentidos e significados vividos na experiência emocional das pessoas devem ser resolvidas primariamente no plano histórico e não no plano da psicologia natural ou biológica. Como escreveu Vigotski (1032/1999), no texto sobre a psi- cologia do autor: “Portanto, natureza das paixões humanas nao determina diretamente as experiencias do ator em cena; ela apenas contem a possibilidade de desenvolvimento de formas muito mais variaveis e mutaveis de implementacao cenica das formas artisticas” (Vigotski, 1932/1999, p.13).
No final do estudo sobre a psicologia do ator, Vigotski (1932/199) volta a uma das ideias principais de sua teoria, apresentada com clareza no texto de 1930 “Sobre os sistemas psicológicos”, mas agora colocando em destaque o tema da emoção. Escreveu:
A psicologia ensina que as emoções não são uma exceção, algo diferente de outras manifestações de nossa vida mental. Como todas as outras funções mentais, as emoções não permanecem na conexão em que elas estão dadas inicialmente em virtude da organização biológica da mente humana. No processo da vida social, os sentimentos desenvolvem-se e as conexões iniciais desintegramse, emoções aparecem em novas relações com outros elementos da vida mental, novos sistemas se desenvolvem, novas ligações de funções mentais e unidades de uma ordem superior aparecem dentro de tais padrões especiais, interdependências, formas especiais de conexão e movimento são dominantes.
Estudar a ordem e a conexão dos afetos é a principal tarefa da psicologia cientı́fica, porque não é nas emoções tomadas de uma forma isolada, mas em conexões com sistemas psicológicos mais complexos, que a solução do paradoxo do ator reside. Esta solução, como pode ser esperada ainda agora, conduzirá os investigadores a uma posição que tem uma significância fundamental para toda a psicologia do ator. As experiências do ator, suas emoções, aparecem não como funções de sua vida mental pessoal, mas como um fenômeno que tem uma significância e um sentido social objetivos, que servem como um estágio de transição da psicologia à ideologia. (Vigotski, 1932/1999, p.21)
CONSIDERAÇOES FINAIS
A partir do retorno aos últimos textos que tratam da emoção na obra de Vigotski, propõese a inclusão de um conceito norteador em pesquisas em Organizations and the Examined Life. É o conceito de emoção na atividade. A emoção humana é uma vivência constituída histórica e culturalmente que integra componentes de representação (símbolos, ideias, valores, ideologias); de expressão, e de manifestação corpórea (motórico-fisiológicas) amalgamadas. A emoção se manifesta dirigida ao objeto da atividade, é gênese e sustentação da atividade humana. A emoção é gerada quando encontra sentido no objeto da atividade. Assim é a emoção que gera, que dá motivo, que é dinamogênica (Vigotski, 2004 p.16), sustenta e dá sentido à atividade do sujeito, até mesmo quando paralisa essa atividade. De igual forma, a atividade também gera, sustenta ou interrompe/modifica a emoção. A emoção imprime sentido, marca a atividade. A atividade é marcada na sua propriedade pela emoção que a sustenta. A emoção imprime autoria à atividade, imprime singularidade (González Rey, 2003). É a emoção que imprime a qualidade da atividade, imprime certo modo de ser (identidade). A atividade, por sua vez, modifica a emoção. Impossível estudar a emoção separada, sem levar em conta as experiências humanas de sujeitos concretos, historicamente situados. A emoção humana deve ser compreendida a partir da configuração subjetiva de cada sujeito (González Rey, 2003). O social inscreve no biológico (Wallon, 1979). A emoção estabelece nexos e conexões com a memória, linguagem, percepção, atenção, imaginação e as outras funções psicológicas, formando um sistema funcional dinâmico, mediado pela linguagem, a partir das experiências geradas nas atividades culturais, sociais e histórica de sujeitos concretos (Vigotski, 1932/1999).
REFERÊNCIAS
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Notas