Artigo
INTERNET DAS COISAS COMO MÍDIA: PERSPECTIVAS E DESAFIOS PARA COMUNICAÇÃO E DESIGN DE ANÚNCIOS
Internet of things as media: perspectives and challenges for communication and advertisement design
Internet de las cosas como medios: perspectivas y desafíos para la comunicación y el diseño de publicidades
INTERNET DAS COISAS COMO MÍDIA: PERSPECTIVAS E DESAFIOS PARA COMUNICAÇÃO E DESIGN DE ANÚNCIOS
Signos do Consumo, vol. 15, núm. 1, e210974, 2023
Escola de Comunicações e Artes da USP
Recepção: 24 Abril 2023
Aprovação: 30 Maio 2023
RESUMO: Esta pesquisa tem como tema comunicação, design e internet das coisas, e como objeto a interface gráfica de anúncio interativo para internet das coisas. O objetivo geral é estudar a internet das coisas como mídia a partir de uma perspectiva do design. A questão de pesquisa diz respeito a como podem ser os regimes estéticos de interação por meio da internet das coisas. Do ponto de vista teórico, a pesquisa utiliza os pressupostos da Teoria do Meio revista. Do ponto de vista metodológico, guia-se pelas ideias da Design Science Research. Essa metodologia está orientada para a solução de problemas complexos, de forma a compreendê-los e a construir e avaliar artefatos. Nesse recorte, usamos a pesquisa exploratória, a pesquisa de experiência de usuário e a criação e testes de protótipo para investigar perspectivas e obstáculos da IoT como mídia para anúncios interativos. Nesse sentido, busca-se uma integração entre a interpretação do fenômeno, do ponto de vista da comunicação, e a ciência dos dados, do ponto de vista da internet das coisas. Os resultados podem colaborar para a criação de prescrições para design gráfico de anúncios com foco no consumo responsável.
PALAVRAS-CHAVE: Design, Internet das coisas, Design Science Research, Comunicação, Mídia.
ABSTRACT: This research has communication, design, and internet of things as its theme and the graphic interface of interactive advertisement for internet of things as its object The general objective of this study is to evaluate internet of things as media from a design perspective. Our guiding question concerns the aesthetic regimes of interaction within the internet of things. From a theoretical point of view, this research uses the assumptions of the revised Medium Theory. From a methodological point of view, this study was guided by the ideas of Design Science Research. This methodology aims to solve and understand complex problems and build and evaluate artifacts. Within this scope, we used exploratory research, users’ experiences, and prototype creation and testing to investigate perspectives and obstacles to internet of things as a media for interactive advertisements. Thus, we seek to integrate the interpretation of the phenomenon from the point of view of communication and data science from the point of view of the internet of things. Results can contribute to prescriptions for graphic design of advertisements aimed at responsible consumption.
KEYWORDS: Design, Internet of Things, Design Science Research, Communication, Media.
RESUMEN: Esta investigación tiene como tema la comunicación, el diseño y el internet de las cosas, y como objeto la interfaz gráfica de la publicidad interactiva para el internet de las cosas (IoT). Su objetivo general es estudiar el internet de las cosas como medios desde la perspectiva del diseño. La pregunta de investigación se refiere a cómo pueden ser los regímenes estéticos de interacción a través del internet de las cosas. Desde un punto de vista teórico, se utilizan los supuestos de la Teoría del Medio Ambiente revisada. Desde el punto de vista metodológico, está fundamentada en las ideas de Design Science Research. Esta metodología está orientada a la resolución de problemas complejos, con el fin de comprenderlos y de construir y evaluar artefactos. Para ello, utilizamos la investigación exploratoria, la investigación de la experiencia del usuario y la creación y prueba de prototipos para investigar las perspectivas y los obstáculos de IoT como medio para la publicidad interactiva. En este sentido, se busca una integración entre la interpretación del fenómeno, desde el punto de vista de la comunicación, y la ciencia de datos a partir del punto de vista del internet de las cosas. Los resultados pueden contribuir a la creación de fórmulas para el diseño gráfico de publicidades con un enfoque en el consumo responsable.
PALABRAS CLAVE: Diseño, Internet de las cosas, Design Science Research, Comunicación, Medios.
INTRODUÇÃO
A pesquisa investigou o tema comunicação, design e internet das coisas e, como objeto, a interface gráfica de um anúncio interativo no âmbito da Internet das Coisas (do inglês, internet of things, IoT). O objetivo geral é estudar a internet das coisas como mídia a partir de uma perspectiva da comunicação e do design, com perspectivas interdisciplinares, centradas na interação entre pessoas e dispositivos da internet das coisas.
A questão de pesquisa diz respeito a como podem ser os regimes de interação por meio da IoT e como esta tecnologia influencia a maneira de pensar novos produtos comunicacionais. Outras questões surgiram ao longo da investigação, relacionadas a processos de design thinking, mediação e midiatização social, do ponto de vista comunicacional; estudos de produção, circulação e recepção dos meios de comunicação em IoT; linguagens e produção de sentidos em IoT; dimensão educacional da comunicação em IoT para o consumo responsável; e para tecnologias, interações, inteligência artificial e convergência de mídia que poderão fomentar pesquisas futuras.
Adota-se a Design Science Research (DSR) como método para a criação de um protótipo de comunicação gráfica e por comando de voz. A DSR é um método baseado no pragmatismo utópico, orientado para a resolução de problemas, de forma a compreendê-los e construir e avaliar artefatos. O objetivo é estudar a relação entre comunicação, design e IoT, com uma metodologia interpretativa e exploratória, e que deve contribuir para a criação futura de um sistema de anúncios e um modelo de prescrições, no sentido de recomendações e orientações, como um aprofundamento no estado da arte desse campo.
O estudo está ancorado nas abordagens de uma teoria do meio revisitada, confrontada pelas teorias da ação comunicativa como modo de compreender a tecnologia permeada nos processos comunicacionais em IoT e auxiliar, de modo multidisciplinar, o design de anúncios interativos.
Resultados parciais desta pesquisa foram debatidos no âmbito dos grupos de trabalho do GP Publicidade e Propaganda no 45º INTERCOM - Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, do XVII Encuentro Latinoamericano de Diseño, na Semana Internacional de Diseño, da Universidad Palermo, no 7° Seminário de Pesquisa em Comunicação Uninter, no XXII Congresso Brasileiro de Ergonomia ABERGO, no 22º Congresso Nacional de Iniciação Científica (CONIC-SEMESP) e no IX Pensacom Brasil 2022 Pensamento Comunicacional Brasileiro.
Para este estudo, usou-se como meio o dispositivo IoT Echo Show, da Amazon. Realizou-se pesquisa exploratória de anúncios interativos existentes, entrevistas com usuários de dispositivos Echo com sistema Alexa, desenvolvimento de protótipo de anúncio interativo e testes com usuários.
TEORIAS DO MEIO REVISITADAS
Desde Norbert Wiener e sua conceituação de cibernética em Cibernética e sociedade: o uso humano de seres humanos ( 1993) há um debate sobre como a tecnologia e a comunicação humana estão enredadas. Por um lado, apesar de nem sempre tão dicotômica, temos uma teoria crítica aos meios de comunicação - principalmente, mas não exclusivamente -, feita pela Escola de Frankfurt e Jürgen Habermas ( 2012), com base nos conceitos de razão comunicativa. Por outro lado, temos uma teoria dos meios ( Medium Theory), capitaneada principalmente pela Escola de Toronto, com expoentes como Harold Innis ( 2011) e Marshall McLuhan ( 1969).
Nesse sentido, Innis, e posteriormente McLuhan, difundiram a hipótese de que tecnologias dos meios alteram relações sociais, e, o que se tornou mais popular por McLuhan, que tecnologias de comunicação são uma extensão dos sentidos humanos. Mais radicalmente e alinhado com Wiener, McLuhan também deixou célebre que os meios seriam as mensagens, e já não tanto os símbolos que produzem ou os sentidos que as pessoas constroem a partir deles.
Habermas, em uma linha mais crítica aos meios, entende que a razão comunicativa foi subordinada a uma razão instrumental, mas que não foi por esta destruída, sendo ainda fonte de estímulo para uma liberdade social. Ao mesmo tempo em que as tecnologias de comunicação se tornaram meios de controle subordinados a um capital, uma razão instrumental, potencializaram as formações simbólicas ( RÜDIGER, 2011) que se estenderam global e atemporalmente.
Nesse sentido, há uma simbiose entre relações sociais e meios de comunicação, na qual um está agindo sobre o outro. Da mesma forma que os meios, naturalmente, foram criados por relações sociais, como princípios econômicos de armazenar e transmitir informações, como nos lembra Vilém Flusser ( 2014), ao mesmo tempo alteram as relações sociais ao permitirem diferentes tipos de diálogo e discursos em diferentes escalas públicas.
Alinhando ao pensamento do Design, compreender e interpretar o meio é um processo de empatia, que foi usado para aproximar a pesquisa do objeto de estudo, principalmente considerando as dimensões como mídia que a IoT permitirá.
MIDIA, DESIGN E INTERNET DAS COISAS: PERSPECTIVAS
A internet das coisas evoluiu fortemente desde 2004. O barateamento das tecnologias e os avanços em infraestrutura e programas sociais de acesso ao ambiente digital permitiram a digitalização de diversas interações diárias, ampliando a capacidade de guardar e transmitir informações.
De acordo com Aksu et al. ( 2018) o ambiente de IoT como mídia está evoluindo rapidamente para um conjunto de dispositivos IoT, que cooperam coletivamente para implementarem e exporem ao usuário múltiplas funcionalidades, bem como para fornecerem anúncios como um veículo atual composto de vários dispositivos IoT incorporados. Os sensores presentes em IoT têm um papel importante na definição do perfil, do que o usuário faz e do contexto específico em que tais atividades são feitas. Parafraseando McLuhan, é como a extensão de um observador, porém com mais precisão de dados e menos interpretação de sentidos. Desse modo, há vários desafios tecnológicos e científicos importantes, como compreender se os dispositivos estão predispostos a receber mídia programática 1, quais os protocolos de criação, produção e mídia para o design gráfico e design de voz de anúncios em IoT, como ter uma compreensão ética e crítica desses dispositivos, além de analisar produtos com ou sem recursos visuais.
Do ponto de vista pragmático, um desafio atual é criar um sistema de anúncios capaz de se adaptar e converter a fragmentação atual dos dispositivos IoT em uma linguagem comum para permitir uma rede de publicidade IoT. Um anunciante de IoT, por exemplo, precisará conceber e projetar sua campanha para destinos heterogêneos. Do ponto de vista do design, isso pode ser resolvido sob a perspectiva de design gráfico e de voz responsivos, que se adaptam ao formato de tela e de conversação no destino. Nota-se, nesse sentido, a razão instrumental que subordina mas não exclui a razão comunicativa. Do ponto de vista comunicacional, é necessário compreender os aspectos sociais e como integrar mensagens responsivas de acordo com a capacidade do dispositivo.
Por outro lado, a experiência de conversação dos usuários modifica os aspectos simbólicos na produção de conteúdo dessas mídias. A chegada da IoT no campo da comunicação trouxe a possibilidade de “inclusão social do telespectador e a democratização dos meios” ( WINCK, 2007), proporcionada por sistemas interativos no universo do audiovisual digital.
Usabilidade e experiência do usuário (UX) são conceitos relacionados a uma área de conhecimento que surgiu e se desenvolveu a partir da necessidade de investigar, compreender e aprimorar a interação humano-computador (IHC). Com o advento da internet das coisas, o compartilhamento de dados coletados a partir de sensores aplicados a objetos e dispositivos, realizado via uma rede de serviços, impactou significativamente a experiência dos usuários. Segundo Rowland ( 2015) a concepção da experiência dos usuários em sistemas IoT é diferente e mais complexa, pois envolve muitos aspectos: a usabilidade de e entre vários dispositivos conectados em um sistema; a conectividade do sistema; os produtos em si; as pessoas; as interfaces, que podem ser visuais ou sonoras; e a interação.
TECNOLOGIAS EM IoT E O DISPOSITIVO ALEXA
Para que os objetivos da pesquisa fossem alcançados, foi necessário compreender a experiência dos usuários na interação com interfaces sonoras e visuais de dispositivos de IoT existentes. Assim, utilizou-se o dispositivo inteligente Echo Show 8, com tela e caixa de som ( smart displays), integrado ao assistente pessoal por comando de voz Alexa, devido ao seu grande volume de vendas atualmente. Segundo dados da Strategy Analytics ( 2022), dos 50 principais modelos de dispositivos inteligentes vendidos, 19 eram com tela. No período, o Echo Show de segunda geração da Amazon, liderou com 1,6 milhão de unidades vendidas, seguido pelo Nest Hub do Google e pela segunda geração do Echo Show 8. No total do primeiro trimestre de 2022, foram vendidos 35,3 milhões de unidades de assistentes de voz. Nesse trimestre, a Amazon registrou um total de 9,9 milhões de unidades de Echo Dots ( smart speakers) e Echo Shows ( smart displays) vendidos, chegando a uma participação de mercado de 28,2% ( Quadro 1).

O Echo Show permite um estudo da interação por áudio e vídeo, possibilitando uma abertura de testes que posteriormente poderão ser replicados em outros dispositivos IoT semelhantes. O teste do sistema de anúncios se faz necessário, uma vez que os modelos nesse tipo de sistema são escassos e carecem de aprofundamento.
Segundo o site New Voice (2022), atualmente o sistema de anúncios interativos por meio do Echo Show está em fase de testes pela Amazon. As propagandas são integradas com a loja da empresa. Assim, os usuários que estiverem escutando uma música poderão pedir, por exemplo, para a assistente de voz adicionar o produto em seu carrinho da loja da Amazon. Os usuários poderão interagir com propagandas com comandos de voz como “Alexa, me diga mais informações”, “Alexa, lembre-me” ou “Alexa, coloque no carrinho”. Na fase de testes, as propagandas interativas são exclusivas para os Estados Unidos.
Além da voz, a Amazon está testando versões em vídeo de anúncios interativos, permitindo que usuários de streaming da plataforma possam comprar por voz produtos e serviços anunciados no aplicativo IMDb TV, embutido em aplicativos Fire TVs. Assim como na versão para voz, as pessoas podem conversar com os vídeos interativos para adicionar o produto ao carrinho ou enviar informações para o email. Anúncios interativos por comando de voz diferem de anúncios web tradicionais porque têm por base a conversação, anteriormente restrita a assistentes de sistemas e chatbots.
METODOLOGIA
A pesquisa foi guiada pelas ideias de Design Science. Nesse sentido, busca-se uma integração entre a interpretação de um fenômeno e a aplicação pragmática. A DSR é usada como um “método que fundamenta e operacionaliza a condução da pesquisa quando o objetivo a ser alcançado é um artefato ou prescrição” ( DRESCH, 2015, p. 67). Por artefatos, entende-se “como algo que é construído pelo homem, ou seja, objetos artificiais que podem ser caracterizados em termos de objetivos, funções e adaptações” ( DRESCH, 2015).
Dividiu-se a pesquisa em três fases: reconhecimento do usuário de IoT, desenvolvimento de protótipo de anúncio interativo e testes deste protótipo. Na primeira e na terceira fases foram realizadas observações e entrevistas utilizando metodologias de experiência do usuário (do inglês, user experience, UX) e interface do usuário (do inglês, user interface, UI). Considerando-se que a IoT mudou a experiência dos usuários, cabe analisar em que medida os métodos utilizados anteriormente para avaliações de UX são aplicáveis ao contexto da experiência em IoT.
Hassenzahl ( 2007) propôs o modelo hedônico versus pragmático para avaliar como se dá a compreensão da experiência pelo usuário. Os aspectos pragmáticos são aqueles com foco no produto, seus aspectos instrumentais, utilidade, usabilidade e possibilidades. Já os aspectos hedônicos são focados no self, como as motivações para o uso do produto, que podem ser de “estimulação (novidade e mudança, crescimento pessoal), identificação (comunicação da identidade, parentesco) e evocação (provocar memórias, simbolizar)” ( HASSENZAHL, 2007, p. 10).
Para estabelecer os critérios e procedimentos de avaliação da experiência dos usuários em sistemas interativos, é necessário, segundo Väänänen-Vainiomattila, Roto e Hassenzahl, ( 2008, apudALMEIDA 2018), conhecer o comportamento do usuário antes, durante e depois da avaliação de UX do sistema. Assim, antes da criação do anúncio interativo, foi realizada pesquisa qualitativa para reconhecimento dos usuários da assistente pessoal Alexa em equipamentos Echo, a fim de compreender suas motivações, hábitos e comportamentos. Foi elaborado um formulário, com o objetivo de estabelecer um primeiro contato para posterior entrevista em profundidade, além de identificar o perfil do usuário e sua experiência e frequência de uso do sistema em questão. Sete usuários de dispositivos Echo com assistente pessoal Alexa participaram das entrevistas, que abordaram temas como motivação da compra, hábitos, local e frequência de uso do sistema, aspectos positivos e negativos das interações. As entrevistas foram feitas em reuniões on-line, filmadas e posteriormente transcritas e analisadas ( MELLO et al., 2022 )
Para a fase de desenvolvimento do protótipo, criou-se um anúncio interativo para o 1961 Design Studio, uma entidade do Centro Universitário Instituto Mauá de Tecnologia focada em design. Os estudos foram feitos por meio do software Adobe XD e com assets, isto é, padronizações de layout disponibilizadas em um kit de design da própria Amazon para o sistema Alexa. A padronização visual e polices relacionadas ao desenvolvimento de skills por terceiros indicam a busca da Amazon por uma identidade de produto, tanto visual quanto sonora. Utilizou-se, ainda, o aplicativo Text Talk para converter texto em áudio, em português.
Para a avaliação de UX do protótipo, foram realizados testes em laboratório com 29 avaliadores, utilizando o software Adobe XD com gravação de tela e câmera de vídeo do computador pela plataforma Zoom. O perfil do respondente foi, em sua maioria, de jovens de 19 a 24 anos, com predominância de usuários masculinos e universitários, cuja maioria se comunica em português e inglês.
RESULTADOS
Reconhecimento do usuário de IoT
Participaram da pesquisa quatro mulheres e três homens, com idades entre 19 e 59 anos e escolaridade de nível superior completo ou em curso. Dois entrevistados possuíam dispositivos Echo Dot terceira geração e cinco possuíam Echo Dot quarta geração, modelos que apresentam apenas interação sonora. Apenas uma entrevistada possuía dispositivo Echo Show, com interação sonora e visual. Dois entrevistados possuíam mais de um dispositivo, em cômodos diferentes da casa. A maior parte possuía o sistema entre um e dois anos e o utiliza diariamente. Entre as motivações para compra, foram relatados interesse por novas tecnologias, facilidade de conexão (rapidez no uso por comando de voz), oportunidade de compra em promoções e intuito de presentear um familiar.
Todos os entrevistados relataram utilizar o sistema nas residências, sendo possível identificar dois perfis de uso, um individual e um familiar, e a existência de relação entre esses perfis e locais de uso e tarefas desempenhadas. Usuários individuais utilizam o sistema em dormitórios ou home offices. As tarefas mais mencionadas foram: programar para despertar com música; ouvir música (rádio ou streaming); controlar a iluminação ambiente; ligar o computador enquanto faz outras tarefas no início do dia de trabalho; usar como sistema de som em reuniões on-line; marcar o tempo para a realização de tarefas (início e duração); realizar pesquisas. Já usuários familiares utilizam os dispositivos em ambientes de uso comum da residência, como salas, varandas e cozinhas. As tarefas mais citadas foram: consultar previsão do tempo; entretenimento (pesquisa, perguntas engraçadas, curiosidades); pesquisar receitas de culinária e fazer lista de compras; e criar lembretes para tarefas domésticas. Quanto à frequência, percebeu-se que o uso diário ocorre entre aqueles que de fato utilizam o sistema como assistente pessoal e para controle de outros dispositivos na residência, como televisores e iluminação. O uso é menos frequente quando o dispositivo é usado apenas como caixa de som, nos momentos de lazer.
Os pontos considerados mais positivos na interação foram “praticidade” e “facilidade”, sendo citados exemplos como “não precisar apertar nenhum botão”, “não precisar se levantar”, “poder controlar dispositivos da casa à distância pelo celular”. Quanto aos aspectos negativos, a reclamação mais recorrente foi referente a o dispositivo funcionar apenas estando conectado na tomada, já que não tem bateria. Foram citados também preocupação com a privacidade, dificuldades de compreensão e de conexão em sistemas com diversos dispositivos (conflito com TVs que possuem o próprio sistema Alexa), perda de sincronização com outros equipamentos ao ser retirado da tomada, começar a falar sem ter sido solicitado, baixa qualidade de som para ouvir música.
A maior parte dos entrevistados afirmou que nunca ouviu anúncios pelo dispositivo, mas foram citados alguns exemplos relacionados a serviços da própria Amazon, como anúncios de filmes que serão exibidos na Amazon Prime e notificações de realização, entrega e avaliação de compras pela Amazon. Nota-se que essas mensagens não foram, em princípio, percebidas como anúncios. Houve poucas menções ao uso de diferentes skills, isto é, de aplicativos específicos do sistema Alexa, normalmente desenvolvidos por terceiros. As skills mais utilizadas referem-se às rádios preferidas ou aplicativos de música (Spotify, Amazon Music). Em pesquisa anterior ( PEREIRA et al., 2022 ), foi identificado crescimento na criação de skills por outras empresas e pessoas, além da Amazon. Isso é possível utilizando-se uma conta de desenvolvedor no site da Amazon e acessando um console de desenvolvimento de skills para Alexa. Percebe-se que há um desconhecimento de skills de uma forma geral, e notou-se que a maior parte dos entrevistados se refere ao sistema sem diferenciar se uma tarefa específica é feita por skills de terceiros ou pelo sistema Alexa “nativo”.
Devido aos aspectos complexos da experiência dos usuários em sistemas IoT, como a usabilidade de e entre vários dispositivos conectados em um sistema, as interfaces visuais ou sonoras, entre outros, é possível considerar que adaptações podem ser necessárias aos métodos tradicionais utilizados para testes de usabilidade, UX e UI, e em particular naqueles aplicados a anúncios interativos.
Desenvolvimento do protótipo de anúncio interativo
Após entrevista com o 1961 Design Studio para elaboração de um briefing, determinou-se que o tema do anúncio seria fornecer informações a respeito da entidade de forma descontraída. Partiu-se para a de definição de persona, ou seja, da compreensão do público para o qual a skill seria feita. Esta etapa ajuda na definição estética do protótipo, o que busca atrair a persona em foco ( COOPER, 1999). Criou-se um mood board (painel de sentimentos), para inspirar os designers envolvidos no desenvolvimento do projeto, uma vez que é um recurso utilizado nas etapas iniciais do processo de design com o objetivo de ajudar na compreensão do problema a ser enfrentado ( GARNER; MCDONAGH-PHILIP, 2001).
Em seguida esboçou-se um roadmap, isto é, um mapa de interação ( fig. 1), considerando as possíveis intenções dos usuários e quais conteúdos poderiam ser atraentes nessas interações. Uma das dificuldades do roadmap é que, diferentemente do ambiente de tela, o design de voz precisa compreender diferentes intenções de fala. Nesse sentido, as Ciências da Comunicação têm uma forte contribuição na compreensão dessa complexidade. A visão comunicacional auxiliou a criar opções de interação focadas mais nas “intenções” e menos em “comandos”.
Foram elaboradas 3 versões do protótipo até conseguir-se o refinamento das interações ( fig. 2). Foram incluídos comandos por toque, uma vez que o dispositivo Echo Show 8 é touchscreen. Esses comandos ampliam as possibilidades de interação para o caso de falhas no reconhecimento de voz. Essa aplicação foi definida no protótipo a partir da observação diretas de interações de outras skills e por meio de entrevistas com usuários ( PEREIRA et al., 2022 ).

Uma dificuldade da prototipação por comando de voz por meio do Adobe XD é que as vozes padrão desse software são em inglês. Ao inserir-se um texto em português, o resultado é quase incompreensível. Para melhorar a experiência de voz, utilizou-se o aplicativo Text Talk para converter texto em áudio com a voz idêntica ao sistema Alexa. Incluiu-se um acionador de tempo para reproduzir o arquivo de áudio assim que ocorre a transição de telas, criando a sensação de diálogo presente na interação entre o usuário e o dispositivo.

No protótipo, as transições são feitas por acionadores de voz com comandos definidos. Como as intenções dos usuários podem variar, sugere-se um comando por meio de mensagem visual, como no exemplo “Tente ‘Alexa, me fale mais sobre Portfolio’”. Os estudos de protótipos por comando de voz necessitam ser testados com vários usuários para compreender os diversos fluxos de interação e intenção.
Incluiu-se também comandos redundantes com diferentes tipos de frases, considerando que o usuário pode variar no modo de falar, como “Alexa, seguinte” ou “Alexa, próximo”. Em um sistema de programação de skills no Console de Desenvolvedor Alexa ( AMAZON, 2022) isso seria substituído por prompts de intenções, comandos que são interpretados por meio de inteligência artificial, tendo por base a Programação de Linguagem Natural (PNL).
Teste do protótipo
A maioria dos avaliadores considera o uso da interface fácil e intuitiva e entende que a interface se comportou de acordo com as expectativas, embora apenas 7 usuários estivessem habituados a utilizar equipamentos de voz. As respostas da interface foram consideradas adequadas e compreensíveis. No entanto, 32,1% consideram que as respostas não foram rápidas. A maioria sentia que sabia o que dizer diante da interface. A voz da interface gerada pelo aplicativo Text Talk foi considerada compreensível, amigável e não irritante, e 42,9% consideraram-na bonita ( fig. 3). Quanto ao visual da interface a maioria considerou-a amigável, bonita, atrativa e compreensível. Sobre a relação visual e voz 30,4% discordam que seja uma interface confiável e 25% consideram difícil de usar. A maioria concorda que a interface foi compreensível e intuitiva.

Houve demora no feedback da interface, indicando que o software Adobe XD necessita de melhorias para servir como ambiente de teste de protótipo de sistemas de conversação. Recomenda-se incluir questões com respostas mais intuitivas e voltadas para uma conversação mais natural, com espaços para variáveis 2. Recomenda-se criar um roadmap de interação com questões mais intuitivas e seguindo um protocolo de intenções e slots, considerando memória e contextos de usos e de dados. Isso foi percebido pelos aplicadores do teste, mas não destacado pelos usuários. Recomenda-se também incluir em testes futuros questões sobre memória (lembrança da conversação com o usuário) e contexto no qual acontece a conversação. Destaca-se que poucos usuários do teste usufruem de equipamentos por comando de voz.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Até este momento da pesquisa, nota-se que a IoT como mídia é um processo que ainda tem muita variabilidade de modelos, linguagens de programação, formatos e estruturas diversas, mas que tende a uma padronização de formatos para possibilitar sistemas de mídia integrados. A IoT como mídia para anúncios interativos ainda carece de aprofundamento em vários aspectos, por isso mais discussões devem ser feitas para prescrições de anúncios no âmbito da comunicação, do design gráfico e da experiência do usuário aplicados à internet das coisas.
Entendemos tratar-se de um processo participativo com uma abordagem interdisciplinar, para gerar a troca de conhecimentos, de referências e experiências aplicadas entre comunicação, design gráfico e internet das coisas; por outro lado, permite levantar insights sobre o impacto gerado pela introdução da IoT na criação e desenvolvimento de produtos tangíveis e na configuração da IoT como mídia.
Devido aos aspectos complexos da experiência dos usuários em sistemas IoT, como a usabilidade de e entre vários dispositivos conectados em um sistema, interfaces visuais ou sonoras, entre outros, é possível considerar que adaptações podem ser necessárias aos métodos tradicionais utilizados para testes de usabilidade, UX e UI, e em particular naqueles aplicados a anúncios interativos.
Os resultados permitem apresentar uma prescrição para um possível modelo do processo de desenvolvimento de design gráfico e de voz ( fig. 4), iniciando com o processo de briefing, seguido de estudos de UX que envolvem principalmente mapa de empatia, moodboard e entrevistas em profundidade. Estes estudos permitem traçar um plano de skill com objetivos, tom de voz, imagem de marca, e sinopse sob a ótica de um design responsivo. Após a validação desse plano, recomenda-se ao designer elaborar um roadmap, isto é, um fluxo de interação, com definição de intenções, slots (espaços para variáveis de texto) e enunciados. Este roadmap precisa ser mais flexível na conversação e mais responsivo entre equipamentos de IoT envolvidos. Nesta etapa recomenda-se usar storyboards como método de interpretação da interação, uma vez que sentimos falta de um storytelling do anúncio. Validado o roadmap, o designer desenvolve a prototipagem por meio de wireframes responsivos das telas, e estabelece o key visual, isto é, a linha criativa visual como um template responsivo, e define também o design e a conversação para os prompts a serem programados. Após a prototipação, um programador poderá realizar a programação dos prompts, considerando a memória da interface, tanto de curto quanto de longo prazo; o contexto emocional e o contexto dos dados (como por exemplo em que hora do dia se dá o acesso), uma vez que isso também foi sentido nos testes de usuário.

Como prescrições para designers de interfaces gráficas e de voz, compreendemos que há uma necessidade de campos de interação interespecialistas com tradução recíproca, como, por exemplo, entre comunicadores, designers e cientistas de dados. Recomendamos que pesquisadores em design testem os softwares de prototipação para sugerir melhorias, como ambientes de teste de protótipo de sistemas de conversação para IoT. Recomenda-se que o comunicólogo inclua questões com respostas mais intuitivas e voltadas para uma conversação mais natural. Recomenda-se criar um roadmap de interação com questões mais intuitivas e seguindo um protocolo de intenções e slots, considerando memória e contextos de usos e de dados.
Uma das dificuldades deste possível modelo são os diferentes sistemas de equipamentos envolvidos no contexto IoT que não permitem, até o momento, um compartilhamento fácil de interfaces responsivas entre os modelos disponíveis.
Recomenda-se também aos pesquisadores incluir questões sobre memória e contexto em testes futuros, assim como métodos de observação e gravações de vídeo, que poderão auxiliar na investigação de UX em IoT ao permitirem chaves de entendimento para além da coleta de dados feitas exclusivamente pelos aparelhos IoT, ou por questionários estruturados e entrevistas, uma vez que possibilitam a descoberta de novos aspectos não pensados a priori e abrem espaço para a construção de hipóteses necessárias nesse momento do campo de pesquisa.
Pesquisas futuras, em conjunto com o campo da Administração, podem aprofundar ainda no que se refere aos sistemas de mídia programática para IoT, compreendendo agências de propaganda, publishers, hubs de mídia, indústrias do IoT e usuários; pode-se pesquisar como criar estratégias de publicidade em IoT a partir da conscientização do contexto do usuário. Pode-se pesquisar, em conjunto com Computação, como dispositivos IoT de usuário conversam com ecossistemas de mídia e publicidade programática em uma linguagem comum, adaptando-se os requisitos de IoT ao conhecido modelo de publicidade na Internet para habilitar um novo sistema de mídia e publicidade em IoT.
Isso pode contribuir para criar um sistema experimental de anúncios interativos e propor prescrições sobre: tipos de anúncios interativos com base numa perspectiva de design; processos de mediação e midiatização social em IoT; linguagens e produção simbólica na IoT; a dimensão educacional da comunicação para o consumo responsável; e as tecnologias, interações e convergência de mídia possibilitadas pela internet das coisas.
Os resultados aqui apresentados colaboram para a compreensão da comunicação por meio do design em IoT sob uma visão de design a partir dos aspectos simbólicos, dos aspectos dialógicos da IoT, da compreensão das análises preditivas das organizações e de suas considerações éticas para um consumo responsável.
Agradecimentos
À aluna Marcela Amaro Mellito pelas contribuições em Iniciação Científica. Aos alunos Rafael Angel Bordenabe e Eduardo Takase Sawada pelo auxílio durante a pesquisa. Ao Instituto Mauá de Tecnologia, Projeto Comunicação, design e IoT: um estudo para anúncios interativos em Internet das Coisas. Edital de Apoio a Pesquisa 2022, Decisão 11883/45/17.
REFERÊNCIAS
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Notas
Autor notes
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