RESUMO: O objetivo da pesquisa é identificar a presença, ou ausência, e a natureza do papel do publicitário em dez das perspectivas brasileiras contemporâneas sobre o fenômeno publicitário. A metodologia é qualitativa e os procedimentos são orientados pela pesquisa bibliográfica. Os resultados apontam que a presença do publicitário é sutil nas abordagens brasileiras recentes sobre o fenômeno publicitário dado que, em poucas delas, o profissional da produção é mencionado como um protagonista do processo, enquanto, na maioria das perspectivas, o publicitário é visto, junto do consumidor, como um coprodutor no contexto de comunicação e cibercultura.
PALAVRAS-CHAVE: Publicidade e propaganda, Publicitário, Produção.
ABSTRACT: The objective of the research is to identify the presence, or absence, and the nature of the advertiser’s role in ten of the contemporary Brazilian perspectives on the advertising phenomenon. The methodology is qualitative and the procedures are guided by bibliographical research. The results indicate that the presence of the advertiser is subtle in recent Brazilian approaches to the advertising phenomenon, given that in few of them the production professional is mentioned as a protagonist of the process, whereas in most perspectives the advertiser is seen as a co-producer with the public consumer in the context of communication and cyberculture.
KEYWORDS: Advertising, Advertiser, Production.
RESUMEN: El objetivo de esta investigación es identificar la presencia o ausencia y la naturaleza del papel del publicista en diez de las “perspectivas brasileñas contemporáneas sobre el fenómeno publicitario”. La metodología es cualitativa y los procedimientos están guiados por la investigación bibliográfica. Los resultados indican que la presencia del publicista es sutil en los recientes abordajes brasileños del fenómeno publicitario, dado que en pocos de ellos se menciona al profesional de la producción como protagonista del proceso, mientras que en la mayoría de las perspectivas el publicista es visto como un coproductor con el público consumidor, en el contexto de la comunicación y la cibercultura.
PALABRAS CLAVE: Publicidad y propaganda, Publicista, Producción.
artigo
O QUE DIZEM AS PERSPECTIVAS BRASILEIRAS CONTEMPORÂNEAS DA PUBLICIDADE SOBRE O PUBLICITÁRIO? 1, 2
What do the contemporary Brazilian perspectives of advertising say about advertiser?
¿Qué dicen las perspectivas brasileñas contemporáneas de la publicidad sobre el publicista?
Recepção: 06 Fevereiro 2023
Aprovação: 30 Maio 2023
No campo da pesquisa acadêmica brasileira sobre publicidade e propaganda, estão consolidados os estudos sobre o texto publicitário, ou produto midiático, e emergem abordagens desse processo de comunicação na perspectiva dos sujeitos e de suas práticas de recepção, e/ou consumo, e produção. Entretanto, como observado em mapeamento de pesquisa antecedente, isso ainda ocorre de modo incipiente ( VIEIRA, 2022). Para contribuir com esse cenário, deve-se refletir sobre a produção publicitária, e o publicitário, no contexto das perspectivas brasileiras contemporâneas sobre o fenômeno publicitário, conforme identificadas por Perez ( 2016) e Wottrich ( 2019). A pesquisa visa dar continuidade à discussão acerca dos acionamentos teóricos sobre a publicidade e a propaganda nas pesquisas brasileiras ( PIEDRAS; INVERNIZZI; WOTTRICH, 2021), o papel do consumidor nessas perspectivas contemporâneas ( PIEDRAS, 2022), entre outros objetivos. Portanto, o objetivo da pesquisa é identificar a presença, ou ausência, e a natureza do papel do publicitário em dez das perspectivas brasileiras contemporâneas sobre o fenômeno publicitário.
O percurso metodológico aponta para uma pesquisa de orientação exploratória e qualitativa, realizada através de dados documentais de natureza bibliográfica, como livros, artigos científicos e comunicações apresentadas em eventos acadêmicos. Os procedimentos de coleta, descrição e análise dos dados são realizados através da técnica de pesquisa bibliográfica (STUMPF, 2009). Na identificação das fontes para a coleta de dados, recorreu-se à indicação por cada um dos dez pesquisadores autores das perspectivas sobre o fenômeno publicitário e de referências qualificadas para a compreensão das abordagens. Após o acesso às fontes, realizou-se a leitura e o fichamento para a compreensão de cada perspectiva. Depois, realizou-se outra leitura buscando estritamente passagens nas quais o termo “publicitário” é acionado pelos autores para compor as perspectivas sobre o fenômeno em questão. Descrevemos todos os dados em tabelas para viabilizar a leitura transversal e a comparação entre eles. Para a análise de dados, identificou-se e discutiu-se a presença, ou ausência, e a natureza do papel do publicitário.
Os resultados da pesquisa apontam para a presença e o papel do publicitário nas abordagens brasileiras contemporâneas sobre o fenômeno publicitário nos seguintes termos: publicidade como processo comunicativo, dupla articulação e fluxo; campo publicitário; publicização; ecossistema publicitário; mediações e midiatizações do consumo; entretenimento publicitário interativo; ciberpublicidade; publicidade pervasiva; publicidade expandida; e publicidade de experiência.
A perspectiva da publicidade como processo comunicativo explora os elementos de articulação da publicidade com o mundo social, seu contexto político, econômico e cultural, as práticas dos sujeitos produtores e receptores e a forma de fluxo. A relação com todas essas dimensões do mundo social confere à publicidade uma configuração multifacetada: instituição econômica de produção cultural; um sistema comercial e mágico; uma indústria; e uma forma de arte ( PIEDRAS, 2009).
Segundo Piedras ( 2009), as práticas articuladas nesse processo de produção e recepção, explorando suas inter-relações, correspondências e contradições, são distintas. Se, nas agências publicitárias, as práticas de produção são institucionais e estratégicas, as práticas de recepção são sociais e táticas.
Os publicitários são abordados como
profissionais [que atuam] como mediadores entre os níveis macro e o micro do mundo social, visto que se ocupam das práticas de produção de anúncios regidas pela estrutura econômica, mas o fazem considerando as práticas culturais dos receptores na interação com essas mensagens. Construídos através das práticas de produção nas agências, seguindo estratégias de comercialização vinculadas ao mercado, os anúncios e [as] campanhas retêm as marcas dessa produção, configuradas pelos publicitários em sua estrutura institucional, mas, também, pela demanda dos receptores. ( PIEDRAS, 2009, p. 25)
Na dupla articulação, os publicitários reproduzem
uma ideologia, em uma posição intermediária, em que poderes específicos são colocados em disputa pelos quatro protagonistas centrais do processo: os profissionais de criação, os profissionais de atendimento, os clientes e os consumidores, sendo os dois primeiros agentes a serviço da sistematização e racionalização de uma ideologia de consumo, que o terceiro […] deseja colocar ao quarto. ( PIEDRAS, 2009, p. 25)
Os publicitários recorrem a inúmeras linguagens e meios técnicos para construir os anúncios “de modo a torná-los atrativos para o público, e comunicar o sentido desejado pelo anunciante” ( PIEDRAS, 2009, p. 25). O resultado dessa mescla de recursos é uma mensagem complexa, com várias possibilidades de interpretação nas práticas de recepção e que guardam uma certa autonomia na produção de sentidos, negociados com a produção.
A perspectiva do campo publicitário ( PETERMANN, 2017)
permite que percebamos a publicidade como um campo relativamente autônomo e inserido em um campo de maiores proporções: o campo da mídia. Relativamente autônomo porque se constrói nas relações com outros campos: a publicidade utiliza-se de acontecimentos e de linguagens de outros campos sociais como matéria-prima para seus anúncios e assim seus discursos são perpassados por uma quantidade infindável de outros, provindos de diversos lugares. É, de certa forma, autônomo, porque apresenta espaços, práticas, discursos e agentes que são próprios, porém é amplamente permeado e suscetível às dinâmicas de outros campos, como, por exemplo, os campos econômico e político, entre outros tantos. ( PETERMANN, 2017, p. 49)
Os publicitários são mencionados como “agentes que incorporam a estrutura [do campo]” e o habitus publicitário a partir do acúmulo de capitais ( PETERMANN, 2017, p. 151). Pela perspectiva dos campos sociais de Bourdieu, Petermann ( 2017) analisa a distribuição desigual de capitais entre os profissionais da publicidade pelo subcampo da criação publicitária e das disputas decorrentes dessas relações. O publicitário é visto como um sujeito que, a partir de uma posição pré-determinada, estabelece relações estratégicas de movimento no campo publicitário. Sempre em relação de disputa, os publicitários objetivam alcançar o domínio das práticas por meio da legitimidade e autoridade.
A perspectiva da publicização ( CASAQUI, 2011) remete à expansão da
compreensão da função da comunicação no sistema produtivo, uma vez que o discurso publicitário é municiador de atributos intangíveis, que dialogam com os interesses, necessidades, desejos, quereres dos indivíduos, abordados como consumidores potenciais pelas mensagens que lhes são direcionadas, objetivando estimular sua ação. ( CASAQUI, 2011, p. 3)
Casaqui ( 2011, p. 133) contempla os “fenômenos que tensionam os limites da publicidade, mantendo o sentido da comunicação persuasiva vinculada ao consumo, porém, com modos complexos de configuração discursiva e de interlocução com os sujeitos identificados como consumidores”. Isso ocorre “em tramas complexas de interação comunicacional, nos modos de presença no cenário urbano e no uso das tecnologias digitais, entre outras formas de inovação nas estratégias que envolvem marcas, mercadorias e corporações”.
O publicitário é mencionado “como mediador das relações entre produção e consumo, ou seja, como linguagem que torna possível a realização plena das duas esferas” ( CASAQUI, 2011, p. 134). Logo, o discurso produzido pelos publicitários tem a função de
amalgamar as representações sociais imersas no espírito de seu tempo, nos sistemas socioculturais e econômicos dos quais é derivado. Seus processos de mediação envolvem a tradução da racionalidade produtiva e corporativa para o campo sensível das afetações dos sujeitos. Dessa forma, é pela linguagem publicitária que temos acesso aos significados atribuídos às práticas e aos objetivos humanos, às imagens e aos imaginários associados ao consumo, às conexões entre corporações, marcas e mercadorias; esses significados são atribuídos de acordo com o período histórico e com a cultura em que esses elementos se inserem. (CASAQUI, 2011. p. 135)
A perspectiva não tem um foco específico no sujeito publicitário, mas nas funções da atividade e do discurso publicitário em nosso tempo e espaço. Ele aborda a institucionalidade das práticas de produção no âmbito das organizações, afirmando que “a cultura corporativa se move na busca de outro lugar, em que sua produção é colocada em circulação social na interseção com ideários contemporâneos, com debates e temas em evidência em dado momento e com as transformações dos papéis dos consumidores” ( CASAQUI, 2011, p. 149).
A perspectiva do ecossistema publicitário ( PEREZ; AQUINO, 2018)
refere-se às ações e relações publicitárias que funcionam, e o que isto significa? Se o objetivo máximo da publicidade é construir vínculos de sentido entre pessoas e marcas (produtos, serviços, ideias, propostas etc.), a questão que se põe ultrapassa qualquer possibilidade de aprisionamento midiático. Ou seja, [ela] transborda. As ideias colocadas em prática que busquem esta relação (pessoas-marcas) pertencem ao ecossistema publicitário. ( PEREZ; AQUINO, 2018)
O publicitário é pouco mencionado objetivamente porque a perspectiva privilegia os rituais e as novas estéticas do consumo. Todavia, Perez e Aquino ( 2018) apontam que o produtor de publicidade hoje envolve uma série de atividades, profissionais e habilidades. Segundo os autores,
além da diversidade de parceiros e instituições que colaboram na criação, há que se considerar as inúmeras possibilidades de formação na sua produção, de publicitários a engenheiros, passando por DJs, fotógrafos, youtubers, antropólogos, semioticistas, filósofos, psicanalistas e programadores. ( PEREZ; AQUINO, 2018, p. 314)
Segundo Trindade ( 2019, p. 68), a perspectiva das mediações e midiatizações do consumo contempla a mediação ritualística do consumo e a midiatização dos processos de interação operados pelo sistema publicitário via expressões das marcas e suas novas formas de interação no que se refere aos vínculos de sentidos entre as marcas e os consumidores. Ele considera também que
as medições permitem compreender o sujeito na dinâmica dos processos comunicacionais com suas apropriações frente às realidades que atuam e a midiatização percebe nessas apropriações do sujeito, uma estrutura que depende de contextos, temporalidades e uma lógica institucional/ideológica que via interações, por meio de dispositivos comunicacionais, modelizam padrões culturais, práticas de sociabilidade, institucionalizam lógicas políticas, crenças e percepções. ( TRINDADE, 2019, p. 67)
E, mais adiante, destaca que
os produtos e serviços via marcas produzem seus discursos institucionais e promocionais para mover o financiamento do capital pelo comércio de bens e serviços, atuando não só de forma política e econômica, mas, sobretudo, como instâncias intermediadoras da regulação das culturas, em acordo com os interesses da lógica produtiva comercial, que entra em embates com as lógicas próprias do consumo. Embora as relações da produção quase sempre tentem se sobredeterminar ao consumo, este não segue necessariamente a lógica da produção, assumindo lógicas próprias. ( TRINDADE, 2019, p. 113-114)
Uma vez que a perspectiva está voltada para a relação consumidor, marca e mídia, o publicitário é pouco mencionado, embora seja abordado como um profissional que atua no sistema publicitário enquanto agente mediador dessa relação. O autor descreve a produção e os produtores como agentes de desenvolvimento das expressões das marcas, os quais
criam as condições de interação com o consumidor dentro de uma perspectiva que se alinha também à ideia de midiatização, inserida no processo de mediação do consumo de mercadorias, entendendo estas mercadorias também como bens culturais, pois os artefatos da cultura se estendem a toda gama material do que o homem produz e consome em seus contextos de vida. ( TRINDADE, 2019 p. 77)
Para Covaleski ( 2015, p. 47), a perspectiva do entretenimento publicitário interativo ( COVALESKI, 2015, p. 47) se refere à abordagem do produto midiático — publicidade híbrida —, apontando para “o surgimento de soluções híbridas que aliam as funções de anunciar, entreter e interagir, de modo concomitante: uma nova comunicação publicitária, para novos emissores e receptores”. Segundo ele, essa perspectiva é construída por quatro elementos: entretenimento (comunicação por entretenimento de marca), persuasão, interatividade e compartilhamento.
Em Covaleski, o publicitário é pouco mencionado visto que é enfatizada a participação do consumidor na produção de discursos junto do publicitário por meio de narrativas híbridas, isto é,
esse sujeito enunciador, agora elevado da discreta coadjuvação às raias do protagonismo, sedimenta, em campanhas contemporâneas baseadas em ambientes digitais, o papel de ator/autor/diretor/produtor/ distribuidor que cabe ao consumidor em narrativas híbridas. Tal capacidade de intervenção na publicidade, que se desprende do discurso hegemônico dos meios massivos, reestabelece a importância do papel que cada cidadão pode desempenhar — inclusive — criticamente na sociedade. ( COVALESKI,2015 p. 117)
A perspectiva da ciberpublicidade ( AZEVEDO, 2012) aponta que
as práticas cotidianas decorrentes do uso generalizado dos diversos dispositivos digitais (normalmente conectados à internet, mas não exclusivamente) forçaram anunciantes e publicitários a reconfigurarem o esquema de abordagem e trato com os consumidores, estabelecendo novas negociações discursivas e constituindo um novo modelo de fazer publicitário, o qual ora classificamos de ciberpublicidade. ( AZEVEDO, 2012, p. 2)
Assim como em Covaleski ( 2015), em Azevedo ( 2012), o publicitário recebe pouco protagonismo porque sua perspectiva destaca a acentuada participação dos receptores na produção e circulação atual de mensagens publicitárias. Além de mencionar os anunciantes como agentes que conduzem estrategicamente essa sinergia entre práticas de receptores e produtores da publicidade, Azevedo considera também que, em vez de
rivalizar com essa nova massa enunciadora (o que obviamente instauraria um antagonismo entre comunicação oficial de marcas, de um lado, e comunicação espontânea sobre marcas, de outro), os anunciantes têm desenvolvido estratégias poderosas de monitoramento e engajamento dessa massa produtora de conteúdos, o que acaba por forçosamente transformar o consumidor num aliado para a disseminação de mensagens positivas sobre a marca. ( AZEVEDO, 2012, p. 5)
Segundo ele, “a ciberpublicidade faz a instância anunciante, de um lado, e o público em geral, de outro, estabelecerem um diálogo frenético, em que ambos se implicam contínua e intensamente, demandando desenvoltura nas estratégias argumentativas (se tudo”vai bem”) ou reformulação (caso haja algum tipo conflito) ( AZEVEDO, 2012, p. 76). Especificamente,
A ciberpublicidade, ao seu turno, opera, por isso, com planejamentos de mídia tão intrincados, como os mapas de programação comuns na publicidade tradicional jamais dariam conta. Isso significa que o plano de mídia de uma campanha hoje não está nunca concluído, requerendo que os profissionais dessa área estejam sempre prontos para agir a qualquer momento. No mesmo barco estão os profissionais de criação, que continuarão ou modificarão os conteúdos a serem veiculados de acordo com a “deixa” do público-alvo, agora proativo no que se refere ao rumo de campanhas publicitárias. ( AZEVEDO, 2012 p. 7)
A perspectiva da publicidade pervasiva aborda campanhas publicitárias que, segundo Carrera e Oliveira ( 2014, p. 48), “infiltram-se nos espaços urbanos, buscando enquadrar afetos através de uma experiência performática de envolvimento com os indivíduos, promovendo expansões sociais, espaciais e temporais”. A noção de pervasividade
não se limita apenas ao uso ou apropriação deste tipo de mídia locativa, mas, sim, do significado do termo que diz respeito à qualidade de se espalhar, de se infiltrar, de penetrar; presente ao mesmo tempo em todas as partes, que tende a se propagar ou se estender totalmente por meio de diversos canais, tecnologias, sistemas, dispositivos. ( CARRERA; OLIVEIRA, 2014, p. 49)
O publicitário é pouco mencionado em Carrera e Oliveira ( 2014, p. 50, 56) já que o ponto de vista consumidor é privilegiado por elas numa perspectiva da experiência partilhada com produtores: “um acordo ficcional é travado para que a maximização da experiência aconteça de forma satisfatória tanto para o sujeito consumidor quanto para quem oferta a encenação que se improvisa dentro das delimitações da cenografia”. Segundo elas, a potência de interação do público consumidor na cibercultura “afeta diretamente em outra postura por parte de anunciantes na hora de estruturar estratégias de comunicação. Calcado pela tríade interatividade, experiência e engajamento”, nesse que constitui hoje “um dos braços que apoiam o marketing experiencial”.
A perspectiva da publicidade expandida ( BURROWES, 2018) se define pelo
tipo de lógica econômica-cultural que opera diretamente associada às estratégias de marketing que a originam. Consiste em seduzir seu(sua) interlocutor(a), potencial consumidor(a), oferecendo aquilo que, supostamente, conforme indicações de pesquisas, ele(a) deseje, seja em experiência concreta, benefício subjetivo ou vantagem objetiva, como base para começar ou manter uma relação de troca comercial. Pensar em termos de publicidade expandida permite abarcar toda a série de novas formas que, se já não se encaixam na definição simples de publicidade como intervalo, ou espaço comprado por uma marca na mídia. ( BURROWES, 2018, p. 133)
Ou seja, nessa complexidade de suportes, formatos e modos de circulação indefinidos, sua força persuasiva se impõe através do apagamento de fronteiras.
O publicitário é pouco mencionado nessa abordagem das normas que regem a publicidade como campo expandido, numa lógica subjacente a sua produção e difusão, aos fins com ele visados originalmente que, segundo a pesquisadora, provoca “mutações do fazer publicitário [que] têm como meta ultrapassar os filtros e barreiras cognitivas construídos pelo público ao longo de décadas de exposição aos formatos tradicionais” ( BURROWES, 2018, p. 128). Assim como Azevedo ( 2012), Carrera e Oliveira ( 2014), Burrowes ( 2018) está atenta à coprodução por parte do consumidor. Segundo ela,
uma micropedagogia é constantemente exercida pela enxurrada de conteúdos produzidos em escala industrial por profissionais treinados e especialistas; tais conteúdos são programados para circular em todos os pontos de contato e impulsionados por altos investimentos na intenção de maximizar sua visibilidade junto aos seus públicos, numa presença de 360º, que imerge o indivíduo num ambiente vivencial-comunicacional. Assim, ao se tornar produtor(a), ela ou ele tende a lançar mão dos formatos e linguagens assimilados. ( BURROWES, 2018, p. 138)
A perspectiva da publicidade de experiência remete à “publicização do produto através da experiência do produtor de conteúdo no vídeo, promovendo o consumo midiático da mercadoria e provocando desejos de compra” ( MONTEIRO, 2020, p. 5). Apresenta como especificidade, diferentemente de product placement, patrocínio e testemunhal, o fato de que “o produtor de conteúdo tem liberdade em escolher a forma de apresentação do objeto de acordo com sua identidade de conteúdo como linguagem e imagem” ( MONTEIRO, 2020, p. 6). Além disso, não há necessariamente um contrato formal do influenciador com a marca. Logo, nem sempre essa publicidade de experiência é declarada, ou seja, o produtor de conteúdo não tem obrigação de dizer que existe um contrato ou um acordo com uma marca para publicar o vídeo.
O termo “publicitário” não é contemplado na abordagem, que, pela natureza do fenômeno explorado, se volta para o produtor de conteúdo, seja youtuber ou influenciador, extrapolando os limites da relação de produção centrada em publicitários e anunciantes. Através de diferentes lógicas e interesses, “as empresas querem atrelar o seu posicionamento com a popularidade do youtuber para atingir o público do canal” ( MONTEIRO, 2020, p. 5).
Neste mapeamento a respeito do fenômeno da abordagem do publicitário nas perspectivas brasileiras contemporâneas, identificou-se ausências e presenças, as quais apresentaram diferentes formas e posições no processo de comunicação.
Não observamos o protagonismo dos agentes sociais que denominamos publicitários, os produtores que atuam nas agências de publicidade. Os publicitários praticamente não são acionados na definição para o fenômeno publicitário apresentado pela maioria das dez perspectivas. Ao desenvolver com detalhes as abordagens, alguns poucos autores contemplam a figura do publicitário, outros mencionam demais agentes de produção, como marcas anunciantes e as próprias instituições de produção e agências.
As perspectivas que reconhecem a presença do publicitário as fazem de dois modos diferentes. Uma delas, mais rara, atribui protagonismo ao publicitário dado seu papel como produtor da publicidade. Em outra, mais frequente, o publicitário é compreendido como um participante, junto do consumidor, do processo de produção, cada vez mais engajado nessa instância devido ao contexto da cibercultura. Três dentre as dez perspectivas nomeiam os publicitários e os situam como agentes centrais do processo de comunicação, considerando-os como mediadores das relações entre produção e consumo, posicionados em uma estrutura institucional orientada geralmente à reprodução de uma ideologia por incorporarem a estrutura do campo através do habitus. Os publicitários, segundo essas perspectivas, operam a sinergia entre as representações sociais, a cultura e a economia para traduzirem em seus discursos a racionalidade produtiva e corporativa para o campo sensível das afetações dos sujeitos. Outras seis perspectivas — bastante pautadas pelos processos de consumo — recorrem aos autores citados anteriormente neste artigo para pensar o publicitário como agente de desenvolvimento de discursos e interação com consumidores, mas sem protagonismo, visto que há uma participação do consumidor na produção de discursos junto do publicitário por meio de narrativas híbridas, diálogo e implicação mútua, interatividade, experiência e engajamento, chegando a uma coprodução publicitário-consumidor, a qual se insinua nos mais variados formatos e espaços do cotidiano. Por fim, em uma perspectiva, o publicitário não é contemplado por emergir do fenômeno explorando a figura do produtor de conteúdo (youtuber ou influenciador).
Com tais resultados, visa-se contribuir com a circulação das abordagens teóricas e conceituais sobre a publicidade desenvolvidas em pesquisas brasileiras contemporâneas, apontando o quanto elas são frutíferas para compreender diferentes instâncias e agentes do processo de comunicação persuasiva. Nesse contexto, ao explorar como é abordado o produtor e/ou publicitário, fomenta-se estudos acerca da instância da produção e das práticas dos publicitários, ainda escassos no campo científico brasileiro.
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