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Subordinação e cuidado: propostas para um Direito do Trabalho politicamente comprometido
Subordination and care: proposals for a politically committed Labor Law
Revista Direito e Práxis, vol. 15, no. 4, e71796, 2024
Universidade do Estado do Rio de Janeiro

Artigos inéditos


Received: 13 December 2022

Accepted: 05 November 2023

DOI: https://doi.org/10.1590/2179-8966/2024/71796

Resumo: Este artigo propõe um diálogo entre o conceito de cuidado como categoria central para o convívio social, desenvolvido especialmente por autoras feministas, e o conceito de subordinação no campo do Direito do Trabalho. Para propor a superação da falácia da autonomia individual, desde o reconhecimento do cuidado como questão coletiva e fundamental, o artigo tratará brevemente do projeto da modernidade, em que o Direito do Trabalho se inscreve. Em seguida, procurará demonstrar como as normas trabalhistas são, ao mesmo tempo, acomodação e tensionamento desse projeto. Para, a partir disso, discutir a importância do cuidado como fator decisivo para compreendermos o elo entre a noção moderna de sujeito de direitos e as possibilidades de reconstrução dos fundamentos dos laços sociais que justificam a regulação jurídica na troca entre capital e trabalho, especialmente a partir da ressignificação da categoria da subordinação.

Palavras-chave: Autonomia, Subordinação, Cuidado, Direito do trabalho.

Abstract: This paper proposes a dialogue between the concept of care as a central category for social coexistence, developed especially by feminist authors, and the concept of subordination in the field of Labor Law. To propose surpassing the fallacy of individual autonomy by recognizing care as a collective and fundamental issue, the article will briefly address the project of modernity, in which Labor Law is inscribed. Then, it will try to demonstrate how labor norms are, at the same time, accommodation and tensioning of this project. Based on this, we discuss the importance of care as a decisive factor in understanding the link between the modern notion of subject of rights and the possibilities of reconstructing the foundations of the social ties that justify legal regulation in the exchange between capital and labor, especially from the redefinition of the category of subordination.

Keywods: Autonomy, Subordination, Care, Labor Law.

1. Introdução

No âmbito do Direito do Trabalho, a regulação jurídica do fenômeno social da troca entre trabalho e capital, como condição para a sobrevivência física, impõe um ritmo de vida (tempo) vinculado ao trabalho obrigatório. Esse tempo é distribuído de forma desigual entre homens e mulheres, pessoas brancas ou não, seres humanos e não humanos, restringindo inclusive as possibilidades de intervenção política e, com isso, comprometendo laços sociais.

O Direito do Trabalho, que se funda no tensionamento e na transgressão do ideário individualista, tem função importante na construção de um discurso que desvele a falácia da autonomia individual e permita um compromisso efetivo com a solidariedade como afeto social central. Embora seja instrumento de manutenção de uma ordem estabelecida sob o signo da falsa autonomia individualista, o Direito do Trabalho lida com questões diretamente relacionadas ao metabolismo desse modelo de convívio social. A troca entre capital e trabalho é central para uma sociedade fundada na propriedade privada e, mais especificamente, na redução de tudo à condição de mercadoria. Logo, seus institutos e o modo como são aplicados, têm concretamente função política. E essa função pode e deve ser transformadora.

Para propor o argumento central desse artigo, que é a necessidade de superação da falácia da autonomia individual, desde o reconhecimento do cuidado como questão coletiva e fundamental, tratarei brevemente do projeto da modernidade, em que o Direito do Trabalho se inscreve. Em seguida, procurarei demonstrar como as normas trabalhistas são, ao mesmo tempo, acomodação e tensionamento desse projeto. Para, a partir disso, discutir a importância do cuidado como fator decisivo para compreendermos o elo entre a noção moderna de sujeito de direitos e as possibilidades de reconstrução dos fundamentos dos laços sociais que justificam a regulação jurídica na troca entre capital e trabalho.

2. O projeto político em que o Direito do Trabalho se inscreve: uma realidade de violência estrutural fundada na captura do tempo

O projeto político da modernidade é fundado na violência, seja em sua versão europeia, seja especialmente na forma como foi imposto no Brasil, a partir da invasão portuguesa. Seu discurso se ancora no tripé liberdade, igualdade, fraternidade. Tem como características: proteção à propriedade privada, concentração de renda, mediação pelo dinheiro, separação entre os âmbitos público e privado. Nos países colonizados, está determinado também pela lógica escravista e pelo reforço do patriarcalismo (SEGATO, 2012). Nada disso é novidade.

A invasão portuguesa trouxe consigo uma sociabilidade específica, cuja formação Federici explora em seu “O Calibã e a Bruxa”. A hipótese da autora é de que o capitalismo é o resultado de um movimento contrarrevolucionário. A autora refere que “a heresia denunciou as hierarquias sociais, a propriedade privada e a acumulação de riquezas” e propunha outra forma de convívio social. O movimento herético, de acordo com Federici, engendrou “uma estrutura comunitária alternativa”, pela qual era possível viver a partir de uma “rede de apoio constituída por contatos, escolas e refúgios”, tornando-se a primeira “internacional proletária” (FEDERICI, 2017, pp. 70-107).

A derrota se deu através de uma mobilização política, fundada na religião, pois o principal instrumento de dominação foi a Santa Inquisição, com a caça às bruxas e aos hereges. Esse é um elemento importante para as reflexões que aqui estou propondo, embora não possa ser aprofundado. O movimento que geralmente estudamos como consolidação da modernidade se dá, em grande medida, através da ruptura com a função de autoridade desenvolvida pela religião na denominada Idade Média (ARENDT, 2002, pp. 43; 288-291).

Os textos e documentos que Federici utiliza para provar a sua tese de contrarrevolução conservadora na Europa inflamada pelos movimentos insurgentes, demonstram que a religião nunca perdeu essa função política. Eis porque ainda hoje a religiosidade desempenha papel central na legitimação do autoritarismo fascista, especialmente em países como o Brasil1. Não é esse o objeto de análise aqui, mas guarda íntima relação com a naturalização da violência como traço fundante desse modo de organização social. Ou seja, permite compreender que apesar das rupturas, o que denominamos modernidade conserva estruturas medievais de dominação.

A religião segue sendo uma arma política fundamental para o controle, submissão e eliminação de determinados corpos. A propriedade privada, que passa a adquirir outra funcionalidade, segue fetichizada e “destinada” a um pequeno grupo. E esses são apenas dois exemplos, capazes de revelar que nos fundamentos da racionalidade moderna capitalista persiste a naturalização de estruturas de violência e poder, a partir da concepção de que existem diferentes tipos de seres humanos. Aqueles destinados à riqueza, ao comando, ao poder, e todos os outros; os descartáveis.

Novos discursos, como o da naturalização do trabalho obrigatório e da racialização dos corpos, serão funcionais para o desenvolvimento dessa nova sociabilidade. Dentre as alterações no discurso daquilo que nos une e permite conviver em sociedade, tem importância a noção de corpo político. Não mais como dispositivo de afecção, de modo a compreender que, quando uma parte é afetada, também o todo se afeta. Portanto, não fundado na solidariedade (SAFATLE, 2015), mas na ideia de lugar vazio de uma figura totalitária. É esse o fundamento filosófico para a construção da noção de Estado com a qual ainda hoje convivemos:

A única maneira de instituir um tal poder comum, capaz de defendê-los das invasões dos estrangeiros e das injúrias uns dos outros, garantindo-lhes assim uma segurança suficiente para que, mediante seu próprio labor e graças aos frutos da terra, possam alimentar-se e viver satisfeitos, é conferir toda sua força e poder a um homem, ou a uma assembleia de homens, que possa reduzir suas diversas vontades, por pluralidade de votos, a uma só vontade. (...) uma verdadeira unidade de todos eles, numa só e mesma pessoa (...). Feito isto, à multidão assim unida numa só pessoa se chama Estado, em latim civitas. (...) É nele que consiste a essência do Estado, a qual pode ser assim definida: Uma pessoa de cujos atos uma grande multidão, mediante pactos recíprocos uns com os outros, foi instituída por cada um como autora, de modo a ela poder usar a força e os recursos de todos, da maneira que considerar conveniente, para assegurar a paz e a defesa comum. Àquele que é portador dessa pessoa se chama soberano, e dele se diz que possui poder soberano. Todos os restantes são súditos (HOBBES, 2003, p. 61).

Se o Estado é como um ser humano, cujas partes precisam agir de forma ordenada, a lei dele emanada nunca será contrária à razão, nem tampouco se resumirá ao texto. Será a intenção do legislador, esse homem artificial. A liberdade humana passa, então, a ser compreendida como uma faculdade em que a verdadeira vontade (eu quero) será voluntariamente mitigada em favor da vontade do Leviatã. O medo, e não a preocupação com o outro ou a consciência da vulnerabilidade, será o afeto político principal. Através da coerção, as pessoas irão se manter fiéis ao pacto social (HOBBES, 2003, p. 52).

O medo não é mobilizado por acaso. Houve muita resistência ao processo de dominação dos corpos, para conformá-los à realidade da necessidade de trabalhar em troca de salário. Como pontua Federici, “durante os séculos XVI e XVII, o ódio contra o trabalho assalariado era tão intenso que muitos proletários preferiam arriscar-se a terminar na forca a se subordinarem às novas condições de trabalho” (FEDERICI, 2017, p. 244). A caça às bruxas e aos hereges é parte do processo de disciplinamento dos corpos (Idem, p. 331-2).

É interessante a observação que essa autora faz acerca do “corpo-máquina”, convertido em “modelo de comportamento social”. Federici afirma que essa conversão se deu com resistência, com a “destruição, por parte do Estado, de uma ampla gama de crenças pré-capitalistas, práticas e sujeitos sociais, cuja existência contradizia a regulação do comportamento corporal prometido pela filosofia mecanicista”. Todo o discurso de racionalidade não impede um “ataque feroz ao corpo”, sobretudo ao corpo feminino, que representava a “visão mágica do mundo” (FEDERICI, 2017, p. 257).

Toda essa alteração na estrutura social e na concepção do que é o Estado, a família, o certo e o errado, especialmente em relação à sexualidade e às posições sociais que devem ocupar homens e mulheres, é trazida com a invasão portuguesa. Vem junto com o discurso que já construiu a figura do selvagem, para justificar a escravização de pessoas. No mesmo livro antes referido, Hobbes defenderá a escravização dos “povos selvagens das Américas” (HOBBES, 2003, p. 109), como também o fará Montesquieu, no Espírito das Leis, referindo-se às pessoas escravizadas como “pretos dos pés à cabeça”, com “nariz tão achatado que é quase impossível ter pena deles” (MONTESQUIEU, 1979, p. 258-268).

Como afirma Aníbal Quijano, “a ideia de raça, em seu sentido moderno, não tem história conhecida antes da América”. Foi a partir da expansão e conquista da África e das Américas que se passou a produzir identidades sociais novas como “índios, negros e mestiços”, outorgando assim legitimidade à dominação. Afinal, não se tratava apenas de uma imposição violenta de poder. Tratava-se de uma verdadeira missão de seres superiores em relação aos selvagens (QUIJANO, 2005). Havia uma crença genuína na superior qualidade do modelo de organização social europeu, no "projeto da modernidade''. Colonizar era mais do que expandir território. Dependia de subjugar também o pensamento social e político. As diferentes correntes “científicas”, que reconheciam nas pessoas negras uma anatomia cerebral diferente e incapacitante ou que defendiam o “evolucionismo” que culminaria no homem branco europeu heterossexual, foram instrumentos políticos poderosos para a construção dessa estrutura racista (CARNEIRO, 2005).

As investigações acerca da realidade de comunidades indígenas pré-invasão confirmam, segundo Rita Segato, a existência do gênero e inclusive de uma masculinidade forjada no enfrentamento da morte, ditada pelo imperativo “de ter que conduzir-se e reconduzir-se a ela ao longo de toda a vida sob os olhares e a avaliação de seus pares”. Portanto, já havia uma construção cultural, pela qual os homens eram criados para provar habilidades de resistência, agressividade, capacidade de domínio. Ou seja, “exibir o pacote de seis potências - sexual, bélica, política, intelectual, econômica e moral” que lhes permitia serem reconhecidos e qualificados como sujeitos masculinos. Com a invasão, entretanto, há uma potencialização desse ideal masculino. Eles passaram a ser os “intermediários com o mundo exterior, ou seja, com a administração do branco”. Conforme escreve Segato, ocorre a “emasculação dos homens no ambiente extracomunitário”. A universalização da esfera pública, que “na condição de espaço público era habitada ancestralmente pelos homens” e a privatização do âmbito doméstico, atua como fator de potencialização da violência de gênero (SEGATO, 2012).

A racialização dos corpos, ao lado da disciplina do trabalho obrigatório e da reorganização dos discursos sobre sexualidade, família e sociedade faz com que o espaço doméstico na aldeia pré-invasão, que era “dotado de politicidade”, por ser de consulta obrigatória e “porque nele se articula o grupo corporativo de mulheres como frente política” (SEGATO, 2012), passe a ser o espaço do não-político. O cruzamento dos discursos racista e patriarcal é central, portanto, na formação da cultura imposta pelos invasores nos países colonizados. No que concerne às relações de gênero, ao lado de uma “hiperinflação da posição masculina na aldeia”, ocorre a “emasculação desses mesmos homens frente aos brancos, o que os submete ao estresse e lhes mostra a relatividade de sua posição masculina ao sujeitá-los ao domínio soberano do colonizador”. O oprimido na relação com o branco é empoderado em sua condição de homem na aldeia, e praticamente obrigado a “reproduzir e a exibir a capacidade de controle inerente à posição de sujeito masculino no único mundo agora possível para restaurar a virilidade prejudicada na frente externa”, o que irá comprometer suas relações com mulheres e filhos (SEGATO, 2012).

Por sua vez, as mulheres racializadas, tratadas “como homens” enquanto escravizadas/subordinadas, no âmbito do mundo-aldeia são confinadas ao espaço doméstico, com “consequências terríveis no que respeita à violência que as vitimiza”2. Com a invasão e o discurso da modernidade, as mulheres - ao adquirirem status de “iguais perante a lei” - têm sua relação com os homens supostamente gerida por um direito contratual que apenas disfarça (e reforça) a dominação patriarcal3. Passam a ser propriedade do “seu homem”, com o qual mantêm o “contrato”, mas também de todos os homens, pois a noção pré-moderna que informa a possibilidade de dominação do corpo feminino se potencializa com a ruptura dos laços comunitários. A violência de gênero estará, então, sustentada num imperativo de agressão. Os homens violentos precisam estar no controle. Isso lhes é ensinado desde a primeira infância. Quando esse núcleo de controle desaparece ou é colocado em dúvida, o que se produz é uma reação à vulnerabilidade. A violência deve então ser compreendida como uma forma de restaurar o status masculino: “não se trata de o homem poder violar, mas de uma inversão dessa hipótese: deve violar, se não através de ação, ao menos de maneira simbólica” (SEGATO, 2003, p. 37).

Nesse cenário, a violência de gênero deixa de ser consequência de patologias individuais. Torna-se fruto de um mandato de violação (SEGATO, 2003, p. 39). É interessante como Maria Rita Kehl apresenta hipótese semelhante, ao defender que o superego nos freia, mas também nos determina. Então, diante da autorização pública para a violência, as pessoas se sentem convocadas a agir violentamente4. Eis porque o racismo tem funcionado como mecanismo social de estímulo à violência, especialmente sobre a mulher negra (GONZALEZ, 1984, p. 223-244).

A realidade do trabalho obrigatório, como único modo de obter acesso aos alimentos, remédios, roupas, moradia, em uma estrutura na qual não há - nem haverá - trabalho remunerado para todas as pessoas, é a outra face dessa mesma estrutura social. E também divide e impõe solidão. Cada um deve se relacionar com os demais seres desde a lógica da compra e venda e da competição. Deve acreditar que é o único responsável pelo próprio sucesso ou fracasso.

O projeto da modernidade nos desampara porque propõe a ruptura com a solidariedade, com o encontro. Ao contrário, coloca todas as pessoas na posição de rejeitar a “ingênua confiança em que ele é como eu” (LACAN, 2008, p. 37), rejeitar a identificação de um destino comum. A violência (de gênero, raça, etc) torna-se funcional, não apenas pela útil dominação dos corpos racializados, femininos ou feminilizados, mas também para reforçar essa concorrência. A funcionalidade dessas estruturas de violência pode ser percebida naquilo que a doutrina irá denominar divisão racial e sexual do trabalho. Há atividades em que determinados corpos não são aceitos, há condições de seleção (veladas ou ostensivas) que estimulam a falsa sensação de que existe competição fundada no mérito individual. Os sujeitos autônomos estão em posição social extremamente desigual e seguem, desde o nascimento e sobretudo durante toda a vida adulta, lidando com o reforço do racismo, do capacitismo, do sexismo, através de requisitos como o da boa aparência ou dos estereótipos não apenas de gênero, mas de sexualidade, de sucesso profissional, de autoridade, etc. Com isso, a impossibilidade de acesso (ao trabalho obrigatório) para todas as pessoas é disfarçada, tornando possível a manutenção de um discurso de igualdade que não guarda relação alguma com a realidade material.

O Estado legisla essas divisões de espaço. Define o trânsito dos corpos nos diferentes lugares, inclusive reconhecendo direitos para as mulheres, acesso através de cotas, etc. E age assim exatamente porque interditou esse trânsito. A politicidade “sequestrada” pela esfera pública e suprimida do espaço doméstico, ocupado pelo “resto” (mulheres, pessoas não brancas, pessoas com sexualidade contrária ao padrão hegemônico...) é disciplinada pelo Estado, de tal modo que, sob a aparência da igualdade, cada corpo se mantém no espaço que lhe é pré-determinado.

O Direito do Trabalho está inscrito nessa mesma matriz de racionalidade, reforçada pela colonialidade, mas tensionada pela tentativa de criação de um capitalismo com face humana (SEVERO, 2020). Ainda está vinculado a esse metabolismo social fundado na disseminação da violência, especialmente contra determinados corpos.

Antes de tratar da função que ele pode exercer para tensionar e desvelar essas diferentes formas de opressão e o quanto elas impedem um convívio saudável, é preciso tratar um pouco dessa vulnerabilidade invisibilizada.

3. O Direito do Trabalho diante da vulnerabilidade negada pelo discurso do sujeito autônomo

A vulnerabilidade que nos constitui, e é inerente à nossa condição de seres sociais, é apagada no discurso da racionalidade moderna. Em seu lugar, desenvolve-se e sustenta-se um conceito de autonomia que é funcional à premissa de redução de tudo à condição de mercadoria. E que é extremamente violento. Um conceito que, antes de nos fortalecer para criar laços sociais e construir uma forma de convívio saudável, nos torna ainda mais frágeis.

Somos seres, cuja existência depende das relações que firmamos com os demais seres. Então, a vulnerabilidade não se refere à condição particular ou episódica de um ser humano, e sim a um “modo de relação”, em que não há como pensar de forma dissociada cada corpo, pois “é a sua dependência de outros corpos e de redes de apoio” o que o constitui, o que viabiliza a sua existência (BUTLER, 2018, p. 144). Diz, pois, tanto com a necessidade física (quando nascemos, dependemos de outros para sobreviver) e biológica (para existirmos, é preciso que duas pessoas nos concebam), quanto com a nossa condição de seres que se constroem no convívio e no olhar do outro (KEHL, 2009, p. 112).

O cuidado ingressa, aqui, como uma condição de existência física, emocional e social. É necessário, por nossa condição de seres vulneráveis. A questão é que o simples reconhecimento dessa necessidade de cuidado e, pois, da vulnerabilidade, já revela a falácia da noção moderna de autonomia. O Direito, tal como hoje o compreendemos, é construído a partir da noção de indivíduo autorreferente. No processo do que estudamos como passagem da Idade Média para a modernidade há uma ressignificação das artes, dos conceitos, das formas de vivência e das relações sociais. Os dogmas medievais são questionados, a partir da reconstrução de significados que, como vimos antes, alteram pouco as estruturas de poder, mas implicam uma legitimidade diversa para a dominação.

Como afirma Hannah Arendt, somos jogados para dentro de nós mesmos, “destituídos do senso comum” (ARENDT, 2002, pp. 297-303. 289-295), por meio de um discurso de autonomia individual que implica pressupor o ser humano como sua própria referência de racionalidade. Há uma recusa do que é exterior como ciência ou conhecimento. Por isso, “a antiga ideia de luz natural assume, agora, um novo sentido: é autoiluminação do pensamento, que por si mesmo alcança a verdade”. A filosofia moderna é uma filosofia do sujeito: “muito mais do que na autonomia da razão, a essência da Idade Moderna deve ser encontrada na mudança absoluta da essência do homem, quando este se converte em sujeito” (CHAUI, 2017).

Ao afirmar “eu penso, logo existo”, Descartes de algum modo inaugura essa tradição de pensamento, segundo a qual a racionalidade humana passa a ser considerada, como ele mesmo escreve, tão “firme e tão certa que todas as mais extravagantes suposições dos céticos não seriam capazes de a abalar”. Para ele, é a dúvida que leva ao conhecimento através da experimentação, da dissecação, de processos humanos de investigação e descoberta da verdade (DESCARTES, 1962, pp. 39-103). Kant, mais adiante, dirá que somos livres, na medida em que negamos nossa “existência sensível” feita de necessidades fisiológicas, animais, anímicas, e nos concentramos na capacidade de sermos racionais. Na medida, portanto, em que negamos nossa vulnerabilidade e afirmamos nossa autonomia. A função do Direito passa a ser a de permitir a coexistência universal das liberdades. A coerção não é “senão um impedimento a um obstáculo à liberdade” (KANT, 1974, p. 226), que é outorgada pela razão.

É a possibilidade de agir em conformidade com uma lei moral dada a priori, comum a todos: ser livre é fazer o que tem que ser feito. Daí porque Kant constrói seus imperativos categóricos e hipotéticos, desde um lugar que antecede o próprio discurso, enquanto construção viva de uma comunidade, em dado momento histórico.

Kant reconhece uma dupla dimensão da autonomia. A autonomia como capacidade de construir imperativos categóricos, elaborados a partir da razão, e a autonomia para aplicá-los na vida prática. Para ele, autonomia e dignidade estão em ligação direta, de tal modo que “só tenho dignidade quando sou autônomo, e só sou autônomo, quando me dou a mim próprio a lei” (KANT, 1974, p. 335). Esse é o fio condutor da compreensão de dignidade humana que vigora até hoje, determinante para o modo como se pensa (no senso comum) a proteção que justifica a existência das normas trabalhistas e mesmo o conceito jurídico-trabalhista de autonomia em contraposição à subordinação.

A autonomia, sob esse signo, implica um sujeito entregue a si mesmo, responsável por sua própria sorte, mas, ainda assim, submetido a um ideal de moralidade que define o certo e o errado e que determina livremente suas escolhas. Hegel acrescentará à noção individualista de autonomia defendida por Kant, o elemento da força de trabalho como propriedade que nos constitui como seres livres. Ser autônomo, então, é agir de forma a exercer a própria vontade em concordância com a vontade alheia, dispondo inclusive de si mesmo. A liberdade não apenas decorre da condição de ser racional e, portanto, da possibilidade de dar-se a si mesmo a lei fundamental que permitirá o convívio social, e agir de acordo com essa lei, mas também está - na concepção hegeliana - atrelada ao conceito de propriedade privada. Ser livre é poder dispor de tudo, inclusive de si mesmo. Eis porque a venda da força de trabalho pode ser compreendida como “contrato de salário”.

Hegel não ignora a vulnerabilidade própria dos seres humanos. Trata disso como sistema de carências:

A mediação da carência e a satisfação dos indivíduos se dá pelo seu trabalho e pelo trabalho e satisfação de todos os outros: é o sistema das carências. (...) a realidade do elemento universal de liberdade implícito neste sistema é a defesa da propriedade pela justiça (...) O fim da carência é a satisfação da particularidade subjetiva, mas aí se afirma o individual na relação com a carência e a vontade livre dos outros; esta aparência de racionalidade neste domínio finito é o intelecto, objeto das presentes considerações e que é o fator de conciliação no interior desse domínio (HEGEL, 1997, p. 173).

Além de figurar como um atributo individual, a carência irá se resolver, para Hegel, pelo Estado através do Direito, por meio da proteção da liberdade e, consequentemente, da propriedade privada. Isso porque é através do manejo (alienação) dessa liberdade (por meio de contratos) que se exercerá autonomia. Se envolver nesse “sistema de carências” é permitir que o Estado regule a vulnerabilidade, mas não reconhecendo-a ou protegendo-a coletivamente, e sim pretensamente eliminando-a pela garantia da livre “negociação” entre os sujeitos. Essa noção de liberdade permite a completa desconexão do indivíduo com a sua condição de ser social. Ele deixa de ser responsável pelo destino de todos os demais. Pode agir apenas em “nome próprio” e, desde que sua vontade individual seja convergente com a vontade de outro, exercer sua liberdade (HEGEL, 1997, p. 178).

Aí vem Marx fazer a crítica a essa característica do pensamento racional moderno, afirmando que a vitória dos dogmas medievais se traduziu, na realidade concreta, como “escravidão mediante a convicção”. A nova forma de convívio social “abalou a fé na autoridade porque restaurou a autoridade da fé”, “libertou o corpo de seus grilhões porque com grilhões prendeu o coração” (MARX, 2005, p. 152). Marx escreverá que o ser humano “existe como necessidade interior, como falta”:

A atividade vital consciente distingue o homem imediatamente da atividade vital animal. Justamente, [e] só por isso, ele é um ser genérico. Ou ele somente é um ser consciente, isto é, a sua própria vida lhe é objeto, precisamente porque é um ser genérico. Eis porque a sua atividade é atividade livre. O trabalho estranhado inverte a relação a tal ponto que o homem, precisamente porque é um ser consciente, faz da sua atividade vital, da sua essência, apenas um meio para a sua existência (MARX, 2004, p. 85).

Ele recupera a discussão sobre a vulnerabilidade, revelando que a autonomia está no reconhecimento da interdependência com todos os demais seres, e não na suposta capacidade individual de dar-se a si mesmo a verdade. A maior riqueza que podemos sentir, Marx afirma nos Manuscritos, é a compreensão do outro como necessidade (MARX, 2004, p. 113). Apesar dessa crítica, o pensamento hegemônico seguirá fiel à noção de liberdade e de autonomia5 desde uma perspectiva individualista e atrelada à visão do corpo como propriedade. A novidade, na doutrina mais contemporânea, será atrelar a concepção de liberdade e de autonomia individual à democracia, enquanto condição de possibilidade do seu exercício (HABERMAS, 2007, p. 295). O substrato, porém, segue sendo de uma liberdade que não precisa necessariamente se traduzir na possibilidade real de fazer escolhas radicais, pois atua no campo individual do dever ser. Ainda está nitidamente presente também o compromisso hegeliano com a identificação da liberdade com o atuar do proprietário em relação aos demais proprietários: liberdade para a venda, inclusive de si mesmo.

É interessante observar como hoje estão disseminadas ideias que desafiam inclusive questões já demonstradas pela ciência, como o fato de a terra não ser plana. É que a racionalidade moderna, curiosamente, alberga em si essa possibilidade de completa desconexão com a realidade. Ou seja, ao construir um discurso pelo qual a verdade e a razão constituem atributos subjetivos e que, portanto, não dependem de validação coletiva nem se apoiam em evidências que estão para além da razão humana, permite-se que - no limite - elas não sejam mais do que a escolha que decorre da vontade de quem detém a autoridade do discurso6. Interessa aqui sublinhar o quanto isso vulnera ainda mais os indivíduos. Se não podem confiar nas crenças ou nos sentidos, nem na ordem social, tudo se torna fluído, dependente de um pacto de concordância com essa autovalidação. Basta rompê-lo, como hoje vem ocorrendo, para que os sujeitos sejam jogados ao desespero (ARENDT, 2002, p. 313). Mas não é apenas a ruptura desse pacto que vulnera.

A vulnerabilidade social aguda é produzida pela estrutura que torna o trabalho obrigatório, que racializa os corpos, determina um padrão de sexualidade, divide os gêneros. Vulnerabilidade de quem não consegue vender trabalho, mas também de quem vende, mas não sabe em que condições e por quanto tempo poderá fazê-lo. A ordem do jogo passa a ser cada um por si, como mercadorias que competem no mercado de trabalho. O sujeito autônomo é responsável pelo próprio sucesso ou fracasso e se relaciona com os demais como um competidor que deve vencer. A vulnerabilidade se aprofunda, então, em razão da impossibilidade de realização da promessa de vida - livre e igual, confortável e segura -, e da necessidade (que essa impossibilidade produz) de sobreviver ao medo de não conseguir ter sucesso (o que para o senso comum equivale a vender força de trabalho e acumular propriedade)7.

Ao criar essa figura irreal do sujeito abstrato autônomo, que precisa vender a si mesmo e “triunfar” em um modo de organização social em que há espaço para poucos, todo o discurso da sociedade moderna capitalista cria também a “ausência do outro”, de modo que “são todos prisioneiros de uma subjetividade de sua própria existência”, privados de “realizar algo mais permanente que a própria vida” (ARENDT, 2002, p. 68). Em um tal contexto, torna-se mais fácil identificar-se com o opressor, agir como “se não fosse vulnerável ao tipo de destruição que causa” (SAFATLE, 2020, pp. 21-39), como se “nunca pudesse vir a pertencer a uma população cujo trabalho e cuja vida são precários, que pode, de repente, ser privada de direitos básicos ou do acesso a moradia ou cuidados médicos, e que vive angustiada sem saber se o trabalho vai chegar algum dia” (BUTLER, 2018, p. 161). Trata-se de uma defesa psíquica contra o desespero. Para Butler, por exemplo, “se alguém está ligado a outra pessoa contra a própria vontade”, ainda que supostamente através de um contrato, essa ligação pode ser “literalmente enlouquecedora, uma forma imposta e inaceitável de dependência”. O que isso gera, em termos de laços sociais, é a conclusão de que a “única razão pela qual você consideraria tentar se juntar a alguém que poderia matá-lo é porque essa é a única maneira que você imagina de continuar vivo” (BUTLER, 2018, p. 166).

O Direito do Trabalho, apesar de ser fundado sob esses mesmos pilares, pois inscrito na realidade capitalista, abrirá espaço para fissuras nessa compreensão individualista do convívio social e, portanto, desvelará a falácia da autonomia. No Brasil, antes da CLT, o Código Civil de 1916 disciplinava a locação de pessoas e de serviços. As normas tipicamente trabalhistas, que são tanto resultado da luta de classes, quanto da imposição de uma “conformação dos trabalhadores à realidade do capital, desarticulando a possibilidade de realidades alternativas e fomentando o desenvolvimento industrial” (SEVERO, 2020, p. 110), terão a importância de inaugurar um novo discurso.

Pela primeira vez, se reconhecerá - em um suposto contrato - a ausência de autonomia. Expressando essa opção política por reconhecer a inexistência de vontade autônoma e atuar para reduzir a assimetria na troca entre capital e trabalho, Evaristo de Moraes Filho, em obra publicada em 1946, afirmará que na relação entre capital e trabalho, “cuja existência é a própria razão de ser do empregado, que vive exclusivamente do salário”, permitir que a livre vontade individual prevaleça “seria o mesmo que assistir tranquilamente ao extermínio de toda uma classe social, no caso, a dos trabalhadores” (MORAES FILHO, 1946, p. 24).

Há, claramente, o reconhecimento de uma vulnerabilidade que independe da condição subjetiva ou financeira de quem vende força de trabalho. É objetiva, está fundada no imperativo da troca de capital por trabalho como condição para o acesso aos bens mais elementares para a existência humana. Esse é um ponto fundamental para a compreensão da função que as normas trabalhistas exercem (ou podem exercer) na atual quadra da nossa história. Ao contrário de estarem ultrapassadas, elas sequer foram plenamente compreendidas no contexto de tensionamento de uma sociabilidade individualista e, por isso mesmo, autodestrutiva. Trata-se do primeiro ramo do Direito a rejeitar (ainda que de modo implícito) a noção moderna de autonomia, afirmando claramente a inexistência de vontade livre em uma troca da qual dependemos para sobreviver.

É certo que essa vulnerabilidade segue sem cor, raça, gênero ou qualquer outra característica que a humanize, no conteúdo da maioria das normas trabalhistas. O reconhecimento da necessidade de imposição de deveres, ao Estado e ao empregador, a fim de que haja condição de existência digna para quem vive do trabalho, vai apenas até o limite em que o próprio metabolismo social não seja questionado. Daí porque o discurso do Direito do Trabalho segue referindo-se ao “contrato” de trabalho, enquanto mantém regras como aquela do artigo 468 da CLT, por exemplo. Isso não invalida a importância histórica que o reconhecimento da vulnerabilidade social, no discurso do Direito do Trabalho, tem no contexto das possibilidades transgressoras do discurso jurídico8. Essas possibilidades dependem, porém, da nossa capacidade de compreensão e desvelamento de um limite fundamental no que denominamos Direito do Trabalho, que precisa ser tensionado: aquele entre o discurso e a prática da subordinação x autonomia.

O conceito de subordinação precisa ser recuperado em sua função de elemento central para a existência mesma de normas trabalhistas. A expressão “sob dependência”, presente no artigo 3º da CLT, historicamente reconhecida como a inserção da força de trabalho na atividade que dela aufere vantagem (VILHENA, 1975), foi desde o início fragilizada a partir de diferentes discursos (parassubordinação; flexibilização; cooperativismo; empreendedorismo, etc) que giram em torno do mesmo tema: o reforço ou a atualização da noção de autonomia individual que é fundante da racionalidade moderna. Aí se encontra uma evidência da potência e do limite do Direito do Trabalho.

A mobilização da categoria do cuidado, que vem sendo trabalhada especialmente por autoras feministas, pode auxiliar na ressignificação do conceito de subordinação e de sua centralidade para o Direito do Trabalho.

4. O diálogo entre o cuidado e a subordinação como caminho para a ressignificação da importância política do Direito do Trabalho

A necessidade de cuidado revela o quanto somos vulneráveis. A resposta capitalista à vulnerabilidade é dissimulá-la através da construção de um discurso de autonomia individual. Sujeitos autônomos compram e vendem, inclusive o cuidado. Desse modo, o cuidado, vital para uma vida que faça sentido, essencial na construção da identidade da criança, fundamental para evitar o adoecimento emocional e para permitir vivências significativas, é considerado também mercadoria passível de compra e venda.

A discussão feita por feministas na década de 1970 do século passado acerca da necessidade de atribuir salário ao trabalho em âmbito doméstico reflete essa compreensão. Como Silvia Federici menciona, o trabalho em âmbito doméstico não é como os outros. É expressão da “manipulação mais disseminada e da violência mais sutil que o capitalismo já perpetuou contra qualquer setor da classe trabalhadora” (FEDERICI, 2019, p. 42).

A reivindicação por uma remuneração para o trabalho em âmbito doméstico, uma espécie de “salário social”, pode ser então associada a outras iniciativas, como a ideia de renda básica universal. Ou seja, não a cooptação do discurso feminista à lógica do trabalho como mercadoria, mas sim a oportunidade de desmascaramento do “processo de naturalização que esse trabalho sofreu por causa de sua condição não remunerada”, para o efeito de explicitar a “natureza e a função especificamente capitalistas do salário” e demonstrar que a “produtividade sempre esteve relacionada à luta pelo poder social” (FEDERICI, 2019, p. 27).

Esse tensionamento coloca em questão o cuidado como forma de circulação de afetos que ampara e é essencial para a vida individual e coletiva. É claro que atribuir salário não altera a lógica da mediação de tudo (inclusive alimentos) pelo dinheiro, que é a base fundante dessa estrutura a ser superada. Trata-se, porém, de um desvelamento que teve sua função, especialmente para os movimentos feministas, e que aqui recupero apenas para explicitar essa centralidade do cuidado e, portanto, a importância de colocar em xeque a subjetividade individualista e supostamente autônoma. E evidenciar, portanto, que somos todos vulneráveis e interdependentes. O reconhecimento disso não nos fragiliza. Ao contrário, determina um novo olhar para questões que dialogam diretamente, inclusive, com o Direito do Trabalho.

Sob essa perspectiva, o cuidado passa a ser considerado uma questão pública, central para que o Direito do Trabalho exerça sua função, a despeito da ordem individualista em que está inscrito. Reconhecer que somos seres sociais, cujos corpos circulam permitindo ou interditando vivências significativas, implica ressignificar esse campo do discurso jurídico, conferindo-lhe uma função política que talvez ainda não tenha sido reivindicada com suficiente clareza. O Direito do Trabalho permite que se perceba a potência transformadora que a coletivização do cuidado e a explicitação de sua importância para o funcionamento do capital possuem.

A reprodução social é condição de subsistência do capitalismo. Como diz Silvia Federici, com a negação de salário ao trabalho em âmbito doméstico, por exemplo, transformando-o em um ato de amor, dois problemas foram resolvidos ao mesmo tempo. Obteve-se uma quantidade expressiva e fundamental de trabalho gratuito e “assegurou-se de que as mulheres, longe de lutar contra essa situação, procurariam esse trabalho como se fosse a melhor coisa da vida”. Enquanto o homem, ao tornar-se provedor, passa a ser ainda mais dependente da existência de um trabalho remunerado, sem o qual se sentirá fracassado, impotente (FEDERICI, 2019, p. 41-4). Terá o poder sobre a mulher, pois sustentará a casa, e ao mesmo tempo, seguirá dependente e fraco. Dependente do trabalho de cuidado que será considerado um “atributo feminino” e do trabalho remunerado, com o qual poderá ter condições de sobrevivência. Ambos - homens e mulheres - estarão “escravizados pelas mesmas condições sociais, pelas mesmas odiosas cadeias do capitalismo que oprimem as suas vontades e os privam das alegrias e encantos da vida”, que implicará mais uma forma de construção da subjetividade determinada pela dificuldade em reconhecimento e unidade entre quem sofre mais agudamente a exploração do próprio trabalho e aqueles ou aquelas que detêm alguma condição de conforto (REED, 2008).

Por sua vez, a noção de autonomia como capacidade de vender a propriedade “força de trabalho” será determinante para que o discurso que nega a importância do cuidado seja naturalizado. Sujeitos autônomos não são vulneráveis e podem, inclusive, comprar e vender o cuidado de que necessitam para seguir trocando trabalho por capital. Por outro lado, se realmente somos seres sociais, o cuidado não se efetivará de modo individual. Dependerá de uma rede coletiva de relações sociais. A individualização e a mercantilização do cuidado tiveram, ao longo dos séculos em que insistimos nessa forma de sociabilidade, o efeito de gerar uma sociedade de pessoas solitárias e adoecidas. Para que se perceba, porém, o caráter necessariamente coletivo e central do cuidado é preciso superar (ou ao menos tensionar) a noção de autonomia.

O Direito do Trabalho produz ferramentas que permitem isso. A subordinação ou dependência como característica central da relação de troca entre capital e trabalho é a explicitação de que não há autonomia. O reconhecimento da interdependência, da vulnerabilidade, da necessidade que temos dos outros, tem como efeito, no campo do discurso jurídico, justificar a teia de proteção social composta pelos direitos trabalhistas.

Em sentido mais amplo, pode ter a função de evidenciar a impossibilidade de seguir apostando na necessidade de troca de trabalho por capital como (via de regra) única forma de sobrevivência. Além de permitir que as normas trabalhistas passem a ser examinadas e aplicadas desde uma perspectiva coletiva e solidária, pode viabilizar uma discussão séria e profunda sobre a necessidade de coletivizar a produção/distribuição de alimentos, remédios, roupas.

Já há uma importante produção nesse sentido, da qual é possível colher indicativos que são fundamentais para seguirmos pavimentando essa estrada. A autora Regina Stela examina a crise do cuidado como reflexo da crise profunda do próprio sistema, cujo efeito tem sido o de repassar cada vez mais às mulheres não brancas e de baixa renda o peso das atividades não remuneradas relativas à manutenção e à reprodução da vida de seus familiares e afetos. E demonstra os limites do Direito do Trabalho no enfrentamento dessas questões sociais, seja discriminando as atividades remuneradas em âmbito doméstico, seja promovendo uma divisão sexual dos encargos relacionados ao cuidado, como ocorre nas regras sobre licença maternidade e paternidade. Sustenta a necessidade de um diálogo mais profundo com outros campos do Direito, a fim de “funcionalizar os instrumentos jurídicos para englobar o cuidado como uma das chaves que respondem aos desafios de nosso pacto social e econômico” (VIEIRA, 2020, p. 2517-2542).

A recuperação do conteúdo da subordinação como categoria central da regulação jurídica da troca, reconhecendo seu caráter objetivo e intimamente ligado à vulnerabilidade (ausência efetiva de autonomia), pode ser um dos modos de promover essa funcionalização. Para mencionar apenas o exemplo do trabalho de cuidado remunerado em âmbito doméstico, a arbitrária classificação da atividade como autônoma, quando prestada menos de três vezes na semana9, além de reforçar a persistência de uma racionalidade escravista (SEVERO, 2022) é regra que não resiste ao exame do conteúdo da subordinação.

Outro exemplo de autora que discute a necessidade de centralidade do cuidado é Romina Lerussi, para quem é necessário a formulação de uma filosofia feminista para o Direito do Trabalho, pautada em eixos. Um deles é justamente de reflexão sobre a questão da vulnerabilidade (LERUSSI, 2018).

Um conceito de vulnerabilidade alinhado com aquele proposto por Judith Butler, a quem já me referi anteriormente. Uma vulnerabilidade que não se refere à condição particular ou episódica de um ser humano, mas sim a um “modo de relação”, em que não há como pensar de forma dissociada cada corpo, pois “é a sua dependência de outros corpos e de redes de apoio” o que o constitui, o que viabiliza a sua existência (BUTLER, 2018, p. 144). Essa é a noção que pode permitir a ressignificação do conceito de subordinação, para o efeito de reconhecer que em uma sociedade de trabalho obrigatório, a dependência intrínseca à troca de capital por trabalho. E dela decorre a necessidade de proteção social através de regras, cuja efetividade precisa ser prioridade. Se não há autonomia, pois somos seres vulneráveis e interdependentes, não apenas o cuidado precisa ser considerado tarefa coletiva (questão social), como também a troca de trabalho por capital deve ser examinada desde essa perspectiva.

Isso significa que não há trabalho por conta alheia, que seja efetivamente autônomo em uma realidade capitalista. De maneira mais objetiva, permite desvelar o disfarce da terceirização (SEVERO, 2020, pp. 278-310), superar a redação discriminatória do artigo 1o da Lei Complementar 150, entre tantas outras consequências imediatas.

Para citar ainda um último exemplo de iniciativa positiva no sentido de realocar esses conceitos e ressignificar o Direito, o Protocolo para julgamento com perspectiva de gênero10, apesar de evidentemente não alterar por si só a racionalidade jurídica, é medida que provoca discussão acerca de categorias e decisões judiciais que por muito tempo (e ainda hoje) fingem a existência de um sujeito universal de direito. É desse fingir que se extrai uma noção individualista da subordinação e sustentam-se práticas de invisibilização e discriminação em relação às atividades relacionadas ao cuidado. Sua importância, portanto, está em colocar na pauta questões que não poderão mais ser ignoradas por quem lida com o sistema de justiça. Não há como recuar e seguir fingindo que existe um sujeito de direitos abstrato, para o qual o Direito em geral, e o Direito do Trabalho em particular, são endereçados.

As pessoas atingidas pela ordem jurídica e que buscam reparação no sistema de justiça têm gênero, raça, classe social, etc. Para além da crítica do recorte contido no Protocolo, que efetivamente não dá conta dos demais fatores de opressão que precisam ser visibilizados, é certa a importância do passo dado pelo CNJ, especialmente para que consigamos avançar no estudo e nas alterações da linguagem jurídica.

Outras contribuições têm sido dadas. Há um impulso, tanto no âmbito acadêmico quanto doutrinário e judicial, para que o Direito seja repensado, como instrumento de uma articulação política para a mudança social. A centralidade do cuidado entra justamente aí. Alterar radicalmente formas de organização que se revelam aparelhos ideológicos do modelo capitalista de sociedade, como é o caso da família, depende de problematizar o cuidado: dos filhos, dos idosos, da casa.

A invisibilização das tarefas relacionadas ao cuidado, desde a maternagem, passando pela manutenção da casa e chegando até a atividade sexual remunerada, constituem a prova da importância dessa discussão. É justamente essa invisibilização que tem permitido a reprodução da lógica de acumulação predatória que viabiliza a fortuna de poucos e a miséria de muitos, destrói o ambiente, contamina nossa alimentação. Basta pensarmos que a privatização na criação dos filhos, geralmente suportada pela mulher (mãe ou avó), e repassada à escola desde a perspectiva de que os pais são consumidores de um ensino sobre o qual devem ter total ingerência, é um dos fatores mais eficazes para a construção de adultos alinhados à lógica do capital. Do mesmo modo, a família tradicional é fator determinante para a compreensão disseminada acerca da propriedade privada e, portanto, para a naturalização de situações absolutamente absurdas, como o fato de alimentos serem vendidos e não distribuídos a todas as pessoas que deles necessitam.

O diálogo que pretendi propor aqui, de modo ainda inicial, relaciona essa centralidade à noção de subordinação. Os estudos feministas têm demonstrado a íntima imbricação entre a forma como lidamos com o cuidado, construindo discursos que ignoram a vulnerabilidade, e a dificuldade que temos em reconhecer a gravidade da necessidade de troca entre capital e trabalho, como condição para a sobrevivência. Uma educação coletivizada de nossas crianças, aliada à construção de outros modos de convivência afetiva, seriam revolucionários para por em xeque o imperativo do trabalho obrigatório. Ao lado disso, o reconhecimento da subordinação (enquanto vulnerabilidade objetiva) como categoria necessariamente presente na troca entre capital e trabalho, extraindo daí consequências jurídicas imediatas, permite a reconstrução de todo o pacto social que funda uma sociedade capitalista.

Em um exemplo de consequência concreta do que aqui proponho, a recuperação do caráter objetivo da subordinação e de sua íntima relação com a vulnerabilidade determinada pela lógica da obrigatoriedade de trabalhar para sobreviver viabiliza o enfrentamento de práticas violentas, como a terceirização. Hoje presente em tantas e tão diversas atividades, essa prática de precarização do trabalho começa em setores racializados e ligados às tarefas de cuidado: limpeza e conservação; vigilância e portaria. Por muitos anos, a terceirização não ocupou o devido espaço nas discussões jurídicas e sociais, porque invisibilizada nessas tarefas. É possível afirmar que apenas com a pandemia, em 2020, houve o reconhecimento da importância das atividades de cuidado, tanto em âmbito doméstico quanto público e hospitalar, por parte do Estado. Ainda assim, esse reconhecimento foi feito com o objetivo de permitir que as trabalhadoras (mulheres na expressiva maioria) seguissem expondo-se ao risco da contaminação e da morte, durante o período mais agudo de adoecimento por COVID-1911.

Reconhecer a presença da subordinação em todas as relações sociais de troca entre capital e trabalho é um caminho para viabilizar concretamente a coletivização do cuidado, por exemplo. Reivindicar não apenas uma divisão equitativa de deveres e direitos entre homens e mulheres, mas a coletivização dessas práticas, problematizando questões como a utilização do tempo de vida para o trabalho obrigatório, seriam fundamentais para que se percebesse, com mais nitidez, a autofagia do sistema capitalista e a necessidade urgente de mudanças estruturais que viabilizem a construção de uma sociedade na qual valha a pena viver. Mas para isso, as pessoas que vivem do trabalho precisam efetuar a troca em condições mínimas de proteção social.

Ressignificar o conceito de subordinação, recuperando sua matriz histórica, mas agora desde a perspectiva da centralidade do cuidado, pode ser um primeiro passo. Do mesmo modo, é fundamental reformular as discussões acerca do tempo de trabalho, não mais apenas como a medida da troca por capital, mas sobretudo como tempo de vida que falta para todo o resto: para o envolvimento político, para o cuidado de si e dos outros, para uma vivência que faça sentido.

5. (Sem) Conclusão

Este artigo é apenas o primeiro ato de estudos que pretendo seguir. Essa estrada vem de longe; está sendo pavimentada há décadas. Mas há ainda muito a trilhar.

O Direito do Trabalho, com toda a potência que possui para desvelar o caráter individualista da regulação jurídica, tensionando e atuando para a construção de uma sociedade diferente, ainda é altamente comprometido com um discurso que se pretende impermeável às questões de gênero, raça, sexo ou capacidade.

Importante, então, reconhecer que esse campo do discurso jurídico funda-se no pressuposto da ausência de autonomia, embora não a negue explicitamente. O conceito de subordinação ou dependência parte da premissa objetiva de que a troca entre capital e trabalho, numa sociabilidade na qual até o alimento precisa ser comprado, é a explicitação de uma vulnerabilidade propositadamente criada.

Para além do fato de sermos seres interdependentes, criamos um modelo de convívio social que vulnera ainda mais, ao permitir que o dinheiro seja o elemento de acesso aos bens indispensáveis à existência, ao criar mecanismos pelos quais esse dinheiro só será acessível através do trabalho. Trata-se de um trabalho, portanto, necessariamente subordinado ao capital e, como tal, precisa contar com uma teia de proteção que viabilize a existência minimamente digna.

O reconhecimento da importância central do cuidado como elemento de manutenção desse modelo social, à custa da sanidade física e mental sobretudo das mulheres trabalhadoras, é o fio que poderá tecer a trama capaz de nos conduzir a um outro Direito do Trabalho. Um direito no qual seja possível superar a lógica do inimigo ou concorrente, compreendendo os demais seres como criaturas com as quais partilhamos um mundo no qual vale a pena viver.

É urgente compreender que essa regulação jurídica tem um significado central para as possibilidades políticas de transformação social. Uma sociedade de trabalho obrigatório é, por definição, uma sociedade de pessoas cuja existência é assujeitada pela necessidade de obter o dinheiro com o qual a sobrevivência física será viabilizada. A potencialidade política, a capacidade de compreender o que está ocorrendo e de engendrar outras formas de convívio social, é sem dúvida diretamente afetada pelo imperativo de que devemos passar a maior parte do nosso tempo de vida vendendo força de trabalho. Que o cuidado seja reconhecido como elemento capaz de viabilizar essa lógica irracional de sociabilidade é o primeiro passo para retirar da invisibilidade as tarefas que permitem a reprodução social. Mas é também o caminho para ressignificar a importância da dependência/subordinação como parte indissociável dessa troca. E extrair daí um discurso de proteção que dê condições a quem vive do trabalho, de ter vida para além do trabalho.

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Notes

1 Para aprofundamento do tema, remeto à leitura do livro de LEMES DIAS, Claudileia. Le catene del Brasile. Un paese ostaggio delle religioni. Roma: L´Asino d´oro, 2022.
2 “Com a emergência da grade universal moderna, da qual emana o Estado, a política, os direitos e a ciência, tanto a esfera doméstica como a mulher que a habita transformam-se em meros restos, na margem dos assuntos considerados de relevância universal e perspectiva neutra”. SEGATO, Rita Laura. Gênero e colonialidade: em busca de chaves de leitura e de um vocabulário estratégico descolonial. E-cadernos CES [Online], 18 | 2012, disponível no dia 01/12/2012, consultado em 30 abril 2019. URL: http://journals.openedition.org/eces/1533 ; DOI : 10.4000/eces.1533.
3 E nesse ponto a autora remete as leitoras ao estudo do livro de Pateman: Segundo a qual a liberdade civil é “atributo masculino e depende do direito patriarcal” PATEMAN, Carole. O Contrato Sexual. São Paulo: Paz e Terra, 2008, p. 17. Tanto as mulheres quanto as pessoas não-brancas escravizadas sempre estiveram ligadas aos homens por meio de um contrato. Não eram sujeitos de direito com plena capacidade civil.
5 É exemplo: RAWLS, John. Justiça como equidade. São Paulo, Martins Fontes, 2003, p. 76.
6 Para aprofundamento desse ponto, recomendo a leitura: GUARESCHI, Pedrinho Arcides; AMON, Denise; GUERRA, André (Organizadores). Psicologia, comunicação e pós-verdade. Florianópolis: ABRAPSO, 2019.
7 É preciso, ainda, considerar o aprofundamento radical das potencialidades dessa estrutura de organização social pelas novas formas de comunicação e de geração de conteúdo (informação). As redes sociais e os meios telemáticos de relação social (seja no âmbito do trabalho ou dos demais afetos) tem função importante nessa desconexão e na hipervalorização do indivíduo. Trata-se de algo que foge ao objeto desse estudo, mas que sem dúvida merece toda a atenção, pois sem compreendermos o que se altera com essas novas formas de sociabilidade, dificilmente teremos condições de fazer algum tipo de enfrentamento/reversão do processo de autodestruição (simbólica e real) para o qual a humanidade parece caminhar.
8 Utilizo aqui a expressão, no sentido proposto por: SEVERO, Valdete Souto. Elementos para o uso transgressor do Direito do Trabalho. 2ª edição. E-book, São Paulo: ESA, 2020.
9 LC 150/2015: art. 1o Ao empregado doméstico, assim considerado aquele que presta serviços de forma contínua, subordinada, onerosa e pessoal e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família, no âmbito residencial destas, por mais de 2 (dois) dias por semana, aplica-se o disposto nesta Lei.


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