Artigos Inéditos
Received: 15 May 2023
Accepted: 17 May 2024
DOI: https://doi.org/10.1590/2179-8966/2024/76081
Resumo: Este artigo tem por objetivo criticar a abordagem de Jürgen Habermas sobre as relações entre capitalismo, democracia e crise. Para tanto, inicialmente é apresentado um panorama dessa abordagem e de suas mudanças ao longo das décadas. A hipótese fundamental que resulta desse panorama é a de que Habermas progressivamente coloca a si mesmo em uma encruzilhada paralisante, constituída pelo amálgama que esses três conceitos - capitalismo, democracia e crise - formam hoje; diante das opções para sair dessa encruzilhada, Habermas hesita. Assim, na segunda parte do artigo, são apresentados alguns elementos da teoria econômica de Eduardo Albuquerque que poderiam estimular Habermas - ou ao menos sua teoria social - a abandonar sua encruzilhada paralisante.
Palavras-chave: Jürgen Habermas, Eduardo Albuquerque, Democracia, Capitalismo, Crise.
Abstract: This paper aims at criticizing the Jürgen Habermas’ approach to the relationship among capitalism, democracy and crises. To do so, at first it presents na overview of this approach and its changes over the decades. The fundamental hypothesis that results from this overview is that Habermas progressively puts himself at a paralyzing crossroads, constituted by the amalgam that these three concepts - capitalism, democracy and crises - form nowadays; faced with the options to get out of this crossroads, Habermas hesitates. Therefore, in the second part of the paper, it presents some elements of the Eduardo Albuquerque’s economic theory that could encourage Habermas - or at least his social theory - to abandon his paralyzing crossroads.
Keywords: Jürgen Habermas, Eduardo Albuquerque, Democracy, Capitalism, Crise.
Introdução
Em trabalho anterior (GOMES, 2023), procurei reconstruir os argumentos de Jürgen Habermas quanto à relação entre capitalismo, democracia e crise. Seu entendimento dessa relação muda ao longo das muitas décadas de ativa produção intelectual, mudanças que se dão a ver com mais clareza quando situadas no marco de uma incipiente teoria do Estado dispersa na obra habermasiana - mais rigorosamente, no marco de suas incessantes considerações em torno do Estado de Bem-Estar Social.
Desde esse ponto de observação teórica, é possível ver como se vai consolidando, no corpus dessa obra, a afirmação de que o mercado de trocas, erguido com o modo de produção capitalista, seria uma aquisição evolutiva e, como tal, sociedades complexas como são as sociedades modernas não poderiam dele abrir mão sem consequências graves. Com esse apego ao mercado de trocas capitalista, porém, J. Habermas coloca a si mesmo em uma encruzilhada, constituída exatamente pela tensão inexorável entre capitalismo, democracia e crise.
Por sua vez, os motivos que o mantêm paralisado nessa encruzilhada seriam, a meu ver, dois: uma redução empiricista na maneira como trata da economia capitalista e um paradoxal déficit de complexidade no cerne de sua teoria social, principalmente nos pilares de teoria da evolução que a sustentam.
Os textos habermasianos das últimas três décadas trazem fortes indícios de que essa encruzilhada não deixou de ser percebida. Todavia, ao lidar com ela, o caminho tem sido sempre o deslocamento da discussão para o âmbito da política, do direito e das instituições, sobretudo na defesa de uma maior integração para além das fronteiras do Estado nacional. Essa alternativa de abordagem, por um lado, não deixa de ser relevante, pois escancara os limites de uma política confinada nacionalmente, em face dos desafios de uma economia intensamente globalizada. Por outro lado, é uma alternativa teórica e prática que deixa intocada a própria encruzilhada e a inércia de J. Habermas dentro dela, posto que não emerge no horizonte alternativa alguma de um futuro sem uma organização econômica capitalista. Os efeitos colaterais desastrosos da imbricação explosiva entre capitalismo, democracia e crise podem, uma vez reconhecidos, ser atenuados, amortecidos; mas, por motivos funcionais, o capitalismo não pode ser superado, a democracia, por motivos normativos, não deve ser abandonada e, como corolário, as tendências de crise não conseguem ser extirpadas.
Por isso, o enfrentamento da questão precisa passar também pelo âmbito econômico e pelas práticas e teorizações correspondentes. Explicitar que o imobilismo de J. Habermas em sua encruzilhada deve-se a uma redução empiricista e a um déficit de complexidade parece-me um passo importante. Mas é necessário complementá-lo com uma leitura mais acurada da estrutura e da dinâmica especificamente econômicas do capitalismo. Isso não significa outra coisa senão um esforço de manter-se fiel ao espírito interdisciplinar sempre lembrado quando se fala de teoria crítica frankfurtiana.
No limite, é porque não enxerga opções viáveis de um futuro não-capitalista que J. Habermas hesita em sair da encruzilhada. A teoria econômica de Eduardo Albuquerque pode oferecer injunções contundentes para que, se não J. Habermas ele mesmo, ao menos sua frutífera teoria social afaste-se desse lugar paralisante. Afinal, essa teoria social segue contendo, em múltiplas frentes, potenciais críticos ainda não-esgotados.
O presente texto estrutura-se da seguinte forma: na próxima seção, é apresentada uma breve síntese das posições de J. Habermas sobre a relação entre capitalismo, democracia e crise no correr das décadas. Ao final dessa seção, é detalhada a encruzilhada habermasiana e os motivos de sua hesitação em mover-se para fora dela. Na seção seguinte, são alinhavados os elementos fundamentais da teorização econômica de E. Albuquerque, naquilo que interessa ao debate aqui proposto. A conclusão busca aproximar os dois autores em torno da categoria da crise, agora retomada em J. Habermas a partir da noção de “consciência de crise”. Com essa aproximação, é possível diferenciar crises do capital de crises da sociedade, bem como vislumbrar nestas últimas as oportunidades que se abrem para a construção de uma sociedade pós-capitalista.
De um ponto de vista metodológico, a forma como esse roteiro é desenvolvido assenta-se na categoria da reconstrução categorial como método de pesquisa e como método de exposição, assim anunciada por J. Habermas em seu resgaste crítico do materialismo histórico: decompor e recompor uma teoria sob uma nova forma para que ela melhor atinja os objetivos que colocou para si mesma (HABERMAS, 2016, p. 25), e expor o que se pensa por meio de uma sucessiva apresentação e crítica de arcabouços teóricos alheios . Desta feita, o objeto teórico a ser reconstruído é a própria teoria habermasiana.
1. J. Habermas sobre capitalismo, democracia e crise
Sem excluir outras propostas de divisão e outros critérios para tanto, a vasta obra habermasiana pode ser dividida - no que tange às relações entre capitalismo, democracia e crise - em quatro grandes fases. Neste caso, o critério para essa divisão é o modo como J. Habermas concebe, em cada fase, as possibilidades e os limites do Estado de Bem-Estar Social, isto é, a possibilidade - com seus limites e suas formas de efetuação - de regulação público-política de uma economia guiada fundamentalmente por uma lógica de investimento e apropriação privados voltados primariamente à obtenção de lucro.
1.1. O capitalismo organizado e a sociedade que administra a si mesma
A primeira fase estende-se do início da década de 1960, com o livro “Mudança estrutural da esfera pública” (HABERMAS, 2014a), até o início da década de 1970, com o texto “Entre filosofia e ciência: marxismo como crítica” (HABERMAS, 2013, p. 351-452), incluído na quarta edição do livro “Teoria e práxis”.
A principal característica desta fase é a crença de que uma regulação política direta da economia de trocas capitalista seria capaz de assegurar um crescimento econômico continuado e sem a recorrência de crises, garantindo a estabilidade do Estado de Bem-Estar Social. Com isso, chegar-se-ia a uma “sociedade da abundância” (HABERMAS, 2014a, p. 481), onde “a acumulação poderia ser total e absolutamente interrompida e, saindo da espiral da reprodução ampliada, assumir a forma circular da reprodução simples” (HABERMAS, 2013, p. 405).
Em outras palavras, prevalece nesta fase a convicção de que a economia capitalista poderia ser completamente submetida ao controle democrático de uma vontade popular soberana. A esse capitalismo domesticado politicamente J. Habermas chamará “capitalismo organizado” (HABERMAS, 2013, p. 407), no qual não teria mais lugar uma caracterização do “mundo enquanto contexto de crises” (HABERMAS, 2013, p. 389).
1.2. O capitalismo tardio, tendências de crises e colonização
A segunda fase vai do início da década de 1970, com o livro “Problemas de legitimação no capitalismo tardio” (HABERMAS, 1992), até 1981, ano de publicação de “Teoria da ação comunicativa” (HABERMAS, 2010). O capitalismo agora atende menos frequentemente pelo epíteto de “capitalismo organizado” (organisierter Kapitalismus) do que pela alcunha de “capitalismo tardio” (Spätkapitalismus). Essa diferença terminológica permite dar relevo à característica precípua desta segunda fase: o que os escritos de J. Habermas sobre as relações entre capitalismo, democracia e crise passam a acentuar é exatamente a impossibilidade de um capitalismo organizado¬ - sem distúrbios, tendências de crise e efeitos colaterais patológicos.
O entusiasmo com uma atuação ativa e planejada do Estado é substituído pela constatação de que à administração estatal cabe uma mera atuação reativa: “o sistema administrativo adquire uma limitada capacidade de planejamento, a qual pode ser utilizada, no quadro de uma obtenção de legitimação formalmente democrática, para propósitos de evitar reativamente crises” (HABERMAS, 1992, p. 61, tradução livre, destaques meus). Essas crises, porém, não se manifestam como crises diretamente econômicas e, sim, como crises políticas, de legitimação do aparato administrativo do Estado (HABERMAS, 1992, p. 68).
Esse quadro geral de análise sobre as relações entre capitalismo, democracia e crise não sofrerá alterações significativas em “Teoria da ação comunicativa” . Entretanto, algumas novidades - que complementam e sofisticam, mas não alteram tal quadro - devem ser destacadas.
A primeira delas é o ganho de precisão conceitual. J. Habermas consolidará seu conceito dual de sociedade: a um só tempo, “sistema” e “mundo-da-vida” (HABERMAS, 2010, p. 817). Essa distinção, de cariz metodológico, possibilita à sua teoria enfocar um mesmo objeto - a sociedade - a partir de dois pontos de vista: de um lado, com o conceito de mundo-da-vida, o ponto de vista interno, isto é, dos participantes enredados em teias infinitas de sentidos compartilhados e de ações correspondentes; de outro, com o conceito de sistema, o ponto de vista de uma observação externa, apto a descrever as operações dos dois subsistemas que se autonomizaram em face do mundo-da-vida e se especializaram funcionalmente - a saber, o mercado e o Estado burocrático.
A integração desses dois pontos de vista metodológicos no bojo de uma mesma teoria social leva, por seu turno, a uma segunda inovação importante, diretamente conectada ao desenvolvimento não-organizado - ou seja, constantemente afetado por perturbações variadas - da economia capitalista e de seu acoplamento institucional com o aparato estatal: junto às tendências de crise que permanecem , vem delimitado agora outro fenômeno, o da colonização do mundo-da-vida pelos subsistemas (HABERMAS, 2010, p. 882-920). As crises se referem ao componente social do mundo-da-vida, às relações sociais e às instituições - a democracia aqui incluída - que as encarnam organizando um horizonte normativo intersubjetivo. Diferentemente, a colonização do mundo-da-vida pelos subsistemas refere-se à exploração exaustiva, pelo mercado e/ou pelo Estado, dos outros dois componentes estruturais do mundo-da-vida - a personalidade, como conjunto de recursos disponíveis no mundo-da-vida que permitem aos indivíduos formarem e preservarem uma referência autônoma e reflexiva a si mesmos ao longo de sua existência, e a cultura, como conjunto de recursos disponíveis no mundo-da-vida que permitem a nós, sociedade humana, organizarmos nossa interação com o meio, e em face do meio, que nos cerca.
Como quer que seja, nem as crises, nem a colonização do mundo-da-vida pelo sistema apontam, por contraste que fosse, para a necessidade de superação estrutural do capitalismo. A isso se relaciona a terceira novidade de “Teoria da ação comunicativa” que é necessário destacar. Trata-se de uma novidade relativa, posto que já se insinuava em trabalhos anteriores. Mas é no livro de 1981 que aparece escancarada a tese de que a economia capitalista, com suas trocas mediadas por dinheiro e guiadas pelo mecanismo anônimo dos preços, seria um ganho evolutivo do qual não se poderia prescindir impunemente. E essa tese seria uma das razões, finalmente, para a ruptura definitiva de J. Habermas com a teoria do valor-trabalho marxista (HABERMAS, 2010, p. 862-863).
1.3. O Estado de Bem-Estar Social recuperado sob a forma de um Estado Democrático de Direito interpretado procedimentalmente
A fase anterior, ao colocar o foco sobre as tendências de crises e patologias em que o Estado de Bem-Estar Social está envolto, parece apontar para o necessário abandono dessa forma institucional. Insurgindo-se contra tal conclusão apressada, a terceira fase interna às considerações habermasianas sobre as relações entre capitalismo, democracia e crise será dedicada a pensar a defesa continuada do Estado de Bem-Estar Social. Contudo, frente ao diagnóstico apresentado na fase anterior, essa defesa precisa ser uma defesa crítica, que não advogue em favor de um Estado de Bem-Estar Social estancado em uma mesmidade, mas exija sua recuperação “em uma etapa reflexiva mais elevada” (HABERMAS, 2015, p. 232).
Essa nova fase vai de meados da década de 1980, com o texto “A crise do Estado de Bem-Estar Social e o esgotamento das energias utópicas” (HABERMAS, 2015), até o início da década de 1990, com o livro “Facticidade e validade” (HABERMAS, 2021a). Um conjunto de premissas teóricas conformam o que seria esse Estado de Bem-Estar Social recuperado em um nível superior de reflexividade.
Em primeiro lugar, tendo deixado de lado a teoria do valor-trabalho, J. Habermas insistirá na perda de centralidade - prática e, consequentemente, teórica - da própria categoria do trabalho, aproveitando-se de seu diálogo com Claus Offe. Nesse sentido, o “esgotamento das energias utópicas” diria respeito, no fundo, ao esgotamento da imagem utópica específica que faz coincidir, de antemão, uma sociedade futura emancipada com uma associação de trabalhadores livres. O resgate do potencial crítico das utopias dependeria, portanto, de um deslocamento dos acentos utópicos, em direção à imagem formal de uma sociedade da comunicação não-distorcida, isto é, uma sociedade na qual não haja obstáculos estruturais e sistemáticos para que as pessoas pertinentes possam livremente definir os contornos de suas próprias vidas.
É essa a justificativa crítica fundamental para que, em segundo lugar, a partir desta fase, J. Habermas devote-se a temas normativos, como a ética do discurso e a teoria discursiva do direito e da democracia. O livro de 1992, “Facticidade e validade”, apresenta precisamente a fundamentação teórica e o delineamento mais amplo para um modelo de sociedade em que o ideal contrafático da comunicação não-distorcida se faça operante num grau satisfatório, partindo do “cerne anárquico” (Habermas, 2021a, p. 27) da comunicação cotidiana e institucionalizando-se em procedimentos de formação discursiva da opinião e da vontade. Internamente conectados, direito e democracia dariam ensejo ao surgimento de um novo arranjo estatal, o Estado Democrático de Direito, e é este Estado Democrático de Direito, interpretado procedimentalmente , que efetivaria a recuperação do Estado de Bem-Estar Social “em uma etapa reflexiva mais elevada”.
Em terceiro lugar, a crítica à utopia da sociedade do trabalho - à imagem concretista de uma associação de trabalhadores livres como expressão de um futuro emancipado - e a defesa enfática do Estado Democrático de Direito não significam a recusa do socialismo. No prefácio a “Facticidade e validade”, é posta com nitidez a articulação entre direito, democracia, socialismo e a utopia de uma sociedade da comunicação não-distorcida:
Se concebermos “socialismo” como súmula das condições necessárias para formas de vida emancipadas, sobre as quais os próprios participantes precisam primeiro se entender, reconhece-se que a auto-organização democrática de uma comunidade de direito também forma o núcleo normativo desse projeto. (HABERMAS, 2021a, p. 28)
Todavia, essa reivindicação da herança socialista só será possível a J. Habermas depois que o socialismo ele mesmo tiver sido reinterpretado nos termos de um reformismo democrático radical (HABERMAS, 2021b, p. 291).
Na definição desse socialismo peculiar já fica claro que, em quarto lugar, também nesta fase permanece a referência à alegada imprescindibilidade do mercado de trocas mediadas por dinheiro.
Por fim, em quinto lugar, nada muda igualmente quanto à constatação de que a economia capitalista de mercado representa um padrão de crescimento econômico sujeito a crises (HABERMAS, 2021b, p. 290).
1.4. A constelação pós-nacional e o retorno autocrítico às teses da crise de legitimação
A quarta e última fase em que se divide a obra de J. Habermas segundo o critério aqui utilizado tem início com o texto “Cidadania e identidade nacional”, escrito em 1990 e publicado como apêndice ao livro “Facticidade e validade”, em 1992. Não há, porém, uma baliza final, pois até o presente ele segue, com seus quase 95 anos, um intelectual ativo e um autor produtivo.
Os dois principais textos, entretanto, desta fase são os livros “A constelação pós-nacional”, de 1998 (HABERMAS, 2001), e “Na esteira da tecnocracia”, de 2013 (HABERMAS, 2014c).
Quanto ao primeiro, a argumentação sustenta que a defesa do Estado de Bem-Estar Social - já recuperado em um grau mais elevado de reflexividade sob a forma do Estado Democrático de Direito - somente é possível, a partir da década de 1990, se pensada para além das fronteiras do Estado-nação, ou seja, como um projeto de integração transnacional. Com a dissolução da União Soviética e o fim da Guerra Fria, o mercado capitalista, como subsistema funcionalmente diferenciado, pôde alcançar um nível sem precedentes de desterritorialização. Essa globaliação econômica, contudo, não se fez acompanhar nem de instituições estatais, nem de uma esfera pública igualmente talhadas para desafios pós-nacionais. Com isso, o equilíbrio entre sistema e mundo-da-vida, que já era frágil no âmbito nacional, tornou-se ainda mais problemático nesse novo cenário global, marcado pela “miséria de uma sociedade mundial fragmentada pelos Estados nacionais e integrada pelo capitalismo” (HABERMAS, 2014c, p. 183).
É esse também o pano de fundo e a tônica geral de “Na esteira da tecnocracia”. Mas com um detalhe importante - o reconhecimento, no diálogo com Wolfgang Streeck, de que a teoria das crises de legitimação estava errada: “não nos deparamos (ainda?) com uma crise de legitimação, mas com uma crise econômica palpável” (HABERMAS, 2014c, p. 184).
No entanto, essa aceitação expressa de que crises propriamente econômicas, e não apenas crises de legitimação, também continuam ocorrendo no capitalismo não gera nenhum desdobramento teórico novo, muito menos quanto ao que poderia ser uma renovada fundamentação especificamente econômica para suas posições. Logo em seguida, o que J. Habermas faz é insistir no mantra de que somente uma integração política e institucional transnacional pode fazer frente às dificuldades postas pelo avanço global de um capitalismo sem pátria.
1.5. J. Habermas, a encruzilhada, a hesitação
De posse do panorama apresentado nas páginas anteriores, é possível compreender os distintos meandros que forjam a encruzilhada em que J. Habermas ele mesmo se colocou ao longo das décadas. A economia capitalista é assumida como um arranjo econômico sujeito à recorrência de crises, inclusive crises propriamente econômicas. Mas o mercado de trocas mediadas por dinheiro seria uma aquisição evolutiva da qual sociedades complexas e diferenciadas como as nossas não poderiam abrir mão impunemente. Ao mesmo tempo, J. Habermas reivindica a herança do socialismo, traduzido em um reformismo democrático radical. Essa democracia radical, porém, tem diante de si os limites de uma economia capitalista de mercado que, não obstante sujeita a crises, deve ser preservada de qualquer ingerência política direta - sob a forma do planejamento estatal, por exemplo. O máximo que lhe é possível são induções indiretas, pela via do direito, que visem a evitar que o subsistema econômico transborde de seu leito e desfigure o mundo-da-vida. Capitalismo, democracia, crise: é esta a encruzilhada.
Para sair dela, J. Habermas precisaria conseguir enxergar alguma alternativa viável à economia de trocas capitalista. Mas, frente a isso, ele hesita. As razões precípuas da hesitação são duas: um reducionismo empiricista e um déficit de complexidade. Sobre o reducionismo empiricista, J. Habermas não consegue aceitar que já estão em curso na história - como, de resto, sempre estiveram - práticas econômicas muito distantes do que seria o estereótipo de uma economia capitalista pura, bem como não consegue recepcionar em sua teoria os esforços teóricos e os ensaios normativos que procuram insistentemente tensionar desde dentro o modo de produção capitalista. Quanto ao déficit de complexidade, ele não consegue perceber que o capitalismo nunca permaneceu idêntico a si mesmo, que a economia segue evoluindo e que, portanto, arranjos econômicos mais complexos do que o mercado de trocas capitalista podem emergir na história - arranjos que, como mais complexos, poderiam ser justamente mais adequados à complexidade crescente de nossa vida social. No fim das contas, é como se J. Habermas também tivesse sido seduzido pela contraditória defesa de uma “pausa evolucionária”, feita por um autor como Pavel Pelikan e criticada por E. Albuquerque (ALBUQUERQUE, 2012, p. 2010).
É exatamente neste ponto, aliás, que a teoria econômica de E. Albuquerque pode oferecer injunções para que J. Habermas não mais hesite em sair de sua encruzilhada. Mais do que isso: injunções para uma renovação da teoria social habermasiana e, no fundo, da teoria crítica como um todo - teoria crítica que, há tempos, deixou de lado a centralidade da crítica da economia política e, nesse mar, navega sem rumo.
2. E. Albuquerque e sua “agenda Rosdolsky”
Tese de titularidade publicada como livro, “Agenda Rosdolsky” (ALBUQUERQUE, 2012) apresenta a moldura e os traços gerais da frutífera pesquisa que E. Albuquerque desenvolve há anos no Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional - Cedeplar, na Faculdade de Ciências Econômicas da UFMG.
Embora essa pesquisa de longa data avance para temas variados, que vão desde a inovação em saúde (ALBUQUERQUE; CHAVES, 2006) até um repensar da divisão centro-periferia (ALBUQUERQUE, 2020; ALBUQUERQUE et al., 2020), e se disperse em trabalhos tanto anteriores quanto posteriores à publicação de “Agenda Rosdolsky”, para o debate aqui proposto há três eixos de sustentação que mantêm de pé uma altiva e original arquitetura de pensamento: as categorias fundamentais da própria “agenda Rosdolksy”; os achados empíricos, a modelagem econométrica e a correspondente teorização sobre as tendências e contratendências da taxa de lucro no modo de produção capitalista; as elaborações sobre o papel da ciência e da tecnologia no capitalismo.
2.1. As metamorfoses do capitalismo e os germes visíveis do socialismo
Retornando a Roman Rosdolsky, E. Albuquerque encontra ali um roteiro singular para refletir sobre problemas contemporâneos da economia capitalista e, ao mesmo tempo, manter o socialismo no horizonte das possibilidades concretas. Para isso, duas categorias se entrelaçam: “metamorfoses do capitalismo” e “germes visíveis do socialismo”.
A expressão “metamorfoses do capitalismo” é tomada de empréstimo a Celso Furtado (ALBUQUERQUE, 2012, p. 14) e se refere às mudanças que o modo de produção capitalista sofreu e segue sofrendo no transcurso de sua história. Com a expressão “germes visíveis do socialismo”, por sua vez, o que ganha destaque é o fato de que, nessas sucessivas mudanças, é possível enxergar a construção de bases do que pode vir a ser um dia um arranjo social e econômico socialista: “uma fotografia da realidade capitalista contemporânea é também uma introdução para a definição de novos termos para o debate sobre o socialismo” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 144).
Para esse entrelaçamento categorial, um primeiro degrau importante é mostrar que a economia capitalista há muito não corresponde - se é que um dia correspondeu - à caricatura do mercado puro. A imprescindibilidade do Estado para sua estruturação e funcionamento impõe que sua definição correta a trate como uma “economia mista” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 180).
Esse acoplamento entre mercado e Estado assume formatos diferentes a depender das trajetórias nacionais específicas em que vai ocorrendo na história. Assim, vão sendo geradas “variedades de capitalismo” , e tais variedades são um verdadeiro celeiro para a emergência de arranjos novos na imbricação entre mercado e Estado. Em outras palavras, quando analisadas a partir desse ponto de vista, o que as “variedades de capitalismo” ofertam é um amplo rol de possibilidades para a articulação entre “plano e mercado” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 180), isto é, entre planejamento estatal e espaço para a alocação de recursos e fatores com base no mecanismo anônimo de preços definidos internamente às trocas econômicas mesmas.
Quando destiladas, porém, essa miríade de trajetórias revela pontos em comum, tanto em relação ao que promove as mudanças incessantes no capitalismo quanto em relação às sementes possíveis de socialismo que essas mudanças deixam entrever. Nesse sentido, as fontes das metamorfoses como um todo do capitalismo seriam quatro: “a articulação entre a dinâmica tecnológica e a financeira”, “a incorporação do Estado e elementos políticos como guerras (com toda a mobilização econômica e industrial que estabelecem)”, os “efeitos recíprocos entre essas dinâmicas e as lutas sociais” e “a reação defensiva frente a temores reais ou imaginários de acontecimentos importantes no cenário internacional” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 218-219) .
Como se pode perceber, essas fontes dizem respeito a três dimensões básicas: “tecnologia, finanças e Estado (poder)” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 148). Por isso, para lidar com elas, E. Albuquerque recorre a dois arcabouços teóricos que, segundo seu entendimento, possuem, cada qual à sua maneira, potencialidades e limites. De um lado, a abordagem das “ondas longas do desenvolvimento capitalista” - que remonta a Joseph Schumpeter e Nicolai Kondratiev, passa por Ernest Mandel e se ancora contemporaneamente em trabalhos como os de Carlota Perez, Chris Freeman e Francisco Louçã - enfatiza a dimensão tecnológica, ao passo que o dinheiro e o poder, não obstante considerados importantes, desempenham um papel secundário. De outro, a abordagem dos “ciclos sistêmicos de acumulação” - que aproxima a teoria econômica de K. Marx com os estudos históricos de Fernand Braudel e teria em Giovanni Arrighi seu maior expoente - coloca seu foco na dimensão financeira e no poderio estatal, deixando apenas implícita a questão tecnológica (ALBUQUERQUE, 2012, p. 148-154). Na medida em que “as duas elaborações reconhecem a importância dos seus pontos fracos” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 148), o diálogo entre elas encontra vazão fácil e enriquece a bricolagem final.
Sobre os germes visíveis do socialismo, são “arranjos institucionais que se desenvolvem ao longo da história do capitalismo (...), corporificam-se e passam a ser parte da própria dinâmica da sociedade capitalista”, em geral como fruto de “lutas sociais, de forças fortemente emancipatórias ou de elementos intrinsecamente comunitários” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 216). E. Albuquerque, ainda que sem pretensão exaustiva, explicita quatro deles: sistemas de inovação científico-tecnológica; sistemas de bem-estar social; o sistema financeiro em seu desenvolvimento atual; e a democracia (ALBUQUERQUE, 2012, p. 222-240).
Por suposto, não se trata de afirmar que esses complexos institucionais, na forma em que se encontram hoje, já representam uma encarnação concreta do socialismo. O cerne da questão reside em ver neles, no desenvolvimento que vieram tendo dentro do capitalismo, a forma larval de uma superação possível desse capitalismo. Para isso, uma premissa metodológica é indispensável: “avaliar cada uma dessas instituições como invenções humanas singulares que potencialmente podem ultrapassar os limites do capitalismo” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 222).
Ou seja, como a escolha do termo “germes” indica, o interesse teórico não está tanto naquilo que esses germes já representam, mas naquilo que podem vir a representar. O caso mais difícil de enxergar é, sem dúvida, o do sistema financeiro. Responsável fundamental pelas proporções alcançadas pela crise de 2007-2008 e reiteradamente apontado como expressão maior das opressões típicas da fase contemporânea do capitalismo , sua presença em um debate sobre um possível futuro socialista soaria, em princípio, como um absurdo. E. Albuquerque, ao contrário, retorna a K. Marx para mostrar como suas reflexões incipientes sobre o tema tomavam o sistema de crédito como uma “poderosa alavanca na transição para a nova sociedade” e as sociedades por ações como “‘forma de transição’ para a nova sociedade” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 227) . Os desenvolvimentos posteriores do sistema financeiro, de finais do século XIX até hoje, corroborariam esses insights, posto que, se por um lado possibilitam um enriquecimento privado exponencial, por outro lado só o fazem forçando uma reestruturação profunda da economia capitalista, redefinindo o instituto da propriedade privada e o lugar do capitalista individual na produção econômica, abrindo espaço para regulações público-políticas e escancarando a dimensão social do capital investido.
Tanto como as fontes das metamorfoses, os germes visíveis não existem isoladamente, devendo ser pensados em sua interação constante. Mas, dentre eles, a democracia tem precedência: a “democracia é a instituição mais importante na transição para o socialismo. Este deve ser considerado uma consequência de avanços na democracia e uma decorrência de decisões democráticas” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 230).
2.2. A teoria do valor-trabalho e a taxa de lucro
À alusão às metamorfoses do capitalismo subjaz a constatação de que as investigações quanto aos limites propriamente econômicos do capitalismo possuem um resultado indeterminado (ALBUQUERQUE, 2012, p. 184-185). Sua flexibilidade e capacidade de transformações estruturais não parecem dar suporte às teorias do colapso ou da derrocada inelutável do modo de produção capitalista por causas estritamente econômicas. O que a história mostra é que as barreiras com que o capitalismo se depara vão sendo superadas por ele mediante a criação de novas barreiras. Se é verdade que essas novas barreiras emergem em uma “escala ainda mais formidável” (MARX, 2015, p. 289), não há elemento algum a autorizar que se decida teoricamente, de antemão, se esse processo tem necessariamente um limite ou se pode seguir indefinidamente.
Essa conclusão, no entanto, traz consigo um pesado ônus argumentativo, uma vez que toca diretamente em dois dos pilares mais importantes da crítica da economia política marxista: a teoria do valor-trabalho e um de seus desdobramentos mais célebres - a lei da queda tendencial da taxa de lucro. O desafio é duplo: de um lado, demonstrar que a teoria do valor-trabalho não perdeu sua validade no contexto da economia capitalista contemporânea, com todas as transformações que ela sofreu desde o século XIX; de outro, demonstrar que a tendência à queda da taxa de lucro é contrabalançada de tal modo pelas “causas contrarrestantes” (MARX, 2015, p. 271-279) que a dinâmica entre ambas não aponta inevitavelmente para um colapso especificamente econômico do capitalismo.
2.2.1. O reposicionamento do trabalho
Quanto ao primeiro ponto, os argumentos são construídos em um enfrentamento direto com as teses de J. Habermas e C. Offe sobre a perda de centralidade do trabalho. E. Albuquerque recusará a assertiva quanto a um deslocamento objetivo do trabalho que coincidisse, no fundo, com o fim da sociedade do trabalho: “as indicações vão no sentido da afirmação de que o trabalho ainda é uma categoria central” (ALBUQUERQUE, 1996, p. 49, destaques do original). Logo, ao invés de um deslocamento objetivo do trabalho, os fenômenos discutidos por J. Habermas e C. Offe seriam mais bem compreendidos como fenômenos de reposicionamento do trabalho.
A diferença reside, em primeiro lugar, no foco colocado sobre o trabalho social como um todo, isto é, na “capacidade de trabalho socialmente combinada” (MARX, 1978, p. 71, destaques do original), e não nos trabalhadores individuais envolvidos no processo produtivo (ALBUQUERQUE, 1996, p. 25-26). Tomado como referência de análise o trabalho social total, é necessário, em segundo lugar, considerar o aumento relativo do trabalho intelectual em face do trabalho manual nas últimas décadas (ALBUQUERQUE, 1996, p. 186-187) : com o avanço tecnológico, “cresce o peso do trabalho intelectual no ‘trabalho pretérito’ incorporado no capital fixo” (ALBUQUERQUE, 1996, p. 29). Assim, o reposicionamento do trabalho pode ser definido como um processo de “aumento do peso do ‘polo de trabalho intelectual’ em detrimento do ‘polo de trabalho manual’ (ALBUQUERQUE, 1996, p. 23), o que, por suposto, vem acompanhado de uma “mudança do centro de gravidade da produção do valor da esfera do trabalho manual para a esfera do intelectual” (ALBUQUERQUE, 1996, p. 37).
Se esse conceito de reposicionamento do trabalho permite a E. Albuquerque contrapor-se a J. Habermas e a C. Offe, ele não deixa, por sua vez, de trazer implícito consigo um conjunto de questões que exigem uma explicação detalhada nos termos da própria teoria do valor-trabalho. São três as principais questões: qual a relação entre trabalho produtivo e produção de mais-valor? O que é trabalho produtivo? E há alguma diferença entre trabalho manual e trabalho intelectual quanto à sua capacidade de gerar valor?
Com forte apoio em Isaak Rubin, E. Albuquerque enfatiza que trabalho produtivo, para a teoria do valor-trabalho, é aquele que produz mais-valor. Em outras palavras, a produtividade ou não do trabalho é definida, no modo de produção capitalista, segundo os critérios do capital, na ânsia incessante pela autovalorização do valor. Por isso mesmo, não há nenhuma diferença relevante, quanto à capacidade de criar valor, entre trabalho manual e trabalho intelectual. A diferença econômica entre trabalho produtivo e improdutivo é funcional, fisiológica, não substantiva ou concretista: não é necessário que o trabalho se objetive em coisas materiais para que seja produtivo; basta que cumpra a função de servir ao capital para que cresça a si mesmo pela via da incorporação do mais-valor (ALBUQUERQUE, 1996, p. 165-167). Em síntese, nada impede que uma economia, como a de hoje, fortemente caracterizada pelo peso do trabalho intelectual e do setor de serviços, seja interpretada com as ferramentas da teoria do valor-trabalho.
2.2.2. O capital como fractal
Com essa leitura não concretista da categoria de trabalho produtivo e com a discussão em torno do conceito de reposicionamento do trabalho, E. Albuquerque coloca a teoria do valor-trabalho em pé de igualdade com quaisquer outras teorias que tentam compreender a economia contemporânea e sua interface com fenômenos sociais e políticos. Certamente, resta a tarefa hercúlea de debruçar-se sobre cada aspecto dessa economia perante o qual a teoria do valor-trabalho seja chamada a se pronunciar. Mas já não se pode dizer, a priori, que os avanços do capitalismo em face do que era sua versão no século XIX - com destaque para o aumento exponencial da aplicação da ciência à produção e do papel do sistema financeiro - tornam a teoria do valor-trabalho formulada naqueles idos inapta para apreender e explicar o presente.
Se a teoria do valor-trabalho permanece válida e atual, como lidar com um de seus desdobramentos mais conhecidos - a lei da queda tendencial da taxa de lucro? Em poucas palavras, a resposta parece simples: tomando o capital como fractal. Mas, desenvolvido junto com Leonardo Ribeiro, Leonardo de Deus e Pedro Loureiro, este é um dos aspectos mais originais e mais difíceis da teoria econômica de E. Albuquerque.
Em vez de considerar apenas os fatores que tendem a causar a queda da taxa de lucro, tudo começa com a devida articulação desses fatores com aqueles outros que tendem a bloquear ou limitar essa queda. Essa visão integrada dos capítulos 13 (“A lei como tal”), 14 (“Causas contra-arrestantes”) e 15 (“Desenvolvimento das contradições internas da lei”) do livro III de “O Capital” (MARX, 2015, p. 249-306) prepara o terreno para definir a dinâmica de longo prazo do modo de produção capitalista como um conflito constante, de longa duração e sem resultado pré-estabelecido, entre causas que promovem a queda da taxa de lucro e causas que atuam em sentido contrário (ALBUQUERQUE; RIBEIRO, 2016a, p. 568). Com essa definição da dinâmica de longo prazo do capitalismo, a taxa de lucro se revela - em total coerência com a base metodológica da crítica da economia política marxista - uma “síntese de múltiplas determinações” (MARX, 2011, p. 54; ALBUQUERQUE et al., 2017a, p. 53), que, reciprocamente, funcionam tanto como causa quanto como efeito (ALBUQUERQUE et al., 2017b, p. 287).
Se é assim, a trajetória da taxa de lucro convida a uma abordagem que se valha de “ferramentas desenvolvidas pela física da complexidade” (ALBUQUERQUE et al., 2017b, p. 288, tradução livre), posto que o modo de produção capitalista exibe características de um sistema complexo. Por “sistema complexo” pode ser entendido aquele “formado por um grande número de componentes interativos entre si e que exibe diferentes organizações a diferentes escalas de observação, o que leva a comportamentos diferentes em escalas diferentes” (ALBUQUERQUE et al., 2017b, p. 289, tradução livre).
Como sistema complexo, a economia capitalista é também um sistema de não-equilíbrio. Isso significa que a interação entre os distintos componentes do sistema e entre as causas que induzem à queda da taxa de lucro e aquelas que a bloqueiam não tende ao equilíbrio. Ao contrário, quando as causas que fortalecem a tendência à queda da taxa de lucro ganham tração, elas impelem, ao mesmo tempo, as causas contrarrestantes, e vice-versa (ALBUQUERQUE et al., 2017b, p. 298), num processo incessante e turbulento (ALBUQUERQUE et al., 2021).
Esse processo, ademais, não permanece estático em sua turbulência: a forma como os fatores que estimulam e limitam a tendência à queda da taxa de lucro interagem muda ao longo do tempo - a turbulência ela mesma é variável. O que acontece é que, em sua lógica expansionista, o capital vai ampliando cada vez mais a “enorme coleção de mercadorias” (MARX, 2013, p. 113) em que se consubstancia a riqueza nas sociedades onde prevalece o modo de produção capitalista. O surgimento de novas mercadorias pode desencadear perturbações que levem a uma reconfiguração profunda da economia, alterando a relação dos elementos diversos que a constituem - que estão a formar-se ou que existiam previamente - e, com isso, também a relação entre os fatores que provocam e os fatores que barram a tendência à queda da taxa de lucro. Em outras palavras, mercadorias novas podem iniciar efeitos-cascata, “efeitos de rede” que retroagem sobre a economia em diferentes níveis e diferentes direções (ALBUQUERQUE et al., 2017a, p. 54). Como conclusão, o sistema não apenas é complexo, mas a própria complexidade altera-se constantemente em sua conformação concreta (ALBUQUERQUE et al., 2017a, p. 52), por meio de um “acoplamento dinâmico entre as tendências e as contratendências à queda da taxa de lucro” (ALBUQUERQUE et al., 2017a, p. 59, tradução livre).
De outro lado, com o mecanismo de indução recíproca entre eles, fatores que contribuem para a queda da taxa de lucro e fatores que contribuem para impedir essa queda atuam simultânea e contraditoriamente. Por conseguinte, embora seja um sistema de não-equilíbrio, o sistema econômico capitalista é um sistema auto-organizado: em termos matemáticos, isso significa que o comportamento cruzado dos fatores que induzem e refreiam a queda da taxa de lucro não permite o colapso do sistema, isto é, não permite trajetórias históricas que tenham “a taxa de lucro convergindo para zero ou para infinito” (ALBUQUERQUE et al., 2017b, p. 299, tradução livre).
Esse comportamento cruzado só pode ser matematicamente capturado por sistemas não-lineares de equações, o que dá origem aos fractais . Em suma, “a dinâmica de longo prazo da taxa de lucro mostra características relacionadas a complexidade, auto-organização e comportamento de não-equilíbrio. O capital é fractal” (ALBUQUERQUE et al., 2017b, p. 302).
A semelhança entre o modelo de simulação gerado a partir dessas premissas e a trajetória empírica da taxa de lucro dos Estados Unidos entre 1869 e 2011 deixa clara a força explicativa que acompanha a compreensão do capital como fractal (ALBUQUERQUE et al., 2017b, p. 292-302) . Dentro do recorte aqui proposto, porém, o que importa é apenas que essa compreensão, com rigor matemático e lastro empírico robusto, desautoriza leituras mais afoitas que, partindo da teoria do valor-trabalho marxista, apressem-se em concluir pelos limites especificamente econômicos do capitalismo e por uma correlata tendência estrutural inevitável a seu colapso, assim como se impõe contra leituras que digam recusar a teoria do valor-trabalho exatamente por não conseguirem vislumbrar esse suposto limite econômico e essa suposta tendência ao colapso.
A teoria do valor-trabalho de K. Marx não apenas permanece válida, mas tanto mais o é quanto mais consegue explicar a capacidade do capitalismo, ao longo do tempo, de reinventar a si mesmo e superar as barreiras que contraditoriamente vai colocando em seu próprio caminho.
2.3. A aplicação tecnológica da ciência à produção capitalista
Na tessitura da “agenda Rosdolsky”, a ciência e a tecnologia têm um lugar de destaque, estando ligadas tanto às fontes das metamorfoses do capitalismo (ALBUQUERQUE et al., 2020, p. 45) quanto aos germes visíveis do socialismo. Essa centralidade da discussão científico-tecnológica, porém, não é novidade na obra de E. Albuquerque: ao contrário, essa é uma de suas preocupações fundamentais - talvez, a preocupação fundamental - desde seus primeiros trabalhos .
Tal relevância não se dá por acaso: a aplicação tecnológica da ciência à produção relaciona-se diretamente ao comportamento da taxa de lucro e, portanto, aos rumos possíveis do modo de produção capitalista. Embora direta, essa relação não é linear nem unilateral, mas exuberantemente contraditória. De um lado, imbricado com a “dinâmica de crescimento da composição orgânica de capital”, “o progresso tecnológico, a aplicação da ciência à produção, está entre os principais determinantes da tendência à queda da taxa de lucro” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 156). De outro, esse mesmo progresso tecnológico também se entranha em “diversos fatores que se contrapõem à queda da taxa de lucro” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 156).
Para recepcionar adequadamente esse caráter contraditório em sua teoria econômica, E. Albuquerque situa suas reflexões sobre ciência e tecnologia no marco da abordagem das “ondas longas do desenvolvimento capitalista”, mencionada acima: “[d]esde a incorporação por Schumpeter das inovações na determinação dos ciclos longos de Kondratiev, (...) a elaboração sobre as ondas longas atribui um papel central às questões relacionadas ao progresso tecnológico” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 151). Assim, o início de uma nova onda longa vem impulsionado por alguma inovação radical, “cujos efeitos se espraiam pelo conjunto da economia com o tempo, alterando toda a sua estrutura” (ALBUQUERQUE, 2019, p. 133).
Não se trata, contudo, de enfatizar algo como um perfil heroico de uma única invenção que tivesse força para pôr em movimento todo um novo longo ciclo da economia capitalista, mas de destacar novas maneiras de produzir - associadas em geral a muitas invenções pontuais de diferentes equipamentos, máquinas e processos - que, como métodos gerais de produção, difundem-se pela economia como um todo, forçando-a a uma reestruturação radical, o que não ocorre sem turbulência.
Se é falsa a imagem heroica de uma única invenção que impulsionasse revolucionariamente a economia capitalista como um todo, é igualmente desprovida de lastro a associação imediata e unilateral entre progresso tecnológico e mercado. O que as pesquisas foram mostrando com o tempo é que as condições institucionais para a inovação científico-tecnológica vão muito além, mais uma vez, da caricatura do mercado puro promovendo o trabalho de mentes geniais isoladas em laboratório, buscando riqueza e glória. O conceito de “sistemas nacionais de inovação” chama a atenção exatamente para a relevância ímpar, no que se refere à aplicação tecnológica da ciência à produção econômica, de arranjos institucionais nos quais se façam presentes atores, órgãos e agências não guiados pela lógica de lucros e perdas - como universidades, institutos de pesquisa e agências estatais (ALBUQUERQUE, 1996, p. 163-195) .
Como quer que seja, na medida em que o capital se comporta como um fractal, o início de uma nova onda, gerado pelo refreamento da tendência de queda da taxa de lucro associado a alguma novidade tecnológica fundamental, põe em ação, simultaneamente, fatores que fortalecem a própria tendência de queda. Por conseguinte, como a alusão a ciclos ou ondas já revela, ao início eufórico de uma nova fase ascendente de acumulação tende a seguir-se, mais cedo ou mais tarde, um período descendente e, na sua culminação, um momento de crise.
3. Considerações finais: o capitalismo, a democracia, a crise
A teoria econômica de E. Albuquerque, recortada acima para os moldes da discussão aqui proposta, oferece um conjunto de conclusões: a teoria do valor-trabalho marxista permanece capaz de explicar a estrutura e a dinâmica da economia capitalista, mesmo com todas as transformações que essa economia sofreu do século XIX até hoje; para compreender a dinâmica de longo prazo dessa economia, um fator primordial é a aplicação tecnológica da ciência à produção, o que tem conduzido o modo de produção capitalista a um tipo de desenvolvimento sob a forma de ciclos ou ondas longas; essa assertiva é corroborada pelo comportamento da taxa de lucro, em que fatores que impulsionam e refreiam sua tendência de queda estimulam-se recíproca e simultaneamente, não permitindo que se afirme haver um limite especificamente econômico para o capitalismo; portanto, de um ponto de vista especificamente econômico, as crises, correspondentes a momentos de prevalência dos fatores que favorecem a tendência de queda da taxa de lucro (ALBUQUERQUE; RIBEIRO, 2016a, p. 568), podem ser momentos de transição para uma nova fase do próprio capitalismo (ALBUQUERQUE; RIBEIRO, 2016b, p. 307), para metamorfoses do capitalismo; nesse caminho, porém, em que o modo de produção capitalista vai criando soluções para lidar com os obstáculos que ele mesmo coloca diante de si em seu desenvolvimento contraditório, é possível vislumbrar não apenas a acomodação capitalista de seus próprios distúrbios, mas também os indícios de um possível futuro não-capitalista; isso não significa uma recusa simplista do mercado e de seu mecanismo anônimo de alocação baseado em preços, mas a constatação de que a economia capitalista e a sociedade correlata continuaram evoluindo incessantemente nos últimos séculos e, nessa evolução constante, foi sendo construída uma mescla institucional de elementos mercantis e elementos não-mercantis, mescla que, muito mais complexa do que a falsa e ingênua imagem do mercado puro, parece mais adequada à complexidade do nosso tempo.
Essas conclusões, sobretudo a última, contrapõem-se de maneira contundente ao dogma da imprescindibilidade do mercado, pelo menos na versão difundida, mais do que todos, por Friedrich Hayek:
Essa complexidade institucional para dar conta da crescente complexidade da economia é uma introdução aos limites de elaborações como as de Hayek, que atribuem ao mercado - exclusivamente - a capacidade para lidar com a complexidade da economia.
(...) esse resultado e essa compreensão teórica podem ser contrapostos à elaboração de Hayek, que sugere que o mercado responderia à complexidade da atividade econômica - e deve ser deixado à sua própria regulação. (ALBUQUERQUE, 2012, p. 111; 181)
Em que pese sua referência imediata seja a teoria dos sistemas de Talcott Parsons, é esse mesmo fantasma hayekiano que parece ter assombrado J. Habermas, a ponto de mantê-lo imobilizado na encruzilhada formada pela tensão entre capitalismo, democracia e crise.
A teoria econômica de E. Albuquerque mostra, em primeiro lugar, que os motivos teórico-econômicos que J. Habermas apresenta para abandonar a teoria do valor-trabalho marxista - cristalizados tanto na compreensão equivocada dessa teoria do valor-trabalho quanto na aceitação acrítica da inevitabilidade do mercado como subsistema funcionalmente diferenciado e radicalmente avesso às intervenções políticas diretas por meio de técnicas de planejamento - não se sustentam. Por isso mesmo, em segundo lugar, o que a teoria econômica de E. Albuquerque disponibiliza são injunções robustas para que J. Habermas, ou pelo menos sua teoria social, saia de sua encruzilhada paralisante.
Como dito, são dois os motivos que mantêm a teoria social habermasiana imóvel nessa encruzilhada: uma redução empiricista no trato da economia capitalista - como se não houvesse nenhuma alternativa concreta disponível pós-Guerra Fria, para além da miragem do mercado puro - e um déficit de complexidade - como se essa mesma miragem fosse, no fim das contas, um momento insuperável de evolução, dado o caráter complexo de nossas sociedades modernas. A redução empiricista de J. Habermas não lhe permite ver que o capitalismo hoje não condiz com a caricatura do mercado puro - na verdade, nunca coincidiu . Essa mesma redução e o déficit de complexidade, por sua vez, não lhe permitem ver que já estão em curso na história intentos de encontrar arranjos institucionais mais complexos do que a ilusão do mercado puro, arranjos esses que, por serem mais complexos, seriam também mais adequados justamente à complexidade crescente de nossa vida social. Os escritos de E. Albuquerque revelam sobejamente os equívocos tanto dessa redução empiricista quanto desse déficit de complexidade - que, na minha interpretação, tomaram há tempos a teoria social habermasiana e vêm explicitados a cada vez que essa teoria social precisa pronunciar-se sobre o capitalismo.
Mas por que, então, insistir ainda em salvar algo dessa teoria social? Por que, com o mesmo gesto de recusa dos equívocos teórico-econômicos que lhe subjazem, não a recusar como um todo?
A resposta é dada pelo próprio E. Albuquerque: “o diagnóstico que Habermas faz da sociedade tardocapitalista apresenta uma abrangência e uma profundidade que o torna um ponto de partida indispensável” (ALBUQUERQUE, 1996, p. 107). Como visto, não obstante reconhecendo as tendências de crise e patologias que lhe acompanham, J. Habermas nunca deixou de defender o Estado de Bem-Estar Social. Esse mesmo Estado de Bem-Estar Social, que J. Habermas, preso em sua encruzilhada, não consegue enxergar para além das tensões entre democracia e economia de mercado capitalista, E. Albuquerque vê como um germe visível de um futuro não-capitalista. Ao mesmo tempo, a democracia, à qual J. Habermas dedicou boa parte de sua obra nas últimas décadas, reivindicando para si um socialismo traduzido como reformismo democrático radical, não só é também um dos germes visíveis do socialismo para E. Albuquerque, como é o principal deles.
Ou seja, a teoria social habermasiana, com sua sensibilidade normativa peculiar, segue tendo potenciais crítico-emancipatórios não esgotados, podendo contribuir em muito na tarefa de superação da sociedade fundada com a economia de trocas capitalista. Para tanto, um dos passos ineludíveis é sua reconexão com a teoria do valor-trabalho marxista. Os desafios com os quais uma tal reconexão, aqui apenas ensaiada, tem que lidar extrapolam largamente os limites deste pequeno texto . Mas, se devidamente enfrentados, podem auxiliar a teoria crítica a reassumir a centralidade de uma crítica da economia política talhada também em termos teórico-econômicos .
Dentro dos limites estabelecidos no presente trabalho, todavia, é possível indicar ao menos um ponto de partida para essa reconexão: o próprio conceito de “crise”, abundante nas páginas anteriores. Para a teoria do valor-trabalho marxista, interpretada via E. Albuquerque, as crises são, do ponto de vista do capital ele mesmo, “momentos de ajuste do capitalismo” (ALBUQUERQUE; RIBEIRO, 2016b, p. 307), que “abrem processos de reconfiguração do sistema” (ALBUQUERQUE; RIBEIRO, 2016a, p. 566). Entretanto, como o capital é, antes de tudo, uma relação social (MARX, 2013, p. 836), essas crises nunca são crises meramente objetivas, informadas pelo indicativo da queda da taxa de lucro e assim apreensíveis somente do ponto de vista estrito do capital. Ao contrário, elas podem manifestar-se - e sempre se têm historicamente manifestado - como crises sociais, experienciadas por indivíduos e grupos e interpretadas como crises desde o seu ponto de vista de participantes de processos sociais impelidos pelo capital e mediados pela forma-mercadoria. Se recepcionadas como crises sociais, com tudo o que isso significa, e se compreendido, em todo seu alcance, que o motor fundamental da reiteração indefinida dessas crises é a persistência estrutural do modo de produção capitalista, pode acontecer que, em um momento futuro, uma crise do capital não se limite a um momento de reconfiguração do capitalismo, a um momento mais de metamorfose do capitalismo, mas ecloda como um momento que coloque com uma intensidade irrevogável a pauta da superação do capitalismo, a pauta da consolidação, sob uma forma madura, daquilo que hoje só aparece como “germes do socialismo”.
A teoria social habermasiana pode desempenhar um papel crucial na mediação entre crise do capital e crise social, seja quanto ao entendimento teórico dessa distinção, seja quanto aos incentivos práticos para levá-la a sério e agir a partir dela. Com a falta de coerência conceitual que lhe rendeu tantas críticas justificadas, mas de uma maneira que não deixa de guardar continuidade com suas reflexões sobre as tendências de crise na década de 1970, J. Habermas recorrerá - tanto em “Facticidade e validade”, quanto em “Na esteira da tecnocracia” - à noção de “consciência de crise”. Com ela, pretende, em última instância, salvar o núcleo normativo da ideia de soberania popular num contexto contemporâneo em que, diante de um sem-número de obstáculos, essa ideia ameaça parecer não mais do que uma relíquia que testemunha a ousadia desproporcional congênita à modernidade. Essa “consciência”, que “não paralisa, mas é criativa” (HABERMAS, 2014c, p. 159), pode, em situações de crise, retirar a esfera pública da inércia que a assola cotidianamente nas democracias modernas e revitalizar, com isso, a bela e audaciosa imagem de uma soberania popular em ação. Se, diante da “percepção de problemas sociais relevantes” (HABERMAS, 2021a, p. 484), nos “momentos críticos de uma história acelerada” (HABERMAS, 2021a, p. 483), é possível que a sociedade civil, “consciente da crise”, mobilize-se para uma afirmação democrática da opinião e da vontade, e se a economia já não é tomada como um forte impenetrável aos ditames normativos da política, nada impede a priori que a opinião e a vontade a serem afirmadas tragam consigo uma decisão refletida sobre a necessidade de libertar-nos dos limites estreitos a que o capitalismo nos confina.
Dizer que o capitalismo não possui limites especificamente econômicos não significa dizer que ele não terá fim: ao contrário, significa insistir na tese de que seu fim só pode ser um fim político - isto é, socialmente construído e politicamente efetivado. Como sintetiza E. Albuquerque, “a eventual superação do modo de produção capitalista depende do processo democrático (e de seu aprofundamento) e de uma escolha da população no sentido da construção de uma nova sociedade” (ALBUQUERQUE, 2012, p. 185). Para isso, a crise do capital e a consciência dela como uma crise social parecem ser momentos incontornáveis. A meandrada teoria social de J. Habermas tem recursos crítico-teóricos não-subestimáveis para lidar com a distinção - que estou a propor com minhas próprias palavras - entre crise do capital e crise social. A efetivação desse potencial crítico, no entanto, depende de que ela saia da encruzilhada em que se meteu e aceite a viabilidade, teórica e prática, de um futuro emancipado sem capitalismo.
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