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Instituições e Desempenho Socioeconômico na Democracia Brasileira: Preferências Liberalizantes e Preferências Distributivas
Institutions and Socioeconomic Performance In Brazilian Democracy Liberal Preferences and Distributive Preferences
INSTITUCIONES Y DESEMPEÑO SOCIOECONÓMICO EN LA DEMOCRACIA BRASILEÑA Preferencias liberales y preferencias distribuidas
Instituições e Desempenho Socioeconômico na Democracia Brasileira: Preferências Liberalizantes e Preferências Distributivas
Administração Pública e Gestão Social, vol. 12, núm. 4, 2020
Universidade Federal de Viçosa

Recepção: 12 Fevereiro 2019
Aprovação: 04 Dezembro 2019
Publicado: 01 Outubro 2020
Resumo: Processos de criação e mudança institucional são dotados de intencionalidades que refletem as preferências políticas dos agentes que os propõem. Partindo deste pressuposto, apresenta-se um estudo a respeito das preferências políticas dos governos brasileiros. Para tanto, optou-se por estudar os governos que foram diretamente eleitos e terminaram seus mandatos no contexto posterior a 1988, observando processos de criação e reforma institucional. Argumenta-se que os governos do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB), que perduraram entre os anos de 1995 e 2002, propuseram reformas que identificam suas preferências como liberalizantes. Por sua vez, os governos petistas (2003 a 2014) estruturaram arranjos institucionais que se aproximam de um social-desenvolvimentismo com preferência por acelerar processos distributivos. Ainda, identifica-se que mudanças institucionais incrementais, realizadas sob a égide das regras do jogo democrático, foram fatores determinantes para se compreender a melhoria de indicadores sociais observada entre 1995 e 2014.
Palavras-chave: Preferências Políticas, Intencionalidade, Análise Institucional, Democracia, Governos Brasileiros.
Abstract: Processes of creation and institutional change have intentions that reflect agents’ political preferences. From this assumption, we present a study about political preferences of Brazilian governments. For that, an option was made of studying the governments that were elected directly by citizens and finished their presidential term, in the context after the year 1988. The argument is that the governments from Brazilian Social-Democratic Party (PSDB) have proposed reforms identified with their liberal preferences. On the other side, when Workers' Party was in power, it constructed institutional arrangements from a social-development perspective, expressing preferences to accelerate processes of income distribution. The analysis identify that incremental institutional changes, working under democratic rules, were a key factor to understand the good performances of social indicators between 1995 and 2014.
Keywords: Political Preferences, Intentionality, Institutional Analyses, Redistribution, Brazilian Governments.
Resumen: Los procesos de creación y cambio institucional están dotados de intencionalidades que reflejan las preferencias políticas de los agentes que los proponen. A partir de ese presupuesto, se presenta un estudio sobre las preferencias políticas de los gobiernos brasileños. Para ello, se optó por estudiar a los gobiernos que fueron directamente elegidos y terminaron sus mandatos en el contexto posterior a 1988, observando procesos de creación y reforma institucional. Se argumenta que los gobiernos del Partido de la Social Democracia Brasileña (1995-2002) propusieron reformas que identifican sus preferencias como liberales. Por su parte, los gobiernos del Partido de los Trabajadores (2003 a 2014) estructuraron arreglos institucionales que se aproximan a un social-desarrollismo con preferencias por acelerar procesos distributivos. Además, se identifica que cambios institucionales incrementales, realizados bajo la égida de las reglas del juego democrático, fueron factores determinantes para comprender la mejora de indicadores sociales observada entre 1995 y 2014.
Palabras clave: Preferencias Políticas, Intencionalidad, Análisis Institucional, Democracia, Gobiernos Brasileños.
1 Introdução
No presente trabalho são analisadas as preferências políticas dos governos brasileiros e suas consequências, observando intencionalidades subjacentes às mudanças institucionais, que estabeleceram novos papeis para o Estado brasileiro no contexto democrático posterior ao ano de 1988. O argumento aqui tratado é que durante 20 anos, entre 1994 e 2014, a democracia brasileira funcionou com parâmetros institucionais relativamente estáveis, em que partidos políticos disputavam votos, ofertando programas políticos distintos, sujeitos ao escrutínio dos eleitores, os quais tinham garantias de que governos eleitos terminariam seus mandatos (O'Donnell, 2011).
Esse cenário institucional possibilitou a alternância de poder, bem como a governabilidade do sistema político. Essa governabilidade assumiu a forma específica do presidencialismo de coalizão (Abranches, 1988; Palermo, 2000; Figueiredo & Limongi, 2007). Se, por um lado, o presidencialismo de coalizão impunha restrições para a ação dos agentes (governos e partidos políticos) em termos de realizar mudanças radicais, por outro lado, garantia a aprovação de políticas e reformas, favorecendo mudanças incrementais. A sedimentação de mudanças incrementais levou o Brasil a uma trajetória virtuosa refletida em diversos indicadores de desenvolvimento socioeconômico. Dessa forma, o respeito às regras do jogo democrático, mesmo que a passos lentos, implicava em incentivos institucionais que conformavam um conjunto de oportunidades no qual era possível crescimento e distribuição, encaminhando-se para um jogo de soma positiva.
Para ilustrar estas proposições, neste artigo recorre-se à metodologia da análise institucional, examinando algumas das principais mudanças que foram propostas no caso brasileiro pelos governos que ocuparam o Executivo Federal entre 1995 e 2014. Nosso modelo assume que as propostas de mudança institucional possuem determinada intencionalidade que reflete diferentes preferências políticas dos agentes (North, 2005). Por sua vez, as preferências políticas expressam diferentes percepções a respeito de como os recursos e as oportunidades devem ser distribuídas em uma sociedade, podendo estar organizadas em um corpo teórico formalizado e coerente ou ser meramente visões de mundo não racionalizadas (Dworking, 1981).
Para dar conta dessas questões, optou-se por estudar os governos que foram diretamente eleitos e terminaram seus mandatos no contexto pós 1988, propondo uma análise comparativa de dois períodos distintos da democracia brasileira. O primeiro período de 1995 a 2002 caracterizado pelo governo do Partido Social Democrata Brasileiro (PSDB), durante dois mandatos. O segundo, de 2003 a 2014, representando as três gestões do Partido dos Trabalhadores (PT) que terminaram seus mandatos. Em cada um desses períodos procurou-se identificar os principais elementos de mudança institucional, através de pesquisa documental e de revisão bibliográfica, bem como resultados em termos de indicadores socioeconômicos e de execução de gastos públicos.
Para apresentar este estudo, o artigo está divido em mais três seções, além desta introdução. Na primeira, são tecidas considerações sobre o marco conceitual que embasa nossa investigação, definindo os conceitos de preferências políticas, intencionalidade e mudança institucional. Na segunda, analisamos as preferências dos governos do PSDB, discutindo a intencionalidade expressa no modelo de reforma de Estado proposto e no processo de liberalização econômica. Na terceira parte, analisamos os governos do PT, privilegiando a observação de criação e reformas institucionais, bem como as políticas sociais propostas. Por fim, apresentamos nossas conclusões.
2 Preferências Políticas, Intencionalidade e Mudança Institucional.
Nas últimas décadas, o neoinstitucionalismo consolidou-se como campo de estudos, enfatizando o papel das instituições na explicação do desempenho de sistemas políticos e econômicos. Nesse campo, uma discussão importante diz respeito à compreensão da própria mudança institucional (Hall & Taylor, 2003). De um lado, o chamado neoinstitucionalismo histórico passou a ressaltar o papel de eventos exógenos (conjunturas críticas), como guerras, crises e revoluções, para se analisar a gênese e as transformações institucionais, priorizando um olhar para as mudanças abruptas (Pierson & Skocpol, 2008). Por outro lado, recentemente, emerge um esforço de teorização a respeito de como a evolução dos arranjos institucionais pode ser explicada por fatores endógenos (Mahoney & Thalen, 2009). Neste artigo, pretende-se analisar processos de mudança institucional que operam de forma lenta e gradual, gerando descontinuidades, sem rupturas abruptas. Considera-se que, no caso brasileiro, para o período analisado, as principais organizações políticas (PT e PSDB) comportaram-se como agentes simbióticos, que procuraram ao mesmo tempo reformar as regras do jogo, preservando as instituições. Nossa análise tem por objetivo teórico chamar a atenção para um elemento ainda pouco abordado nessa literatura: O papel das preferências política e da intencionalidade subjacente à mudança institucional.

Seguindo a definição clássica de Douglass North, em que as instituições podem ser consideradas as regras do jogo e as organizações os jogadores, assume-se que a mudança institucional deve ser explicada primordialmente pela interação entre organizações e instituições (North, 1990). As instituições configuram uma matriz de constrangimentos que delimitam o conjunto de oportunidades e ganhos possíveis percebidos pelos agentes. Estes, por sua vez, estão competindo em um ambiente de escassez que os leva a criar estratégias que têm como objetivo provocar a mudança institucional e, assim, alterar a matriz de pay-offs da economia. Ou seja, a intencionalidade do processo se expressa na busca de alterar os parâmetros institucionais que regulam a produção e a distribuição.
Nesta perspectiva, assume-se que para se compreender as transformações institucionais e, consequentemente, a mudança econômica, é preciso observar a intencionalidade dos atores e organizações com poder para efetuar mudanças (North, 2005). Essa intencionalidade reflete as preferências políticas a respeito do caminho para a promoção de bem-estar social. Seguindo a definição de Richard Dworking:
I mean [political] preferences about how the goods, resources and opportunities of the community should be distributed to others. These preferences may be either formal political theories of the familiar sort, such as the theory that goods should be distributed in accordance with merit or desert, or more informal preferences that are not theories at all, such as the preference many people have that those they like or feel special sympathy for should have more than others (Dworking, 1981, p. 192).
Dessa forma, trata-se também de concepções sobre as funções do Estado em redistribuir os recursos sociais, embasando as políticas a serem implementadas. Essas políticas, por sua vez, criam efeitos de path dependence que estruturam as relações entre as burocracias públicas, os agentes econômicos e os cidadãos, conformando as trajetórias nacionais específicas. Assim, as preferências se desdobram em intenções governamentais e estas podem ser apreendidas observando propostas de criação, extinção ou modificação institucional. Segundo Fonseca:
O exame destas [mudanças institucionais] pode mostrar-se valioso metodologicamente ao permitir, com maior facilidade e precisão, que sejam empiricamente reveladas intenções, planos e projetos, porquanto em geral resultam de atos deliberados, que precisam ser materialmente expressos não só “fisicamente” (caso de órgãos, institutos, ministérios, associações), como pela escrita (caso de leis, códigos e alguns símbolos) ou pela linguagem oral (caso de discursos e entrevistas, por exemplo) (Fonseca, 2003, p. 134).
Portanto, as instituições são reflexos da intencionalidade daquelas organizações com maior poder de barganha para delimitar as regras do jogo, de modo a favorecer seus interesses próprios ou os interesses dos quais são representantes. A competição em um ambiente de escassez pode ser vista como um jogo de soma zero, em que os interesses de uns são satisfeitos à custa dos interesses de outros. Tendencialmente, isso é refletido em um tipo de crescimento econômico que tem por resultado a concentração na distribuição de renda. Entretanto, o processo de desenvolvimento econômico pode engendrar dinâmicas cooperativas, em que a matriz institucional da sociedade passa a determinar um conjunto de oportunidades que favoreça a posição de todos os atores sociais, ou seja, para um jogo de soma positiva (North, 2005).
3 Preferências Liberalizantes e Intencionalidade Reformista: Os Governos do PSDB (1995-2002)
No Brasil da década de 1990 havia um clima misto de otimismo com as novas instituições democráticas e de pessimismo gerado pelo insucesso do primeiro governo eleito em combater a inflação e com os escândalos de corrupção que levaram ao impedimento de Fernando Collor de Melo em setembro de 1992. Nesse contexto, a Constituição Federal de 1988 (CF/1988) ampliava os direitos sociais, a exemplo de garantir o orçamento da seguridade social (saúde, assistência e previdência), delegando ao Estado brasileiro um papel de garantia do bem estar social através de políticas universalistas. Contudo, no cenário internacional já vigoravam ideias em favor do laissez-faire e da redução do grau de intervenção do Estado na economia. Em 1995, Fernando Henrique Cardoso (FHC) assume a Presidência do Brasil com o desafio de levar adiante o Plano Real, focado na estabilização monetária. Para tanto, as políticas desse governo precisavam dar conta de tensões entre as exigências dos mercados financeiros globalizados, as estruturas institucionais existentes, a grave situação social do país e as exigências constitucionais de universalização de direitos.
O caminho escolhido para enfrentar esses desafios tem como marco o Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado (PDRAE), elaborado pelo recém-criado Ministério da Reforma do Aparelho do Estado (MARE), comandado por Bresser-Pereira. Apesar de o MARE ter sido extinto no final do primeiro mandato, em 1998, o PDRAE subsidiou o conjunto de reformas institucionais implementadas no Brasil nos oito anos de governo do PSDB e expressava a forma como se estava concebendo novas funções do Estado na sociedade brasileira. Seus efeitos foram determinantes, gerando uma nova trajetória institucional que delimitou as possibilidades de ação estatal nas duas décadas seguintes.
O referido Plano Diretor estabeleceu as diretrizes para implantar uma ampla reforma do aparelho do Estado brasileiro. Inicialmente o plano apontava que
Tornou-se claro, afinal, que a causa da desaceleração econômica nos países desenvolvidos e dos graves desequilíbrios da América Latina e no Leste Europeu era a crise de Estado, que não soubera processar de forma adequada a sobrecarga das demandas a ele dirigidas (Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado, 1995, p. 3)
Além disso, afirmava também que houve superação tanto do Estado Liberal, por ocasião da primeira guerra mundial e da grande depressão, quanto do Estado vigente na economia brasileira, propulsor da economia capitalista. Superação decorrente da crise fiscal e do esgotamento do modelo de substituição de importações. Diante disso, definia a crise de Estado como:
Uma crise fiscal, caracterizada pela crescente perda do crédito por parte do Estado e pela poupança pública que se torna negativa; (2) o esgotamento da estratégia estatizante de intervenção do Estado, a qual se reverte de várias formas: o Estado do bem-estar social nos países desenvolvidos, a estratégia de substituição de importações no terceiro mundo, e o estatismo nos países comunistas; e (3) a superação da forma de administrar o Estado, isto é, a superação da administração pública burocrática (Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado, 1995, p. 3).
Conforme demonstrado na Figura 2, o PDRAE concebia que caberia ao Estado exercer as funções legislativas, judiciárias e gestão na cúpula do executivo – expressas no “Núcleo Estratégico” – e as funções exclusivas (fiscalização, regulamentação e fomento). As atividades não fins deveriam ser terceirizadas, os serviços não exclusivos (universidades e museus, por exemplo) deveriam ser “publicizados” e, por fim, a produção de bens e serviços deveria ser privatizada. Propunha ainda, para cada grupo de funções, uma forma de propriedade (estatal, pública não estatal ou privada) e o tipo de administração a ser adotada (burocrática ou gerencial). Decorre desta visão a atuação do Estado no Governo FHC, a qual se caracterizou pela liberalização comercial, privatizações, publicizações e a implementação (parcial) da administração pública gerencial.

A implementação da concepção de Estado segundo o PDRAE exigiu a aprovação de emendas à CF/1988, em especial no capítulo que trata da Ordem Econômica e Financeira. Em relação à publicização, em 1997 foi aprovada a Lei n. 9.790, a qual cria as Organizações s da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPS) e estabelece as formas de parceria entre o Estado e o setor público não estatal para fins de execução de funções que até então eram desempenhadas exclusivamente pelo Estado. No que se refere às privatizações, apesar de o Programa Nacional de Desestatização estar na pauta desde o início dos anos 1980, foi no primeiro mandato do governo FHC que se consolidaram as “megaprivatizações” dos serviços de telefonia e energia em especial. Outra mudança significativa na matriz institucional do país foi a aprovação da Lei n. 8.987/1995, que estabeleceu normas sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, normatizando a concessão de serviços de manutenção de rodovias através de pedágios.
Em linhas gerais, a proposta do PDRAE era reduzir a rigidez e a centralização, flexibilizar o regime de trabalho no serviço público, estabelecer uma elite burocrática altamente capacitada que ocupasse o núcleo estratégico e criar um amplo sistema de informações que agilizasse a gestão. Assim, o plano de Bresser-Pereira envolvia muito mais do que a redução do déficit público, envolvia uma reforma radical que levasse a uma maior eficiência do serviço público (Bressan, 2002). Porém, principalmente depois que o MARE foi extinto e o projeto de reforma ficou vinculado ao Ministério do Planejamento, a percepção generalizada em relação a tal política era de que seu principal foco se referia às privatizações e à redução do déficit público.
De fato, nos governos de FHC (1995 a 2002), a redução do déficit fiscal foi uma das prioridades na agenda política. Desde os anos 1970, o Brasil passava por um aumento considerável da dívida pública, acumulando passivos internos e externos. A leitura era de que o Governo Federal enfrentava problemas como altos gastos com funcionalismo público e com as estatais, as quais em diversos momentos tiveram prejuízos, recorrendo aos cofres públicos para fechar seu caixa. O endividamento de estados e municípios também era visto como um problema central para equalizar a situação fiscal (Nassif, 2002).
Vale ressaltar que a situação fiscal é agravada ainda em 1995, quando, após a crise do México, que resultou em fuga de capitais no Brasil, o Banco Central eleva bruscamente a taxa básica de juros (SELIC). Tal elevação, necessária à manutenção da política de ancoragem cambial (câmbio fixo com teto de R$1,00 para o dólar), representou substancial aumento da dívida pública, queda na arrecadação e falências no setor privado:
Quando os juros explodiram e foram mantidos em patamares elevadíssimos, a economia desabou. Do lado privado, houve recordes históricos de falências, concordatas e inadimplência. As empresas capitalizadas se ajustaram, demitindo e revendo seus planos de investimento. As empresas menos capitalizadas quebraram ou acumularam passivos impagáveis junto a bancos e ao fisco. Do lado público, a legislação não permitia demissões ou redução de salários e benefícios. Quando a arrecadação despencou, o resultado foi um aumento geral do déficit e dos passivos públicos. O segundo foi que, como a taxa de juro praticada pelo Banco Central servia de parâmetro para correção da maioria das dívidas estaduais e municipais, houve crescimento exponencial da dívida pública em todos os níveis (Nassif, 2002, p. 44).
Assim, no final do primeiro mantado (1995-1998), o êxito do Plano Real no combate à inflação implicou em novos problemas, como a elevação da dívida pública interna e externa. Dessa forma, houve estabilização com desequilíbrios, de modo que no segundo mandato de FHC (1999-2002) o foco de ação passou a estar nos ajustes estruturais para obtenção de equilíbrio fiscal (Oliveira & Turolla, 2003).
Os desequilíbrios não eram visíveis apenas nas contas públicas. A situação externa da economia também era grave. A política de ancoragem cambial implicou na sobrevalorização da moeda e, dessa forma, em um crescimento das importações maior que o crescimento das exportações, provocando déficits em transações correntes. Problemas nas contas externas eram eminentes, dados os sucessivos déficits comerciais entre 1995 e 2000 e o crescimento do passivo externo, implicando uma transferência média de renda em torno de US$20 bilhões anuais (Faria, 2004).
Neste cenário de crise externa e de constantes desequilíbrios fiscais, no final de 1998, o Brasil recorreu a empréstimos internacionais para equilibrar o balanço de pagamentos. A partir de então, diante das condicionalidades impostas, a sustentabilidade das contas públicas passou a ser o foco da política macroeconômica do Governo FHC. Acertado com o Fundo Monetário Internacional, o Banco Mundial e o Banco Interamericano de Desenvolvimento, o programa baseou-se no forte ajuste fiscal que o Brasil já estava implementando naquele ano[ii], bem como nas reformas constitucionais da Previdência, da Administração Pública e do regime fiscal, incluindo a do sistema tributário. Além das metas fiscais, incluiu compromissos com a estabilidade macroeconômica, com a manutenção de uma firme disciplina monetária e com a continuação da abertura econômica.
A aprovação da Lei complementar n. 101/2000 – conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) – deu contornos finais à mudança da matriz institucional apresentando normas voltadas ao equilíbrio das contas públicas e estabelecendo limites de endividamento e de gastos com pessoal. A LRF estabeleceu controles fiscais às esferas da federação, de modo a estipular metas fiscais, exigindo projeções de receitas, despesas, resultados nominais e dívida pública para os três anos seguintes, além da previsão anual, da Lei de Diretrizes Orçamentárias. Além disso, proibiu a criação de despesas permanentes sem aumento de receitas permanentes e coibiu o comprometimento de novos gastos para o mandato seguinte sem o valor correspondente em caixa. Ainda em outubro de 2000 foi aprovada a Lei n. 10.208/00, prevendo penalidades e sanções aos governantes que descumprissem a LRF (Chieza, 2008; Silveira, 2009).
Pode-se afirmar que as ideias liberais encontraram terreno fértil no Brasil dos anos 1990, uma vez que os governos do PSDB foram caracterizados por mudanças que aumentavam a importância das forças de mercado na organização do sistema econômico brasileiro, o que ficava expresso nas privatizações, na liberalização comercial e financeira, entre outras reformas pró-mercado. O conteúdo do PDRAE e as demais reformas institucionais aqui discutidas indicam a intencionalidade do Governo FHC, o qual aderiu à nova ordem internacional que se conformava, marcada pela liberalização econômica.
Vale lembrar que uma das afirmações mais contundentes da teoria econômica neoclássica é que mercados competitivos tendem a ser eficientes em termos de alocação de recursos. Porém, é questionável a capacidade de esses mercados promoverem distribuições justas. Além disso, processos de liberalização não necessariamente implicam em maiores níveis de competição, pois podem resultar em maior concentração, pela formação de oligopólios e monopólios. Nesse sentido, o que se pode afirmar a respeito das preferências distributivas dos governos de FHC é que o conjunto de mudanças institucionais indicou que os resultados distributivos seriam consequências das dinâmicas de mercado, restando ao Estado a função de minimizar os custos gerados em termos de pobreza. Assim, inaugurou-se uma lógica de implementar políticas sociais focalizadas, tímidas no enfrentamento dos problemas sociais e sem magnitude suficiente para alterar os rumos do crescimento econômico e do desenvolvimento social (Cohn, 1999; Costa, 2009).
De toda forma, a reformulação da matriz institucional naquele período tem impactos no desenvolvimento socioeconômico, especialmente em função de ter logrado sucesso no controle do processo inflacionário. Ao se observar o principal indicador de desigualdade de renda, o Índice de Gini, percebe-se que entre 1993 e 1998 este sofreu pouca alteração, girando em torno de 0,600 (Figura 3). Contudo, em 1998 inicia-se uma tendência de longo prazo de queda nesse indicador. Essa tendência já refletia o novo ambiente macroeconômico, pois não seria possível sem o combate a inflação, dado que a elevação no nível geral de preços, durante muito tempo, operou como um poderoso mecanismo concentrador de renda.

4 Preferências Distributivas e Social-Desenvolvimentismo: A atuação do Estado nos Governos do PT (2003-2014)
Especialmente entre setores de extrema-esquerda, é recorrente a afirmação de que os governos do Partido dos Trabalhadores, apesar de terem sido eleitos com promessas de mudança, teriam dado continuidade à lógica de coalizões que fundamentava as políticas neoliberais dos anos 1990. Nesse sentido, não teriam rompido com pactos e políticas elitistas que tradicionalmente marcaram a política brasileira, nem com as políticas neoliberais do período anterior, especialmente como configuradas no chamado “tripé macroeconômico”.
De outra parte, durante as últimas competições eleitorais, atores políticos mais à direita argumentaram explicitamente que os bons resultados dos governos do PT, especialmente em políticas sociais, foram apenas consequência da continuidade de ações implementadas durante os governos do PSDB. Esses setores destacaram o fato de que os programas focalizados de transferência de renda foram inaugurados na época de FHC. Dessa forma, a diferença dos programas sociais petistas seria de natureza meramente quantitativa e não qualitativa.
Assim, por ambos os lados do espectro político, emerge uma lógica discursiva que enfatiza traços de continuidade entre os governos da década de 1990 e aqueles do início do século XXI. Contudo, traços marcantes de descontinuidade são evidenciados ao se olhar para processos de mudança institucional, implantados pelos governos de Lula da Silva e Dilma Rousseff. Nesses governos, consolida-se uma concepção diferente sobre a função do Estado em relação ao desenvolvimento econômico e social, implicando na formulação e execução de políticas para as quais o aparato estatal herdado não fornecia capacidades suficientes. Para serem viáveis, era necessário estabelecer um intenso processo de criação e reforma de regras e estruturas de governança.
Assim, ocorreram mudanças importantes na matriz institucional brasileira, especialmente em função da criação de aparatos institucionais como o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), o Conselho Nacional de Desenvolvimento Industrial (CNDI), os Conselhos de Competitividade do Plano Brasil Maior, a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) e a Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República. Também deve-se destacar que se renovou a forma de atuação de empresas e agências estatais criadas durante a fase desenvolvimentista da história brasileira – como o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA). Esses organismos passaram a liderar debates, pesquisas e ações com um sentido de tornar o Estado o indutor de desenvolvimento econômico. Dentro da própria burocracia estatal fortalecia-se uma convenção de ideias pró-desenvolvimento (Erber, 2011), a qual buscava uma interação potente com atores da sociedade civil.
Essas dinâmicas institucionais expressavam a intenção de fortalecer as capacidades de o Estado brasileiro impulsionar e direcionar o desenvolvimento econômico nacional. Para tanto, delineavam-se arranjos institucionais de políticas públicas responsáveis por novas formas de coordenação entre atores da sociedade civil, agentes políticos e tecnoestrutura estatal (Chieza & Gaspary, 2014; De Toni, 2015; Gomide & Pires, 2014; Queiroz-Stein & Gugliano, 2017).
Assim, as políticas públicas do período identificavam uma atuação do Estado brasileiro em favor de uma agenda social-desenvolvimentista, apostando no fortalecimento do mercado interno e na capacidade de o Estado redistribuir renda e direcionar o investimento (Bastos, 2012). Nesse sentido, merecem ser destacadas ações nas áreas de educação, trabalho e assistência social. Na área educacional foram criados os programas Universidade para Todos (ProUni) (2005), Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI) (2007), Ciência sem Fronteiras (2011) e Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC) (2013). Na área de políticas sociais, de significativo impacto foram o Programa Bolsa Família e o Brasil sem Miséria.
O ProUni e o REUNI objetivavam o aumento do número de vagas na educação superior em universidades privadas e públicas, respectivamente. O programa Ciência sem Fronteiras era voltado para a promoção, expansão e internacionalização da ciência e tecnologia e da inovação através de intercâmbio e mobilidade internacional para jovens do ensino superior. O PRONATEC foi focado na ampliação da oferta de cursos de educação profissional e tecnológica. Esses programas possibilitaram o acesso de um número significativo de jovens na educação técnica e superior, atuando no sentido de fortalecer a cidadania e mitigar a restrição na oferta qualificada de força de trabalho (Cassiolato & Garcia, 2014). Esse conjunto de políticas contribuiu para um resultado não desprezível que foi o aumento da escolaridade média da população entre 18 e 29 anos, que passou de 8,3 anos em 2005 para 9,8 anos em 2013 (Santos, 2016).
Na área de assistência social, renda e emprego, uma série de políticas expressou a intenção de aliar desenvolvimento econômico com as a promoção de equidade. Dentre essas políticas, destacam-se o Programa de Renda Condicionada - Bolsa Família (PBF) (2004), o Programa Brasil sem Miséria (2011) e a Política de Valorização do Salário Mínimo Nacional, as quais, como detalhado abaixo, operaram como mecanismos de promoção de melhoria nos padrões de vida da população brasileira, através da elevação do nível de renda e do acesso à educação e à saúde.
O PBF reuniu, consolidou e ampliou todas as ações de transferência de renda focalizada já existentes. Seu objetivo era reduzir e interromper o ciclo intergeracional de reprodução da pobreza. Para tanto, essa política realizava transferências de renda para famílias em situação de pobreza, sendo o valor calculado de acordo com o número de filhos. Em contrapartida, as mães – que são as responsáveis exclusivas por acessar e gerenciar os recursos – deveriam garantir a frequência escolar das crianças, além de participar de ações de orientação nutricional, de saúde para mulheres grávidas e de vacinação. As avaliações indicam que o PBF foi um programa bem focalizado, de baixo custo e eficaz em atingir seus objetivos. Utilizando de um orçamento médio próximo de 0,5% do produto interno bruto (PIB), atingiu em torno de 13 milhões de famílias em 2013. Seus resultados foram significativos, dentre os quais é possível destacar a redução da pobreza e das desigualdades, aumento na frequência e queda na evasão escolar, melhorias na saúde pré-natal, queda na mortalidade infantil e na subnutrição infantil (Kerstenetzky, 2009; Campelo & Neri, 2013; Paiva, Falcão, & Bartholo, 2013; Marques, Mendes, Leite, & Jansen, 2010).
No ano de 2011, fatores como o mercado de trabalho aquecido, o crescimento nos rendimentos reais e o maior acesso à educação criavam condições para se almejar a superação da miséria, exigindo avanços no já bem avaliado PBF. Esse objetivo foi consolidado no programa Brasil Sem Miséria, que buscou implementar a universalização do PBF para todas as famílias pobres. Dessa forma, estruturou-se o programa em três eixos – garantia de renda, inclusão produtiva e acesso a serviços de educação e saúde. Diversas medidas foram tomadas para universalizar o programa, ampliando sua abrangência para além daquelas famílias com filhos em idade escolar, atingindo assim a todos em situação de extrema pobreza. Dentre essas medidas destacavam-se a busca ativa de usuários ainda não incluídos, o esforço contínuo para correção de erros de exclusão e a ampliação do valor variável pago às famílias, garantindo que a renda familiar per capita chegasse a um valor acima de R$70,00. Dessa forma, objetivava-se que o percentual de pessoas em extrema pobreza passasse para menos de 1% da população. Sobre as políticas sociais desse período, pode-se afirmar que:
A trajetória bem-sucedida do programa [PBF] até 2010 contribuiu para a emergência do Plano Brasil Sem Miséria. Primeiramente, por ser um exemplo eficiente de iniciativa intersetorial e interfederativa, mobilizando diversos setores e esferas governamentais. Segundo, por ter “patrocinado” a criação de um instrumento, o CadÚnico, sem o qual qualquer iniciativa voltada para a superação da extrema pobreza seria infrutífera. Ao mesmo tempo, o Plano Brasil Sem Miséria representou um grande desafio para um programa que começava a se consolidar – e que tinha, e em grande medida ainda tem, uma pesada agenda de estruturação operacional à frente. Mudanças significativas foram feitas já em 2011, com o reajuste concentrado nos benefícios variáveis, o aumento do número máximo desses benefícios por família (de três para cinco benefícios), o aumento da meta de atendimento de 12,9 para 13,8 milhões de famílias. Em 2012, com a criação do Benefício de Superação da Extrema Pobreza, o programa fez uma inflexão ainda maior na direção das crianças e da extrema pobreza, permitindo que quase cinco milhões de famílias recebessem um complemento de renda capaz de levar a renda familiar per capita acima dos R$ 70,00 (Paiva et al., 2013, p. 43).
De fato, o governo FHC inaugura um padrão de política social focalizado que tem continuidade nos governos petistas, sendo o PBF uma expressão significativa disso. Contudo, é importante destacar que o argumento que percebe as políticas sociais após 2003 como apenas uma ampliação quantitativa do que já vinha sendo feito não resiste a uma análise mais detalhada dessas políticas. Seu êxito foi devido, em grande medida, à capacidade de aprendizado por parte dos formuladores e gestores, que implicou em uma constante inovação institucional no arranjo de governança e execução dessas políticas. Entre essas inovações é preciso destacar a implementação do Sistema Único da Assistência Social, que possibilitou a gestão integrada e descentralizada do financiamento e da execução das políticas; a criação e o permanente aperfeiçoamento do Cadastro Único (CadÚnico), que contém informações detalhadas sobre as famílias de baixa renda, colhidas em nível municipal, abrangendo todo território nacional, com base no qual se definem os públicos-alvo e os beneficiários; o Índice de Gestão Descentralizada, que avalia permanentemente a qualidade da gestão municipal na implementação de políticas sociais; a criação do Ministério do Desenvolvimento Social, responsável por coordenar a gestão de políticas sociais (Paiva et al., 2013; Colin, Pereira, & Gonelli, 2013).
As preferências dos governos petistas pela aceleração dos processos de distribuição de renda e combate à miséria não ficavam expressas apenas nas políticas de transferência direta de renda. O projeto de desenvolvimento conduzido pelo Estado tinha como um dos pilares o fortalecimento do mercado interno, conjugado com ações redistributivas (Curado, 2011; Bastos, 2012). Nesse sentido, provavelmente, a mais impactante e importante política do período foi a Política de Valorização do Salário Mínimo Nacional (2007). Basicamente, consistia em promulgar reajustes anuais no salário mínimo que contabilizavam a inflação do ano anterior, medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), acrescida de um aumento real equivalente ao desempenho do PIB de dois anos anteriores. Essa fórmula de reajuste seria aplicada até o ano de 2023, implicando em transferência dos ganhos da produtividade social para os trabalhadores no longo prazo (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos [DIEESE], 2017).
Essa política teve impactos significativos, dada a amplitude de seu alcance. Segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE, 2017), estima-se que em torno de 47,9 milhões de brasileiros têm seus rendimentos referenciados no salário mínimo e que 68,6% do total de pessoas ocupadas recebam, no máximo, o valor equivalente a dois salários mínimos. Para essas pessoas, o aumento real acumulado nos seus salários, entre 2002 e 2017, foi de 77%. Isso implicou em elevar o poder aquisitivo para essas famílias, de modo que a quantidade de cestas básicas que poderiam ser adquiridas com um salário mínimo em São Paulo passou de 1,05 em 1995 para 2,10 em 2014 (Figura 4).

Não seria exagero afirmar que a política de valorização do salário mínimo nacional representou a mais importante mudança em favor de uma agenda social-desenvolvimentista, uma vez que desempenhou papel de estruturação do mercado de trabalho e de melhoria na renda dos segmentos mais marginalizados. Por sua vez, isso gerou impactos positivos nos indicadores de distribuição de renda e de expansão do mercado interno de consumo de massa, sendo outro elemento propulsor o crescimento econômico. No que se refere à matriz institucional voltado ao mercado de trabalho, os governos petistas implementaram políticas em favor do fortalecimento da regulação pública do mercado de trabalho e também em favor de sua liberalização. Conforme demonstrado no Quadro 1, nesses governos pode-se encontrar tanto medidas pró-flexibilização quanto pró-regulação, sem implicar, contudo, em transformações radicais, configurando um padrão incremental de mudanças nas regras do jogo.
| Mudanças Pró-flexibilização | Mudanças Pró-regulação | ||
| Reforma da previdência | Emenda Constitucional n.41/2003 - Taxou os inativos e extinguiu a integralidade para servidores públicos, entre outras mudanças. | Política de Salário Mínimo. | Reajuste de acordo com a inflação (INPC) do ano anterior, mais aumento real correspondente à variação do PIB de 2 anos anteriores. |
| Nova Lei de Falências | Lei n. 11.101/2005 - Reduziu o limite de preferência do crédito trabalhista para 150 salários mínimos. | Estágios | Lei n. 11.788/2008 - Criou regras para estágios, com limite de jornada diária de 6 horas e direito a férias. |
| Nova Regulação para Trabalho em Atividades Intelectuais | Lei n. 11.196/2005 - Estabelece que a pessoa física que presta serviços intelectuais pode ser concebida como pessoa jurídica, saindo das regras do campo trabalhista para as regras civis e comerciais. | “Super Receita” | O veto à Emenda n. 3, que proibia o auditor fiscal de multar empresa com relação de emprego disfarçada. |
| Intervalo Intrajornada de Trabalho | Portaria do Ministério do Trabalho, n. 42/2007 - Autorizou a redução do intervalo intrajornada através de negociação coletiva, prevalecendo o negociado em detrimento do legislado. | Seguro Desemprego | Aos setores mais atingidos pela crise econômica de 2008 e 2009, ampliou-se o seguro-desemprego para sete meses. |
| Trabalho em Transporte Rodoviário de Cargas. | Lei n. 11.442/2007 - Considera que não há vínculo empregatício, apenas relações de natureza comercial entre o motorista e a empresa do setor, pela exigência de o motorista ser proprietário do veículo de carga. | Pagamento de Licença Maternidade | Cancelamento de alterações no tema feitas em 1999, que definia pagamento da licença diretamente pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) e não pelo empregador, que era depois ressarcido. |
| Contrato de Trabalhador Rural | Lei n° 11.718/2008 - Autorizou a contratação de trabalhador rural sem carteira de trabalho assinada, por contrato de até dois meses. | Revogação da Portaria n. 865/95 | Essa portaria impedia a fiscalização por parte dos auditores fiscais de cláusulas previstas em acordos coletivos de trabalho. |
Em relação às mudanças aparentemente contraditórias no mercado de trabalho, pode-se apontar que a agenda de flexibilização, forte no primeiro governo Lula, perdeu espaço no segundo governo, principalmente após a crise de 2008 (Krein, Santos, & Nunes, 2012). Também é preciso destacar que a regulação foi concomitante a um processo de aquecimento do mercado de trabalho e elevação dos ganhos reais dos trabalhadores. Isso ficava expresso não só nos indicadores já analisados referentes ao salário mínimo, mas também pela queda sustentada na taxa de desemprego (Figura 5). Dessa forma, contrariava-se a lógica neoliberal segundo a qual a única forma de gerar empregos é pela desregulamentação e, no limite, pela abolição do salário mínimo (Marques, Mendes, Leite, & Jansen, 2010).

Ainda é preciso ressaltar outros programas de envergadura como o Programa de Aceleração do Crescimento, o Minha Casa Minha Vida, o Luz para Todos, o Projeto de Integração do Rio São Francisco e a Reestruturação da Indústria Naval, que objetivaram promover o desenvolvimento socioeconômico em diferentes setores da economia, contando com a estruturação de complexos arranjos institucionais para sua gestão (Gomide & Pires, 2014). Também foi importante o fato de que depois de aproximadamente duas décadas de ausência de ações explícitas e coerentemente articuladas, o Estado brasileiro voltou a formular e executar políticas industriais para fortalecer a competitividade da indústria brasileira (De Toni, 2013; Queiroz-Stein & Herrlein, 2016; Queiroz-Stein, 2016).
De toda forma, o ponto a ser enfatizado é que o Estado, no período pós-privatizações, não retoma uma forma de atuação próxima do que foi o desenvolvimentismo no século XX. Sua lógica é mais aproximada de ser um coordenador dos agentes, objetivando elevar os níveis de desenvolvimento socioeconômico em um complexo arranjo de governabilidade, do que ser a locomotiva desse desenvolvimento. Nesse contexto, de fato, o termo social-desenvolvimentista parece ser apropriado para descrever sua atuação. Isso se expressa em dois indicadores de gasto público. O primeiro é a participação das funções de desenvolvimento[iv] no total das despesas liquidadas da União, que apresenta uma clara mudança de trajetória a partir da década de 1990[v] (Figura 6). Em boa medida, essa queda se deve justamente aos processos de privatizações, em que o Estado deixou de ser o principal investidor em áreas importantes.

Ainda calculamos os desvios padrões dos gastos com funções de desenvolvimento para cada governo, desde 1980 (Tabela 1). Aqui, observa-se que além da tendência de longo prazo de uma queda sustentada nesses gastos, eles tendem a diminuir sua variabilidade. Isso corrobora a afirmação de que há cada vez menos margens discricionárias para os governos implementarem seus projetos de desenvolvimento econômico.
| Governos | Média (%) | Desvio Padrão (%) |
| Figueiredo (1980-1985) | 26,52 | 1,36 |
| Sarney (1986-1989) | 24,96 | 10,84 |
| Collor/Itamar (1990-1994) | 5,27 | 1,50 |
| FHC I (1995-1998) | 3,83 | 0,79 |
| FHC II (1999-2002) | 2,69 | 0,41 |
| Lula I (2003-2006) | 2,27 | 0,18 |
| Lula II (2007-2010) | 1,89 | 0,13 |
| Dilma I (2011-2014) | 1,60 | 0,08 |
O segundo indicador é a participação dos gastos sociais no total de gastos liquidados pela União. A priorização do gasto da União aponta que o traço marcante da estratégia esteve na política social. O crescimento da participação relativa dos gastos sociais, a despeito da manutenção da política de obtenção de superávit primário, aponta que é possível identificar traços de descontinuidades em relação aos governos do PSDB. Expressando a preferência por acelerar processos distributivos, a política social ganha substancial espaço orçamentário, carregada de uma intencionalidade de fazer valer as funções estatais no que se refere à promoção de equidade. Dessa forma, segundo a classificação funcional do gasto público, a rubrica do gasto social[vi] passa de 23,35% em 2000 para 37,31% do total da despesa liquidadas pela União em 2014 (Figura 7).

Por fim, há de se ressaltar outro elemento marcante desta estratégia dos Governos de Lula e Dilma que está demonstrado na Figura 8[vii]. Nela, visualiza-se como foi feita a partilha do total do gasto da União entre as Despesas Financeiras (juros, amortização e refinanciamento da dívida pública) e as Demais Despesas. Apesar da “financeirização” do gasto público se manter nos Governo FHC e Lula, observa-se que em 2008, no contexto da crise financeira e econômica global, ocorre uma inversão do gasto. A partir de 2008, mais de 50% das despesas liquidadas deixam de ser gastas com despesas financeiras (juros, amortização e refinanciamento da dívida), sinalizando alguma mudança em relação à sobreposição do capital financeiro, vigente até 2008 (Chieza et al., 2014).

Considerações Finais
No livro “Understanding the Process of Economic Change”, Douglass North argumenta que a teoria econômica neoclássica pode nos fornecer instrumentos valiosos para analisar como operam os mercados em economias desenvolvidas, porém, seria de pouca utilidade em analisar de forma abrangente a evolução dos sistemas econômicos. Isso se deve à ausência de três elementos em seu corpo teórico: fricções nas trocas, pois assume custos de transação zero; tempo, pois parte de uma análise fundamentalmente estática; intencionalidade, pois não incorpora uma análise mais sofisticada dos processos psicossociológicos subjacentes à tomada de decisões (North, 2005, p. 65).
Inspirado nessa crítica de North à teoria convencional, foi discutido neste artigo como as mudanças institucionais propostas na democracia brasileira ao longo de 20 anos (1995 a 2014) expressaram intencionalidades dos atores sociais que governaram o país. Assim, procurou-se elucidar a importância desse fator – ausente na teoria econômica neoclássica – para compreender-se o sentido das transformações socioeconômicas. Também foi apontado que essas intencionalidades nos dizem muito a respeito das preferências políticas dos governos e de suas ações para criar e modificar parâmetros institucionais. Esses parâmetros condicionam a produção e a distribuição dos recursos em uma sociedade e o estudo da intencionalidade subjacente à sua constituição possibilita uma visão complexa das transformações pelas quais passam os sistemas socioeconômicos em seu desenvolvimento.
Em relação aos governos do PSDB, ficou claro que havia preferências liberalizantes que orientavam a realização de reformas pró-mercado. Graças ao êxito obtido no combate à inflação, através do Plano Real de 1994, o Governo FHC, eleito já no primeiro turno das eleições, adquiriu força para implementar reformas pró-mercado. A concepção de Estado que predominou naquele governo está muito bem documentada no PDRAE, que subsidiou o conjunto de reformas voltadas à redução do grau de intervenção do Estado na economia. Dentre as principais, destacam-se a liberalização comercial e financeira, a redução do tamanho do Estado através do processo de privatizações das estatais, o tripé macroeconômico e a LRF.
Essas reformas foram marcantes em inaugurar uma nova trajetória institucional, especialmente em relação às funções que o Estado exerce sobre o desenvolvimento socioeconômico. Nos governos PSDB não havia uma preferência por redistribuição. Havia, claramente, uma prioridade em favorecer os mercados, sendo que ao Estado caberiam papéis mínimos e não audaciosos de combate à pobreza. De toda forma, é preciso reconhecer que a estabilização monetária anulou um dos mecanismos de concentração de renda da sociedade brasileira – a inflação – e criou condições necessárias para o combate às desigualdades.
Por sua vez, os governos petistas apresentaram políticas e engendraram processos de construção institucional que expressavam preferências de acelerar os processos distributivos. A lógica de atuação desses governos seguiu mais próximo do que vem sendo caracterizado pelo conceito de social-desenvolvimentismo, fazendo apostas mais robustas em políticas sociais e criando complexos arranjos institucionais para estruturar capacidades políticas e técnico-administrativas.
Mesmo que tenha tido políticas econômicas mais ativas, como na área de infraestrutura e de política industrial, não se pode afirmar que o Estado, durante os governos petistas, reproduziu o desenvolvimentismo do século XX. Pelo contrário, a estruturação de funções de coordenação de atores subnacionais e internacionais, públicos e privados, é exemplar de formas inovadoras de atuação estatal no século XXI. Nesse sentido, é preciso ressaltar os méritos e os resultados das políticas sociais, educacionais e de geração de emprego, as quais foram fatores decisivos para o bom desempenho em termos de crescimento econômico verificado em boa parte do período[viii] e para a redução significativa da pobreza e das desigualdades sociais.
Por fim, vale retomar o argumento inicial de que os ganhos observados nesse período da história brasileira tiveram por condição de realização o funcionamento relativamente estável das instituições democráticas. O Brasil chegou próximo de entrar em uma rota sustentável em que o desenvolvimento socioeconômico passasse a configurar um jogo de soma positiva, de modo a poder se desfrutar de uma melhor distribuição de seus recursos. Dar respostas aos anseios da população e fazer valer a arena eleitoral como o espaço em que se formam as maiorias que conferem legitimidade às decisões políticas foi um fator fundamental, sem o qual não se explica a adoção de tal ou qual política pelos partidos que assumiram o poder. Contudo, a instabilidade institucional instaurada após 2014 colocou em xeque a própria base de legitimidade das regras do jogo, sobre as quais passou a reinar uma significativa dose de desconfiança e incerteza, inclusive no que refere aos direitos mais básicos de uma democracia. Nesse sentido, se há algo de realmente decisivo para o futuro deste país é a capacidade de restaurar a confiança e o funcionamento estável de suas instituições democráticas.
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Notas