Pesquisa cientométrica da alocação de recursos públicos em diferentes campos do conhecimento

Scientometric research on the allocation of public resources in different fields of knowledge

Investigación cienciométrica sobre la asignación de recursos públicos en diferentes campos del conocimiento

Thiago Mateus Gavron
Programa de Pós-graduação em Ciência Política UFPR, Brasil
Elaine Cristina de Oliveira Menezes
Universidade Federal do Paraná, Brasil
Fabiano Maury Raupp
Universidade do Estado de Santa Catarina, Brasil

Pesquisa cientométrica da alocação de recursos públicos em diferentes campos do conhecimento

Administração Pública e Gestão Social, vol. 14, núm. 3, 2022

Universidade Federal de Viçosa

Recepción: 18 Noviembre 2021

Aprobación: 14 Abril 2022

Publicación: 22 Julio 2022

Resumo: Objetivo da pesquisa: Analisar comparativamente quais diferentes campos de conhecimento têm se dedicado ao estudo das dimensões do processo alocativo.

Enquadramento teórico: O estudo compreende a alocação de recursos públicos como as diferentes formas e sistemas de deliberações políticas sobre o processo de criação e distribuição de riquezas da sociedade, que se consubstanciam no orçamento e no planejamento público sob duas dimensões: sociopolítica e econômico-financeira.

Metodologia: Realizou-se uma revisão de literatura de escopo a partir de metadados, aplicando sobre eles análises estatísticas relacionais de pesquisa bibliográfica. Demonstrou-se as características do tópico de estudo escolhido por meio de recursos cientométricos a partir de um fluxo metodológico sistemático. Foram investigados metadados de 3438 artigos, publicados entre 2016 e 2021, presentes na Web of Science, analisados no software VOS Viewer, buscando identificar nessa literatura linhas mestras e lacunas mais visíveis nos diferentes campos do conhecimento.

Resultados: Os estudos enfatizam a dimensão econômico-financeira. Todavia, percebem-se mudanças, em especial, em pesquisas de países europeus e norte-americanos, que têm revelado preocupação com questões socioambientais, ancoradas na dimensão sociopolítica do processo alocativo.

Originalidade: Trata-se de um estudo cuja revisão de escopo é inédita, sobretudo, por considerar uma visão ampla do processo de alocação de recursos públicos em diferentes campos do conhecimento.

Contribuições teóricas e práticas: É salutar a concentração de esforços para o entendimento da temática da alocação de recursos públicos no sentido de verificar quais campos têm produzido estudos sobre suas possibilidades e se tais estudos têm incorporado as diferentes dimensões do processo alocativo. Nessa direção, a pesquisa contribui a partir do momento em que apresenta o que se tem publicado, quem os artigos cocitam, onde publicam, bem como a agenda de pesquisa que tem sido construída.

Palavras-chave: Alocação de recursos públicos, Revisão de escopo, Campos do conhecimento.

Abstract: Research objective: To analyze comparatively which different fields of knowledge have been dedicated to the study of the dimensions of the allocation process.

Theoretical framework: The study comprises the allocation of public resources as the different forms and systems of political deliberations on the process of creation and distribution of wealth in society, which are embodied in the budget and public planning under two dimensions: sociopolitical and economic-financial.

Methodology: A scope literature review was carried out based on metadata, applying relational statistical analyzes of bibliographic research on them. The characteristics of the chosen study topic were demonstrated through scientometric resources from a systematic methodological flow. Metadata of 3438 articles published between 2016 and 2021 present in the Web of Science were investigated, analyzed in the VOS Viewer software, seeking to identify in this literature guidelines and more visible gaps in different fields of knowledge.

Results: The studies emphasize the economic-financial dimension. However, changes can be seen, especially, in surveys from European and North American countries, which have revealed a concern with socio-environmental issues, anchored in the socio-political dimension of the allocation process.

Originality: This is a study whose scope review is unprecedented, especially for considering a broad view of the process of allocation of public resources in different fields of knowledge.

Theoretical and practical contributions: It is salutary to concentrate efforts to understand the issue of allocation of public resources in order to verify which fields have produced studies on their possibilities and whether such studies have incorporated the different dimensions of the allocation process. In this direction, research contributes from the moment it presents what has been published, who the articles cocite, where they publish, as well as the research agenda that has been built.

Keywords: Allocation of public resources, Scope review, Fields of knowledge.

Resumen: Objetivo de la investigación: Analizar comparativamente cuáles diferentes campos del conocimiento se han dedicado al estudio de las dimensiones del proceso de asignación.

Marco teórico: El estudio comprende la asignación de los recursos públicos como las diferentes formas y sistemas de deliberaciones políticas sobre el proceso de creación y distribución de la riqueza en la sociedad, que se plasman en el presupuesto y la planificación pública bajo dos dimensiones: sociopolítica y económico-financiera.

Metodología: Se realizó una revisión de la literatura de alcance a partir de metadatos, aplicando análisis estadísticos relacionales de la investigación bibliográfica sobre los mismos. Las características del tema de estudio elegido se demostraron a través de recursos cienciométricos a partir de un flujo metodológico sistemático. Se investigaron metadatos de 3438 artículos publicados entre 2016 y 2021 presentes en la Web of Science, analizados en el software VOS Viewer, buscando identificar en esta literatura pautas y brechas más visibles en diferentes campos del conocimiento.

Resultados: Los estudios enfatizan la dimensión económico-financiera. Sin embargo, se notan cambios, especialmente en investigaciones de países europeos y norteamericanos, que han revelado preocupación por temas socioambientales, anclados en la dimensión sociopolítica del proceso de asignación.

Originalidad: Se trata de un estudio cuya revisión de alcance no tiene precedentes, especialmente por considerar una visión amplia del proceso de asignación de recursos públicos en diferentes campos del conocimiento.

Aportes teóricos y prácticos: Es saludable concentrar los esfuerzos para comprender el tema de la asignación de los recursos públicos a fin de verificar qué campos han producido estudios sobre sus posibilidades y si dichos estudios han incorporado las diferentes dimensiones del proceso de asignación. En esta dirección, la investigación contribuye desde el momento en que presenta lo publicado, quiénes cocitan los artículos, dónde publican, así como la agenda de investigación que se ha construido.

Palabras clave: Asignación de recursos públicos, Revisión del alcance, Campos de conocimiento.

1 INTRODUÇÃO

Para fins deste estudo, compreende-se a alocação de recursos públicos de maneira ampla e que considera diferentes formas e sistemas de deliberações políticas sobre o processo de criação e distribuição de riquezas da sociedade, muitas delas capitaneadas pelo Estado e que contemple as especificidades de cada contexto e o horizonte temporal do longo prazo (Ramos, 1981; Ramos, 1989; Heidemann, 2016). Tais formas e sistemas se consubstanciam no orçamento e planejamento público sob duas dimensões: sociopolítica e econômico-financeira.

A dimensão sociopolítica é aquela em que a alocação de recursos é definida politicamente e é mais responsiva aos interesses da cidadania, envolvendo mecanismos de representação e participação da sociedade (Rourke, 1972). Já a dimensão econômico-financeira, é composta por inúmeros regramentos, classificações, prescrições e gestão dos recursos públicos no quadro do sistema de alocação de recursos públicos (Nóbrega, 2016).

Os desafios da alocação dos recursos públicos demonstram que esse processo deve ser cada vez mais preciso e amparado em fontes confiáveis. Tais desafios são potencializados quando se depara com um cenário de decadência do ciclo de prosperidade e crescimento econômico – final do século XX e início do século XXI – que demonstra sucessivas crises de diferentes naturezas, dentre elas, fiscal, política, cultural e ambiental. (Sachs, 2009, Sampaio, 2018). A conformação de mecanismos que articulem o planejamento de forma orgânica, observando lógicas de diferentes atores sociais, mostra-se um importante tópico para discussão.

É nesse contexto que se definiu a seguinte pergunta de pesquisa: Quais diferentes campos de conhecimento têm se dedicado ao estudo das dimensões do processo alocativo de recursos públicos? Para tanto, o objetivo do artigo consiste em analisar comparativamente quais diferentes campos de conhecimento têm se dedicado ao estudo das dimensões do processo alocativo de recursos públicos. Assim, realizou-se uma busca na base Web of Science, plataforma de pesquisa multidisciplinar com rígidos critérios de qualidade e impacto aos periódicos indexados. Após a realização de filtros, foram exportados os metadados do corpus de pesquisa final, trabalhados no software VOS Viewer.

Em termos de justificativas, destaca-se o fato de que se trata de estudo cuja revisão de escopo é inédita, sobretudo, por considerar uma visão ampla do processo de alocação de recursos públicos em diferentes campos do conhecimento. Nessa direção, a importância da pesquisa reside na contribuição do campo a partir do momento em que apresenta o que se tem publicado, quem os artigos cocitam, onde publicam, bem como a agenda de pesquisa que tem sido construída. A definição da string se pautou na abrangência a seu aparecimento em títulos, resumos e nas palavras-chave dos documentos. Por se tratar de estudo de caráter cientométrico, no qual o maior propósito é realizar science mappings (mapas da ciência), adotou-se modelo IMRAD (Introdução, Métodos, Resultados e Discussão). A revisão proposta vislumbra reduzir vieses interpretativas, utilizando protocolos de seleção de textos com estratégias mais estritas do que as das revisões narrativas e das revisões sistemáticas. Pautou-se na concepção dos diversos trabalhos já empreendidos nesse formato (Clemente et al., 2021; Codato, Lorencetti, & Bittencourt, 2019; Palludeto & Felipini, 2019).

2 MÉTODOS

Revisões de literatura informam o estado da arte dos principais estudos sobre um tema de interesse no intuito de avaliar e sintetizar os estudos publicados, bem como identificar as lacunas de conhecimento científico, mostrando como pesquisas futuras poderiam ser conduzidas (Paul & Criado, 2020). Elas devem demonstrar como a literatura está organizada segundo algum critério, que podem ser escolas de pensamento, métodos usados, questões de pesquisa, entre outros. (Walsh, 2006).

Embora esses elementos sejam relativamente comuns às diferentes modalidades de revisão de literatura, existem tipos distintos entre elas, sendo as mais conhecidas as revisões sistemática, metanalítica, bibliométrica, narrativa e de escopo (Grant & Booth, 2009). Nesse sentido, empreendeu-se uma pesquisa com abordagem quantitativa, de natureza exploratória, por meio de uma revisão de escopo que mobilizou métodos cientométricos, tendo em vista que o objetivo é apresentar as características mais gerais sobre o tema de interesse, tendo como técnica a pesquisa bibliográfica.

Foram utilizadas ferramentas bibliométricas, adaptando o fluxo metodológico (workflow) proposto por Zupic e Cater (2015), composto por cinco fases para pesquisas que envolvam mapas da produção científica (science mappings). A Figura 1 sintetiza os protocolos adotados.

Figura 1: Fluxo metodológico de pesquisa cientométrica
Figura 1: Fluxo metodológico de pesquisa cientométrica
Fonte: Adaptado de Zupic e Cater (2015).

Para a primeira etapa, elegeu-se a seguinte pergunta de pesquisa: Quais diferentes campos de conhecimento têm se dedicado ao estudo das dimensões do processo alocativo? Tal questão foi definida com base no objetivo, qual seja, é analisar comparativamente quais diferentes campos de conhecimento têm se dedicado ao estudo das dimensões do processo alocativo, a partir de uma revisão de escopo (Palludeto & Felipini, 2019).

Na segunda fase, que se refere à coleta de dados, realizou-se o acesso via Portal de Periódicos CAPES, a partir do login pela Comunidade Acadêmica Federada (CAFe), para busca e testagem de diferentes bases, ao passo que se optou pela Web of Science, tendo como população os dados explorados e extraídos dessa base. A motivação para essa escolha envolveu a multidisciplinariedade da base e os critérios de indexação de periódicos – elevada citação e fator de impacto em suas respectivas áreas – presentes na mesma. Com isso, alcançou-se a manifesta preocupação de acessar uma amostra expressiva das frentes contemporâneas (últimos cinco anos) de investigação sobre o tema, com a captura de uma parte qualificada da produção científica.

Após testagens, definiu-se a string de busca como financ* OR spent* OR "budget process" AND public AND "resourc* allocation", com abrangência a seu aparecimento em títulos, resumos e nas palavras-chave dos documentos. Enquanto uma requisição feita aos motores de busca das bases de dados automatizadas, a string se configura em uma expressão que opera segundo critérios lógicos no intuito de alcançar a literatura de interesse. Dessa forma, utilizou-se dos operadores booleanos -OR(OU)- e -AND(E)- sinalizando ao sistema palavras que direcionam a combinação de termos da pesquisa, além dos operadores de truncamento -”- (aspas) para correspondências exatas a termos compostos e -*- (asterisco) que apresenta diferentes sufixos aos termos.

Na sequência, passou-se a definição dos critérios de seleção do corpus da pesquisa, a partir da aplicação dos seguintes filtros: coleção principal da WoS; recorte de tempo de 2016 a 2021 (com propósito de apresentar o panorama contemporâneo da agenda de pesquisa); apenas artigos e revisões (meios de comunicação científica que absorvem mais rapidamente inovações e temas emergentes de pesquisa); e definição dos idiomas inglês, português e espanhol (possibilitando a leitura e interpretação pelos autores). Almejando a construção dos science mappings (mapas da ciência), exportaram-se os metadados de unidades bibliográficas, incluindo as listas de referências de citações.

No que tange à terceira fase, análise dos dados, foi imprescindível a escolha de um software bibliométrico compatível aos objetivos específicos da pesquisa e que fosse capaz de mensurar os conceitos mobilizados (cocitação de referências, acoplamento bibliográfico e coocorrência de palavras). Definiu-se pelo uso do VOSviewer na sua versão 1.6.16. O referido software opera com os metadados extraídos da base WoS e permite a visualização de redes bibliométricas, favorecendo a geração de mapas da produção científica.

Adiante, na etapa de tabulação dos resultados, permaneceu-se no referido software, operando grafos de coocorrência de palavras, acoplamento bibliográfico (de fontes e de documentos) e cocitação. Com destaque aos rígidos critérios para clusterização e visualização das redes, que ficam explícitos nas legendas dos mapas na seção de resultados. Na quinta e última etapa foi realizada a discussão balizada pelos resultados da pesquisa e da análise das redes, com interpretações alicerçadas nos dados, buscando evitar possíveis vieses. A apresentação dos resultados é realizada na próxima seção.

3 RESULTADOS

3.1 A primeira aproximação com o corpus

Inicialmente, foi realizada uma análise panorâmica sobre o corpus de pesquisa, na própria Web of Science. Verifica-se, na Tabela 1, que as 3.438 publicações foram realizadas por 7129 autores (média de coautoria de 2,0), alocados em 2731 organizações/instituições, com publicações em 134 revistas ou outras fontes.

Tabela 1: Características gerais das publicações
Web of ScienceVisão Geral dos resultados
Publicações3.438
Autores7.129
Revistas/Título de fonte134
Organizações/Instituições2731
Fonte: Elaborado pelos autores via Web of Sciense (2021).

Quanto às áreas com maior volume de publicações, notou-se a concentração da área de Administração Pública, mas com certa heterogeneidade entre as áreas de Ciências Ambientais, Economia e Negócios e Estudos Urbanos; bem como disciplinas ligadas ao campo do desenvolvimento, leis e governos, questões sociais, ciência e tecnologia. Nessa primeira aproximação aos estudos, verificou-se que os países de origem dos mesmos são predominantemente: Estados Unidos, Inglaterra, China e Austrália, com aproximadamente 1900 estudos. Observa-se que são países considerados referência em pesquisas e inovações do campo. Destaca-se que o Brasil é o único país latino-americano que aparece entre os 10 com maior volume de publicações, com aproximadamente 150 documentos.

3.2 O que se tem publicado?

A coocorrência de palavras recai sobre o mapa semântico da literatura e identifica quais são os conteúdos, os conceitos, as metodologias e os principais objetivos dos estudos, ao passo que exibe o que tem sido pesquisado e publicado. Na Figura 2, visualiza-se o mapa de ocorrência de palavras.

Figura 2: Rede de coocorrência de palavras-chave
Figura 2: Rede de coocorrência de palavras-chave
Fonte: Elaborado pelos autores via VOSviewer (2021).

Nota: Método de contabilização: Completa (full counting: cada vínculo de coocorrência terá o mesmo peso na conformação do mapa). Número mínimo de ocorrências: 20. Obtendo-se 213 palavras selecionadas. Clusterização: Mínimo de 15 nós, formando 4 clusters. Método de normalização: LinLog/Modularity. Visualização por ocorrências.

Foram identificados quatro clusters, com as seguintes características semânticas:

3.3 Quem os artigos (co)citam?

A análise de cocitação de referências é um valioso caminho para observar as estruturas intelectuais que compreendem a temática da alocação de recursos públicos. Essa análise busca revelar sobre quem os documentos se apoiam, ou seja, a literatura de base e fundação intelectual. Tal métrica mostra as aproximações conceituais e metodológicas guardadas entre os estudos, dada sua ocorrência paralela em outros trabalhos (Grácio, 2016). A Figura 3 permite observar a estrutura do conhecimento que está por trás dos estudos que incorporam o corpus de análise.

Figura 3: Rede de cocitação de autores
Figura 3: Rede de cocitação de autores
Fonte: Elaborado pelos autores via VOSviewer (2021)

Nota: Contabilização completa (full counting: cada vínculo do acoplamento terá o mesmo peso na conformação do mapa). Número mínimo de ocorrências: 40. Obtendo-se 205 autores para análise, alocados em 5 clusters. Método de normalização: Association Strength. Unidade de análise: lista de referências bibliográficas. Método de contabilização: Visualização por força total de conexão (total link strength).

Observam-se cinco clusters, com destaque para:

3.4 Onde se publica?

O acoplamento bibliográfico de fontes mostra que quanto maior o volume de ocorrências entre veículos de publicação cocitados, maior a proximidade entre as fontes (Palludeto & Felipini, 2019). Ao se observar em quais fontes (em geral revistas científicas) acontecem as publicações sobre finanças e alocação de recursos públicos, observa-se as afinidades de abordagens e subsidia-se a leitura de como está a estrutura institucional do "domínio intelectual” dessa temática, oferecendo uma mostra de sua relação com o campo da Administração Pública. Fontes e demais meios de comunicação e veiculação científica, possuem escopos, missões, parâmetros e critérios que balizam a produção indexada. Averiguar a alocação dos trabalhos é averiguar a proximidade temática e de ideias deles. A Figura 4 apresenta o mapa gerado.

Figura 4: Rede de acoplamento bibliográfico de fontes
Figura 4: Rede de acoplamento bibliográfico de fontes
Fonte: Elaborado pelos autores via VOSviewer (2021).

Nota: Contabilização completa (full counting: cada vínculo do acoplamento terá o mesmo peso na conformação do mapa). Número mínimo de documentos por fonte: 5. Número mínimo de citações por fonte: 5. Obtendo-se 107 artigos de corpus de análise, alocados em 4 clusters. Método de normalização: LinLog/Modularity. Unidade de análise: fontes (revistas - aglutinadas por bibliografias compartilhadas). Método de contabilização: Visualização por força total de conexão (total link strength).

Observam-se quatro clusters, com destaque para:

3.5 Qual a agenda de pesquisa?

Operando de forma oposta da cocitação, que forma uma rede na qual os “nós” são as referências citadas, a análise acoplamento bibliográfico de documentos mensura o vínculo existente entre os artigos do corpus de análise a partir da quantidade de referências citadas paralelamente por dois ou mais artigos. Nesse caso, os “nós” são os próprios artigos citantes que se ligam pela força de conexão dada pela quantidade de citações partilhadas em suas listas de referências bibliográficas (Grácio, 2016). Essa medida é a ideal quando se deseja captar as agendas de pesquisa de uma dada literatura, sendo, nesse caso, concernente à temática de alocação de recursos públicos. Para abordar o arcabouço da literatura que contempla essa discussão, apresenta-se, inicialmente, a Figura 5.

Figura 5: Rede de acoplamento bibliográfico de documentos
Figura 5: Rede de acoplamento bibliográfico de documentos
Fonte: Elaborado pelos autores via VOSviewer (2021).

Nota: Método de contabilização: Contabilização completa (full counting: cada vínculo do acoplamento terá o mesmo peso na conformação do mapa). Número mínimo de citações por cada documento: 40, obtendo-se 194 artigos de corpus de análise. A rede está formada por 179 documentos conectados entre si, formando 5 clusters. Método de normalização: LinLog/Modularity. Clusterização: Mínimo de 15 nós. Visualização por citação.

Com o mapa gerado, observa-se a presença de cinco comunidades:

4 DISCUSSÕES

Por meio das análises empreendidas até aqui, verificam-se termos de agendas de pesquisas, bem como termos mais frequentes, conteúdos e artigos, conforme Figura 6.

Figura 6: Síntese da análise cientométrica
Figura 6: Síntese da análise cientométrica
Fonte: Elaborado pelos autores (2021).

Observa-se que a agenda de pesquisa está centrada em compreender performance e governança, sendo uma parte significativa dos estudos. No que se refere aos conteúdos, têm-se centrado esforços em compreender as reformas do aparelho do Estado, bem como aspectos da parceria público-privada.

Outra agenda evidenciada no estudo foi a de políticas e gestão de crises, focadas em compreender aspectos da gestão de crises financeiras, integração regional, políticas de alocação de recursos públicos. Essas duas primeiras agendas se concentram na dimensão econômico-financeira do processo alocativo, cujas técnicas, instituições e aspectos econômicos são centrais. Evidenciam também que as tendências gestadas no campo da adminsitração pública são ainda predominantes.

A terceira agenda está centrada em estudos sobre inovação e tecnologia, com foco em temas como energia renovável, tecnologias da comunicação e informação, bem como as questões de economia compartilhada, ancoradas na dimensão sociopolítica do processo alocativo, evidenciando preocupação com a agenda socioambiental. Há uma quarta agenda focada em estudos regionais e governos locais, cujos temas principais buscam compreender as dinâmicas dos governos locais, a austeridade, a transparência, as questões fiscais e orçamentárias, ancorando-se na dimensão sociopolítica do processo alocativo, visto que mobiliza questões de governança e accountability.

A quinta agenda está relacionada às políticas climáticas e ao desenvolvimento sustentável, demonstrando que a preocupação com a problemática socioambiental tem se inserido no contexto desse campo de estudo da administração pública. As três últimas agendas apresentam aspectos da dimensão econômico-financeira, mas já demonstram abertura para a dimensão sociopolítica do processo alocativo.

Tais achados de pesquisa demonstram que a alocação de recursos públicos permeia várias disciplinas, denotando a sua complexidade. A literatura sobre planejamento é considerada, por Pagnussat (2006), como um campo de pensamento com diferentes correntes, sintetizados em: (i) análise de políticas; (ii) aprendizagem social; (iii) reforma social; e (iv) mobilização social. Essas abordagens têm demonstrado que não há uma única corrente de pensamento predominante, mas sim, a hibridização delas na prática. As predições e prescrições típicas do campo do planejamento, tanto o planejamento para o desenvolvimento quanto o planejamento governamental, podem ser o ponto de partida para uma análise mais ampla do quadro alocativo (Menezes et al., 2020).

Todavia, o contexto do século XXI prescinde a qualquer teorização que empreenda compreender novas alternativas de alocação de recursos públicos, atentando-se às diferenças dos sistemas de produção (Ramos, 1981; Heidemann, 2016). É preciso considerar, assim, uma variedade e multiplicidade de elementos que envolvem tais processos, o que, para Heidemann (2016, p. 201), “tem relação com estruturas e sistemas diferentes daqueles que se centram no modelo de mercado, pois não há um sistema exclusivo ou único para determinar o processo alocativo”.

O presente artigo corrobora com a perspectiva de que a alocação de recursos públicos, de forma ampla, é composta por diferentes maneiras e sistemas de deliberações políticas sobre o processo de criação e distribuição de riquezas da sociedade, muitas delas capitaneadas pelo Estado e que contemple as especificidades de cada contexto e o horizonte temporal do curto, médio e longo prazo (Ramos, 1981; Heidemann, 2016). Essa visão prescinde da compreensão de que o processo alocativo é composto por duas dimensões: a econômico-financeira e a sociopolítica. Nota-se, por meio do estudo cientométrico, a predominância de estudos que centram esforços em compreender a dimensão econômico-financeira do processo alocativo. Todavia, percebe-se um avanço acerca da dimensão sociopolítica, tanto em termos de quantidade quanto em termos de abrangência territorial.

A predominância de estudos da dimensão econômico-financeira está na pressão gerada pelo processo de globalização das economias, bem como na necessidade das reformas e no processo de democratização dos países latino-americanos, os quais contribuíram para aumentar a demanda por reformas institucionais (Ferlie et al., 1999). Esse movimento global fez ampliar estudos do campo da administração pública. Todavia, as reformas do aparelho do Estado, engendradas desde 1980, demonstraram inúmeros limites em diferentes países, em especial nos latino-americanos, bem como tiveram diferentes impactos em diferentes contextos territoriais. Dessa forma, considera-se relevante pesquisas sobre a dimensão sociopolítica do processo alocativo, sendo um campo em ascensão.

Do ponto de vista espacial e territorial, a distribuição de estudos no mundo demonstra que os países ocidentais foram os que colocaram maior esforço nas reformas, como EUA, Inglaterra, Austrália e Alemanha, capitaneadas pelo Banco Mundial, pelo Fundo Monetário Internacional, dentre outros organismos internacionais (Ferlie et al., 1999; Cavalcante, 2017). Embora já se percebam estudos na China e mesmo em países como o Brasil, que é o único país latino-americano que aparece entre os 10 com maior volume de publicações.

5 CONCLUSÕES

O objetivo do artigo consistiu em analisar comparativamente quais diferentes campos de conhecimento têm se dedicado ao estudo das dimensões do processo alocativo de recursos públicos. Buscou-se realizar uma revisão de literatura de escopo a partir de metadados extraídos informacionalmente, aplicando sobre eles análises estatísticas relacionais de pesquisa bibliográfica. Demonstrou-se as características do estudo por meio de recursos cientométricos a partir de um fluxo metodológico sistemático.

Trata-se de um estudo com limitações à sua natureza como, por exemplo, o enviesamento dado pelo próprio repositório bibliográfico escolhido: Web of Science. Os resultados alcançados não representam a globalidade da produção de conhecimento e, por esse motivo, não podem ser generalizados para todos os campos de estudo, cuja produção científica absorvida é hegemonicamente em língua inglesa.

Conclui-se, em relação ao local de publicação, que aqueles vinculados ao campo do Planejamento Urbano e Regional possuem destaque em dois clusters .Regional Studies no clusterverde e Housing Studies e a International Journal of Urban and Regional Research no cluster azul). Tal constatação traz subsídio para afirmar que essa temática tem sido mais explorada nesse campo. Embora esse destaque para as revistas do campo do Planejamento Urbano e Regional não seja surpreendente, era de se esperar também um maior destaque para os periódicos do campo da Economia e da Administração Pública. Desse modo, os resultados abrem espaço para uma discussão sobre quem (qual campo do conhecimento) pauta a discussão sobre processo alocativo dos recursos públicos e, ao mesmo tempo, encoraja o desenvolvimento de pesquisas futuras.

Foi possível verificar que os estudos têm centrado esforços em compreender a dimensão econômico-financeira do processo alocativo. Conclui-se que a dimensão sociopolítica ainda é marginalizada, embora apareça com temas em três das cinco agendas investigadas na revisão de escopo. Percebe-se que, pouco a pouco, a dimensão sociopolítica do processo alocativo tem ganhado espaço, mas que ainda são insuficientes para compreender a sua complexidade e a interconexão com a dimensão econômico-financeira do processo alocativo.

A principal contribuição do artigo está em concentrar esforços no entendimento da temática da alocação de recursos públicos e na compreensão de quais campos têm produzido estudos e se tais estudos têm incorporado as diferentes dimensões do processo alocativo como, por exemplo, a sociopolítica e a econômico-financeira. Contribui no sentido de apresentar o que se tem publicado, quem os artigos cocitam, onde publicam, bem como a agenda de pesquisa que tem sido construída no campo da alocação de recursos públicos.

Os debates sobre alocação de recursos públicos têm colocado em evidência a complexidade do processo alocativo estatal. A literatura, os aspectos normativos e institucionais têm demonstrado que a dimensão econômico-financeira é a preocupação predominante dos governos. Tal constatação, pode explicar, em parte, a tendência das pesquisas e dos campos do conhecimento concentrarem esforços em compreender a dimensão econômico-financeira do processo alocativo.

Cabe destacar a necessidade de ampliação da agenda de pesquisa, incluindo estudos sobre a dimensão sociopolítica do processo alocativo. Todo esse contexto demonstra que tanto os problemas públicos apresentados pela modernidade quanto os diferentes campos das políticas públicas tornam o tema complexo, sendo necessárias análises intersetoriais, articuladas e baseadas em evidências, pautadas no princípio de limites (precaução) e da equidade intergeracional. Assim, o campo de estudo da alocação de recursos é um campo interdisciplinar que deverá absorver diferentes contribuições de diferentes disciplinas, aspecto que foi evidenciado no presente artigo.

REFERÊNCIAS

Aalbers, M. B. (2017). The Variegated Financialization of Housing. Int. J. Urban Reg., 41(4), 542-554. https://doi.org/10.1111/1468-2427.12522

Alcaide Muñoz, L., Rodríguez Bolívar, M. P., López Hernández, A. M. (2017). Transparency in Governments: A Meta-Analytic Review of Incentives for Digital Versus Hard-Copy Public Financial Disclosures. The American Review of Public Administration, 47(5), 550-573. https://doi.org/10.1177/0275074016629008

Arundel, R. (2017). Equity Inequity: Housing Wealth Inequality, Inter and Intra-generational Divergences, and the Rise of Private Landlordism, Housing. Theory and Society, 34(2), 176-200. https://doi.org/10.1080/14036096.2017.1284154

Bresser-Pereira, L. C. (1997). Estratégia e estrutura para um novo Estado. Revista de Economia Política, 17(3), 24-30.

Cavalcante, P. (2017). Gestão Pública Contemporânea. do movimento gerencialista ao pós-NPM. Rio de Janeiro: IPEA.

Cepiku, D., Mussari, R., Giordano, F. (2016). Local Governments Managing Austerity: Approaches, Determinants and Impact. Public Administration, 94(1), 223-243. https://doi.org/10.1111/padm.12222

Clemente, A. Jr., Rejane Chitolina Perini, M., dos Santos, D., Nabolotnyj Martinez, I., Santos da Rosa, C., Mateus Gavron, T. (2021). Smart cities: Uma revisão de escopo no campo das ciências sociais (2015-2020). Revista Brasileira de Informação Bibliográfica em Ciências Sociais, 1(96), 1–28. https://doi.org/10.17666/bib9604/2021

Codato, A., Lorencetti, M., Bittencourt, M. (2019). Política da ciência na ciência da política: um estudo sobre a internacionalização da literatura sobre mulheres na América Latina. Anais do Encontro da ANPOCS, 43.

Ferlie, E. et al. (1999). A nova administração pública em ação. Brasília: UnB/ENAP.

Grácio, M. C. C. (2016). Acoplamento bibliográfico e análise de (co)citação: revisão teórico conceitual. Encontros Bibli: Revista eletrônica de biblioteconomia e ciência da informação, 21(47), 82-99.

Gautam, Y., Andersen, P. (2016). Rural livelihood diversification and household well-being: Insights from Humla, Nepal. Journal of Rural Studies, 44(1), 239-249. https://doi.org/10.1016/j.jrurstud.2016.02.001

Genschel, P., & Jachtenfuchs, M. (2016). More integration, less federation: The European integration of core state powers. Journal of European Public Policy, 23(1), 42-59. https://doi.org/10.1080/13501763.2015.1055782

Grant, M. J., Booth, A. (2009). A typology of reviews: An analysis of 14 review types and associated methodologies. Health Information and Libraries Journal, 26(2), 91-108. https://doi.org/10.1111/j.14711842.2009.00848.x

He, B. J., Zhao, D. X., Zhu, J., Darko, A., Gou, Z. H. (2018). Promoting and implementing urban sustainability in China: An integration of sustainable initiatives at different urban scales. Habitat International, 82(1), 83-93. https://doi.org/10.1016/j.habitatint.2018.10.001

Heidemann, F. G. (2016). Formas de Alocação de Recursos no Brasil: elementos analíticos inescusáveis, segundo Guerreiro Ramos. Ilha, 18(1), 185-204.

Hodge, G. A., Greve, C. (2017). On Public–Private Partnership Performance: A Contemporary Review. Public Works Management & Policy, 22(1), 55-78. https://doi.org/10.1177/1087724X16657830

Höhne, N., Kuramochi, T., Warnecke, C., Röser, F., Fekete, H., Hagemann, M., Day, T., Tewari, R., Kurdziel, M., Sterl, S., Gonzales, S. (2017). The Paris Agreement: resolving the inconsistency between global goals and national contributions. Climate Policy, 17(1), 16-32. https://doi.org/10.1080/14693062.2016.1218320.

Lo, K., Xue, L., Wang, M. (2016). Spatial restructuring through poverty alleviation resettlement in rural China. Journal of Rural Studies, 47(1), 496-505. https://doi.org/10.1016/j.jrurstud.2016.06.006

Mazzucato, M., Semieniuk, G. (2018). Financing renewable energy: Who is financing what and why it matters. Technological Forecasting and Social Change, 127(1), 8-22. https://doi.org/10.1016/j.techfore.2017.05.021

Menezes, E. C. O. et al. (2020). Planejamento Municipal em Debate: Trajetória e Prioridades no Município de Florianópolis. Administração Pública e Gestão Social, 12(1), 1-23.

Murillo, D., Buckland, H., Val, E. (2017). When the sharing economy becomes neoliberalism on steroids: Unravelling the controversies. Technological Forecasting and Social Change, 125(1), 66-76. https://doi.org/10.1016/j.techfore.2017.05.024

Nóbrega, M. (2016). Construção e desmonte das instituições fiscais. In Salto, F., Almeida, M. Finanças públicas: da contabilidade criativa ao resgate da credibilidade. Rio de Janeiro: Record.

Pagnussat, J. L. (2006). Introdução. In Giacomoni, J., Pagnussat, J. L. (Org). Planejamento e Orçamento governamental. Brasília: ENAP.

Palludeto, A. W. A., Felipini, A. R. (2019). Panorama da literatura sobre a financeirização (1992-2017): uma abordagem bibliométrica. Econ. soc., 28(2), 313-337.

Paul, J., Criado, A. R. (2020). The art of writing literature review: What do we know and what do we need to know? International Business Review, 29(4).

Ramos, A. G. (1981). Problemas alocativos da economia brasileira. Jornal do Brasil, 2.

Ramos, A. G. (1989). A nova ciência das organizações: uma reconceituação da riqueza das nações. Rio de Janeiro: FGV.

Rourke, F. (1972). Bureaucratic power in national politics. Boston: Little, Brown.

Sachs, I. (2009). A terceira margem. em busca do ecodesenvolvimento. São Paulo: Companhia das Letras.

Sampaio, D. P. (2018). Economia Brasileira No Início Do Século XXI: Desaceleração, Crise e Desindustrialização (2000-2017). Semestre Económico, 22(50), 107-128.

Tchamyoua, V. S., Erreygers, G., Cassimon, D. (2019). Inequality, ICT and financial access in Africa. Technological Forecasting and Social Change, 139(1), 169-184.

Wang, H., Xiong, W., Wu, G., Zhu, D. (2018). Public–private partnership in Public Administration discipline: a literature review. Public Management Review, 20(2), 293-316. https://doi.org/10.1080/14719037.2017.1313445.

Walsh, J. I. (2006). A Guide to Writing Literature Reviews in Political Science and Public Administration. Recuperado de https://politicalscience.charlotte.edu/sites/politicalscience.charlotte.edu/files/media/docs/litreviews.pdf, em 18 de junho de 2022.

Wossen, T., Abdoulaye, T., Alene, A., Haile, M. G., Feleke, S., Olanrewaju, A., Manyong, V. (2017). Impacts of extension access and cooperative membership on technology adoption and household welfare. Journal of Rural Studies, 54(1), 223-233. https://doi.org/10.1016/j.jrurstud.2017.06.022

Zupic, I., Cater, T. (2015). Bibliometric methods in management and organization. Organizational Research Methods, 18(3), 429-472.

Notas

[1] Caracterizada por ser orientada “para o cidadão e para a obtenção de resultados; pressupõe que os políticos e os funcionários públicos são merecedores de um grau real ainda que limitado de confiança; como estratégia, serve-se da descentralização e do incentivo à criatividade e à inovação; o instrumento mediante o qual se faz o controle sobre os órgãos descentralizados é o contrato de gestão” (Bresser-Pereira, 1997, p. 30).
HTML generado a partir de XML-JATS4R por