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Espiritualidade no Trabalho: Um Modelo de Mensuração para Organizações Públicas Brasileiras
Spirituality at Work: A Measurement Model for Brazilian Public Organizations
Espiritualidad en el Trabajo: Un Modelo de Medición para las Organizaciones Públicas Brasileñas
Administração Pública e Gestão Social, vol. 15, núm. 1, 2023
Universidade Federal de Viçosa

Artigos


Recepción: 03 Diciembre 2021

Aprobación: 05 Junio 2022

Publicación: 20 Enero 2023

Resumo: Objetivo da pesquisa: Propor um modelo de mensuração da espiritualidade no trabalho para organizações públicas brasileira.

Enquadramento teórico: Utilizou-se o conceito e o modelo estruturados por Ashmos e Duchan (2000), visto que esses autores trazem a definição mais utilizada nas publicações acadêmicas sobre o assunto.

Metodologia: Realizou-se a validação de um modelo de mensuração da espiritualidade no trabalho, aplicado em uma organização pública brasileira, por meio da análise fatorial exploratória e confirmatória. Os dados foram obtidos por meio de levantamento (survey).

Resultados: Um modelo de mensuração da espiritualidade no trabalho para organizações públicas brasileiras, contendo 16 variáveis, para o qual considerou-se, além do resultado da validação, as argumentações teóricas, estatísticas e práticas, visando a adequação ao contexto dessas organizações.

Originalidade: Considerando que não foram encontrados na literatura modelos desenvolvidos para a mensuração da espiritualidade no trabalho em organizações públicas, o modelo proposto neste estudo busca preencher essa lacuna.

Contribuições teóricas e práticas: Além de buscar preencher uma lacuna da literatura, o modelo proposto busca possibilitar a mensuração da espiritualidade no trabalho em organizações públicas brasileiras, auxiliando os gestores públicos na tomada de decisão quanto à implantação ou à avaliação de políticas e de ações relacionadas ao desenvolvimento desse constructo.

Palavras-chave: Espiritualidade no trabalho, Validação de modelo de mensuração, Organizações públicas brasileiras.

Abstract: Research objective: To propose a model for measuring spirituality at work for Brazilian public organizations.

Theoretical framework: The concept and model structured by Ashmos and Duchan (2000) were used, as these authors bring the definition most used in academic publications on the subject.

Methodology: A validation of a model for measuring spirituality at work was carried out, applied in a Brazilian public organization, through exploratory and confirmatory factor analysis. Data were obtained through a survey.

Results: A model for measuring spirituality at work for Brazilian public organizations, containing 16 variables, for which, in addition to the validation result, theoretical, statistical and practical arguments were considered, aiming at adapting to the context of these organizations.

Originality: Considering that no models developed to measure spirituality at work in public organizations were found in the literature, the model proposed in this study seeks to fill this gap.

Theoretical and practical contributions: In addition to seeking to fill a gap in the literature, the proposed model seeks to enable the measurement of spirituality at work in Brazilian public organizations, helping public managers in decision making regarding the implementation or evaluation of policies and related actions to the development of this construct.

Keywords: Spirituality at work, Validation of a measurement model, Brazilian public organizations.

Resumen: Objetivo de la investigación: Proponer un modelo de medición de la espiritualidad en el trabajo para las organizaciones públicas brasileñas.

Marco teórico: Se utilizó el concepto y modelo estructurado por Ashmos y Duchan (2000), ya que estos autores traen la definición más utilizada en las publicaciones académicas sobre el tema.

Metodología: Se realizó una validación de un modelo para medir la espiritualidad en el trabajo, aplicado en una organización pública brasileña, a través de análisis factorial exploratorio y confirmatorio. Los datos se obtuvieron a través de una encuesta.

Resultados: Un modelo de medición de la espiritualidad en el trabajo para las organizaciones públicas brasileñas, que contiene 16 variables, para lo cual, además del resultado de la validación, se consideraron argumentos teóricos, estadísticos y prácticos, con el objetivo de adaptarse al contexto de estas organizaciones.

Originalidad: Considerando que no se encontraron en la literatura modelos desarrollados para la medición de la espiritualidad en el trabajo en las organizaciones públicas, el modelo propuesto en este estudio busca llenar ese vacío.

Contribuciones teóricas y prácticas: Además de buscar llenar un vacío en la literatura, el modelo propuesto busca posibilitar la medición de la espiritualidad en el trabajo en las organizaciones públicas brasileñas, ayudando a los gestores públicos en la toma de decisiones sobre la implementación o evaluación de políticas y acciones relacionadas. al desarrollo de este constructo.

Palabras clave: Espiritualidad en el trabajo, Validación de un modelo de medición, Organizaciones públicas brasileñas.

INTRODUÇÃO

A partir dos anos 90, os métodos mecanicistas e burocráticos da antiga Administração de Recursos Humanos passam a ser questionados, e a importância da subjetividade nos modelos de Gestão com Pessoas passa a ser reconhecida (Dalvel & Vergara, 2010). Na Gestão Pública, o processo não é diferente, considerando os novos preceitos constitucionais da recém promulgada Constituição Federal de 1988 e os movimentos reformistas, que buscam incorporar o gerencialismo baseado nos princípios da new public management (Costa, 2008).

Para Ashmos e Duchan (2000), nesse período, passa a ocorrer uma transformação que ultrapassa a visão dos sistemas racionais e dá espaço a uma visão que busca o significado e o propósito do trabalho. Os autores chamam essa transformação de “movimento espiritual”, a qual faz surgir o constructo da espiritualidade no trabalho no ambiente organizacional. Ressalta-se que a espiritualidade não deve ser confundida com religiosidade, pois não é dogmática, tampouco segue um sistema de crenças institucionalizado. A espiritualidade não se trata de uma questão teológica, mas multidisciplinar, que tem como objetivo a experimentação de um senso de propósito pessoal alicerçado na interioridade e no autoconhecimento de cada indivíduo (Dias, Garin, & Timm, 2011).

Diversos estudos apontam a relação positiva e benéfica existente entre a espiritualidade no trabalho e o desempenho organizacional (Duchon & Plowman, 2005; Garcia-Zamor, 2003; Jurkiewicz & Giacalone, 2004; Karakas, 2010; Milliman, Czaplewski, & Ferguson, 2003; Rego, Cunha, & Souto, 2007). Contudo, verificou-se que a grande maioria dos estudos acerca da espiritualidade no trabalho possui foco em empresas privadas (Ashmos & Duchan, 2000; Dent, Higgins, & Wharff, 2005; Duchon & Plowman, 2005; Fry & Slocum, 2008; Garcia-Zamor, 2003; Jurkiewicz & Giacalone, 2004; Milliman et al., 2003; Rego et al., 2007; Tecchio, 2015), sendo que Bruce (2000) alerta para a necessidade da apropriação da espiritualidade no trabalho pelo setor público. Com isso, esta pesquisa tem a pretensão de contribuir com a gestão de pessoas de organizações públicas, uma vez que essas instituições também necessitam acompanhar as inevitáveis mudanças do mundo do trabalho, proporcionando o bem-estar dos seus servidores e, por conseguinte, a otimização de seu desempenho organizacional.

Nesse sentido, considerando que não foram encontrados na literatura modelos desenvolvidos para a mensuração desse constructo em organizações públicas, o presente estudo tem como objetivo apresentar uma proposta de modelo de mensuração da espiritualidade no trabalho para a Administração Pública brasileira. Para tanto, realizou-se uma pesquisa com abordagem quantitativa, mediante um levantamento (survey) materializado pela aplicação e validação do modelo de espiritualidade no trabalho de Ashmos e Duchon (2000), com suas dimensões: senso de comunidade, trabalho com significado e vida interior, aos Técnico-Administrativos em Educação (TAEs) da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Optou-se pela utilização do modelo de Ashmos e Duchon (2000), pois, ainda que se trate de um modelo seminal, os avanços e adaptações desse modelo ocorreram baseados na sua aplicação em organizações privadas (Milliman et al., 2003; Rego et al., 2007; Tecchio, 2015), sendo, portanto, prudente a utilização do modelo original no contexto púbico, visando ao avanço incremental do constructo dentro desse novo contexto.

O resultado deste estudo tem a pretensão de possibilitar o levantamento da espiritualidade no trabalho dos servidores das organizações públicas brasileiras, sendo esse levantamento o primeiro passo para a tomada de decisão quanto à implantação ou à avaliação de políticas e de ações que visem ao desenvolvimento desse constructo nessas instituições, tendo em vista o seu reflexo positivo sobre o desempenho organizacional.

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Considerar a subjetividade nos processos que relacionam trabalho e indivíduo significa compreender que as pessoas são dotadas de uma vida interior fruto de sua história pessoal e social e que, além disso, vivem em constante interação (senso de comunidade) e mutação. O reconhecimento da interioridade dos seres humanos dentro da gestão com pessoas é fundamental para o sucesso e para a sobrevivência das instituições, pois o indivíduo possui valor diferenciado, já que é o único capital capaz de combinar emoção e razão, subjetividade e objetividade (Davel & Vergara, 2010).

Como o indivíduo é um ser dotado de vida interior ou um ser espiritual, emerge a necessidade do reconhecimento da espiritualidade no ambiente de trabalho como uma teoria a ser difundida dentro da gestão com pessoas, visto que não se pode mais ignorar o espírito humano no trabalho, pois isso, de certa forma, seria desprezar o real significado do que é “ser humano” (Ashmos & Duchon, 2000). Rego, Cunha e Souto (2007) ratificam essa informação, alertando que pessoas não querem ser vistas como dentes de uma engrenagem desumanizada; ao contrário disso: querem ser tratadas de forma digna e respeitosa. Os autores também salientam que, provavelmente, ao realizarem um trabalho com significado, os trabalhadores o transformam em “vocação”, tornando-o mais do que um simples “emprego”. A consequência disso é uma entrega holística ao trabalho (física, mental, emocional e espiritual).

Para Tecchio (2015, p. 47), a partir da análise de estudos teóricos (Ashmos & Duchan, 2000; Duchon & Plowman, 2005; Garcia-Zamor, 2003; Karakas, 2010), quatro foram os principais indutores responsáveis pelo desenvolvimento e pela incorporação da espiritualidade no ambiente organizacional, quais sejam: “a busca de sentido na realização do trabalho, a melhoria do desempenho organizacional, a reação à ganância corporativa e a necessidade de conexão com outras pessoas”.

A espiritualidade no trabalho gera benefícios tanto para os trabalhadores quanto para a organização. Tal situação é ratificada pelos autores que apresentam em seus estudos a relação positiva e benéfica entre a espiritualidade e fatores que impactam o desempenho organizacional, como: o comprometimento organizacional (Duchon & Plowman, 2005; Garcia-Zamor, 2003; Jurkiewicz & Giacalone, 2004; Karakas, 2010; Milliman et al., 2003; Rego et al., 2007), a satisfação no trabalho (Duchon & Plowman, 2005; Garcia-Zamor, 2003; Milliman et al., 2003; Rego et al., 2007), o pertencimento organizacional (Garcia-Zamor, 2003; Karakas, 2010), a produtividade (Duchon & Plowman, 2005; Garcia-Zamor, 2003; Karakas, 2010; Rego et al., 2007), a redução da rotatividade (Duchon & Plowman, 2005; Milliman et al., 2003; Rego et al., 2007) e a redução do absenteísmo (Duchon & Plowman, 2005).

Além disso, indivíduos com espiritualidade acentuada são mais cientes do significado que conferem à vida, são entregues às atividades a que se propõem, incentivam a conexão entre a comunidade e compartilham sentimentos de plenitude e alegria. À luz das evidências teóricas e empíricas, é possível vislumbrar que ambientes espiritualizados podem conduzir a desempenhos individuais e organizacionais mais elevados, promovendo a autoeficácia, o otimismo, a esperança, a motivação, a redução de conflitos, a diminuição do estresse, o reconhecimento, a satisfação no alcance dos resultados, entre outros (Garcia-Zamor, 2003; Karakas, 2010; Rego et al., 2007). Compreende-se, por fim, que a espiritualidade no trabalho é um dos caminhos para enfrentar as situações adversas da vida social, além de otimizar o desempenho organizacional (Ashmos & Duchon, 2000; Garcia-Zamor, 2003; Karakas, 2010; Rego et al., 2007).

Neste estudo, optou-se por utilizar o conceito estruturado por Ashmos e Duchan (2000), visto que trazem a definição mais utilizada nas publicações acadêmicas sobre o assunto, explicando a espiritualidade no trabalho por meio de três componentes: “a vida interior, o significado no trabalho e a comunidade”. Os autores definem o tema como “o reconhecimento de que os empregados têm uma vida interior que nutre e é nutrida pela realização de um trabalho com significado em um contexto de comunidade” (Ashmos & Duchan, 2000, p. 137).

Modelo de Espiritualidade no Trabalho de Ashmos e Duchon (2000)

Com o objetivo de dar suporte empírico à observação e à medição do construto da espiritualidade no trabalho, Ashmos e Duchon (2000) propuseram um modelo baseado na revisão da literatura existente. Nessa revisão, chegaram a várias possibilidades de dimensões para mensuração da espiritualidade no trabalho, contudo, quando interpretadas, resumiram-se a três: a vida interior, o trabalho com significado e o senso de comunidade.

Na proposta inicial de Ashmos e Duchon (2000), uma lista de itens foi desenvolvida (variáveis), sendo ela revisada por acadêmicos, por especialistas em desenvolvimento de organizações, por um ex-diretor executivo de um grande hospital e por vários membros da comunidade empresarial local, que concordaram com a proposta.

O modelo de questionário inicial foi dividido em três partes. A parte 1 tratava do nível individual, abordando atitudes dos informantes sobre si mesmos. Na parte 2, os informantes eram questionados sobre a sua unidade de trabalho (setor) dentro da organização e, na parte 3, eram abordadas questões sobre a organização como um todo. Após a aplicação do modelo, os dados foram submetidos à análise fatorial, utilizando como técnica de extração a fatoração por verossimilhança máxima com a rotação de fatores do tipo Varimax (Ashmos & Duchon, 2000).

Com isso, concluiu-se que as partes 2 (nível da unidade de trabalho) e 3 (nível organizacional), propostas no modelo, não apresentavam estrutura fatorial satisfatória e atraente quando comparadas à parte 1 (nível individual). Segundo os autores, isso se deu pelo fato de ser conceitualmente mais fácil responder perguntas sobre si mesmo do que projetar as características questionadas sobre a unidade de trabalho ou sobre a organização, já que a relação espiritual dos indivíduos com esses locais é ainda mais sutil e abstrata (Ashmos & Duchon, 2000).

Mantiveram-se, portanto, apenas as variáveis que compunham a parte 1 do questionário. Porém, além dos três fatores já esperados pelos autores (o senso de comunidade, o trabalho com significado e a vida interior), foram encontrados outros quatro fatores: bloqueios ou barreiras à espiritualidade, responsabilidade pessoal, conexões positivas com outros indivíduos e contemplação. Contudo, ainda que todos esses fatores apoiem e complementem a conceituação do constructo, os itens que compõem o fator 4 (barreiras à espiritualidade) foram excluídos por tratarem-se da mera inversão dos itens dos três fatores já esperados. Além disso, os fatores 5 (responsabilidade pessoal) e 6 (conexões positivas com outros indivíduos) foram agrupados ao fator 1 (senso de comunidade), e o fator 7 (contemplação) foi agrupado ao fator 3 (vida interior), devido à proximidade e ao enriquecimento conceitual (Ashmos & Duchon, 2000).

Com isso, o modelo proposto por Ashmos e Duchon (2000) para mensuração da espiritualidade no trabalho ficou composto por três fatores ou dimensões: sense of community (senso de comunidade), meaning at work (trabalho com significado) e inner life (vida interior). Os autores propõem a utilização da escala do tipo Likert de 7 (sete) pontos, em que o nível 1 (um) refere-se a “discordo totalmente”, e o nível 7 (sete) refere-se a “concordo totalmente”.

Com o objetivo de adequar os termos do modelo de Ashmos e Duchon (2000), tanto às ciências administrativas brasileiras quanto à linguística (da língua inglesa para portuguesa), Tecchio (2015) apresentou-o para análise de dois professores da área de gestão e dois da área de linguística. Após a implementação dos ajustes sugeridos, o pesquisador realizou o pré-teste, aplicando o questionário a um grupo de trabalhadores de uma empresa de base tecnológica. Tecchio (2015) identificou que não houve dificuldades em relação ao entendimento das sentenças por parte dos respondentes. Assim, após os ajustes sugeridos pelos professores, o questionário foi considerado adequado. Nessa oportunidade, o autor verificou ainda a confiabilidade interna do modelo por meio do cálculo do coeficiente alfa de Cronbach, encontrando valores que evidenciavam a existência de consistência interna do modelo traduzido e pré-testado (Tecchio, 2015).

PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

A presente pesquisa possui abordagem metodológica quantitativa e, em relação ao procedimento técnico utilizado, é considerada do tipo levantamento (ou survey) (Gil, 2002), visando a atender o objetivo de propor um modelo de mensuração da espiritualidade no trabalho para a Administração Pública brasileira, por meio da validação de um instrumento em uma organização pública. Esse levantamento foi realizado com a aplicação do modelo de mensuração da espiritualidade no trabalho de Ashmos e Duchon (2000), traduzido e pré-testado por Tecchio (2015), conforme exposto no subcapítulo anterior e apresentado no Quadro 1. O instrumento foi aplicado com utilização de escala Likert de 7 pontos, em que 1 significa “discordo totalmente”, e 7 significa “concordo totalmente”.


Quadro 1: Modelo de mensuração de Espiritualidade no Trabalho desenvolvido por Ashmos e Duchon (2000) e traduzido, pré-testado e adequado por Tecchio (2015)

Fonte: adaptado de Tecchio (2015).

A população deste estudo compreende os servidores TAEs com as situações de contrato ativo, ativo transitório e em exercício provisório na UFSM, instituição pública de ensino superior, constituída como uma autarquia especial, pertencente à administração indireta da esfera federal brasileira e vinculada ao Ministério da Educação. Sendo esta pesquisa um passo inicial no avanço do constructo da espiritualidade no trabalho em organizações públicas, a instituição foi escolhida devido à proximidade do pesquisador, visto que este estudo é fruto de uma dissertação de mestrado profissional e, como tal, foi aplicada à realidade a qual este vivencia.

A população compreende 2.634 servidores TAEs. Para o cálculo da amostra mínima representativa, foi utilizada a fórmula amostral de população finita, com nível de erro de 5% e nível de confiança de 95%. Assim, obteve-se que o tamanho da amostra mínimo deveria ser de 336 servidores TAEs. A pesquisa foi encaminhada para toda a população e obteve 366 respondentes.

A coleta de dados foi realizada por meio do Sistema de Questionários institucional da UFSM, que é acessado pelo servidor com login e senha. Os servidores que atendiam ao critério de inclusão foram convidados, via e-mail enviado pelo Centro de Processamento de Dados (CPD) da UFSM, conforme solicitação dos(as) pesquisadores(as), a participarem voluntariamente da pesquisa.

Após a coleta, os dados foram organizados com auxílio de uma planilha eletrônica do software Office Excel, para, em seguida, serem analisados com o auxílio dos programas Statistical Package for the Social Sciences Statistics 20.0 (SPSS) e SPSS Analysis of Moment Structures Graphics 26.0 (AMOS).

Os dados foram submetidos à Análise Fatorial Exploratória (AFE), com o intuito de verificar a dimensionalidade e a confiabilidade da escala no contexto da Administração Pública brasileira. A AFE é o primeiro passo para a validação do modelo (Lopes, 2016), verificando se a estrutura de variáveis em cada dimensão mantém-se a mesma do modelo original (Hair, Black, Babin, Anderson, & Tathan, 2009). A AFE identifica ponderações ótimas entre as variáveis, de modo que estas possam ser reduzidas a um conjunto menor, para que o constructo tenha máxima variabilidade e fidedignidade (Lopes, 2016).

A verificação da adequação dos dados para a AFE foi realizada por meio do determinante da matriz de correlação (matriz-R), do teste de esfericidade de Bartlett e do teste de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO). Para examinar a dimensionalidade, o método de extração de fatores utilizado foi o da Análise dos Componentes Principais (ACP), com critérios a priori e de percentagem de variância, sendo que a reespecificação do modelo foi realizada com base nos valores das cargas fatoriais e das comunalidades. A confiabilidade de cada uma das dimensões foi verificada por meio do coeficiente de Alpha de Cronbach.

Em seguida, após a purificação do modelo pela AFE, este foi submetido à Análise Fatorial Confirmatória (AFC), para que a teoria de mensuração fosse testada, visando à validação do modelo. Na AFC, foi utilizada a técnica da modelagem de equações estruturais (Structural Equation Models – SEM), com o estimador de máxima verossimilhança (MLE). Para otimização da qualidade de ajuste, a reespecificação do modelo na AFC foi analisada com base em três medidas diagnósticas: estimativas de caminhos, resíduos padronizados e índices de modificação, sendo observada a consistência conceitual antes da implementação de qualquer modificação.

Aspectos éticos

A coleta de dados foi precedida do registro do projeto junto à Plataforma Brasil (Certificado de Apresentação para Apreciação Ética – CAAE: 34055720.7.0000.5346), para apreciação pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da UFSM, tendo sido aprovado, em 14 de julho de 2020, sob o parecer consubstanciado 4.154.805.

Aos respondentes, antes do preenchimento do instrumento de coleta de dados, foi disponibilizado, no Portal de Questionários da instituição, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), no qual manifestavam concordância. Além disso, foram assegurados aos participantes do estudo todos os esclarecimentos necessários acerca da pesquisa, bem como a possibilidade de retirar a qualquer momento o consentimento de participação no estudo, sem qualquer penalização.

ANÁLISE DOS RESULTADOS

Para que fosse realizada a AFE, foi verificada a adequabilidade dos dados por meio do determinante da matriz de correlação (matriz-R), devendo este ser superior a 0,00001, indicando a inexistência de multicolinearidade extrema entre as variáveis; do teste de esfericidade de Bartlett, que deve ser significativo (Sig.<0,05), apontando a presença de correlações entre as variáveis; e do teste KMO, o qual deve apresentar resultados entre 0,5 e 1,0, indicando a adequabilidade dos dados ou da amostra para análise fatorial. No Quadro 2, são apresentados os resultados dos três testes preliminares mencionados, os quais evidenciam a adequabilidade dos dados para a AFE.


Quadro 2 : Resultados dos testes de adequabilidade dos dados para AFE

Como cada uma das dimensões foi analisada separadamente, os testes foram realizados considerando essa unidimensionalidade. O método de extração utilizado nesta pesquisa foi o de componentes principais com critério a priori, com o número fixo de fatores a extrair igual a 1 (Lopes, 2016; Hair et al., 2009). Além do critério a priori em razão da unidimensionalidade, foi verificado o critério de percentagem de variância, que, em ciências sociais, requer que a solução (dimensão com suas variáveis) explique pelo menos 60% da variância total (Hair et al., 2009).

Para atender ao critério de percentagem de variância, após verificada a adequabilidade da análise fatorial por meio dos recursos preliminares apresentados no Quadro 2, foram analisadas as cargas fatoriais da matriz fatorial não rotacionada para cada variável da dimensão, bem como as comunalidades de cada uma delas. Não foi necessário utilizar a rotação de fatores, visto que não há rotação quando o número de fatores a extrair é igual a 1, devido à unidimensionalidade já mencionada (Hair et al., 2009).

Na reespecificação do modelo fatorial, visando a obter a estrutura dimensional inerente ao contexto de uma organização pública brasileira, foi realizada a ação corretiva de eliminação das variáveis que apresentaram caga fatorial inferior a 0,7 e comunalidade inferior a 0,5. Considerando o valor mínimo aceitável de explicação de 0,5 (comunalidade), pretende-se que pelo menos metade da variância de cada variável seja compartilhada ou explicada pela dimensão, com a outra metade correspondendo à variância de erro (Hair et al., 2009).

Assim, na dimensão senso de comunidade, foram eliminadas as seguintes variáveis, conforme ordem de exclusão: 8 (Sou encorajado a correr riscos no trabalho) com carga fatorial de 0,417 e comunalidade 0,174; 11 (Eu me sinto responsável pelo meu comportamento) com carga fatorial de 0,499 e comunalidade 0,249; 10 (Eu me sinto responsável pelo meu crescimento) com carga fatorial de 0,571 e comunalidade de 0,326; 14 (Eu faço a diferença para as pessoas com as quais trabalho) com carga fatorial de 0,644 e comunalidade de 0,414; 13 (Meu trabalho gera experiências de trabalho significativas para os outros) com carga fatorial de 0,658 e comunalidade de 0,433; 1 (Eu me sinto parte de uma comunidade em meu local de trabalho - departamento, unidade, etc.) com carga fatorial de 0,678 e comunalidade de 0,459; 12 (Eu acredito que os colegas vivenciam alegria em função do resultado do meu trabalho) com carga fatorial de 0,61 e comunalidade de 0,450; e 3 (Vivenciei inúmeras experiências em meu trabalho que resultaram em crescimento profissional) com carga fatorial de 0,676 e comunalidade de 0,456.

Na dimensão trabalho com significado, nenhuma variável foi eliminada e, na dimensão vida interior, foram eliminadas as seguintes variáveis, conforme ordem de exclusão: 22 (Eu sinto esperança sobre a vida) com carga fatorial de 0,51 e comunalidade de 0,282; 28 (Reflexão pessoal é uma atividade importante da minha vida) com carga fatorial de 0,585 e comunalidade de 0,342; e 27 (Meditação é uma atividade importante da minha vida) com carga fatorial de 0,6 e comunalidade de 0,468.

Diante das variáveis remanescentes, foi realizada a análise de confiabilidade de cada dimensão, com a utilização do coeficiente de Alpha de Cronbach, que varia de 0 a 1, sendo valores acima de 0,7 considerados aceitáveis. É possível, ainda, excluir variáveis do modelo quando essa exclusão aumentar a confiabilidade da dimensão, porém resultados deste estudo não indicaram nenhuma exclusão.

No Quadro 3, são apresentadas as variáveis remanescentes após ação corretiva (eliminação das variáveis que não atendiam aos critérios), seguidas dos valores de comunalidade e carga fatorial, bem como a percentagem de variância acumulada de cada uma das dimensões e o valor do coeficiente de Alpha de Cronbach.


Quadro 3: Estrutura resultante da AFE

Nota-se, no Quadro 3, que o critério de percentagem de foi atendido em todas as dimensões. Além disso, a confiabilidade das três dimensões foi evidenciada pelos valores do coeficiente de Alpha de Cronbach superiores a 0,7.

Verificadas a dimensionalidade e a confiabilidade da escala no contexto de uma organização pública brasileira, por meio da AFE, sendo esta o primeiro passo para a validação do modelo, passa-se então à AFC. A AFC tem por objetivo testar a teoria de mensuração, avaliando o ajuste e a validade dos constructos do seu modelo de mensuração, sendo que “quando um modelo AFC se ajusta e demonstra validade de construto, a teoria de mensuração é sustentada” (Hair et al., 2009, p. 593).

O modelo purificado pela AFE foi especificado no software AMOS, por meio da inclusão do diagrama de caminhos, apresentado na Figura 1. Esse diagrama retrata as 17 variáveis medidas, remanescentes da AFE, assim como os três constructos (dimensões) latentes do modelo (não medidos ou não observáveis). Esses constructos são exógenos, visto que não são dependentes, mas correlacionados entre si (setas bidirecionais, que representam covariância entre os constructos latentes) (Hair et al., 2009).

O modelo é considerado congênere, consistindo em três constructos unidimensionais, sendo que cada variável pode ter carga sobre apenas um desses constructos. Cada variável medida tem um termo de erro associado a ela, representando a variância de erro e/ou a variância específica ou única de cada uma delas. Além disso, o modelo classifica-se como uma teoria reflexiva de mensuração, visto que as dimensões são as causas das variáveis medidas (Hair et al., 2009).

Após a especificação, o modelo foi estimado com utilização do estimador MLE. Com isso, foram obtidos os parâmetros estimados padronizados, conforme apresentado na Figura 1: três covariâncias fatoriais, 17 cargas fatoriais e 17 variâncias de erros


Figura 1
Diagrama de caminhos do modelo inicial estimado

O ajuste do modelo foi verificado por meio dos índices de qualidade de ajuste (goodness of fit – GOF). Esses índices estão apresentados no Quadro 4, seguidos dos valores de corte considerados para que o modelo demonstre qualidade de ajuste, conforme indicado por Hair, Black, Babin, Anderson e Tathan (2009).


Quadro 4: Valores de corte dos índices de ajuste

Fonte: Elaborado pelos(as) autores(as) a partir de Hair et al. (2009).

Em termos gerais, após a estimação, o modelo apresentou um bom ajuste. Contudo, verificou-se a possibilidade de otimização de seis índices, os quais não atingiram os valores de corte indicados, são eles: χ²/df=3,105; GFI=0,893; RMSEA=0,076; NFI=0,897; RFI=0,879 e TLI=0,914. Qualquer reespecificação no modelo só pode ser implementada se existir consistência conceitual para a intervenção proposta. Em outras palavras, toda a modificação no modelo deve encontrar justificativa na teoria por trás dos itens e dos constructos (Hair et al., 2009).

Para verificar a possibilidade de reespecificação do modelo, três medidas diagnósticas da AFC foram verificadas nas saídas do software AMOS: estimativas de caminhos, resíduos padronizados e índices de modificação (MI). As duas primeiras não indicaram potenciais reespecificações, pois todas as estimativas de carga são superiores a |0,5| (Figura 1) e nenhum resíduo padronizado é superior a |4,0|, conforme recomenda Hair et al. (2009).

Os MI indicaram duas potenciais mudanças na especificação do modelo. A primeira foi a liberação do caminho entre os termos de erro e12 e e13 que correspondem às variáveis 20 (Eu vejo conexão entre o meu trabalho e um bem social maior para com minha comunidade) e 21 (Eu entendo o que proporciona ao meu trabalho significado pessoal), respectivamente, pertencentes à dimensão trabalho com significado. Além do alto valor de MI e do fato de essas variáveis pertencerem ao mesmo constructo, pode-se inferir que, ao passo que o servidor público identifica o significado do seu trabalho em relação a um bem social maior, também compreende esse bem social como aquilo que dá significado pessoal ao seu trabalho. Essas ponderações vão ao encontro daquilo que se entende como o papel de um servidor público: servir à sociedade.

A segunda mudança foi a exclusão da variável 15 (Eu vivencio alegria no meu trabalho), pois esta possuía o maior valor de MI do modelo quando relacionada com a dimensão senso de comunidade, sendo que essa variável pertence à dimensão trabalho com significado. Além de possuir o maior valor de MI do modelo em relação a uma dimensão diferente da qual pertence, a variável 15 possui relação com as variáveis 17, 18 e 20, pertencentes à sua dimensão (trabalho com significado) e com as variáveis 2, 6, 7 e 9, pertencentes à dimensão senso de comunidade. Com isso, optou-se pela exclusão da variável 15 do modelo, pois aparenta gerar dúvidas nos respondentes em relação à variável latente que representa (SC ou TS), bem como aparenta já ser retratada por outras variáveis da dimensão à qual pertence.

Com essas modificações, todos os índices atingiram os valores de corte, podendo o modelo ser considerado ajustado, conforme Quadro 5.


Quadro 5: Índices de ajuste do modelo inicial e final

Por fim, para avaliar validade de construto, foram examinadas as validades: convergente, discriminante e nomológica.

A validade convergente é verificada quando as variáveis observadas do modelo compartilham elevada proporção de variância. Para estimar a quantia relativa de validade convergente, foram utilizadas, neste estudo, as cargas fatoriais padronizadas, a variância extraída por dimensão e a confiabilidade de constructo (Hair et al., 2009).

Cargas fatoriais elevadas e significantes indicam elevada validade convergente. Como foi mencionado, as cargas fatoriais padronizadas devem ser de |0,5| ou, além disso, devem ser significantes baseadas no nível de significância 0,05 (p-valor<0,05) e no valor da razão crítica (Critical Ratio – C.R.) superior a |1,96| (Hair et al., 2009; Silva, 2006). O valor da variância extraída (VE) igual ou maior do que 0,5 (50%) também sugere convergência adequada, sendo que valores menores indicam que, em média, existe mais variância de erro nos itens do que variância explicada pelo fator latente (dimensão) (Hair et al., 2009).

A confiabilidade é também um indicador de validade convergente, sendo que esse indicador já foi obtido para cada um dos constructos por meio do Alpha de Cronbach. Na AFC, é exibido um valor de confiabilidade de constructo (CC) que frequentemente é usado junto à SEM. Assim como em outras medidas de confiabilidade, valores iguais ou maiores do que 0,7 sugerem a existência de consistência interna (Hair et al., 2009).

No Quadro 6, estão os valores referentes às medidas conceituadas nos parágrafos anteriores, demonstrando a validade convergente do modelo após a reespecificação.


Quadro 6: Indicadores de validade convergente

Conforme o Quadro 6, é possível verificar que todas as cargas fatoriais estimadas são altamente significantes (C.R.>1,96 e p-valor<0,05) e maiores do que 0,5. As estimativas de variância extraída dos constructos excedem o valor de 50%, segundo sugere a regra e os valores de confiabilidade das dimensões são superiores a 0,7. Desse modo, as informações do Quadro 6, evidenciam a validade convergente do modelo de mensuração.

A validade discriminante refere-se ao “grau em que um construto é verdadeiramente diferente dos demais”, informando, ainda, que as variáveis medidas representam somente aquela dimensão. Uma das maneiras de testar a validade discriminante de um modelo é por meio da comparação entre os valores de VE de cada constructo e os valores das estimativas de correlação entre dois constructos elevadas ao quadrado (estimativa quadrática de correlação) (Hair et al., 2009, p. 592). A validade discriminante é evidenciada quando o valor de VE é maior do que a estimativa quadrática de correlação entre as dimensões, uma vez que uma dimensão deve explicar suas medidas de variáveis melhor do que outra dimensão (Hair et al., 2009).

No Quadro 7, são apresentadas as correlações estimadas entre os constructos (covariâncias padronizadas), a estimativa quadrática de correlação entre esses constructos e o valor de VE de cada constructo replicado do Quadro 6.


Quadro 7: Indicadores de validade discriminante

Observa-se que as estimativas de VE das dimensões são todas maiores do que as estimativas quadráticas de correlação. Portanto, o teste evidencia a validade discriminante do modelo (Hair et al., 2009).

A validade nomológica “examina se as correlações entre os construtos na teoria de mensuração fazem sentido” (Hair et al., 2009, p. 589), sendo que sua lógica é baseada na AFE. Em termos de AFC, foi analisada a matriz de correlação, sendo esta considerada apenas um esforço inicial para avaliação da validade nomológica. Para tal, espera-se que as dimensões se relacionem positivamente entre si e que suas correlações sejam significantes (C.R.>1,96 e p-valor<0,05).

No Quadro 8, são apresentadas as estimativas de covariância entre os constructos, o seu erro padrão e os valores de C.R. e p-valor.


Quadro 8: Indicadores de validade nomológica

Nota-se, no Quadro 8, que as dimensões são positivamente relacionadas entre si, além disso, todas as correlações são significantes. Com os constructos positivamente relacionados, espera-se que avaliações favoráveis desses três constructos indiquem que o servidor possui espiritualidade no trabalho. Assim, a análise das correlações estimadas sugere a sustentação da validade nomológica do modelo.

Diante do ajuste e da validade de constructo (convergente, discriminante e nomológica) do Modelo de Espiritualidade no Trabalho de Ashmos e Duchon (2000), pôde-se considerar, conforme afirma Hair et al. (2009), que a teoria de mensuração foi sustentada. Na Figura 2, está o diagrama de caminhos do modelo final, após a reespecificação (modificação), com os respectivos parâmetros estimados padronizados.


Figura 2
Diagrama de caminhos do modelo final estimado
Fonte: Elaborado pelos(as) autores(as) no software AMOS.

Conclui-se que os resultados da AFC/SEM sustentaram a teoria de mensuração. Sendo assim, o Modelo de Espiritualidade no Trabalho de Ashmos e Duchon (2000) pode ser considerado validado no contexto da Administração Pública brasileira com aplicação em uma instituição de ensino superior.

Um modelo para organizações públicas brasileiras

Visando a proposição de um modelo de mensuração da espiritualidade no trabalho para a aplicação na Administração Pública brasileira, neste estudo, são sugeridas algumas intervenções, para que esse modelo possa ser melhor aplicado e testado nos diferentes contextos de organizações públicas brasileiras, pois, segundo Silva (2006, p. 43), “a avaliação da adequação de um modelo deve ser baseada em múltiplos critérios, que envolvem considerações teóricas, estatísticas e práticas”. A autora acrescenta que cabe ao pesquisador a tomada de decisão quanto ao que se considera um melhor modelo (Silva, 2006).

Assim, primeiramente, sugere-se que a dimensão Senso de Comunidade seja denominada “Condições para a comunidade”, levando em consideração os conteúdos das variáveis remanescentes da AFE, bem como a tradução literal do nome atribuído pelos autores, Ashmos e Duchon (2000), a esse fator (Conditions for Community). Além disso, sugere-se que a questão 25 (Orar é uma atividade importante de minha vida), mantida no modelo final validado, absorva as práticas sugeridas nas variáveis 27 (meditação) e 28 (reflexão pessoal), excluídas do modelo na AFE, estabelecendo uma relação de adição ou de alternância ao ligar os termos com as conjunções “e/ou”. A justificativa para essa intervenção está na fundamentação teórica deste estudo, que objetiva distinguir e não limitar a espiritualidade a atos eminentemente religiosos, sendo a oração um deles. Além disso, a variável 25 apresenta diferenças estatisticamente significativas entre as médias em todos os agrupamentos sociodemográficos da amostra.

Diante do exposto, com a utilização das conjunções aditiva e alternativa “e/ou” entre os termos, sugere-se que o conteúdo da referida variável, para aplicação na Administração Pública brasileira, passe a ser: Oração, meditação e/ou reflexão pessoal são uma atividade importante em minha vida.

No Quadro 9, é apresentado o modelo de mensuração da espiritualidade no trabalho proposto para aplicação na Administração Pública brasileira, contendo as adaptações alicerçadas na teoria, na prática e nas análises estatísticas desta pesquisa, bem como uma nova numeração (sequencial) para as variáveis.


Quadro 9: Modelo de mensuração da espiritualidade no trabalho para a Administração Pública brasileira

O modelo final possui 16 itens, sendo seis pertencentes à dimensão Condições para a Comunidade, outros seis pertences à dimensão Trabalho com Significado e quatro pertencentes à dimensão Vida Interior.

CONCLUSÕES

Nesta pesquisa buscou-se contribuir com a Gestão das Organizações Públicas por meio da inserção de um conceito relativamente recente nos ambientes organizacionais, a espiritualidade no trabalho, mediante a proposição de um modelo de mensuração da espiritualidade no trabalho para a Administração Pública brasileira.

Ressalta-se, ainda, que conceitos inovadores na gestão com pessoas também devem ser trazidos para os ambientes organizacionais públicos, fazendo com que as organizações públicas acompanhem as profundas e constantes mudanças do mundo do trabalho, de modo que possam até mesmo tornarem-se precursoras em modelos de gestão inovadores.

Dada a incipiência do tema, constatou-se a necessidade de propor uma maneira adequada para a coleta de informações acerca da espiritualidade no trabalho em organizações públicas, sendo o levantamento o primeiro passo para implementação ou avaliação de políticas ou ações de gestão. Para atingir esse objetivo, o Modelo de Espiritualidade no Trabalho de Ashmos e Duchon (2000) foi aplicado aos servidores Técnico-Administrativos em Educação da UFSM, com suas três dimensões: senso de comunidade, trabalho com significado e vida interior.

Como primeiro passo para a validação do Modelo de Espiritualidade no Trabalho de Ashmos e Duchon (2000) para a Administração Pública brasileira, os dados de cada umas das dimensões, separadamente, foram submetidos à análise fatorial exploratória. A AFE teve o objetivo de purificar o modelo, definindo a estrutura inerente entre as variáveis de cada dimensão, com máxima fidedignidade.

A estrutura das dimensões senso de comunidade e vida interior, antes com 14 e 7 variáveis, passaram a conter, 6 e 4 variáveis, respectivamente. A dimensão trabalho com significado manteve a sua estrutura com 7 variáveis, conforme havia sido proposto por Ashmos e Duchon (2000).

Uma percepção interessante nesse ponto do estudo é de que a maior parte das variáveis excluídas, na AFE dos idealizadores do modelo, também eram pertencentes a outros fatores, porém foram agrupadas por Ashmos e Duchan (2000) devido às bases conceituais por eles propostas e por entenderem que essas variáveis capturam aspectos da comunidade ou da vida interior dos indivíduos.

Esse agrupamento de fatores em torno dos componentes centrais da espiritualidade no trabalho, na concepção de Ashmos e Duchan (2000) (comunidade, significado do trabalho e vida interior), não ocorreu na dimensão trabalho com significado, que, desde a AFE dos precursores, era composta por um fator, e foi a única que manteve a mesma estrutura inerente entre as variáveis.

Essas percepções transmitem confiança à AFE realizada nesta pesquisa, sendo que, além da redução do número de variáveis, nessa parte do estudo, surge outra sugestão acerca da proposição do modelo desejado. A dimensão senso de comunidade passa a ser denominada: “Condições para a comunidade”. Essa nova nomenclatura leva em consideração o conteúdo das variáveis remanescentes e a tradução literal do nome atribuído ao fator por Ashmos e Duchan (2000), antes de ser agrupado a outros dois fatores, para formar a dimensão senso de comunidade.

Finalizando a validação do Modelo de Ashmos e Duchan (2000), os dados foram submetidos à análise fatorial confirmatória. Essa análise teve por objetivo confirmar a estrutura remanescente de variáveis da AFE por meio da avaliação do ajuste e da validade de constructo do modelo.

Duas modificações foram implementadas no modelo com o intuito de otimizar o seu ajuste. A primeira foi a liberação do caminho (reconhecimento da correlação) entre as variáveis “eu vejo conexão entre o meu trabalho e um bem social maior para com minha comunidade” e “eu entendo o que proporciona ao meu trabalho significado pessoal”, pertencentes à dimensão trabalho com significado. Sendo papel o servidor público “servir à sociedade”, é compreensível que exista relação entre “um bem social maior” e “aquilo que proporciona significado ao trabalho” para os servidores. A segunda refere-se à exclusão da variável “eu vivencio alegria no meu trabalho”, pertencente à dimensão trabalho com significado, pois a AFE indicou que esta poderia estar causando confusão aos respondentes, ao apresentar grande relação com a dimensão senso de comunidade, bem como com outras quatro variáveis dessa dimensão. A elevada relação dessa variável com outra dimensão viola a propriedade congênere do modelo e gera incerteza quanto ao constructo que está sendo por ela medido.

Observando a totalidade do estudo, a proposição do modelo considerou as argumentações teóricas, estatísticas e práticas, culminando em duas alterações no produto desta pesquisa: a alteração do conteúdo da variável “orar é uma atividade importante de minha vida” para “oração, meditação e/ou reflexão pessoal são uma atividade importante em minha vida”; e a alteração da nomenclatura da dimensão senso de comunidade para “Condições para a comunidade”, conforme já foi mencionado.

Conclui-se o estudo com a proposição de um modelo de mensuração da espiritualidade no trabalho para organizações públicas brasileiras, contendo 16 variáveis, sendo seis pertencentes à dimensão Condições para a Comunidade (CC), seis à dimensão Trabalho com Significado (TS) e quatro à dimensão Vida Interior (VI).

O modelo possui potencial para ser aplicado tanto no levantamento inicial, antes da implementação de uma política ou ação relacionada ao desenvolvimento da espiritualidade no trabalho, quanto na avaliação dos resultados após a implementação de uma política ou ação de desenvolvimento.

Esta pesquisa apresentou limitações, devido à escassez de estudos acerca da espiritualidade no trabalho em organizações públicas e devido ao fato de a aplicação da pesquisa ter ocorrido durante a pandemia de COVID-19, a qual alterou a forma e as relações de trabalho na instituição e no mundo.

Diante disso, sugere-se que o Modelo de Ashmos e Duchon (2000) seja aplicado em sua totalidade em outros espaços públicos, de modo que se encontre a estrutura de variáveis ideal para as organizações públicas. Além disso, estudos qualitativos podem trazer uma interpretação mais profunda desse fenômeno do mundo social, bem como podem possibilitar a investigação de como os diferentes agentes compreendem a possibilidade de pragmatização da espiritualidade no trabalho, diante do seu comprovado benefício para o desempenho organizacional.

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