Resumo:
Objetivo da Pesquisa: analisar a relação entre habilidade política, reputação individual e desempenho de agentes privados em suas interações com órgãos reguladores. Enquadramento Teórico: a presente pesquisa parte dos construtos Habilidade Política e Reputação individual para analisar o desempenho de agentes privados na interação com órgãos reguladores. Metodologia: trata-se de uma pesquisa quantitativa, com análise de dados primários coletados de funcionários de agências reguladoras federais brasileiras que lidam diretamente com representantes de empresas reguladas. Os questionários foram aplicados de forma presencial e avaliaram a percepção do respondente sobre um representante da iniciativa privada com quem se relacionasse diretamente em suas atividades. As escalas foram adaptadas dos trabalhos de Ferris et al. (2005), para Habilidade Política, de Zinko, Gentry e Laird (2016), para Reputação Pessoal, e de Borman e Motowidlo (1993) para avaliação do desempenho. Para análises foram empregadas as técnicas de análise fatorial e regressão linear múltipla. Resultados: os resultados evidenciaram que nem todas as dimensões da habilidade política e da reputação individual se associaram de forma significativa ao desempenho no ambiente de trabalho analisado, corroborando a necessidade do estudo dos construtos sob uma perspectiva multidimensional. Verificou-se que a reputação individual exerce uma função mediadora da relação entre habilidade política e desempenho, sugerindo que a habilidade política do indivíduo pode não ser condição suficiente para manutenção do desempenho no ambiente analisado. Originalidade: o trabalho aborda o contexto de interação entre agências reguladoras e representantes privados, explorando características do agente privado que orientarão o desempenho na defesa de interesses frente às organizações públicas. Contribuições Teóricas e Práticas: os resultados reforçam as características multidimensionais da Habilidade Política e da Reputação, além de identificarem quais dimensões dos construtos estão associadas ao desempenho. Observa-se uma relação de mediação da Reputação de Integridade e Social sobre a relação entre as dimensões da Habilidade Política e o Desempenho. Esses resultados põem em perspectiva o papel da Habilidade Política, uma vez que sua associação ao desempenho passa pelo desenvolvimento de uma reputação positiva. Além de contribuírem com os estudos sobre habilidade política e reputação, os resultados possibilitam a orientação da atuação de organizações privadas na interação junto a agentes reguladores.
Palavras-chave: Habilidades políticas, Reputação Desempenho, Agências Reguladoras.
Abstract:
Research Objective: to analyze the relationship between political skill, individual reputation and the performance of private agents in their interactions with regulatory agencies. Theoretical Framework: this research departs from the Political Skill and Individual Reputation constructs to analyze the Performance of private agents in the interaction with regulatory agencies. Method: this research is quantitative, analyzing primary data collected from employees of Brazilian federal regulatory agencies who deal directly with representatives of regulated companies. The questionnaires were applied face-to-face and assessed the respondent's perception of a private sector representative with whom they had a direct relationship in their activities. The scales were adapted from Ferris et al. (2005) for Political Skill, from Zinko, Gentry and Laird (2016) for Personal Reputation, and from Borman and Motowidlo (1993) for Performance evaluation. The analysis techniques included factor analysis and multiple linear regression analysis. Results: The results showed that not all dimensions of political ability and individual reputation were significantly associated with performance in the analyzed work environment, corroborating the need to study the constructs from a multidimensional perspective. Reputation plays a mediating role in the relationship between political skill and performance, suggesting that the individual's political skill may not be a sufficient condition for maintaining performance in the analyzed environment. Originality: the work addresses the context of interaction between regulatory agencies and private representatives, exploring characteristics of the private agent that will drive its performance in the defense of interests against public organizations. Theoretical and Practical Contributions: the results reinforce the multidimensional characteristics of Political Ability and Reputation, in addition to identifying which dimensions of the constructs are associated with performance. A mediation relationship of Integrity and Social Reputation are observed on the relationship between the dimensions of Political Ability and Performance. These results put the role of Political Ability into perspective since its association with performance implies the development of a positive reputation. In addition to contributing to studies on political ability and reputation, the results allow guiding the actions of private organizations in their interaction with regulatory agents.
Keywords: Political skills, Reputation Performance, Regulatory agencies.
Resumen:
Objetivo: analizar la relación entre la capacidad política, la reputación individual y el desempeño de los agentes privados en sus interacciones con los organismos reguladores. Marco teórico: esta investigación parte de los constructos Capacidad Política y Reputación Individual para analizar la actuación de los agentes privados en la interacción con los órganos reguladores. Metodología: se trata de una investigación cuantitativa, con análisis de datos primarios recopilados de empleados de agencias reguladoras federales brasileñas que tratan directamente con representantes de empresas reguladas. Los cuestionarios se aplicaron cara a cara y evaluaron la percepción del encuestado sobre un representante del sector privado con quien tenía una relación directa en sus actividades. Las escalas fueron adaptadas del trabajo de Ferris et al. (2005) para Habilidad Política, de Zinko, Gentry y Laird (2016) para Reputación Personal, y de Borman y Motowidlo (1993) para evaluación de desempeño. Para el análisis se utilizaron técnicas de análisis factorial y regresión lineal múltiple. Resultados: los resultados refuerzan las características multidimensionales de Habilidad Política y Reputación, además de identificar qué dimensiones de los constructos se asocian con el desempeño. Se observa una relación de mediación de la Integridad y la Reputación Social sobre la relación entre las dimensiones de Habilidad Política y Desempeño. Estos resultados ponen en perspectiva el papel de la Habilidad Política, ya que su asociación con el desempeño implica el desarrollo de una reputación positiva. Además de contribuir a estudios sobre habilidad política y reputación, los resultados permiten orientar las acciones de las organizaciones privadas en su interacción con los agentes reguladores. Originalidad: el trabajo aborda el contexto de interacción entre las agencias reguladoras y los representantes privados, explorando las características del agente privado que orientarán la actuación en la defensa de los intereses frente a las organizaciones públicas. Aportes Teóricos y Prácticos: los resultados encontrados refuerzan las características multidimensionales de la Habilidad Política y la Reputación, además de identificar que las dimensiones de la Reputación tienen un efecto mediador en la relación entre la Habilidad Política y el Desempeño.
Palabras clave: Habilidades políticas, Reputación Actuación, Agencias regulatorias.
Artigos
Habilidade Política e Reputação para o Desempenho de Agentes Privados na interação com Agências Reguladoras
Political Skill and Reputation for the Performance of Private Agents in Interacting with Regulatory Agencies
Habilidad Política y Reputación por el Desempeño de los Agentes Privados en la Interacción con las Agencias Reguladoras
Recepción: 31 Julio 2022
Aprobación: 01 Julio 2023
Publicación: 24 Agosto 2023
O contexto de atuação das agências reguladoras pode ser caracterizado como uma arena política (Campos, Ávila e da Silva Jr., 2000), marcada pelo conflito de interesses e disputas de poder entre diferentes organizações que buscam influenciar o processo de criação de normas (Hanegraaff, Ploeg & Berkhout, 2020). Nesse ambiente competitivo há a necessidade de interação com diferentes atores governamentais, representantes da sociedade civil e atores privados para o bom desempenho no ambiente de trabalho (Davidovitz & Cohen, 2021; Bustos, 2021). A governança de organizações regulatórias demanda a participação e a interação entre organizações públicas e privadas para identificação de problemas, compartilhamento de informações, discussão e busca de alternativas que permitam orientar a intervenção do Estado (Fraussen & Beyers, 2016; Rex, 2018; Benoît, 2021).
Embora sob uma perspectiva ideal a governança dos órgãos reguladores deva possibilitar o acesso de todos os interessados e evitar a super ou a sub-representação de interesses, observa-se que diferentes organizações conseguem diferentes níveis de acesso aos órgãos reguladores e a seus decisores (Fraussen & Beyers, 2016; Hanegraaff, Ploeg & Berkhout, 2020). Pesquisas recentes buscaram identificar atributos dos grupos de interesse com melhores acessos aos decisores e identificaram características como: expertise técnica, acesso a informações e conhecimentos, representatividade, legitimidade, acesso a recursos e possibilidade de apoio à implementação das políticas (Irwin & Githinji, 2015; Fraussen & Beyers, 2016). Ressalta-se, no entanto, que as relações entre órgãos reguladores e agentes privados ocorrem por meio da interação entre funcionários de organizações privadas e servidores públicos que atuam nas agências (Albareda, 2020). Poucos estudos avaliam a influência de características dos representantes de organizações privadas na sua interação com agentes públicos (Irwin & Githinji, 2015). Sob uma perspectiva de análise focada nos indivíduos, destaca-se o papel da a habilidade política e da reputação para defesa de interesses frente ao órgão regulador.
A habilidade política trata da capacidade de efetivamente entender os outros no ambiente de trabalho e usar tal conhecimento para influenciar seus comportamentos no sentido de agir para melhorar seus objetivos pessoais e/ ou organizacionais (Ferris et al., 2005). Pesquisas empíricas frequentemente mostram benefícios vinculados às habilidades política no ambiente de trabalho (Treadway et al., 2014; Liu, et al., 2014; Munyon et al., 2015), bem como em interações sociais (Wang & Hall, 2019). Indivíduos com alta habilidade política são mais aptos a obterem melhor desempenho e satisfação no trabalho, bem como sucesso na carreira (Cullen, Gerbasi & Chrobot-Mason, 2018; Kwon, 2020; Chen, Jiang &Wu, 2021), porque são vistos como fontes de informação e de conhecimento para seus colegas, se beneficiando da dependência de informações (Ferris et al., 2005; Cullen et al., 2018). Também estão mais propensos a reconhecer e a aproveitar oportunidades, já que conseguem perceber informações relevantes no ambiente em que se inserem (Ferris et al., 2007; Russell et al., 2016; Wihler et al., 2017).
A reputação, por sua vez, é a representação social de algo ou alguém, formada de um conjunto de informações e crenças construídas por uma comunidade (Bromley, 2001). Pode ser entendida como a identidade formada a partir da percepção de um grupo, de forma que o indivíduo possui controle limitado de sua própria reputação, já que ela é construída pela percepção de terceiros (Ferris et al., 2005). De acordo com Cavazza, Guideti e Pagliaro (2014) a construção de uma reputação positiva no ambiente de trabalho é um trabalho árduo, demorado e de difícil manutenção, uma vez que um único desvio de comportamento pode comprometer todo o esforço empreendido. Não obstante, a reputação é vista como uma poderosa ferramenta de controle social (Cavazza, Pagliaro, & Guidetti, 2014) que influi consideravelmente em fatores como desempenho e sucesso na carreira do indivíduo (Zinko et al., 2017).
Diante o exposto, a presente pesquisa visa contribuir com a literatura sobre a interação entre agentes privados e organizações públicas. Nesse sentido, a presente pesquisa tem por objetivo analisar a relação entre habilidade política, reputação individual e desempenho de agentes privados em suas interações com órgãos reguladores. Para consecução do objetivo proposto, o artigo encontra-se dividido da seguinte forma. A seção seguinte apresenta o referencial teórico que subsidia o desenvolvimento do presente trabalho. Posteriormente é apresentado o método de pesquisa. Os resultados e análises são apresentados na quarta seção. Por fim, são apresentadas as conclusões.
Os estudos sobre habilidade política são relativamente recentes na literatura. O interesse pelo tema surge a partir do reconhecimento das organizações como arenas políticas em que as interações e os jogos de poder são constantes e que o exercício da influência e da persuasão são aspectos essenciais (Pfeffer, 1981; Mintzberg, 1985). Partindo dessas premissas surge o conceito de habilidade política, onde indivíduos inseridos em contextos relacionais buscam influenciar e persuadir os demais ao mesmo tempo em que são influenciados (Good & Schwepker Jr. 2022).
O conceito de habilidade política vem sendo aplicado a diversos contextos e parece especialmente aplicável para a análise das relações entre organizações públicas e privadas no contexto da estrutura de governança de órgãos reguladores. Recursos humanos são aspectos críticos para a efetividade das ações de defesa de interesses (Fraussen & Beyers, 2016). Em um nível micro de análise, as características e atributos pessoais do indivíduo, em especial afetos à capacidade de negociar, influenciar e persuadir, podem ser determinantes no convencimento dos tomadores de decisão e no sucesso da defesa de interesses.
A habilidade política enfatiza características cognitivas e interpessoais do indivíduo abarcando um abrangente conjunto de competências sociais que auxiliam o indivíduo a navegar pelos diferentes ambientes organizacionais, obtendo apoio e acessando recursos (Kimura, 2015; Kimura, Bande & Fernández-Ferrín, 2018; Good & Schwepker Jr. 2022). Pessoas com alta habilidade política tendem a apresentar comportamentos que indicam uma alta autoconsciência em relação ao ambiente social em que se inserem, sendo capazes de modificar seus comportamentos de forma a melhor se adequar à situação, demonstrando sinceridade, inspirando confiança e influenciando o comportamento dos outros (Ferris et al., 2005; Banister & Meriac, 2014).
Diversos conceitos de habilidade política foram propostos ao longo dos anos (Chen, Jiang & Wu, 2021). Kimura (2015) ressalta que estudos recentes usualmente empregam a definição proposta por Ferris et al. (2005): a habilidade política é a capacidade de efetivamente entender os outros e de usar tal conhecimento para influenciar as pessoas a agir em favor de objetivos pessoais ou organizacionais (Ferris et al., 2005). A habilidade política está positivamente associada com diversos construtos de efetividade social (Banister & Meriac, 2014; Wang & Hall, 2019), contudo se distingue dos demais construtos por focar em competências particularmente eficazes no ambiente de trabalho (Kwon, 2020).
Pesquisas empíricas normalmente caracterizam a Habilidade Política como um construto multidimensional, composto por quatro dimensões distintas, porém relacionadas: (i) astúcia social, (ii) influência interpessoal, (iii) capacidade de networking e (iv) sinceridade aparente (Ferris et al., 2005; Banister & Meriac, 2014; Kimura, Bande & Fernández-Ferrín, 2018; Kwon, 2020; Chen, Jiang & Wu, 2021).
A Astúcia Social (social astuteness) se refere à capacidade de interpretar com precisão o seu próprio comportamento, assim como o de outros, em diferentes contextos sociais. Diz respeito ao poder de discernimento e “self-awareness” (Ferris et al., 2005; Ferris et al., 2007). Para Wang e Hall (2019) a Astúcia Social trata da habilidade de compreender as interações sociais e interpretar de forma acurada os comportamentos próprios e dos outros. De forma similar, Good e Schwepker Jr. (2022) argumentam que indivíduos que têm maior astúcia social são fortes em observar os outros e interpretar as interações entre e com outras pessoas, indicando que eles têm um nível mais alto de compreensão da rede social e autoconsciência. Indivíduos com astúcia social são capazes de participar de diferentes ocasiões sociais, de observar os outros e de perceber situações sociais sutis de modo a ajustar seus comportamentos, de acordo com seus objetivos de influência (Chen, Jiang & Wu, 2021).
A Influência Interpessoal (interpersonal influence) corresponde à capacidade de se adaptar e calibrar adequadamente o comportamento a cada situação, a fim de influenciar e obter respostas específicas de outras pessoas (Ferris et al., 2005; Pfeffer, 2010). Wang e Hall (2019) entendem a influência pessoal como a capacidade de exercer influência e obter as respostas desejadas de outras pessoas por meio de uma comunicação eficaz, sendo agradável, desenvolvendo harmonia e fazendo com que os outros se sintam à vontade. Para Cheng, Jiang e Wu (2021), a influência interpessoal é definida como a capacidade de mudar as expectativas dos outros de maneira sutil e convincente. Kimura (2015) sumariza a influência interpessoal como a capacidade de exercer uma influência sobre os outros de forma sutil e convincente e de se adaptar e calibrar apropriadamente o próprio comportamento para cada situação, a fim de obter respostas específicas de outras pessoas.
A Habilidade de Networking (networking ability) trata da capacidade de identificar e desenvolver redes de relacionamentos, construir alianças e coalizões, bem como identificar contatos importantes e construir relacionamentos (Ferris et al., 2005; Wang & Hall, 2019). A Habilidade de Networking reflete o grau de habilidade das pessoas em estabelecer e gerenciar diversas redes e contatos, intercambiando conhecimentos, informações e recursos relevantes para o alcance de objetivos organizacionais e pessoais (Russell et al., 2016; Wihler et al., 2017; Good & Schwepker Jr., 2022). Pessoas com altas habilidades políticas são mais propensas a compreender os outros, identificar aqueles que têm recursos ou ativos valiosos e construir relacionamentos amigáveis, confiáveis e benéficos (Kimura, 2015; Chen, Jiang & Wu, 2021).
Por fim, a Sinceridade Aparente (apparent sincerity) refere-se ao fato dos indivíduos com alta habilidade política serem percebidos como pessoas de altos níveis de integridade, autenticidade e sinceridade, mesmo em um contexto de manipulação (Ferris et al., 2005; Ferris et al., 2007). O comportamento das pessoas politicamente habilidosas é frequentemente enxergado como honesto e sincero, inspirando confiança (Chen, Jiang & Wu, 2021) e possibilitando a prática efetiva da influência, pois suas ações aparentam genuínas e íntegras (Ferris et al., 2005; Ferris et al., 2007). Indivíduos com sinceridade aparente inspiram confiança porque suas ações não são vistas como coercitivas ou manipuladoras, possibilitando o exercício da influência sobre os demais (Good & Schwepker Jr., 2022).
Muito embora seja normalmente aplicado a um contexto intraorganizacional, observam-se pesquisas recentes que empregaram o construto em uma perspectiva interorganizacional, mantendo-se a perspectiva de que a habilidade política, assim como as suas dimensões estão positivamente associadas ao desempenho no ambiente de trabalho (Treadway et al., 2014; Liu et al. 2014; Cullen et al., 2018; Chen, Jiang & Wu, 2021). Kimura, Bande e Fernández-Ferrín (2018) confirmaram a influência da habilidade política sobre o desempenho de vendedores, devido à sua capacidade de se relacionar com consumidores e se adaptar com facilidade a mudanças ambientais. Good e Schwepker Jr. (2022) analisaram a relação entre a habilidade política e o desempenho de vendedores.Para os autores, vendedores habilidosos utilizam suas qualidades interpessoais para entender os compradores e influenciar suas decisões. Os resultados indicam que a habilidade política está positivamente associada à construção de relacionamentos com clientes e ao desempenho em vendas (Good & Schwepker Jr., 2022).
A reputação vem sendo objeto de estudo em organizações públicas com foco na reputação das organizações públicas e seus efeitos em termos de legitimidade, autonomia e poder (Bustos, 2021). Especificamente em órgãos reguladores, a reputação organizacional influencia a confiança dos regulados, facilitando a cooperação, a troca de conhecimentos e informações, de forma que a reputação é compreendida como um ativo para as organizações públicas em seu relacionamento com a sociedade (Capelos et al., 2016; Bustos, 2021; Davidovitz & Cohen, 2021; Peci, 2021). Entende-se que esse argumento também é válido sob uma perspectiva inversa, uma vez que há reciprocidade nos relacionamentos (Yang, 2005). A reputação de indivíduos representantes de organizações privadas é um ativo em seu relacionamento com organizações públicas, pois facilita o acesso, a troca de conhecimentos e informações e o estabelecimento de relações cooperativas (Nastase & Muumans, 2020).
A exemplo da habilidade política, a reputação pessoal também exerce relevante influência sobre o desempenho no ambiente de trabalho (Laird et al., 2013; Zinko et al. 2012). Cavazza, Guidetti & Pagliaro (2014) indicam que indivíduos com uma reputação favorável têm mais chances de acesso a recursos por meio da colaboração e interação social. Graham, Harvey e Puri (2015) identificam a reputação do gerente como fator determinante para alocação de recursos em projetos. Zinko et al. (2017) apresentam evidências de que a reputação pode fazer a diferença na troca de informações entre indivíduos que não se conhecem pessoalmente. Possuir reputação positiva em um grupo aumenta as chances de se atingir melhor desempenho e de criar impressões favoráveis que levam a melhores avaliações de desempenho (Blickle et al., 2011). Yang, Volet e Mansfield (2018) apontam a reputação do supervisor como fator determinante para escolha do programa de Doutorado por parte de discentes. Zinko et al. (2012) demonstraram que boa reputação pode ainda proporcionar mais poder ao indivíduo, maior autonomia para agir no trabalho e progresso na carreira. O indivíduo de reputação favorável tem mais chances de ser eficaz ao influenciar outras pessoas, pois são vistos como mais confiáveis (Hochwarter et al., 2007; Yang, Volet & Mansfield, 2018).
Além de influenciar o desempenho no contexto social, a reputação é uma ferramenta de controle social (Cavazza, Guidetti & Pagliaro, 2014). Indivíduos se preocupam com a imagem que é formada e projetada de si mesmas para um grupo ao qual pertencem, por isso moderam suas atitudes e moldam seus comportamentos de modo a se adequar a cada ambiente por medo de sanções sociais (Duran, 2016). Ao analisar o processo de registro voluntário de organizações de lobby e de defesa de interesses na União Europeia, Nastase e Muumans (2020) identificam preocupações e benefícios para a reputação como o principal indutor do comportamento.
Reputação pessoal refere-se a uma percepção coletiva compartilhada sobre os atributos de um indivíduo (Laird et al., 2013). A reputação é composta pelas percepções favoráveis e desfavoráveis de diferentes públicos que emergem de ações e resultados passados (Capelos et al., 2016; Peci, 2021), de forma que a reputação é um conceito multifacetado, indicando que uma mesma pessoa ou organização pode ter mais de uma reputação a depender dos atributos considerados e do público a que se destina (Bromley, 2001; Bustos, 2021). Indivíduos podem ter diferentes reputações em grupos diversos. A reputação que um indivíduo carrega na empresa em que trabalha é diferente da que possui no ambiente familiar ou entre amigos. Mesmo dentro de uma mesma organização o indivíduo pode possuir reputações diversas pelos diferentes departamentos e setores da companhia (Ferris et al., 2007; Laird et al., 2013).
Mui, Halberstadt e Mohtashemi (2003) propuseram uma árvore de tipologias da reputação em que o conceito é separado entre reputação do grupo e do indivíduo. Normalmente o foco do estudo da reputação recai sobre a organização, contudo Bustos (2021), em uma revisão da literatura sobre o tema em administração pública, indica a necessidade de estudos com enfoque sobre a reputação do indivíduo. Para Mui, Halberstadt e Mohtashemi (2003) a reputação individual pode ser dividida em reputação direta e indireta. A reputação direta refere-se a percepções derivadas da experiência e observação direta do avaliador, enquanto que a indireta se refere à reputação baseada em evidências de segunda mão, como aquela adquirida por meio da “boca a boca” (Mui, Halberstadt e Mohtashemi, 2003).
Embora as reputações organizacionais e individuais interajam entre si, elas podem ser estudadas de forma separada (Capelos et al., 2016). Com foco especificamente sobre o indivíduo, Zinko, Gentry e Laird (2016) construíram um modelo multidimensional que avalia a reputação a partir de três diferentes perspectivas não necessariamente correlacionadas: (i) Reputação de Tarefa; (ii) Reputação Social; e (iii) Reputação de Integridade. Importante destacar que diferentes dimensões da reputação podem ter diferentes impactos sobre a percepção de desempenho (Capelos et al., 2016). Zinko, Gentry e Laird (2016) argumentam pela necessidade de estudos que considerem as diferentes dimensões da reputação individual.
A dimensão da Reputação de Tarefa (task reputation) diz respeito à reputação pessoal formada com base nos resultados obtidos da realização de tarefas (Zinko, Gentry & Laird, 2016). Está baseada na percepção de competência, conhecimento e efetiva entrega de resultados (Capelos et al., 2016). Irwin e Githinji (2015) ressaltam o papel da competência e da expertise técnica para o acesso de grupos de interesse aos responsáveis pela elaboração de políticas públicas.
A Reputação Social (social reputation) está interligada ao convívio e às interações sociais com outros atores (Ferris et al., 2005). O ambiente de trabalho envolve interdependência, e as pessoas dependem umas das outras para atingir seus objetivos pessoais e organizacionais, nesse sentido a capacidade de interação dos indivíduos exerce papel fundamental em como são enxergados por colegas e stakeholders da organização. Nesse contexto de interação contínua, a reputação social se forma com base nas interações (ou falta delas) com outras pessoas (Zinko, Gentry & Laird 2016).
A reputação pessoal construída com base na integridade (integrityreputation) se refere ao quão íntegro (ou não) o indivíduo é percebido por outros. Reflete a capacidade de demonstrar empatia e se comunicar de forma honesta (Capelos et al., 2016). A Reputação de Integridade é um componente essencial da reputação pessoal e é um atributo relevante em diversos contextos sociais, seja no trabalho, na família ou na comunidade religiosa (Zinko et al., 2012). A integridade como componente necessário para a reputação, pois permite que o público ultrapasse a percepção sobre outros comportamentos e desenvolva expectativas sobre a forma de agir do indivíduo em qualquer situação (Zinko, Gentry & Laird 2016).
Conforme argumentado nas seções anteriores, a habilidade política e a reputação individual se associam positivamente ao desempenho no ambiente de trabalho e proporcionam diversos benefícios para o indivíduo. Além dessas associações, pesquisas indicam que habilidade política influencia positivamente a reputação pessoal (Liu et al., 2007; Laird, Zboja & Ferris, 2012; Zinko & Rubin, 2015). O desenvolvimento de uma reputação pessoal envolve a tomada de ações deliberadas com o intuito de gerar e manter impressões positivas sobre a identidade criada (Laird, Zboja & Ferris, 2012). Indivíduos politicamente qualificados têm alta habilidade para desenvolver relacionamentos, são percebidos como sinceros e autênticos, mesmo em ambientes de manipulação, e possuem capacidade de interpretar comportamentos alheios com precisão e adaptar suas atitudes para influenciar outras pessoas (Banister & Meriac, 2014; Good & Schwepker Jr. 2022). Consequentemente, esses indivíduos inspiram maior confiança e transmitem sinais que conduzem a uma imagem favorável aos outros, resultando em avaliações de reputação pessoal mais altas (Ferris et al., 2005; Laird et al., 2013).
Indivíduos com alto nível de habilidade política combinam uma compreensão aguçada de situações sociais com a capacidade de ajustar seu comportamento para atender às necessidades de mudança, aspectos que inspiram confiança e permitem a influência e controle sobre os outros (Liu et al., 2007). Além da observação direta influenciar a reputação, há outro fator que contribui para isso. A habilidade política vai permitir que os indivíduos comuniquem seu sucesso de forma sincera e efetiva, melhorando, assim, sua imagem e reputação (Laird et al., 2013; Russel et al., 2016). Isso implica dizer que a habilidade política molda a forma como outras pessoas percebem e avaliam a reputação de um indivíduo (Munyon et al., 2015).
Além disso, é possível observar a reputação pessoal exercendo papel relevante na relação entre habilidade política e desempenho. Laird et al. (2013) concluíram que a habilidade política proporciona aos funcionários a capacidade de destacar seu desempenho de maneira favorável, resultando na formação de percepções positivas da reputação pessoal. Os resultados do estudo mostram que o desempenho no trabalho foi positivamente associado à reputação pessoal de funcionários politicamente qualificados, mas não a indivíduos com pouca habilidade política (Laird et al., 2013). Esses achados indicam a existência de função relevante da reputação pessoal na relação entre habilidade política e desempenho. Paralelamente, foram encontradas evidências de que a reputação exerce papel mediador entre habilidade política e desempenho. Liu et al. (2007) detectaram que a relação entre habilidade política e desempenho no trabalho foi totalmente mediada pela reputação pessoal.
Observa-se nos estudos citados que a reputação e a habilidade política foram abordadas como construtos unidimensionais. Avanços nas pesquisas com os construtos demonstraram a multidimensionalidade da habilidade política (Ferris et al., 2005; Banister & Meriac, 2014; Kimura, Bande & Fernández-Ferrín, 2018; Chen, Jiang & Wu, 2021) e da reputação (Mui, Halberstadt & Mohtashemi, 2003; Capelos et al., 2016; Zinko, Gentry & Laird 2016). Em que pese as evidências empíricas encontradas, análises com as dimensões dos construtos podem evidenciar relações distintas que detalhem melhor a interação entre reputação e habilidade política (Liu et al., 2007). Trata-se de uma lacuna teórica que a presente pesquisa preencher tanto para a literatura de habilidade política quanto para de reputação. A Figura 1 sintetiza as relações propostas no presente referencial teórico.

O presente estudo foi realizado com informações coletadas de respostas de funcionários de agências reguladoras federais brasileiras que lidam diretamente com representantes de empresas reguladas e grupos de interesse. Foram pesquisadas quatro Agências Reguladoras do setor de infraestrutura: Agência Nacional de Transporte Terrestre (ANTT), Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC), Agência Nacional de Transporte Aquaviário (ANTAQ) e Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL). Os questionários foram aplicados de forma presencial, entre os meses de junho e julho de 2019, e buscaram avaliar a percepção do respondente sobre um representante da iniciativa privada com quem se relacionasse diretamente em suas atividades profissionais. A avaliação por terceiros foi empregada por Laird et al. (2013), Laird, Zboja e Ferris (2012) e Kwon (2020) em estudos sobre reputação, habilidade política e desempenho. A amostra final contou com 82 respostas. A Tabela 1 sumariza o quantitativo de respostas obtidas por Agência Reguladora.

Habilidade Política. A avaliação da habilidade política foi realizada a partir de uma perspectiva multidimensional, buscando-se a avaliação das quatro dimensões do construto: Astúcia Social, Influência Interpessoal, Habilidade de Networking e Sinceridade Aparente. Foi utilizada a escala Political Skill Inventory (PSI) (Ferris et al., 2005), por já ter sido amplamente utilizada e validada em pesquisas empíricas sobre o tema (Chen, Jiang & Wu, 2021).
Reputação Pessoal. A exemplo do construto anterior, a reputação pessoal também foi avaliada em uma perspectiva multidimensional, a partir da mensuração de três dimensões: Reputação Social; Reputação de Tarefa; e Reputação de Integridade. Foi utilizada a escala criada por Zinko, Gentry e Laird (2016), que engloba as diferentes dimensões de reputação.
Desempenho. A presente pesquisa trata ambiente de interação entre funcionários públicos e representantes de empresas reguladas/ grupos de interesse, de forma que se optou pela avaliação do desempenho individual a partir de uma perspectiva contextual. O desempenho contextual está associado a interações com outros indivíduos e comportamentos que demonstram autodisciplina, persistência e disposição para se esforçar no trabalho e envolve padrões comportamentais que sustentam o contexto psicológico e social no qual as atividades da tarefa são realizadas (Scotter, Motowidlo & Cross, 2000). Para avaliar o desempenho contextual foi utilizada a escala criada por Borman e Motowidlo (1993). Os itens foram avaliados em uma escala de 1 (nada provável) a 7 (extremamente provável).
As questões dos três construtos foram avaliadas em uma escala Likert de sete pontos, variando de 1 (discordo totalmente) a 7 (concordo totalmente). A referida escala é comumente utilizada no campo de estudos sociais aplicados (Bryman, 2008) e tem uma quantidade de pontos que possibilita uma maior sensibilidade da escala, fugindo do ponto central, ao mesmo tempo que não demanda demasiado esforço do respondente (Lee e Lings, 2008). Anterior à efetiva aplicação, as escalas citadas foram adaptadas ao contexto da pesquisa e foram submetidas à avaliação por quatro pesquisadores doutores com experiência em pesquisas sobre os construtos com vistas à verificar a adequação e a pertinência dos itens para mensuração dos construtos. O questionário foi submetido à pré-teste com respondentes com perfil similar ao da população pesquisada com vistas a identificar eventuais problemas de compreensão das perguntas e das escalas utilizadas. O Quadro 1 apresenta os construtos e os itens utilizados para mensuração.

Os dados foram analisados com análise fatorial e análise de regressão múltipla. A análise fatorial foi empregada para a sumarização das variáveis do questionário e verificação dos fatores propostos pela teoria. Conforme proposto no referencial teórico, a Habilidade Política e a Reputação são construtos compostos por diferentes dimensões, de forma que as variáveis afetas a cada construto foram analisadas em conjunto. Dessa forma, realizou-se uma análise fatorial para cada construto, além de uma específica o Desempenho. As três análises fatoriais foram realizadas pela técnica de componentes principais. A extração dos fatores se deu com base na análise do Autovalor (Eigenvalue), sendo extraídos fatores com autovalores maiores que 1. Para facilitar a interpretação dos fatores e reforçar que as variáveis tivessem cargas fatoriais altas em um único fator, utilizou-se a rotação Varimax e as variáveis com cargas inferiores foram suprimidas. Ademais, seguindo as orientações de Hair Jr. et al. (2010), o teste de esfericidade de Barlett e o indicador KMO foram utilizados para verificar a adequação da análise fatorial. Variáveis com comunalidades abaixo de 0,5 foram removidas das análises.
Uma vez criados os fatores, foi empregada a análise de regressão múltipla para verificar a associação entre os fatores criados e o desempenho percebido pelos respondentes. Foram testados diversos modelos com vistas a identificar as associações individuais dos construtos e o desempenho, assim como eventuais associações entre os fatores da Habilidade Política e da Reputação. Com vistas a testar a potencial relação de mediação da Reputação sobre a relação entre Habilidade Política e Desempenho, foram realizadas análises de regressão adotando os fatores da Reputação como variáveis dependentes e os fatores da Habilidade Política como variáveis independentes. A seção seguinte apresenta os resultados das análises estatísticas.
Os resultados da análise fatorial com as variáveis sobre Habilidade Política resultaram na criação de quatro fatores que explicam 74,94% da variância original dos dados. O coeficiente KMO e o teste de Barlett apresentaram valores aceitáveis (0,851 e p < 0,00) de acordo com os padrões descritos por Hair Jr. et al. (2010). Foram excluídas das análises variáveis com comunalidades inferiores a 0,5, bem como com carga fatorial alta em mais de um fator. Por fim, foi aplicado o coeficiente Alpha de Cronbach para avaliar a adequabilidade das escalas utilizadas para a mensuração dos fatores (Tabela 2).

Os fatores criados mostram-se alinhados com os trabalhos de Ferris et al. (2005) e Ferris et al. (2007), de forma que o primeiro fator criado congrega variáveis que tratam sobre a capacidade de influência pessoal do agente, sendo o fator denominado Influência. O segundo fator traz variáveis afetas à astúcia social dos indivíduos, sendo denominada Astúcia. O terceiro fator é composto por variáveis afetas à sinceridade aparente do indivíduo, de forma que foi denominado Sinceridade. Por fim, o quarto e último fator agrega variáveis sobre a capacidade de construção de redes de contatos, sendo denominado Networking. A confiabilidade dos fatores foi avaliada a partir do Alpha de Cronbach. Observa-se que todos os demais apresentaram valores dentro dos parâmetros considerados adequados por Hair Jr. et al. (2010).
Os resultados das análises com o construto Reputação (Tabela 3) apresentaram coeficiente KMO e teste de Barlett adequados (0,834 e p < 0,00 respectivamente) e indicaram a criação de 3 fatores que explicam 81,64% da variância original das variáveis. O coeficiente Alpha de Cronbach apresentou valores adequados para os 3 fatores. Os resultados da análise fatorial com as variáveis do construto Reputação correspondem ao proposto por Zinko et al. (2016). Seguindo o proposto pelos autores, os fatores criados foram denominados de Integridade, Tarefa e Social.

Por fim, foi realizada análise fatorial com as variáveis associadas ao construto Desempenho. Os resultados (Tabela 4) apresentaram coeficiente KMO e teste de Barlett adequados (0,928 e p < 0,00 respectivamente) e indicaram a criação de um único fator, denominado Desempenho, que explica 73,88% da variância original. O Alpha de Cronbach também apresentou resultados adequados, indicando a confiabilidade da escala adotada.

Como forma de possibilitar a efetiva redução das variáveis a serem empregadas nas análises subsequentes, os fatores criados foram transformados em valores a partir da média dos valores das variáveis que os compõem, conforme orientações de Hair Jr. et al. (2010).
A partir da criação dos fatores não foram detectados casos faltantes, no entanto quatro observações foram eliminadas por se tratar de casos extremos. O diagnóstico de multicolinearidade foi feito por meio da correlação de Pearson e não evidenciou a presença de altas correlações entre os fatores. Os dados foram, então, submetidos à análise de regressão múltipla, adotando o Desempenho como variável dependente e os fatores afetos à Habilidade Política e à Reputação pessoal como variáveis independentes. Os resultados são apresentados na Tabela 5.

Legenda: * variável significativa a P <0,1; ** variável significativa a P < 0,05; *** variável significativa a P < 0,01; (-) variável não inserida no modelo.
O primeiro modelo testado incluiu os fatores afetos ao construto Habilidade Política. Os resultados encontrados indicam que somente os fatores Influência Interpessoal e Sinceridade Aparente estão positivamente associados ao Desempenho no ambiente de trabalho. Esses resultados significativos corroboram a perspectiva de que a habilidade política se associa de forma positiva ao desempenho (Treadway et al., 2014; Liu et al., 2014; Munyon et al., 2015), também no ambiente de relacionamentos para defesa de interesses.
O indivíduo com elevada Sinceridade Aparente é capaz agir demonstrando sinceridade e honestidade de forma genuína, inspirando confiança (Banister & Meriac, 2014; Chen, Jiang & Wu, 2021; Good & Schwepker Jr., 2022), mesmo quando há segundas intenções em suas atitudes (Ferris et al., 2012). Ao possibilitar que os indivíduos sejam vistos de forma favorável (Kimura, 2015), a Sinceridade Aparente possibilita a prática da influência (Ferris et al., 2005; Ferris et al., 2007). Os resultados encontrados confirmam essas perspectivas também para o ambiente de interação com servidores públicos, de forma que a habilidade cognitiva de aparentar sinceridade e despertar confiança mostram-se relevantes para o bom desempenho na interação com servidores de agências reguladoras.
A Influência Interpessoal, por sua vez, corresponde à capacidade de se adaptar e calibrar adequadamente o comportamento a cada situação (Ferris et al., 2005; Pfeffer, 2010), de forma a se comunicar de forma eficaz para a efeitos de persuasão e, assim, obter respostas específicas (Kimura, 2015; Wang & Hall, 2019). A influência interpessoal é responsável por tornar o comportamento selecionado dos indivíduos politicamente qualificados mais eficaz (Whiler et al., 2017). Para Wang e Hall (2019) e Kwon (2020) essa dimensão refere-se à uma competência de comunicação. Aqueles com capacidade de influenciar possuem uma forma particular de se comunicar, que interfere positivamente na qualidade de seus relacionamentos e nas percepções de desempenho (Liu et al., 2014). Em um ambiente de competição por acesso ao órgão regulador (Hanegraaff, Ploeg & Berkhout, 2020; Davidovitz & Cohen, 2021), como o analisado, tal característica tende a se sobressair, o que explica a associação positiva encontrada.
Apesar da Astúcia Social ser descrita como uma relevante dimensão da habilidade política (Kwon 2020), se relacionando com o desempenho no trabalho (Munyon et al. 2015), os resultados não corroboraram com essa perspectiva. A referida dimensão refere-se à capacidade de interpretar com precisão o seu próprio comportamento, assim como o de outros, em diferentes contextos sociais (Chen, Jiang & Wu, 2021; Good & Schwepker Jr., 2022). A Habilidade de Networking trata da capacidade de identificar contatos relevantes e construir relacionamentos com eles (Wihler et al., 2017; Chen, Jiang & Wu, 2021; Good & Schwepker Jr., 2022), resultando em benefícios para o indivíduo (Ferris et al., 2005; Wang & Hall, 2019).
Tanto a Astúcia Social quanto a Habilidade de Networking não apresentaram uma associação estatisticamente significativa com o Desempenho. Em ambos os casos, a falta de significância pode ser explicada pela existência de procedimentos padronizados de atendimento por parte do órgão público, de forma a assegurar a isonomia de tratamento entre os agentes privados (Campos et al., 2000). Essa característica reduziria as possíveis variações nos contextos sociais e principalmente orientaria os comportamentos das partes, de forma a reduzir o papel da Astúcia Social e sua influência sobre o desempenho.
O segundo modelo testado incluiu somente os fatores afetos à Reputação pessoal. Os achados indicaram que somente a Reputação Social e a Reputação de Integridade se associaram positivamente ao Desempenho. Preocupações e benefícios com a reputação induzem o comportamento dos indivíduos (Cavazza, Guidetti & Pagliaro, 2014; Nastase & Muumans, 2020). Considerando se tratar de um ambiente de convívio constante, a capacidade de fazer com que as pessoas se sintam confortáveis nas interações, associada à Reputação Social, e de ser percebido como honesto e sincero, associado à Reputação de Integridade (Capelos et al., 2016; Zinko, Gentry & Laird 2016) confirmam-se como ativos do indivíduo que se associam diretamente ao seu desempenho no ambiente de trabalho.
De maneira diversa, a Reputação de Tarefa, ou seja, a reputação pessoal formada com base nos resultados obtidos na execução e desempenho de suas atividades (Capelos et al., 2016; Zinko, Gentry & Laird 2016), não apresentou resultados significativos. Competência e expertise técnica são normalmente descritos como recursos empregados por grupos de interesse para acesso a órgãos e decisores (Irwin & Githinji, 2015; Fraussen & Beyers, 2016). Tal perspectiva não parece ser corroborada pelos resultados. Eventualmente, no contexto analisado, uma reputação favorável em termos de capacidade técnica e conhecimentos seja uma condição mínima necessária para o acesso, não se refletindo em um diferencial com capacidade de diferenciar o desempenho dos agentes privados.
Os Modelos 3 e 4 testaram os fatores de Habilidade Política e Reputação de maneira conjunta, sendo que no Modelo 3 foram inseridas todas as variáveis. No Modelo 4 foram inseridas somente aquelas variáveis que apresentaram significância estatística em algum dos modelos anteriores. Somente os fatores Reputação Social e Reputação de Integridade mantiveram a associação positiva ao desempenho. Os fatores, Influência Interpessoal e Sinceridade Aparente (relacionados à Habilidade Política), inicialmente significativos (conforme Modelo 1), tornaram-se não-significativos com a inserção das dimensões relacionadas à reputação pessoal. Esses resultados indicam uma situação de mediação da Reputação sobre a relação entre Habilidade Política e Desempenho.
A relação entre habilidade política e desempenho é mediada pela reputação individual, sugerindo que, no contexto analisado, a habilidade política é um antecedente da reputação e que sua influência sobre a percepção de desempenho do indivíduo ocorre a partir da construção de uma reputação no ambiente de trabalho. Essa perspectiva corrobora os argumentos de Laird, Zboja e Ferris (2012) e Laird et al. (2013) de que a habilidade política do indivíduo influencia positivamente a percepção de outras pessoas e a construção da reputação.
O papel mediador da Reputação sobre a relação entre Habilidade Política e Desempenho já havia sido descrito anteriormente pela literatura (Liu et al., 2007), contudo os autores trataram os construtos como unidimensionais. A reputação individual e a habilidade política são conceitos multidimensionais (Ferris et al. 2005; Zinko, Gentry & Laird, 2016). Ao abordar as dimensões dos construtos, foi possível detalhar o efeito mediador e observar que, ao menos para o contexto das agências reguladoras estudadas, a relação de mediação ocorre entre dimensões específicas dos construtos. Esse achado constitui uma contribuição teórica do presente trabalho.
Como forma de testar a associação entre os fatores de Habilidade Política e de Reputação (Banister & Meriac, 2014; Zinko & Rubin, 2015; Good & Schwepker Jr. 2022), foram testados dois modelos complementares assumindo os fatores de Reputação Individual com resultados significativos como variáveis dependentes e os fatores de Habilidade Política com resultados significativos como variáveis independentes. Os resultados são apresentados na Tabela 6.

Ambos os modelos testados se mostraram significativos e com expressiva capacidade de explicar as dimensões da Reputação (coeficiente R² de 0,47 e 0,43). Os resultados encontrados evidenciam que o fator Sinceridade Aparente se associa positivamente aos fatores Reputação Social e Reputação de Integridade. É possível dizer que a habilidade de aparentar sinceridade é fundamental para forma como a reputação por ser uma pessoa íntegra e honesta é projetada para outros indivíduos (Laird et al., 2013; Russel et al., 2016). Sabe-se que a sinceridade permite que os indivíduos politicamente qualificados possam até mesclar quaisquer segundas intenções, se estiverem presentes (Ferris et al., 2012). Assim, pessoas com altos níveis de Sinceridade Aparente são enxergadas por outros como sinceras e honestas, mesmo quando não estiverem sendo, gerando uma Reputação de Integridade positiva. Portanto, é possível afirmar que aqueles que conseguem aparentar sinceridade em suas ações estão mais propensos a serem enxergados pelo público como seres de alta integridade.
O fator Influência Interpessoal, por sua vez, associa-se de forma significativa e positiva ao fator Reputação Social, porém não apresenta resultados significativos com o fator Integridade. A influência interpessoal é entendida como a capacidade do indivíduo adaptar seu comportamento e exercer influência de forma a mudar as expectativas dos outros de maneira sutil e convincente (Kimura, 2015; Cheng, Jiang & Wu, 2021). A Reputação Social, por sua vez, diz respeito à reputação desenvolvida a partir do convívio e da interação no meio social (Ferris et al., 2005; Zinko, Gentry & Laird, 2016), de forma que a associação positiva entre os construtos parece natural. Diferentemente da Reputação de Integridade, que requer o desenvolvimento de uma imagem percebida como honesta, franca e íntegra (Capelos et al., 2016; Zinko, Gentry & Laird 2016. Enquanto a primeira reputação deriva da afabilidade nas interações, a segunda impõe uma expectativa de comportamento mais elevada.
Este trabalho teve como objetivo analisar a relação entre habilidade política, reputação individual e desempenho de agentes privados em suas interações com órgãos reguladores. A interação entre agentes públicos e privados no contexto de políticas regulatórias é um tema ainda incipiente no Brasil. Não se observam pesquisas nacionais com foco em identificar os atributos relevantes dos agentes privados para o seu desempenho na sua interação com o órgão regulador. Para consecução do objetivo, foram coletadas informações sobre a percepção de funcionários de agências reguladoras sobre um representante da iniciativa privada com quem se relacionasse diretamente em suas atividades profissionais.
Os resultados encontrados corroboraram a perspectiva de que tanto a habilidade política quanto a reputação individual se associam positivamente à percepção de desempenho do agente privado em suas interações com organizações públicas. Ressalte-se que, na presente pesquisa, a habilidade política e a reputação individual foram avaliadas em uma perspectiva multidimensional, o que possibilitou precisar quais dimensões dos construtos efetivamente são relevantes para o desempenho no ambiente de trabalho analisado, assim como evidenciar interações entre as dimensões da reputação e da habilidade política.
Ao analisar as dimensões da Habilidade Política, os resultados encontrados indicam que somente as dimensões Influência Interpessoal e Sinceridade Aparente se relacionam de forma significativa com o desempenho. Considerando as dimensões da Reputação Individual, somente as dimensões Reputação Social e de Integridade se associaram de forma significativa à variável critério. Esses resultados corroboram a perspectiva de diferentes contextos podem demandar distintas dimensões da Habilidade Política e da Reputação e que esses construtos devem ser analisados sob uma perspectiva multidimensional, uma vez que os impactos de suas dimensões variam. Adicionalmente, contribuem com o campo de estudos sobre o tema ao atender uma lacuna identificada na literatura e ao expandir as discussões para o contexto de relacionamentos intraorganizacionais entre atores públicos e privados em um ambiente regulatório.
Os resultados indicaram ainda um efeito mediador das dimensões significativas da Reputação Individual sobre as dimensões da Habilidade Política, indicando que a relação entre habilidade política e desempenho ocorre de forma indireta a partir da construção de uma reputação positiva. A verificação da interação entre as dimensões dos construtos analisados, assim como a identificação de quais dimensões estão associadas ao desempenho no ambiente estudado são contribuições do presente trabalho à literatura.
Sob uma perspectiva prática, os resultados sugerem características a serem desenvolvidas pelos representantes de organizações privadas em ações de defesa de interesses junto a órgão reguladores. Em que pese se tratar de um campo de atuação politizado, para além da habilidade política, é necessário o desenvolvimento de uma reputação positiva. De forma específica, os resultados sugerem que a presença exclusivamente de habilidade política pode não ser condição suficiente para manutenção do desempenho no contexto analisado. Há a necessidade de esforços para a construção e manutenção de uma imagem positiva por parte de organizações privadas em seus relacionamentos com organizações públicas em ambientes regulatórios.
A presente pesquisa possui suas limitações. A amostra é reduzida e foi coletada de forma não-aleatória, o que não permite inferências populacionais sobre os resultados encontrados. Em vista dessas limitações, embora o artigo aponte para resultados observados na literatura, ainda se fazem necessárias mais pesquisas sobre os relacionamentos público-privados no contexto de Agências Reguladoras para corroborar ou refutar os achados ora apresentados. Os resultados encontrados, embora não permitam a inferência populacional, possibilitam hipóteses a serem testadas em pesquisas futuras.
A habilidade política, a reputação individual e o desempenho dos agentes privados foram analisados sob a perspectiva do interlocutor público. Outras perspectivas de análise (por exemplo do ente regulado) ou combinações de perspectivas poderiam ser empregadas para analisar as mesmas relações propostas. De forma similar, muitas são as formas de se mensurar e analisar o desempenho de um indivíduo. Pesquisas futuras podem avaliar as influências da habilidade política e reputação pessoal sob a ótica de diferentes formas de desempenho individual nas relações interorganizacionais. Além disso, futuros estudos longitudinais podem avaliar como estes padrões de comportamento se modificam, ou não, ao longo do tempo e em que situações.







Legenda: * variável significativa a P <0,1; ** variável significativa a P < 0,05; *** variável significativa a P < 0,01; (-) variável não inserida no modelo.
