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Análise do Efeitos Intertemporais dos Gastos Per Capita em Educação Sobre as Taxas de Crimes Violentos em Minas Gerais
Analysis of the Intertemporal Effects of Per Capita Spending on Education on Violent Crime Rates in Minas Gerais
Análisis de los efectos intertemporales del gasto per cápita en educación sobre los índices de delincuencia violenta en Minas Gerais
Administração Pública e Gestão Social, vol. 16, núm. 4, 2024
Universidade Federal de Viçosa

Artigos


Recepción: 10 Agosto 2023

Aprobación: 02 Agosto 2024

Publicación: 23 Diciembre 2024

Resumo: Objetivo da pesquisa: Analisar o efeito intertemporal dos gastos per capita em educação sobre as taxas de crimes violentos em Minas Gerais.

Enquadramento Teórico: As taxas de crimes violentos consideradas nesse estudo se referem a crimes desqualificados, segundo Lochner e Moretti (2004). Dessa forma, a elevação dos gastos per capita em educação tende a diminui-las. Além disso, conforme Williams e Sickles (2002), esse efeito ocorre com certa defasagem, que é considerada no trabalho.

Metodologia: Estimação de modelos econométricos com dados em painel dinâmico, considerando-se o período 2000-2021.

Resultados: Verificou-se existência de relação inversa entre gastos per capita em educação, defasados em três, quatro e cinco períodos, sobre as taxas de crimes violentos, sendo que o efeito com maior magnitude foi relativo a cinco defasagens. Além disso, foi encontrado que os crimes violentos são, em geral, cometidos pela parcela mais jovem dos municípios e em regiões com maior nível de atividade econômica. Ademais, notou-se que os crimes cometidos no passado influenciam aqueles notificados no período contemporâneo e a pandemia da COVID-19 afetou a atuação dos criminosos, reduzindo as taxas de criminalidade.

Originalidade: A pesquisa contribui com a literatura, especialmente brasileira, pois somente foram encontrados dois trabalhos similares, mas com períodos e objetos de estudo distintos. Além disso, o trabalho considera dados recentes e versa o caso de um estado, cuja participação em termos populacionais e econômicos no país é elevada, além de apresentar taxas de crimes violentos muito distintas entre suas mesorregiões.

Contribuições teóricas e práticas: O estudo contribui com a literatura brasileira relativa ao tema e pode contribuir na discussão relativa a alocação ótima dos gastos públicos em educação, levando em consideração o efeito defasado dos gastos per capita em educação sobre as taxas de crimes violentos, o que demanda planejamento de longo prazo.

Palavras-chave: Educação, Criminalidade, Painel dinâmico, Desenvolvimento econômico.

Abstract: Research objective: To analyze the intertemporal effect of per capita spending on education on violent crime rates in Minas Gerais.

Theoretical Framework: The violent crime rates considered in this study refer to disqualified crimes, according to Lochner and Moretti (2004). Therefore, increasing per capita spending on education tends to reduce them. Furthermore, according to Williams and Sickles (2002), this effect occurs with a certain lag, which is considered in this study.

Methodology: Estimation of econometric models with dynamic panel data, considering the period 2000-2021.

Results: An inverse relationship was found between per capita spending on education, lagged by three, four and five periods, and violent crime rates, with the largest effect relating to five lags. It was also found that violent crimes are generally committed by the youngest group of municipalities and in regions with a higher level of economic activity.In addition, it was noted that crimes committed in the past influence those reported in the contemporary period and the COVID-19 pandemic has affected the actions of criminals, reducing crime rates.

Originality: The research contributes to the literature, especially in Brazil, as only two similar studies were found, but with different periods and objects of study. In addition, the work considers recent data and deals with the case of a state whose share of the country's population and economy is high, as well as having very different violent crime rates between its mesoregions.

Theoretical and practical contributions: The study contributes to the Brazilian literature on the subject and can contribute to the discussion on the optimal allocation of public spending on education, considering the lagged effect of per capita spending on education on violent crime rates, which requires long-term planning.

Keywords: Education, Crime, Dynamic panel, Economic development.

Resumen: Objetivo de la investigación: Analizar el efecto intertemporal del gasto per cápita en educación sobre las tasas de delitos violentos en Minas Gerais.

Marco teórico: Las tasas de delitos violentos consideradas en este estudio se refieren a delitos descalificados, según Lochner y Moretti (2004). Por tanto, aumentar el gasto per cápita en educación tiende a reducirlos. Además, según Williams y Sickles (2002), este efecto se produce con un cierto desfase, que se tiene en cuenta en este estudio.

Metodología: Estimación de modelos econométricos con datos de panel dinámicos, considerando el período 2000-2021.

Resultados: Se encontró una relación inversa entre el gasto per cápita en educación, rezagado en tres, cuatro y cinco periodos, y las tasas de delitos violentos, siendo el efecto de mayor magnitud el relativo a cinco rezagos. También se constató que los delitos violentos suelen cometerse en el grupo de municipios más jóvenes y en las regiones con mayor nivel de actividad económica. Además, se observó que los crímenes cometidos en el pasado influyen en los reportados en el período contemporáneo y que la pandemia del COVID-19 ha afectado las acciones de los criminales, reduciendo los índices de criminalidad.

Originalidad: La investigación contribuye a la literatura, especialmente en Brasil, ya que sólo se encontraron dos estudios similares, pero con diferentes períodos y objetos de estudio. Además, el trabajo considera datos recientes y trata del caso de un estado cuya participación en la población y en la economía del país es alta, además de tener tasas de crímenes violentos muy diferentes entre sus mesorregiones.

Contribuciones teóricas y prácticas: El estudio contribuye a la literatura brasileña sobre el tema y puede contribuir a la discusión sobre la asignación óptima del gasto público en educación, teniendo en cuenta el efecto rezagado del gasto per cápita en educación sobre las tasas de delitos violentos, lo que requiere una planificación a largo plazo.

Palabras clave: Educación, Delincuencia, Panel dinámico, Desarrollo económico.

1 INTRODUÇÃO

O avanço da criminalidade tem gerado elevados custos para a sociedade, destacando-se em primeira instância os prejuízos materiais e os gastos tanto públicos quanto privados, seguidos pela redução da qualidade de vida, do turismo e investimentos, além da perda de capital humano (Santos & Kassouf, 2008).

Tendo em vista a participação dos referidos custos no orçamento público, é possível mensurar sua dimensão no Brasil, comparando-se suas estatísticas de criminalidade com as de outros países. De acordo com Santos e Kassouf (2008), a taxa de homicídios é a medida mais adequada para mensurar a ocorrência de crimes devido a elevada taxa de subregistro das demais categorias de crimes, particularmente daquelas contra a propriedade. Assim, entre os 20 países com as maiores taxas de homicídios, 13 pertenciam a América Central e o Brasil era o segundo colocado da América do Sul, atrás apenas da Venezuela, com uma taxa de 27,8 homicídios por 100 mil habitantes (Instituto Igarapé, 2018).

Diante da expressividade das taxas de criminalidade nos países em desenvolvimento e particularmente no Brasil, diversas Ciências têm se debruçado na análise desse fenômeno, tais como a Psicologia, o Direito, a Economia, a Administração Pública, as Ciências Sociais, e etc.; demonstrando o caráter multidisciplinar do tema. Nesse sentido, diversos fatores socioeconômicos já foram atrelados ao crime, tais como o nível de renda, a taxa de desemprego, os níveis de pobreza e desigualdade, além da educação, que é o foco desse estudo, a partir das contribuições seminais de Arrow (1997) e Becker e Mulligan (1997).

De modo geral, a literatura relativa ao tema encontra tanto relações positivas quanto negativas entre educação e criminalidade. Os efeitos negativos apontam que a educação pode reduzir as taxas de crimes desqualificados, como crimes violentos (homicídios, roubos, extorsão, sequestro e estupro), ou seja, aqueles que não requerem maior planejamento e habilidade. Teoricamente, por meio da melhoria dos indicadores educacionais, como por exemplo, maior frequência dos jovens nas escolas, a tendência é que haja redução na probabilidade de que eles ingressem em atividades ilícitas (Lochner & Moretti, 2004).

Por outro lado, a literatura também encontra relação diretamente proporcional entre educação e criminalidade para crimes considerados qualificados, como é o caso do estelionato. Esse tipo de delito demanda maior nível de planejamento, execução e habilidade por parte dos infratores, que usualmente pode ser adquirida com mais anos de estudo (Becker, 1968).

No caso do presente estudo, leva-se em consideração a relação da educação com crimes desqualificados, visto que o objetivo do trabalho é analisar o efeito intertemporal dos gastos per capita em educação sobre os crimes violentos. Dessa forma, com maiores incentivos governamentais, por meio dos gastos públicos em educação, eleva-se o nível educacional e consequente o nível de capital humano, com redução das taxas de crimes desqualificados (Becker & Kassouf, 2017).

Segundo parte da literatura, os gastos em educação apresentam efeitos geralmente defasados sobre o avanço da criminalidade, ou seja, trazem retornos futuros e não imediatos. Essa relação no tempo está atrelada ao fato de que o nível educacional atual corresponde a um processo de acumulação de capital humano durante a vida do indivíduo, sendo assim necessário mais tempo para que a sociedade absorva seus efeitos (Lochner, 2004; Cunha, Heckman, Lochner & Masterov, 2006).

Tal relação foi verificada no estudo para o Brasil de Becker e Kassouf (2017), assim como no trabalho realizado por Fochezatto, Petry, Braatz e Marcondes (2018) para os municípios do estado do Rio Grande do Sul, no qual verificou-se a existência de relação negativa entre gastos educacionais e taxas de crimes, reforçando que a educação pode reduzir a criminalidade após determinado período.

Dessa forma, apoiando-se na literatura relativa ao tema, o presente estudo tem como objetivo analisar se o efeito intertemporal dos gastos per capita em educação, defasados em até cinco períodos, pode reduzir as taxas de crimes violentos no estado de Minas Gerais, considerando-se o período 2000-2021. Justifica-se a escolha do referido estado em virtude de sua importância econômica, pois de acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística [IBGE] (2020), corresponde ao terceiro no país com maior participação no Produto Interno Bruto (PIB) e o segundo em termos de contingente populacional.

Além disso, por mais que o estado de Minas Gerais não figure entre aqueles com as maiores taxas de crimes violentos no país, os indicadores são alarmantes quando comparados aos de outros países latino-americanos. Segundo o Atlas da Violência de 2021, Minas Gerais apresentou uma taxa de 12,03 homicídios para cada 100 mil habitantes. Este percentual é relativamente baixo comparado a taxa de 22,42 por 100 mil habitantes registrada no Brasil (IPEA, 2021). No entanto, a partir de dados da United Nations Office on Drugs and Crime [UNODC] (2017), observou-se que em países geograficamente próximos, como Uruguai (8,2), Peru (7,7), Equador (5,8), Argentina (5,1) e Chile (4,3), as taxas de homicídios por 100 mil habitantes foram significativamente inferiores.

Ademais, o estado de Minas Gerais chama a atenção pela disparidade socioeconômica e em termos de avanço da criminalidade entre suas mesorregiões. Segundo dados da Secretaria de Estado de Justiça Pública [Sejusp] (2021), foram registradas 128,04 mortes por 100 mil habitantes oriundas dos crimes violentos na mesorregião Metropolitana de Belo Horizonte em 2021. Concomitantemente, esta taxa foi de 51,32 para a mesorregião Campo das Vertentes, ou seja, aproximadamente 149% inferior em relação a primeira. Nesse sentido, segundo Dellasoppa et al. (1999), a violência urbana é causada por inúmeros fatores nebulosos e conflitantes, que existem em dimensões distintas e oscilam desde indivíduos a sociedades inteiras. Logo, a heterogeneidade característica do estado representa uma síntese da realidade brasileira, tornando-o instrumento útil para a avaliação da criminalidade no país.

Dessa forma, mediante a importância do estado de Minas Gerais para o país e considerando-se que na literatura brasileira foram encontrados apenas dois trabalhos similares, Becker e Kassouf (2017) e Fochezatto, Petry, Braatz e Marcondes (2018), esta pesquisa pode contribuir com a literatura brasileira relativa ao tema. Além disso, leva-se em consideração um maior período (2000 a 2021) e são utilizados dados mais recentes, o que permite uma análise mais robusta, visto que o modelo de dados em painel dinâmico, utilizado no trabalho, apresenta melhores resultados quando o intervalo de tempo é mais elevado. Para a consecução do estudo, além dessa introdução, a próxima seção descreve as evidências empíricas relativas ao tema, seguida pela seção metodológica, resultados e considerações finais.

2 EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS

Como especificado na seção anterior, há divergências na literatura a respeito da relação entre educação e criminalidade. De modo geral, a maioria dos trabalhos coincidem com o que foi proposto por Lochner e Moretti (2004), em que maiores anos de escolaridade implicam em reduções nas taxas de crimes desqualificados no longo prazo. Nesse estudo, os autores verificaram, a partir de um modelo descritivo simples sobre a tomada de decisão dos criminosos, que a conclusão do ensino médio reduz a probabilidade de prisão em 0,76 ponto percentual (p.p.) para pessoas brancas e em 3,4 p.p. para negros.

Outros trabalhos relativos ao tema, como Freeman (1996), destacaram a necessidade dos investimentos em educação para minimizar o número de infratores e, consequentemente, a quantidade de encarcerados. O autor analisou o território norte-americano, sendo que os resultados indicaram que em 1991, dois terços de todos os encarcerados haviam evadido o ensino médio e 12% dos que abandonaram o ensino médio entre 24 e 35 anos estavam presos em 1993.

Além disso, como supracitado, alguns trabalhos evidenciam que a educação pode diminuir as taxas de crime a partir de determinado período, pois é necessário que o indivíduo e a sociedade absorvam a melhoria do nível educacional. Estudos como aquele realizado por Williams e Sickles (2002) demonstraram que o impacto da educação sobre a criminalidade não ocorre de forma imediata, havendo uma certa defasagem. Os autores, por meio de modelo Probit, observaram que o acréscimo de 10% nos anos de escolaridade completos promove um efeito redutor de 0,1% na criminalidade na idade adulta.

Similarmente, os trabalhos nacionais de Becker e Kassouf (2017) e Fochezatto, Petry, Braatz e Marcondes (2018) também verificaram o efeito redutor da educação sobre a criminalidade. No primeiro estudo, as autoras observaram elasticidade de aproximadamente 0,1 para a primeira defasagem da variável gastos com educação, o que significa dizer que um incremento de 10% na referida variável implica em redução de 1% nas taxas de crimes desqualificados no período seguinte, considerando-se os estados brasileiros. Já o segundo trabalho concluiu que a elevação em uma unidade nos investimentos em educação para cada mil habitantes no período anterior pode provocar diminuição de 0,0053 crimes para cada mil indivíduos no período atual.

Como explicação teórica desses resultados, a literatura relativa ao tema aponta que o efeito da educação sobre a criminalidade não é imediato, pois a melhoria do nível educacional representa um processo complexo e atua por diferentes canais para reduzir a criminalidade. Segundo Lochner e Moretti (2004), as escolas podem promover aumento das habilidades e das capacidades individuais, o que, consequentemente, amplia as perspectivas futuras em termos de probabilidade de obtenção de empregos no mercado de trabalho formal e elevação dos salários.

Estas alterações nas perspectivas dos indivíduos corroboram com a teoria econômica do crime de Becker (1968), uma vez que indivíduos mais instruídos têm maior custo de oportunidade em cometer um delito. Outros trabalhos relativos ao tema, como Grogger (1998), Gould, Weinberg e Mustard (2002), Lochner (2004), Machin e Meghir (2004) e Edmark (2005), também verificaram que indivíduos mais capacitados são mais avessos ao risco e têm preferência pelos rendimentos formais em detrimento aos decorrentes do crime.

Além disso, Usher (1997) aponta que níveis mais elevados de gastos em educação permitem o incremento na qualidade do ensino, por meio da melhor infraestrutura escolar, qualidade e formação dos professores etc. Tais melhorias podem reduzir as taxas de evasão escolar, elevando, assim, a frequência escolar dos jovens. Dada a maior participação destes no ambiente escolar, elevam-se os anos de estudos e, consequentemente, os indivíduos adquirem habilidades e conhecimentos (ganhos em termos de capital humano), que são exigidos pelo mercado de trabalho formal, propiciando futuramente melhores empregos e maiores salários.

3 METODOLOGIA

3.1 Modelo Econométrico

Conforme Santos e Kassouf (2007), a metodologia de dados em painel corresponde a melhor forma de se analisar os efeitos da criminalidade. Segundo os autores, a vantagem decorre da possibilidade de controle da heterocedasticidade não observável, fixa no tempo, entre as unidades, que corresponde às características socioeconômicas e culturais que podem influenciar o comportamento dos cidadãos.

Além das vantagens da utilização dos dados em painel, para a regressão dos dados e estimação dos resultados, o presente estudo optou pela utilização específica de dados em painel dinâmico. Trabalhos anteriores, como os de Kume (2004) e Santos (2009), também utilizaram o referido método, levando em consideração sua adequação aos dados relativos à criminalidade. Segundo os autores, por meio da estimação com dados em painel dinâmico é possível controlar a relação de endogeneidade entre algumas variáveis inseridas no modelo, assim como atenuar o efeito da subnotificação das taxas de crime consideradas. Esse controle é muito importante, pois segundo Wooldridge (2011), a endogeneidade enviesa a estimação quando pelo menos um dos regressores está correlacionado com o termo de erro.

Além disso, considera-se a questão inercial, que é típica de dados relativos à criminalidade. Nesse sentido, insere-se a própria variável dependente, geralmente defasada em 1 período, com explicativa. De acordo com Arellano e Bond (1991) e Arellano e Bover (1995), a consideração do “efeito inércia” é fundamental, sendo ele consequência da possível correlação entre valores presentes e passados da variável dependente, Dessa forma, usualmente, estima-se o modelo via estimador Generalized method of moments (GMM), como apontado por Blundell e Bond (1998). Como o trabalho considera amostras finitas de dados para os municípios mineiros, a estimação por GMM System é consistente, além de se considerar erros padrão robustos para que a heterocedasticidade seja corrigida (Windmeijer, 2005).

Dessa forma, é possível definir o modelo padrão para dados em painel dinâmico da seguinte forma:




Combinando-se as duas primeiras equações, encontra-se a equação especifica a ser estimada, vide modelo (3). Substituindo-se os termos genéricos pelas variáveis utilizadas, sendo essas apresentadas no Quadro 1, abaixo, o modelo econométrico estimado apresenta-se da seguinte forma:





Quadro 1 - Variáveis incluídas na estimação do modelo econométrico

Fonte: Elaboração própria com base nos metadados da FJP (2023).

Em primeiro lugar, é importante definir que o painel é desbalanceado e a forma funcional da estimação é linear. Além disso, foi incluído o índice n, com o intuito de representar as cinco defasagens da variável de gastos per capita em educação a serem utilizadas, sendo que n varia de 1 a 5. No que tange a variável dependente, taxas de crimes violentos (crime), vide Quadro 1, a partir da definição de Lochner e Moretti (2004), ela se refere a modalidades de crime que se enquadram como desqualificadas, por não necessitarem de elevados níveis de planejamento.

Tendo em vista a utilização do modelo com dados em painel dinâmico, é comum utilizar a variável dependente defasada em um período como regressora para captar o efeito inércia, como já salientado (Arellano & Bond, 1991; Arellano & Bover, 1995). Espera-se para essa variável sinal estimado positivo, já que a literatura aponta a ocorrência de transferência da atividade criminosa de um período para o outro em virtude do aprendizado e especialização por parte dos criminosos (Kume, 2004; Santos, 2009).

A primeira variável explicativa, foco do presente estudo, corresponde aos gastos per capita em educação (gpceduc), defasados em até cinco períodos, inserida a partir do estudo realizado por Becker e Kassouf (2017). O intuito da referida desfasagem é o de analisar os efeitos intertemporais dos gastos em educação, pois como mencionado anteriormente, tais efeitos em termos de redução esperada da criminalidade são, geralmente, observados em períodos posteriores e não de maneira imediata, vide estudos de Witte e Tauchen (1994), Williams e Sickles (2002) e Deming (2011). Cabe ainda salientar que na apresentação dos resultados, foram estimados cinco modelos, levando em consideração de uma a cinco defasagens da referida variável.

Não obstante, tendo como parâmetro a literatura relativa ao tema, foram inseridos os seguintes controles adicionais: taxa de emprego no setor formal (txemp), taxa de urbanização (urb), proporção da população entre 15 e 24 anos (idade), percentual do investimento em relação à despesa total (invest), Índice de Desenvolvimento Tributário e Econômico (idte), dummy para o período de pandemia da COVID-19 (covid), gastos per capita com difusão cultural (gpccult), rendimento médio do setor formal (rend), gastos per capita com saúde (gpcsaude) e gastos per capita em segurança pública (gpcsegpub). Os três últimos controles foram considerados endógenos na estimação em função da relação de simultaneidade com a variável dependente, constatada vide Teste de Durbin-Wu-Hausman. Outros estudos, a exemplo de Ullah, Akhtar e Zaefarian (2018), atestam a utilização desse teste para verificar a endogeneidade em modelos com dados em painel dinâmico. Outrossim, importante destacar que todas as variáveis monetárias foram deflacionadas segundo o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (INPC), tendo como base o último ano da série, 2021.

Por fim, municípios cujas variáveis relativas aos gastos per capita em educação defasados, gastos per capita em saúde, gastos per capita em cultura e gastos per capita em segurança pública apresentaram valores iguais a 0foram retirados da amostra, já que não foi possível identificar se isso se deveu ao fato de os montantes dispendidos serem diminutos em relação as populações municipais ou correspondiam a dados faltantes.

Foram empregados ainda os testes de Arellano-Bond para investigar a possível autocorrelação serial dos erros, além do teste de Sargan para verificar a validade dos instrumentos. Em relação aos resultados, no primeiro teste, não foi diagnosticada a existência de correlação serial dos erros nas estimações realizadas. Para o segundo teste, em todos os modelos estimados, não se rejeitou a hipótese nula de validade dos instrumentos.

3.2 Fonte e Tratamento dos Dados

Para a elaboração do trabalho, todas as informações foram extraídas do Índice Mineiro de Responsabilidade Social (IMRS), desenvolvido pela Fundação João Pinheiro (FJP). Esse Índice disponibiliza informações relacionadas a mais de 700 indicadores sociais, divididos entre as áreas de educação, saúde, vulnerabilidade, segurança pública, saneamento e meio ambiente, e cultura e esporte. Por meio dos indicadores, a FJP busca procura retratar as dimensões sociais do estado mineiro para a criação de políticas públicas e estudos com maior confiabilidade e abrangência. Além disso, é importante destacar que a escolha do período analisado, entre os anos 2000 e 2021, decorreu da disponibilidade de dados para construção das variáveis de interesse para o estudo.

4 RESULTADOS

Esta seção é dividida em duas subseções, onde na primeira utilizada é apresentada a análise descritiva da amostra e na segunda os resultados econométricos.

4.1 Análise Descritiva

Inicialmente, é importante apresentar as estatísticas descritivas das variáveis, vide Tabela 1 abaixo, tendo em vista que a partir delas é possível uma melhor caracterização da amostra, assim como tende a facilitar a compreensão dos resultados econométricos, apresentados na subseção seguinte.


Tabela 1 - Análise descritiva das variáveis utilizadas na estimação econométrica

Fonte: Elaboração própria a partir dos metadados da FJP (2023).

É possível constatar que algumas variáveis apresentaram elevada discrepância, sendo os desvios padrões mais elevados que suas médias, com destaque para as taxas de crimes violentos, gastos per capita em educação, gastos per capita em saúde e gastos per capita em segurança pública.

Para se ter uma ideia da referida elevada discrepância entre os municípios mineiros, a taxa de crimes violentos, com média de 147,58 por 100 mil habitantes, possui valor mais elevado de 2326,78 por 100 mil habitantes, correspondente a Contagem em 2016. Das 12603 observações consideradas na amostra, 4124 (32,72%) possuem valores acima da média para essa variável, com destaque para a microrregião de Belo Horizonte. Nesse sentido, Contagem apresenta o valor mais elevado da taxa de crimes violentos na amostra, que é de 2326,78 por 100 mil habitantes em 2016, sendo que nesse mesmo ano Belo Horizonte e Betim também exibem cifras extremamente altas, correspondentes a 2114,78 e 1889,09 por 100 mil habitantes, respectivamente.

Como complemento às estatísticas descritivas, as Figuras 1, 2 e 3, abaixo, apresentam, respectivamente, os gastos per capita em educação em 2000 e 2004, além das taxas de crimes violentos em 2005 nas mesorregiões de Minas Gerais. Para a elaboração das figuras, os municípios mineiros foram agrupados em suas respectivas mesorregiões e foi calculada a média das variáveis de interesse, gastos per capita em educação e taxas de crimes violentos, sendo considerado, assim, cinco períodos de defasagem na Figura 1 e um período na Figura 2. O agrupamento dos municípios em mesorregiões facilita a observação e apresentação dos gastos em educação e das taxas de delitos, distribuídos em Minas Gerais. Segundo a teoria da Economia Regional, municípios próximos têm mais características em comum com seus vizinhos em relação aos municípios mais distantes (Lima & Simões, 2009).



Figura 1 - Gastos per capita em educação no estado de Minas Gerais em 2000
Fonte: Elaboração própria a partir dos metadados da FJP (2023).



Figura 2 - Gastos per capita em educação no estado de Minas Gerais em 2004
Fonte: Elaboração própria a partir dos metadados da FJP (2023).



Figura 3 - Taxas de crimes violentos no estado de Minas Gerais em 2005
Fonte: Elaboração própria a partir dos metadados da FJP (2023).

No que tange os gastos per capita em educação, observa-se que em 2000 as mesorregiões que mais destinavam recursos foram Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba e Central Mineira. Por outro lado, a menor destinação ocorreu nas mesorregiões do Vale do Mucuri e Jequitinhonha. Já no ano de 2004, verifica-se que em todas as mesorregiões houve crescimento dos gastos per capita em educação, com destaque para o Sul e Sudoeste de Minas (407,36%), Campo das Vertentes (383,30%) e Vale do Mucuri (1072,47%). Tal crescimento expressivo dos referidos gastos pode ser explicado pelo crescimento econômico do país e do estado de Minas Gerais na década de 2000.

Nesse sentido, segundo Ferreira, Santos, Paula e Fernandes (2012), entre 2002 e 2008, o estado aumentou em 0,7% p.p. sua participação no PIB brasileiro. Além disso, é necessário destacar a atuação da “Lei Robin Hood” (Lei nº 12.040/1995) em Minas Gerais, como apontado por Costa et al. (2019), a partir do qual o estado passou a estimular mais os gastos municipais nas áreas de educação, saúde e cultura de modo a promover ganhos de bem-estar, como redução da criminalidade.

Para os crimes violentos, observa-se que tais delitos se concentraram nas mesorregiões Metropolitana de Belo Horizonte, Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba. Isso revela a priori que os crimes violentos ocorrem com maior frequência nas regiões com níveis mais elevados de atividade econômica, visto que os retornos das atividades ilícitas tendem a serem maiores. Além disso, por serem regiões mais desenvolvidas, a estrutura do crime tende a ser mais complexa, o que dificulta a identificação e captura dos infratores. De acordo com Glaeser, Kallal, Scheinkman e Shleifer (1992) e Glaeser, Sacerdote e Scheinkman (1996), em aglomerados urbanos há maior troca de informações e organização das atividades criminais

As Figuras 4, 5 e 6, a seguir, servem de complemento as anteriores, pois permitem analisar a correlação dos gastos educacionais per capita defasados e a criminalidade em um período distinto, mais no fim da série considerada no estudo. As figuras apresentam, respectivamente, os gastos per capita em educação em 2014 (com cinco defasagens) e 2018 (com uma defasagem) e as taxas de crimes violentos em 2019.

Em relação aos gastos per capita em educação, no ano de 2014, verifica-se que as mesorregiões que mais destinaram recursos foram Central Mineira e novamente a Metropolitana de Belo Horizonte e Triângulo Mineiro. Já para 2018, observa-se que houve crescimento nos gastos para todas as mesorregiões, com destaque para o Sul e Sudoeste de Minas (18,56%), Noroeste de Minas (18,25%) e Campo das Vertentes (16,41%). Para os crimes violentos, nota-se que os delitos se concentraram novamente nas mesorregiões Metropolitana de Belo Horizonte e Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba, o que reforça a ideia de que as regiões com maior nível de atividade econômica são mais atrativas para crimes economicamente motivados.



Figura 4 - Gastos per capita em educação no estado de Minas Gerais em 2014
Fonte: Elaboração própria a partir dos metadados da FJP (2023).



Figura 5 - Gastos per capita em educação no estado de Minas Gerais em 2018
Fonte: Elaboração própria a partir dos metadados da FJP (2023).



Figura 6 - Taxas de crimes violentos no estado de Minas Gerais em 2019
Fonte: Elaboração própria a partir dos metadados da FJP (2023).

Por meio das referidas figuras, tem-se indício de possível relação inversa entre os gastos per capita em educação defasados e as taxas de crimes violentos. Por exemplo, tomando-se o período de gastos per capita em educação (2004-2018) e o intervalo relativo aos crimes violentos (2005-2019), verifica-se que os primeiros cresceram 203,81% e os delitos reduziram-se em 20,42% na mesorregião do Triângulo e Alto Paranaíba. Tal constatação a priori corrobora com os resultados previamente encontrados na literatura, já que gastos mais elevados em educação implicam em redução das taxas de crimes desqualificados após determinado período. Entretanto, reforça-se que a análise descritiva fornece apenas um indicativo, pois resultados mais concretos são exibidos na subseção seguinte, que apresenta os resultados da estimação econométrica, onde são adicionados outros controles.

4.2 Resultados Econométricos

Para aferir os efeitos dos gastos per capita em educação, em até cinco defasagens, sobre as taxas de crimes violentos, utilizou-se um modelo econométrico com dados em painel dinâmico para os municípios de Minas Gerais entre os anos de 2000 e 2021. Os resultados encontram-se na Tabela 2, abaixo, considerando-se erros padrões robustos para corrigir a heterocedasticidade. Foram estimados cinco modelos, em que a cada estimação a variável de gastos per capita em educação era defasada em um período adicional, ou seja, no primeiro modelo foi incorporada uma defasagem e na última especificação cinco defasagens. Em todos os modelos estimados, o teste de Wald sugeriu a rejeição da hipótese nula de não significância conjunta dos parâmetros das variáveis significativas.


Tabela 2 - Resultados Econométricos

Fonte: Elaboração própria com base nos metadados da FJP (2023).Nota: *** significativo a 1%; ** significativo a 5%; * significativo a 10%. Os valores entre parênteses representam os erros padrão.

As variáveis correspondentes aos gastos per capita em educação, defasadas em até cinco períodos, representam o principal resultado econométrico do estudo. Como já ressaltado, o uso da defasagem está relacionado ao tempo de absorção dos efeitos da educação pelos indivíduos e sociedade, como proposto por Becker e Kassouf (2017). Mediante o que foi apresentado na Tabela 2, nas terceira, quarta e quinta estimações, o sinal encontrado foi negativo e significativo. Por sua vez nas duas primeiras estimações, os resultados não foram estatisticamente significativos. Foi estimado um modelo com uma sexta defasagem dos gastos per capita em educação, mas este não foi reportado, pois os resultados não estavam em conformidade com os testes de correlação serial dos erros e validade dos instrumentos.

Em termos quantitativos, o coeficiente estimado para a variável de gastos per capita em educação sugere que um acréscimo de R$ 100,00 no regressor implica em redução das taxas dos crimes violentos em 0,03 pontos percentuais (p.p.) (Modelo 3), 4,6 p.p (Modelo 4) e em 9,1 p.p. (Modelo 5). Dessa forma, verifica-se que os gastos per capita em educação defasados em cinco períodos possuem efeito com maior magnitude sobre as taxas de crimes consideradas nesse estudo.

Além disso, os resultados encontrados concordam com os aqueles apontados em trabalhos previamente incluídos na revisão de literatura, a exemplo de Becker e Kassouf (2017), no qual foi verificada uma elasticidade negativa de 0,116 para a primeira defasagem da variável de gastos educacionais, além do estudo de Fochezatto, Petry, Braatz e Marcondes (2018), em que os autores observaram que a elevação de uma unidade nos gastos em educação implicava na redução de 0,0053 crimes por 100 mil habitantes.

Nesse sentido, os resultados apontam que o processo de redução da criminalidade, por meio dos gastos em educação, é complexo e não ocorre de maneira imediata. Mediante o aumento do montante destinado a educação, é possível incrementar a infraestrutura escolar, capacitar professores e educadores, modernizar laboratórios de informática e de ciências, melhorar a qualidade da alimentação dos alunos da rede pública e estadual, ampliar a prática de esportes e de atividades complementares.

Logo, após a elevação dos gastos, ocorre melhoria nos indicadores educacionais seguida da redução da criminalidade, pois com melhores condições para a escolarização, a tendência é que os jovens se sintam mais atraídos pelas escolas, de tal forma que a frequência escolar cresça. Segundo Witte e Tauchen (1994), a elevação da presença dos jovens nas instituições de ensino provoca redução da probabilidade de que sejam praticadas atividades criminosas, uma vez que estando ocupadas nas escolas, possuem menos tempo disponível para cometerem delitos. Além disso, em seu estudo, Arrow (1997) apresenta os efeitos sociais da educação, os quais denotam que a frequência escolar é capaz de moldar as preferências individuais, tornado os jovens mais avessos a praticar crimes, dado o temor das punições e condenações. Por fim, o tempo dispendido nas escolas permite ampliação do nível de capital humano dos jovens, obtido por meio dos anos de estudo, sendo que estes permitirão no futuro que eles alcancem melhores níveis de empregos e salários (Becker & Mulligan, 1997; Lochner & Moretti, 2004; Machin, Marie & Vujić, 2011).

Analisando-se os resultados encontrados para as demais variáveis de controle, tendo em vista a quinta especificação, nota-se a presença do “efeito inércia”, visto que a variável dependente, taxas de crimes violentos defasada em um período, apresentou sinal positivo e estatisticamente significativo. Desse modo, é notável a transferência dos crimes do passado para o presente, por meio do aprendizado e especialização dos infratores em práticas ilegais, assim como concluído no trabalho de Becker e Kassouf (2017).

As variáveis relacionadas aos gastos públicos per capita, em saúde, segurança pública e cultura não foram estatisticamente significativas em nenhuma das cinco estimações. É possível relacionar a não significância ao uso ineficiente dos recursos públicos, pois a alocação indevida dos recursos ou sua insuficiência não é capaz de auxiliar na redução da criminalidade. Alguns estudos, como os de Silva, Benedicto, Carvalho e Santos (2013), respaldam esta possibilidade, pois de acordo com os autores, cerca de 81% dos municípios mineiros apresentaram grau de ineficiência moderado ou alto e apenas 2% das cidades do estado alocavam os recursos da maneira adequada. Seguindo na mesma direção, Santos, Carvalho e Lírio (2008) também verificaram que a ineficiência está relacionada ao baixo desempenho na distribuição de recursos, tornando clara a necessidade de modificações no desenho das políticas públicas.

A variável de rendimento médio do setor formal apresentou coeficiente estimado positivo. Desse modo, o resultado vai ao encontro com o que foi verificado no trabalho de Araújo e Fajnzylber (2001). Segundo os autores, as regiões com maiores níveis de escolaridade tendem a possuir níveis mais elevados de rendimentos no setor formal, sendo de tal forma mais atrativas aos criminosos, pois a renda das famílias é normalmente utilizada como parâmetro do retorno esperado dos delitos. Além disso, a sensação de frustração e privação dos indivíduos com menor nível de renda em relação àqueles mais ricos pode interferir no comportamento dos criminosos (Araújo & Fajnzylber, 2001; Mendonça, 2002; Santos, 2009).

De maneira complementar, também foi encontrado coeficiente estimado positivo e significativo para a variável relacionada ao nível de emprego no setor formal. Isso corrobora a interpretação do resultado para a variável de rendimento médio, já que em regiões com nível mais elevado de atividade econômica, maiores tendem a ser as taxas de emprego, dada a necessidade de mão de obra. Logo, em regiões com maiores níveis de crimes economicamente motivados, a exemplo de alguns considerados na taxa de crimes violentos, tais como roubos, extorsão e sequestro, sua atratividade é mais elevada, em virtude dos possíveis retornos esperados.

Já a variável relacionada à proporção de jovens no município, idade, apresentou coeficiente estimado positivo e significativo. O resultado concorda com o proposto por Teixeira (2011), no qual o autor afirma que os crimes são praticados em sua maioria por indivíduos de 15 a 24 anos, e após esse intervalo a participação decresce. Sendo assim, pode-se esperar que quanto mais elevado o percentual de jovens nos municípios, maior tende a ser a propensão a cometer crimes.

Para o controle da influência do período pandêmico da COVID-19, a variável covid apresentou coeficiente estimado negativo e significativo. O resultado é esperado e corrobora com outros trabalhos, a exemplo de Faria, Diniz e Alves (2022), pois dadas as medidas sanitárias adotadas, a circulação de pessoas em vias públicas reduziu-se, o que por sua vez atenuou o cometimento de crimes violentos.

De modo a avaliar a gestão dos municípios e o impacto da eficiência na destinação de recursos, a variável relacionada ao Índice de Desenvolvimento Tributário e Econômico, idte, apresentou coeficiente estimado negativo e significativo nas estimações 3, 4 e 5. Isso sugere que quanto maior o valor do referido índice, ou seja, a capacidade de arrecadação dos municípios, menores tendem a ser as taxas de criminalidade.

Por fim, a última variável explicativa considerada, urb, apresentou sinal estimado negativo em todas as especificações. O resultado diverge do que se esperava, já que regiões com elevada densidade facilitam a fuga de criminosos e em contrapartida dificultam sua identificação e captura (Glaeser et al.,1992; Glaeser et al., 1996). Entretanto, é possível justificar o resultado encontrado, dada a elevação do nível de criminalidade no meio rural, além de que as modalidades criminais que compõe os crimes violentos possivelmente se concentram em tais localidades. Por exemplo, verifica-se que entre as principais causas da criminalidade neste meio está a disputa por terrenos, que por sua vez gera conflitos entre os residentes, e consequentemente eleva os índices de homicídios. Trabalhos como aquele realizado Maniglia e Fiorati (2006) apresentam alguns dos determinantes da elevação da criminalidade na zona rural, considerando a disputa por terras como um fator relevante.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo se propôs a analisar os efeitos intertemporais dos gastos per capita em educação, defasados em até cinco períodos, sobre as taxas de crimes violentos, considerando os municípios do estado de Minas Gerais entre os anos de 2000 e 2021, por meio da estimação de modelos econométricos com dados em painel dinâmico.

Os principais resultados apontaram que os gastos per capita em educação defasados de três a cinco períodos reduzem as taxas de crimes violentos, sendo o efeito mais expressivo registrado na quinta defasagem. Assim, o aumento dos referidos gastos pode ser capaz de melhorar a infraestrutura escolar, a qualidade dos docentes e ambientes de estudos, além de propiciar incrementos nas práticas esportivas e atividades complementares. Após a elevação dos gastos, o ambiente escolar passaria a ser mais atrativo, o que por sua vez pode implicar no incremento da frequência escolar com possível aumento do nível de capital humano e formação de cidadãos mais conscientes. Dessa forma, as possíveis melhorias no sistema educacional implicariam na redução das taxas de crimes violentos, com determinada defasagem, como pôde ser observado nos resultados supracitados.

Para as demais variáveis de controle consideradas, constatou-se a presença do efeito inércia, uma vez que a variável dependente taxa de crimes violentos, defasada em um período, apresentou coeficiente estimado positivo, que por sua vez indica que os delitos cometidos no passado possuem influência naqueles cometidos no período corrente. Já as variáveis de rendimento médio e taxa de emprego no setor formal apresentaram coeficientes positivos, que por sua vez indicam que regiões com maiores níveis de atividade econômica são mais atrativas para os infratores, em virtude das maiores possibilidades de retorno do crime.

Além disso, verificou-se que os crimes violentos em sua maioria são executados por indivíduos jovens, visto que a proporção de indivíduos de 15 a 24 anos mostra-se positivamente relacionada com a criminalidade. Ademais, os coeficientes estimados para taxa de urbanização e Índice de Desenvolvimento Tributário e Econômico foram negativos, o que pode estar associado, respectivamente, ao crescimento da criminalidade no meio rural e a boa gestão dos recursos nos municípios, que podem reduzir a criminalidade. Outrossim, para controlar os efeitos do período pandêmico da COVID-19, a dummy utilizada apresentou coeficiente estimado negativo, indicando que as políticas sanitárias e de distanciamento social reduziram os índices de criminalidade.

Por fim, espera-se que esse estudo possa contribuir para a elaboração de políticas públicas capazes de ampliar a qualidade do sistema educacional e reduzir consequentemente as taxas de criminalidade. Como apresentado na subseção anterior, o estudo sugere que os investimentos em educação são capazes de reduzir os índices de criminalidade após determinado período (neste estudo a partir de 3 anos), reforçando a necessidade de planejamento de longo prazo por parte do poder público no intuito de atingir o referido objetivo.

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