Resumo: O uso de tecnologias de informação e comunicação aproximou o ensino da bioética à prática profissional. O objetivo deste estudo é avaliar o objeto virtual de aprendizagem Análises de Situações Éticas, produzido e utilizado como abordagem inovadora no ensino da bioética em cursos na área da saúde. A metodologia integra análises quantitativas e qualitativas. Os participantes são estudantes que utilizaram o objeto virtual nas disciplinas ética e bioética de cursos de odontologia e fonoaudiologia. Foi aplicado questionário (questões abertas e fechadas), e as categorias analisadas relacionam-se ao uso do objeto virtual e à aprendizagem da bioética: interação, conteúdo curricular e dinâmicas de ensino-aprendizagem. Depoimentos demonstram que o material educativo proporcionou análise de situações com possíveis conflitos bioéticos e evidenciam a possibilidade de interdisciplinaridade, considerando a experiência importante na formação de profissionais da saúde. O estudo aponta para a bioética enquanto campo curricular transversal das práticas de saúde.
Palavras-chave: BioéticaBioética,Educação a distânciaEducação a distância,Educação em saúdeEducação em saúde,Desenvolvimento de pessoalDesenvolvimento de pessoal,Materiais de ensinoMateriais de ensino.
Artigo de Pesquisa
Ensino da bioética: avaliação de um objeto virtual de aprendizagem
Recepção: 27 Julho 2015
Revised document received: 14 Junho 2016
Aprovação: 29 Junho 2016
No cotidiano dos serviços e da formação profissional em saúde, vê-se cada vez mais o uso de biotecnologias, que acarreta distanciamento nas relações entre profissionais e usuários. Nas práticas dos profissionais de saúde, a organização de processos de trabalho privilegia o uso de equipamentos, exames diagnósticos etc., caracterizados como tecnologias duras. O consumo de tecnologias orienta atualmente os modelos de trabalho em saúde, sendo considerado importante objeto de confiança na interface entre profissionais e usuários 1-4. Em outras palavras, as tecnologias que permeiam as práticas de saúde conferem formas e até mesmo ditam mecanismos dessas relações e, nesse sentido, podem ser consideradas, por sua complexidade, objetos de confiança 5. Nesse contexto, cresce a importância da bioética para a compreensão das constantes incorporações de inovações tecnológicas na área da saúde 6.
A medicalização da saúde é fenômeno que tem sido estudado por vários pesquisadores nos últimos anos – dentre os quais se destacam neste artigo Rose e Bell 7,8. Isso perpassa os movimentos de transformação das sociedades contemporâneas, marcadas por exacerbação dos fundamentos da modernidade e pela cultura do excesso e da urgência, assim como do consumo e da individualidade 9. Ao se questionarem as adversidades desses tempos, em suas implicações bioéticas e biopolíticas, muito interligadas ao signo do consumo, do hiperindividualismo e das novas tecnologias, conclui-se ser tempo de reestruturação das subjetividades 10. E, compreendendo a potência instituinte do trabalho em saúde enquanto micropolítica de governo de subjetividades 11-13, problematiza-se como incidir nas micropolíticas de processos medicalizadores ─ a própria prática dos trabalhadores de saúde.
Destaca-se, então, a responsabilidade, no que se refere a ensino da bioética, dos sistemas educacionais que formam profissionais de saúde. O desafio é proporcionar a estudantes exercícios de análise de suas práticas profissionais (individuais e coletivas), apontando para a importância dos benefícios da ciência quando em equilíbrio com as exigências da humanização. O sentido do humano compreendido aqui não é de valor essencial do bem conquistado pelo caminho da razão, mas reside nas inter-relações do sujeito com história, cultura e sociedade 14. O objetivo é desenvolver o agir em competência para superar práticas de saúde reducionistas ou que se atenham a aspectos tecnocientíficos em detrimento do desenvolvimento de vínculo com usuários 15-21.
A transversalidade da bioética e da humanização assume importância na formação em saúde tendo em vista o papel que se atribui para interação social na perspectiva dos princípios bioéticos universais ─ autonomia, não maleficência, beneficência, justiça 2. Dessa maneira, temas como biopoder e direito à saúde 22,23, ao serem apropriados nos percursos curriculares, ampliam a compreensão sobre o modo de se produzir saúde e de acessar e consumir tecnologias 3.
Os conteúdos da bioética tratados nos cursos de graduação devem atender às necessidades de humanização nos serviços de saúde e de processos de trabalho mais qualificados 24,25. A humanização pode ser compreendida como princípio de conduta de base bioética, fundamentado em políticas públicas para a atenção e a gestão das tecnologias do cuidado no Sistema Único de Saúde (SUS). A bioética constitui-se instrumento a favor da humanização, pois alimenta criticamente o olhar dos profissionais de saúde sobre o modo como as instituições pensam e agem 26.
Nesse processo, entende-se também que as novas tecnologias informacionais assumem papel no ensino e seu uso é justificado pela necessidade de torná-lo mais interativo 27. Destaca-se, na esfera atual e global, o uso intenso de computadores e tecnologias de informação e comunicação (TIC) 28-32. A incorporação de ambientes virtuais de ensino pode ser compreendida como elemento catalisador de mudanças significativas na aprendizagem, por desenvolver atividades colaborativas e pressupor a participação ativa dos envolvidos no processo, que compartilham suas experiências, pesquisas e descobertas. A educação em saúde baseada em métodos tradicionais não tem sido suficiente para formar profissionais para modelos de saúde humanizados: Um novo modelo de saúde exige novos sujeitos sociais, novas formas de prestação de serviços e novas maneiras de formar os profissionais da área 33.
Ambientes virtuais proporcionam a alunos e professores a oportunidade de expandir seus repertórios e estilos de engajamento com a aprendizagem; podem facilitar o aprendizado experiencial e social ─ aspectos favoráveis à adaptação social e cultural envolvida com o tornar-se bioético 34. Em decorrência de tais virtudes, foi elaborado o objeto virtual de aprendizagem (OVA) Análises de Situações Éticas – cuja aplicação é apresentada e discutida neste artigo –, que pretende ampliar meios e abordagens inovadoras nos cursos de bioética inseridos em graduações em saúde, ou pontos de produção de saúde e bioética.
A utilização de um OVA justificou-se pela necessidade de aperfeiçoar o ensino da bioética nos currículos de graduação da área da saúde, tornando-o mais atrativo e interativo. O OVA disponibiliza conteúdos de hipermídia que incentivam a autonomia, possibilitando a construção de conhecimento pelo usuário. Sua organização em forma de situações reais, relacionadas com políticas e práticas atinentes ao campo da saúde, propicia a vivência e a exploração de conteúdos abordados por aplicação prática.
As principais características do OVA podem ser relacionadas a princípios da educação de adultos que enfatizam a aplicação prática do conhecimento 35. Pode ser utilizado em aulas presenciais ou ainda integrado a diferentes ambientes virtuais de aprendizagem, conforme as intenções pedagógicas de cada professor. Pretende levar, no caso da leitura acadêmica, a níveis de autêntica hermenêutica 36. Na forma de hipertexto, procura explorar a complexidade diante de uma organização linear do saber e exige do leitor a mobilização de sua bagagem cultural 37.
O objetivo deste estudo é avaliar o uso do OVA Análises de Situações Éticas, analisando como contribuiu para o ensino e a aprendizagem de concepções bioéticas em cursos na área da saúde.
Este estudo explora a integração de perspectivas de análise quantitativas e qualitativas. Participaram da pesquisa 39 estudantes das disciplinas de ética e bioética ministradas nos cursos de odontologia (26 estudantes do semestre 2014/2) e fonoaudiologia (13 estudantes do semestre de 2014/1) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). As disciplinas foram organizadas possibilitando acesso e uso dos conteúdos do OVA no percurso curricular, sempre intercalado com encontros de compartilhamento presenciais ou em fóruns assíncronos de educação a distância 38.
Elaborou-se instrumento de pesquisa estruturado, composto por questões abertas e fechadas (ver Anexo). O questionário foi disponibilizado aos participantes ao final das atividades das disciplinas de ética e bioética realizadas no ano de 2014, em link acomodado anteriormente no próprio OVA. Abordaram-se no instrumento categorias de avaliação de OVA utilizadas em outros estudos: interface, interatividade, usabilidade, motivação, conteúdos, linguagem hipertextual e integração a atividades presenciais 39-42. As respostas dos estudantes foram organizadas a partir de escala do tipo Likert, habitualmente utilizada em questionários de pesquisas de opinião, por suas características de confiabilidade, validade e sensibilidade, com poder de captação do real ainda mais significativo 43.
Os dados quantitativos produzidos pelo estudo foram analisados pela frequência das respostas fechadas. Quanto à análise qualitativa, foi baseada nos fundamentos epistemológicos da análise do discurso que objetiva trabalhar o sentido, e não apenas o conteúdo do texto 44. O projeto de pesquisa obedece às diretrizes éticas em vigor no Brasil. Apenas foram considerados estudantes que assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE).
O questionário de pesquisa inicia com pergunta que permite aos estudantes expor sua compreensão sobre os objetivos do OVA Análises Éticas de Situações de Saúde, e eles assim responderam: aprendizagem e ensino; realização de atividades práticas relacionadas à bioética; uso de recursos tecnológicos para disponibilizar e sistematizar o conhecimento; complementação dos conteúdos de bioética; e interação entre professores e alunos. Nas falas dos respondentes:
“Expor casos que contenham questões éticas que possam ser debatidas e relacionadas com os conteúdos vistos em aula” (Estudante 7);
“É uma unidade de ensino na qual o conhecimento da ética e bioética é transmitido através dos recursos tecnológicos” (Estudante 11);
“Complementar o conhecimento do aluno, bem como facilitar o acesso do mesmo às informações referentes às aulas ministradas” (Estudante 6);
“Interação e integração entre colegas e professores” (Estudante 18);
“Facilitar o aprendizado dos alunos através de uma ferramenta única, simples e didática, unificando os principais locais de acesso do aluno para diversas informações acadêmicas” (Estudante 21).
Do mesmo modo, ainda no início do questionário, solicitou-se aos estudantes que indicassem as principais dificuldades encontradas durante a utilização do OVA. Os depoimentos descrevem três aspectos principais: a linguagem complexa dos textos, os problemas com os vídeos e a busca pelas informações solicitadas. Um dos depoimentos não se referiu propriamente ao objeto virtual, mas à dinâmica pedagógica utilizada na disciplina: “O local de disponibilidade de notas nem sempre é intuitivo. A falta de notificação por e-mail de atividades e seu prazo de encerramento” (Estudante 21).
Considerando ainda os aspectos gerais de avaliação, foi solicitado aos estudantes que oferecessem sugestões de mudança nas formas de apresentação e interação, caso considerassem importantes. Foram indicados os seguintes pontos: “Mais facilidade no entendimento e acesso aos temas propostos” (Estudante 8); “Uso de frases curtas” (Estudante 29); “Linguagem mais acessível e direta” (Estudante 33); “Alterações nas dificuldades de acesso” (Estudante 21).
A primeira categoria do OVA avaliada relaciona-se a componentes de sua qualidade de interação. Os resultados quantitativos apresentados no Quadro 1 demonstram que os escores alcançados podem ser considerados positivos.
De forma aberta e procurando investigar aspectos subjetivos relacionados à interação dos estudantes com o OVA, foi solicitado aos participantes que não aprovaram a apresentação do OVA que justificassem a resposta. Registre-se que apenas um entrevistado reprovou o uso do OVA, exprimindo sua opinião com a seguinte afirmação: “Dificuldade de chegar ao indicado” (Estudante 13). Outro dado importante sobre o OVA foi que, quando questionados se o OVA proporcionava liberdade de navegação, 85% dos entrevistados responderam “sim”.
Quando estimulados a relatar por que usavam dados fornecidos pelos links nas atividades propostas (textos, gráficos, tabelas, notícias de jornal etc.), os estudantes deram diversas justificativas. Alguns afirmaram que o fizeram por considerá-los “complementares” (Estudantes 21, 33, 39), outros pela “curiosidade de interação que despertavam” (Estudantes 29, 13) e pelo “estímulo das atividades presenciais” ─ “Pois foi realizada uma atividade de análise em sala de aula na qual os dados apresentados eram necessários para se pensar nas questões propostas” (Estudante 37).
A segunda categoria do OVA avaliada relaciona-se ao desenvolvimento do conteúdo curricular (Quadro 1). Os resultados quantitativos se mostram positivos. Ao serem estimulados a responder de forma livre sobre a forma como o OVA ajudou no desenvolvimento do conteúdo de bioética, foi enfatizado pelos estudantes a possibilidade de relacionar casos práticos com o conteúdo aprendido:
“Através da explanação das práticas profissionais” (Estudante 33);
“Exemplificando a matéria de ética e bioética aprendida em aula” (Estudante 2);
“O OVA contextualizou os conteúdos; assim, pudemos ver a aplicação de tais em uma situação da vida real” (Estudante 7);
“Mostrou as ferramentas metodológicas na prática” (Estudante 22).
Os entrevistados também consideraram que o uso do OVA facilitou o desenvolvimento do conteúdo, tanto em relação à apresentação do caso quanto à possibilidade de exercitar análise crítica da situação: “Ajuda a pensar criticamente sobre o caso, relacionando com os conteúdos vistos em aula” (Estudante 10); “Fazendo refletir sobre as diferentes formas de se olhar para o mesmo caso” (Estudante 32).
Os estudantes salientaram que o OVA ajudou no desenvolvimento do conteúdo – quando define conceitos e amplia conhecimentos sobre bioética disponibilizados em forma de vídeos e sistematizados em um único ambiente de aprendizagem (Estudantes 6, 11, 20 e 21). Na opinião de 92% deles, o OVA ajudou a sedimentar os conteúdos de bioética, entre os quais foram destacados os seguintes:
“Princípios e conceitos éticos e bioéticos” (Estudantes 2, 3, 6, 7, 10, 19, 22, 25, 29, 31, 34, 35, 39 e 30);
“Análise ética de casos e situações” (Estudantes 8, 9, 11, 12, 13, 17, 37);
“Foucault e biopolítica” (Estudantes 14, 22, 26, 27);
“Prática clínica e profissional” (Estudantes 20, 28, 32, 33);
“Ferramentas metodológicas” (Estudantes 22, 25);
“Humanização na saúde, a ciência em serviço da saúde” (Estudante 37);
“Questões de contexto socioculturais, bem como qualidade de vida tudo relacionado a casos clínicos reais” (Estudante 16);
“O ser ou não ser bioético” (Estudante 15).
Ainda na forma de pergunta aberta, alguns estudantes responderam de que modo o OVA despertou a curiosidade para a busca de novos conteúdos. Foram dois os aspectos relacionados: 1) o uso de situações práticas profissionais; e 2) a linguagem hipertextual. Na fala dos participantes: “O caso da Dona Laura envolveu uma questão odontológica que foi posta à discussão dentro da faculdade e que me fez pesquisar mais sobre e compreender melhor sobre o assunto”. (Estudante 7); “Por meio dos hiperlinks” (Estudante 33).
Os entrevistados foram questionados ainda se o OVA ofereceu forma diferente de compreender o tema da bioética, e 79% dos entrevistados responderam “sim”, 13% opinaram que “nada havia de diferente” e 8% acharam que “ofereceu uma forma muito diferente de compreender a bioética”.
A interação dos estudantes com o recurso de aprendizagem virtual, o OVA, inserido em novas tecnologias educacionais possibilitou apreender temas da bioética (humanização, qualidade de vida, biopolítica, entre outros) como fundamentais para suas futuras práticas clínicas. Nessa perspectiva, o estudo da bioética mostra sua potencialidade de ser estruturante e também transversal para a formação, pois permite ao aluno ultrapassar concepções biomédicas ainda arraigadas, lançando visões ampliadas das ações de saúde, principalmente ao incluir os campos ético, social e humanístico nesses processos. E esta pesquisa corrobora a possibilidade de se pensar, assim como outros exemplos no campo da saúde 16, uma formação pautada na transversalidade que a bioética comporta, tanto por sua natureza quanto pela vivência prática ao longo do curso 2,33,45,46.
A terceira categoria do OVA avaliada relaciona-se ao modo como foi utilizado pedagogicamente, tendo em vista que teve o objetivo de apoiar a disciplina presencial de bioética. Os resultados quantitativos podem ser observados no Quadro 1.
Ainda numa análise qualitativa quanto à forma de integração com as demais atividades na disciplina, os alunos responderam que isso ocorreu por meio de debates, vídeos, conteúdos complementares, realidade social, interdisciplinaridade, análises de casos clínicos e práticas profissionais.
“Porque os conteúdos abordados em aulas estavam presentes no OVA em forma de vídeos (maioria)” (Estudante 20);
“Porque através dos blocos do site podemos facilmente consultar os outros conteúdos, e nos próprios casos clínicos houve a instigação dos alunos através de ‘desafios’” (Estudante 22);
“Pois pode-se integrar a teoria estudada com a prática vista na sociedade” (Estudante 26);
“Porque podemos ter exemplos e interação com áreas relacionadas ao caso apresentado” (Estudante 39).
Os resultados destacam aprendizagens ocorridas no campo da bioética relativas ao uso do OVA Análises de Situações Éticas e demonstram como o tema pode despertar o interesse dos estudantes. Isso inclui a vivência de situações reais que aproximam conteúdo e prática profissional, o envolvimento dos estudantes com metodologia de ensino interativa, que se apoia em recursos das TIC, assim como as dinâmicas de ensino-aprendizagem.
Como parte da compreensão sobre o “fazer” saúde, instrumentos pedagógicos como o OVA permitem que os envolvidos no processo de ensino-aprendizagem produzam julgamentos diante de situações complexas e ambíguas. A análise bioética de casos reais se opõe à mera aplicação por parte dos estudantes de princípios para aprender a resolver possíveis futuros dilemas profissionais. O tema já foi debatido por outros autores 47, os quais destacam que a simples explicitação de princípios com alusões a casos hipotéticos leva a desinteresse pelo tema por parte de estudantes. De uma perspectiva andragógica, ao oferecer oportunidades de aprender a trabalhar com problemas da vida real, os princípios de humanização podem ser potencializados, descrevendo como os adultos aprendem melhor 35.
Os participantes do estudo parecem associar o OVA à oportunidade para análise de casos de práticas profissionais. Quando se compara a aprendizagem online com aquela proveniente da interação presencial, verifica-se que está associada: 1) a inibição diminuída e aumento da disposição para assumir riscos, compartilhar e discutir questões sensíveis; 2) a discussão mais equitativa (ou seja, menos dominada por poucos indivíduos); 3) a maior tempo para interação reflexiva; 4) a aumento da aprendizagem sobre temas polêmicos e 5) a desenvolvimento de uma comunidade on-line 48.
O uso de recursos interativos de comunicação e a aproximação do estudante com os temas da bioética, enquanto possível espaço fora do contexto da sala de aula, estimulado pela virtualidade, otimizam a dinâmica pedagógica. Além disso, possibilitam certa personalização, na medida em que os alunos têm a possibilidade de acessar o ambiente em local e tempo a critério de suas disponibilidades. Dessa forma os ambientes virtuais de aprendizagem podem ser potentes para reconstruir as dimensões do ensino, abrindo a perspectiva de uma outra sala de aula, relocalizada no espaço virtual e com características próprias.
A interação é independente de espaço e tempo e possibilita aprendizagens contextualizadas e colaborativas. O ambiente virtual não é réplica nem simulação da sala de aula presencial, e sim outro contexto de ensino-aprendizagem com regras e características próprias. Compõe cenário técnico-pedagógico criativo, contextualizado, com características específicas e apoiado em pressupostos que derivam de como as ferramentas tecnológicas serão usadas. O ensino em ambientes virtuais de aprendizagem traz para o professor/tutor o desafio da gestão de habilidades, de mediação entre conteúdos e o agir no contexto social de aprendizagem 49.
Por um lado, o OVA possibilitou inovadora relação dos conteúdos de bioética com os estudantes, o que se constituiu desafiador desde o início; por outro, afirmou a necessidade de se pensar a bioética na formação dos profissionais de saúde como de responsabilidade de todos os docentes (e de forma institucional), posto que é questão transversal do “fazer” saúde. Entende-se, do mesmo modo que outros autores têm pensado a formação em saúde, que cabe aos formadores (instituição e docentes) proporcionar vivências, estimular o entendimento e a compreensão das escolhas e do comportamento dos estudantes ao longo de sua futura carreira 2,20. O envolvimento com dinâmicas de aprendizagem do OVA pode trazer conhecimentos pertinentes sobre novos papéis sociais ─ por exemplo, no caso da bioética, quando aprendem a equilibrar as tensões entre a humanização e a medicina baseada em evidências 48.
Com Boyd 50 e sua experiência de explorar métodos para o desenvolvimento de pensamento crítico em estudantes de odontologia, considera-se primordial pensar, propor e avaliar novas estratégias didáticas e pedagógicas que favoreçam a compreensão e que preparem os estudantes para enfrentar de forma cuidadora os problemas coletivos e dos usuários. Também, partilhando das ideias do trabalho de Junqueira e colaboradores 4, entende-se que o espaço do debate que problematiza respostas consideradas satisfatórias para as necessidades de saúde dos usuários e que transcendem a clássica transmissão de informações e o treinamento de habilidades incentiva o pensamento crítico. Contudo, ressalta-se aqui que se refere à forma muito especial de crítica, ou àquela que se direciona para vasta gama de questões sobre como o poder age por meio de práticas discursivas 51. Deve-se destacar na bioética seu papel de crítica sociocultural e de visão hipercrítica do progresso científico 52.
Alguns depoimentos descritos nos resultados demonstram que o uso desse recurso pedagógico auxiliou os estudantes a compreender o valor da interdisciplinaridade ─ quando reconhecem a importância de práticas socioculturais ou integração com outras áreas do conhecimento. Esse ponto em particular revelou como o ensino da bioética pode desenvolver posturas profissionais que privilegiem o reconhecimento do outro, o que institucionalmente permite a busca por valores balizadores das atitudes profissionais que expressem o que, na sua dimensão coletiva, se considera bom e justo 26.
Finalmente, os conteúdos e linguagens apropriados do OVA foram considerados facilitadores da aprendizagem. Pelas respostas dos entrevistados, percebe-se que aspectos como a compreensão de utilização do OVA, instruções claras e linguagem adequada estimularam seu uso e foram importantes para despertar a curiosidade em relação a temas da bioética. O OVA trouxe para o estudo da bioética na graduação a possibilidade de integração das atividades presenciais da disciplina, debates e aproximação com a realidade social ao estimular a análise de casos clínicos e práticas profissionais.
Em relação ao conteúdo que o OVA apresentou aos alunos, acredita-se que a bioética produz, para estudantes e docentes, níveis maiores de compreensão sobre o impacto das novas tecnologias sobre a vida. Há, na bioética, potência para conciliar o desenvolvimento técnico-científico, que interfere cada vez mais na vida humana e na natureza, com valores humanitários 53. Para tal, proposições estimulantes e criativas, que não considerem bioética apenas como disciplina, mas enquanto território, lugar de confronto de saberes e problemas surgidos do progresso das ciências biomédicas, das ciências da vida e das ciências humanas 54, podem catalisar as ações pautadas no respeito, solidariedade, compaixão, empatia, bondade 26.
O desenvolvimento do estudo permitiu a compreensão sobre o processo de ensino-aprendizagem desenvolvido com o uso do OVA Análises de Situações Éticas, que se revelou apoio para aprendizado do estudante de graduação de duas áreas da saúde (odontologia e fonoaudiologia) por proporcionar oportunidades de análise de situações profissionais com possíveis conflitos bioéticos. Depreende-se, pela opinião dos estudantes, que o OVA ampliou o aprendizado de bioética ao permitir que atividades presenciais tenham continuidade fora da sala de aula.
De acordo com os resultados, os estudantes consideram que o OVA contribuiu para o processo de ensino e aprendizagem de suas concepções bioéticas. A percepção dos estudantes sobre a utilização do OVA estimula seu aperfeiçoamento e seu uso como estratégia pedagógica para turmas futuras e/ou para outras instituições. A análise dos limites e possibilidades dessa ferramenta pedagógica, por meio das respostas dos participantes da pesquisa, possibilita ainda aprimorar a compreensão sobre formas de integrar os conteúdos de bioética ao cotidiano da prática clínica.
A abordagem de temas relacionados a situações de saúde na prática clínica, nas pesquisas, na organização de serviços ou mesmo debates e vivências, bem como o pluralismo da sociedade humana atual em sua complexidade – dos problemas de saúde à sofisticação da tecnologia –, desafiam as instituições formadoras e os cursos da área da saúde a repensar sua função como agentes facilitadores e promotores do desenvolvimento das competências do aluno para tomar decisões, articular conhecimentos, habilidades e valores. São questões de ordem técnica, científica, social e ética que somente poderão ser alcançadas por meio de abordagem transversal, ou seja, estruturada a partir de atividades planejadas e inseridas em todas as disciplinas da formação. Isso estimula e favorece estratégias de ensino que promovem reflexão dialógica com metodologias específicas. Os dados encontrados neste estudo indicam que a transversalidade do ensino da bioética não pode recair em atividades desordenadas e ocasionais. Logo, considera-se que um currículo de formação na área da saúde, em sua totalidade, também precisaria que o planejamento de atividades de bioética fosse orientado e articulado com processos de trabalho.
Defende-se, portanto, a bioética enquanto campo, território, fórum multifacetado e interdisciplinar, com notável espectro de possibilidades de desenvolvimento de visão hipercrítica de atos em saúde. Essa abordagem do campo da bioética poderia superar modelos estruturados em disciplinas específicas, muitas vezes dissociadas da vivência e interesse dos estudantes. São novos os desafios para a formação em saúde e também devem ser inovadores os métodos, as abordagens e as ferramentas pedagógicas. Nesse contexto o OVA desperta o interesse de alunos e transforma as relações de aprendizagem, pois valoriza novas relações entre o real e o prescrito, além de surgir como inovação às necessidades de uma formação humanista, coerente com práticas em saúde éticas e justas.
Curso: ___________________ Sexo: () Feminino () Masculino Idade: ___________
Estado civil: (1) Solteiro (2) Casado (3) Separado ou divorciado (4) Viúvo (5) Outro
Estado de origem:_________________
Cidade de origem:_________________
Possui computador: () Sim () Não
Frequência com que utiliza o computador:
(1) Nunca (2) Raramente (3) Às vezes (4) Frequentemente (5) Muito frequentemente
Nível de conhecimento em ferramentas básicas de informática (Word, Excel, internet):
() Muito baixo () Baixo () Médio () Alto () Muito alto
Bloco I – Quanto à interação com o objeto de aprendizagem (funcionalidade)
____________________________________________________________________
(1) Muito fácil (2) Fácil (3) Indiferente (4) Difícil (5) Muito difícil
2.1. Destaque as principais dificuldades encontradas na utilização do OVA (caso isso tenha ocorrido).
____________________________________________________________________
(1) Instigou muito (2) Instigou (3) Instigou pouco (4) Inibiu (5) Inibiu muito
3.1. Se você não gostou, por que não gostou? _________________________________
3.2. Teria alguma sugestão de mudança nas formas de apresentação e interação? ______________________
(1) Muito claras (2) Claras (3) Pouco claras (4) Confusas (5) Muito confusas
() Sim () Não
(1) Muito fácil (2) Fácil (3) Nem fácil nem difícil (4) Difícil (5) Muito difícil
Bloco II – Quanto ao conteúdo curricular desenvolvido a partir do objeto de aprendizagem
(1) Ajudou muito (2) Ajudou (3) Ajudou pouco (4) Não ajudou (5) Atrapalhou a compreensão
7.1. De que forma lhe ajudou? ______________________________________________________________
(1) Muito eficiente (2) Eficiente (3) Pouco eficiente (4) Não foi eficiente (5) Não houve aprendizagem
(1) Muito bom (2) Bom (3) Indiferente (4) Regular (5) Inconsistente
9.1. Por quê? ____________________________________________________________________
(1) Muito bom (2) Bom (3) Indiferente (4) Regular (5) Inconsistente
() Sim () Não
11.1. Por quê?____________________________________________________________________
11.2. Em sua opinião, quais conteúdos de bioética foram mais sedimentados por conta do uso do OVA?
____________________________________________________________________
() Sim () Não
12.1. Em caso afirmativo, de que forma isso ocorreu? ____________________________________________
() Sim () Não
() Sim () Não
14.1. Por quê? ___________________________________________________________________
Bloco III – Dinâmicas de ensino-aprendizagem
(1) Muito diferente (2) Diferente (3) Pouco diferente (4) Não ofereceu diferença (5) Não permitiu a compreensão
(1) Integrou muito (2) Integrou (3) Indiferente (4) Integrou pouco (5) Não Integrou
16.1. Por quê? ____________________________________________________________________________
(1) Muito compartilhados (2) Compartilhados (3) Mais ou menos compartilhados (4) Pouco compartilhados (5) Não foram compartilhados
17.1. Em caso afirmativo, relate sua experiência: ________________________________________________
Bloco IV – Considerações finais
(1) Gostei muito (2) Gostei (3) Gostei pouco (4) Desgostei (5) Desgostei muito
Aprovado Plataforma Brasil CAAE 30459914.8.0000.5347
Todos os autores contribuíram na redação e revisão crítica do artigo. Fabiana Schneider Pires e Martiné Levesque trabalharam na interpretação dos resultados. Cristine Maria Warmling contribuiu na concepção e análise dos resultados.
Correspondência Cristine Maria Warmling – Rua Dona Leonor, 194, apt. 1.407, Rio Branco CEP 90420-180. Porto Alegre/RS, Brasil.