Resumo: Este estudo avalia a mortalidade no trânsito em Roraima sob os aspectos da epidemiologia e da deontologia. Trata-se de pesquisa longitudinal e descritiva, que comparou dados do Instituto Médico Legal de Roraima, do Sistema de Vigilância de Violências e Acidentes e do Sistema de Informações sobre Mortalidade. A maioria das vítimas era homens (85,2%), pardos (81,5%), residentes em área urbana (81,5%), solteiros (66,7%), com entre 15 e 34 anos (54,9%). As lesões mais comuns foram contusão (96,2%) e fratura (75,5%). As partes mais atingidas foram cabeça (69,8%), membros inferiores (66%) e face (54,7%). A principal causa mortis foi trauma na cabeça (43,4%). Comparando os dados, constatou-se subnotificação da mortalidade no trânsito em Roraima. A reflexão constante é fundamental para estabelecer parâmetros éticos para os profissionais envolvidos, e recomenda-se integrar órgãos da saúde com o Instituto Médico Legal para criar banco de dados que subsidie políticas adaptadas à realidade local. Aprovação CEP-SLM 1.570.471
Palavras-chave: Acidentes de trânsito, Epidemiologia, Ética.
Resumen
Aspectos epidemiológicos y deontológicos de la mortalidad en el tránsito en Roraima: Este estudio objetivó evaluar la mortalidad en el tránsito en Roraima bajo los aspectos de la epidemiología y deontología. La investigación longitudinal y descriptiva comparó datos del Instituto Médico Legal de Roraima, del Sistema de Vigilancia de Violencias y de Accidentes y del Sistema de Información sobre Mortalidad. La mayoría de las víctimas fueron hombres (85,2%), pardos (81,5%), residentes en área urbana (81,5%), solteros (66,7%), en el grupo de edad 15-34 años (54,9%). Las lesiones más frecuentes fueron contusión (96,2%) y fractura (75,5%). Las partes afectadas fueron cabeza (69,8%), miembros inferiores (66%) y cara (54,7%). La principal mortis causa fue trauma en la cabeza (43,4%). La comparación entre los datos obtenidos permitió cuantificar la subnotificación de mortalidad en el tránsito en Roraima. Es fundamental la reflexión constante con el fin de establecer parámetros éticos a los profesionales, y se recomienda integrar organismos de la salud pública con el Instituto Médico Legal, para crear un banco de datos orientado a subsidiar políticas adaptadas a la realidad local.
Palabras clave: Accidentes de tránsito, Epidemiología, Ética.
Abstract
Epidemiological and deontological aspects of traffic mortality in Roraima: This is a longitudinal and descriptive study evaluating epidemiological and deontological aspects of traffic mortality in Roraima by comparing data from the Legal Medical Institute of Roraima, the Violence and Accident Surveillance System and the Mortality Information System. Most of the victims were men (85.2%), brown-skinned (81.5%), living in an urban area (81.5%), single (66.7%), between 15 and 34 years old (54.9%). The most common injuries were contusion (96.2%) and fracture (75.5%). The body parts most affected were the head (69.8%), lower limbs (66%) and face (54.7%). The main cause of death was head trauma (43.4%). The comparison of data evidenced underreporting of traffic mortality in Roraima. Constant reflection is essential to establish ethical parameters for the professionals involved, and the integration between health agencies and the Legal Medical Institute is recommended to create a database to support policies adapted to the local reality
Keywords: Accidents, traffic, Epidemiology, Ethics.
PESQUISA
Aspectos epidemiológicos e deontológicos da mortalidade no trânsito em Roraima
Recepção: 7 Agosto 2017
Revised document received: 19 Dezembro 2019
Aprovação: 14 Janeiro 2020
Acidentes de trânsito são grave problema de saúde pública, com elevadas taxas de morbidade e mortalidade. Dados apontam que 50 milhões de pessoas sofrem lesões – muitas ficando com sequelas – e 1,2 milhão morrem todo ano no mundo por acidentes no tráfego, o que causa problemas sociais e humanitários, além de significativo prejuízo para a economia 1-6.
Projeções globais de mortalidade por ocorrências no trânsito indicam aumento de 1,2 milhão em 2002 para 2,1 milhões em 2030 7, o que representa elevação de 75% no número de vidas ceifadas violentamente. Considerando índices de 178 países, constata-se que 90% da morbidade e mortalidade ligada ao tráfego ocorre em países de baixa e média renda, onde estão apenas 48% dos veículos do mundo 8. Embora preveníveis, essas mortes precoces alcançam níveis alarmantes nesses países 9.
Nas Américas, o Brasil é o terceiro país com maior mortalidade no trânsito, ficando atrás apenas de Belize e da República Dominicana, enquanto o Canadá é o país da região com menor prevalência desse agravo 10. No mundo, o Brasil ocupa o quinto lugar em acidentes rodoviários 11. De fato, é alarmante a quantidade de lesões e óbitos por essa causa no país, que contabiliza mais de 40 mil mortes por ano 12, número maior que o de vítimas de guerras recentes e da aids13. A Segunda Conferência Global de Alto Nível sobre Segurança no Trânsito apontou deficiência de dados e falta de fiscalização e de coordenação entre programas federais e estaduais como explicações para o problema 14.
O Sistema de Vigilância de Violências e Acidentes (Viva) foi implantado em 2006 no Sistema Único de Saúde (SUS) para viabilizar o conhecimento do perfil epidemiológico de violências e acidentes, dentre eles os relacionados ao trânsito. Entretanto, vítimas do tráfego não atendidas pelo SUS ficam invisíveis no Viva, de modo que a magnitude dos óbitos e agravos ainda é subestimada 15.
As bases de dados do Ministério da Saúde (MS) registram limitações para as regiões Norte e Nordeste do país, que têm cobertura insatisfatória e expressiva subnotificação de óbitos 16,17. A Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) ratifica que muitos países padecem de problemas de subnotificação, com mortes no trânsito registradas como “outras ou não especificadas” 10.
Estudos sobre o perfil das vítimas internadas por lesões decorrentes de acidentes de transporte terrestre (ATT) no Brasil entre 2000 e 2013 apontam 1.747.191 internações, das quais 410.448 foram de pessoas com sequelas físicas (23,5%). Destas, 77,7% eram do sexo masculino; 26,5% na faixa etária entre 20 e 29 anos; 46,4% residentes na região Sudeste; 32,5% pedestres e 31,1% motociclistas. Com diagnóstico de provável sequela física, foram 359.259 internações, 43,3% de motociclistas 1.
Em pesquisa com três diferentes fontes de informação sobre acidentes de trânsito em Belo Horizonte (MG) constatou-se preenchimento inadequado em todas elas, destacando-se a falta de dados sobre uso de equipamentos de segurança e consumo de álcool pelo condutor. Na comparação das três fontes, também é possível encontrar o mesmo perfil de envolvidos em acidentes: homens, jovens, motociclistas e passageiros de motocicleta ou pedestres. Além do alto coeficiente de mortalidade em Belo Horizonte no período (19,4 por 100 mil habitantes), houve aumento de acidentes e de vítimas não fatais, com elevação na taxa de internação (34%) e nos custos hospitalares (53%) e maior envolvimento de motocicletas proporcionalmente à frota. Apesar das lacunas nos registros, é possível apontar algumas recorrências: pedestres idosos, motociclistas, uso de álcool e excesso de velocidade 4.
Quanto às bicicletas, estudo fundamentado nos dados do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) detectou que a maior parte das mortes de ciclistas em acidentes de trânsito no Brasil, de 2000 a 2010, ocorreu devido a traumatismos na cabeça. A maioria das vítimas era do sexo masculino (85,4%). A pesquisa ainda apontou aumento desses óbitos no Norte e Nordeste, e redução no Sul e Sudeste 5.
Dados de 2000 apontavam Boa Vista (RR) como a capital com maior mortalidade nesse contexto, com 47,9 óbitos por 100 mil habitantes 13. E segundo o MS, de 2000 a 2004 o município registrou aumento de 43% na mortalidade por trânsito, chegando a 111,6 óbitos por 100 mil habitantes 18. Nem mesmo com a chamada “Lei Seca” a mortalidade por acidentes de transporte terrestre diminuiu em Roraima, uma vez que números do SIM permitem concluir que os óbitos aumentaram nos biênios de 2008 e 2009, 2011 e 2012 e 2014 e 2015 19. Essas estatísticas são de grande relevância, pois ajudam a elaborar e aprimorar políticas públicas 20-22.
O presente estudo descreve a mortalidade no trânsito em Roraima, na Amazônia Legal Brasileira, com base em laudos de perícia médico-odontolegal de exames de corpo de delito e necropsias do Instituto Médico Legal de Roraima (IML/RR) – o único do estado 23-25 –, traçando perfil epidemiológico a fim de relacioná-lo com dados oficiais do Viva Inquérito e do SIM, ambos do MS. Além disso, busca-se nesta pesquisa refletir sobre a mortalidade no trânsito considerando as normas éticas dos conselhos profissionais de medicina26 e odontologia 27 (uma vez que a especialidade toma parte no trabalho pericial) e a legislação vigente.
O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade São Leopoldo Mandic, de Campinas/SP, e submetido à Plataforma Brasil do MS. A direção do IML/RR 28 autorizou, por meio de documento, o acesso dos pesquisadores aos laudos de perícia médico-odontolegal relacionados a acidentes de trânsito.
De delineamento quantitativo, transversal, descritivo e exploratório, o estudo abrange o estado de Roraima, pertencente à Amazônia Legal Brasileira 29,30. Foram adotados os critérios do Viva Inquérito 2011 31, que utilizou amostra probabilística do mês de setembro de 2011 como parâmetro nacional. Na presente pesquisa, no entanto, considerou-se o período entre 2011 e 2015.
Na análise dos laudos, as variáveis (detalhadas no Anexo) foram: 1) dados gerais do exame de corpo de delito de necropsia; 2) dados da pessoa examinada; 3) residência da pessoa examinada; e 4) informações sobre lesões. A fonte de pesquisa foram os arquivos do IML/RR, que realiza com exclusividade os exames periciais previstos nos §§ 3º e 5º do artigo 5º da Lei 6.194/1974 32, que trata de danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre. Dados do Viva Inquérito 2011 33 e do SIM (2011-2015) 34 também foram consultados.
É pertinente esclarecer que para haver inumação legal (sepultamento) é necessário atestado e, consequentemente, certidão de óbito 35. O atestado, também conhecido como “declaração de óbito”, é emitido pelo médico – estando este presente no local – ou por duas pessoas qualificadas que tenham presenciado ou verificado a morte. Já a certidão é emitida por um cartório de registro civil 36.
O estudo comparou os referidos laudos do IML/RR com as fontes do MS a fim de verificar se há de fato a subnotificação de mortalidade descrita na literatura 10,16,17. Por meio das frequências absolutas e relativas, realizou-se análise exploratória da totalidade dos dados obtidos 37.
No período considerado, o IML/RR registrou 859 óbitos relacionados a acidentes de trânsito, 66% deles ocorridos na capital do estado. A maioria das vítimas era do sexo masculino (85,2%), de cor parda (81,5%), residente em área urbana (81,5%) e solteira (66,7%). Quanto à faixa etária, em 18,5% dos casos as vítimas tinham de 30 a 34 anos, em 16,6% de 20 a 24 anos, e em 10,4% de 15 a 19 anos. A causa de morte mais comum foi o trauma cranioencefálico (28,3%), seguido de politraumatismo (16,9%) e hemorragia intracraniana (9,4%).
A Tabela 1 apresenta dados sobre a natureza das lesões, considerando diagnóstico e parte do corpo atingida. É importante ressaltar que a mesma vítima pode apresentar várias lesões, de tipos diversos e em diferentes partes do corpo. Dentre elas, a contusão foi a mais comum, seguida por fratura, escoriação e trauma cranioencefálico. A parte do corpo mais atingida é a cabeça, seguida dos membros inferiores, face, tórax, múltiplos órgãos/regiões, abdome/quadril e membros superiores.

As Tabelas 2 e 3 comparam os resultados das pesquisas no IML/RR com dados do MS, Viva Inquérito e SIM. Ressalte-se que o Viva utilizou amostra probabilística do mês de setembro de 2011 como parâmetro nacional e, até a elaboração deste artigo, só disponibilizou dados de mortalidade desse ano, mesmo com a Portaria MS 708/2014 38, que liberou recursos financeiros para novo inquérito – já realizado, segundo o MS 39. A comparação entre laudos do IML/RR e dados do Viva Inquérito e do SIM traz evidências de subnotificação da mortalidade no trânsito em Roraima.


Segundo dados do IML/RR, a mortalidade no trânsito atinge sobretudo pessoas do sexo masculino (85,2%) com entre 15 e 34 anos de idade (54,9%). A faixa etária é compatível com a de outras pesquisas, mas a porcentagem de vítimas do sexo masculino é elevada 1,5,6,40. A diferença pode ser explicada pelo fato de que no estado de Roraima, diferentemente do restante do país, há mais homens do que mulheres 41.
Pessoas da cor parda são as mais atingidas pela mortalidade no trânsito (81,5%), considerando que também se enquadram na classificação indivíduos que se declaram mulatos, caboclos, cafuzos ou mamelucos. Em Roraima, a maioria da população é parda (65,6%) 42. O estado tem o maior percentual de indígenas do país 43, com mais da metade de suas escolas voltadas a essa parte da população (53%) 44. Esse perfil demográfico contribui para a miscigenação.
Além de faixa etária e sexo, o estudo constatou que a maioria dos atingidos pela mortalidade no trânsito são solteiros (66,7%) e residentes na capital (66%), em área urbana (81,5%). Esses achados favorecem o planejamento de ações preventivas direcionadas.
A causa de morte mais comum nos laudos do IML/RR foram traumas na cabeça (trauma cranioencefálico, hemorragia intracraniana, trauma crânio-hemorrágico e edema cerebral) (43,4%), coincidindo com resultados de outros estudos 6,45. As fontes, no entanto, são incompletas, inclusive no que se refere a informações sobre o uso de equipamentos de segurança 4.
No Brasil, para ficar em um exemplo, os ciclistas não são obrigados a vestir capacete, embora tenha havido significativa redução da mortalidade e de traumas na cabeça e na face em países que obrigam a utilização desse equipamento 5. Visando mudar esse cenário, o Programa Bicicleta Brasil, que incentiva o ciclismo visando à melhoria das condições de mobilidade urbana, preconiza a atuação de órgãos governamentais e não governamentais para elaborar e divulgar campanhas educativas sobre o uso seguro da bicicleta e seus benefícios 46.
Uma pesquisa mapeou as regiões corpóreas mais atingidas em acidentes de trânsito, concluindo que motociclistas geralmente lesionam membros superiores, inferiores e cintura pélvica, enquanto vítimas de atropelamento e motoristas e passageiros de outros tipos de automóvel apresentam mais lesões na cabeça, no pescoço e na face 47. Em estudo com mototaxistas em Feira de Santana (BA), as partes mais afetadas foram os membros inferiores e superiores 6.
O Conselho Federal de Medicina 48 e a legislação penal brasileira 49 determinam que a necropsia deve ser iniciada seis horas após o óbito, salvo se os peritos, constatando que a morte é evidente, julgarem que o procedimento pode ser feito antes desse prazo. O planejamento para realizar a necropsia por acidente de trânsito pode ser alterado devido a contingências logísticas e de alocação de recursos humanos. Em todo caso, o legista deve registrar no laudo a data exata do óbito e do exame necroscópico.
Ao comparar os laudos de necropsias do IML/RR com os números do Viva Inquérito, a pesquisa evidenciou a subnotificação da mortalidade no trânsito em Roraima, com 57,1% de óbitos não registrados pela pesquisa do MS 31. Portanto, permanecem invisíveis os casos de desfecho letal que seguem para o IML/RR sem passar pelos serviços de saúde.
Na comparação com dados do SIM de 2011 a 2015, os casos não notificados chegaram a 10,37%, considerando todo o período. As próprias Fichas de Qualificação de Mortalidade do MS 16,17apresentam limitações, com expressiva subnotificação de óbitos no Norte e no Nordeste do país. As declarações de óbito por acidentes de trânsito, classificados como “causa externa”, são sempre emitidas pelo IML após a necropsia, mesmo que a morte ocorra em serviço de pronto-atendimento 20-22.
Estima-se subnotificação de 21% das mortes no trânsito nas Américas 10. No caso de Roraima, como visto, a porcentagem chega a 57,1% quando se considera o Viva Inquérito (Tabela 2), e a 10,7% quando se considera o SIM (Tabela 3).
Mensurar as subnotificações é importante para elaborar e aprimorar programas e estratégias de políticas públicas, uma vez que a falta de informações precisas sobre a taxa de mortalidade impede o conhecimento da realidade epidemiológica local, limitando as ações do sistema e diminuindo a efetividade da vigilância em saúde 50.
É importante firmar parcerias no planejamento de inquéritos de saúde, integrando órgãos de epidemiologia com instituições de outra área – como o IML, que pertence à pasta de Segurança Pública – a fim de se obter banco de dados unificado, completo e confiável 4. Essa colaboração ajudaria a cumprir as diretrizes da Política Nacional de Redução da Morbimortalidade por Acidentes e Violências, produzindo dados fidedignos para subsidiar gestores na criação de políticas públicas voltadas à realidade local, com ações de prevenção, promoção e proteção da saúde, bem como reabilitação de pessoas acidentadas 2,3,14.
A essência da ética médica é a ação em prol do paciente, tomado como fim – e não meio – da atuação profissional, sempre com seu consentimento livre e esclarecido 51. Estabelecendo relação de confiança mútua, o médico deve buscar o benefício e evitar o malefício, respeitando a autonomia do paciente e tratando-o com justiça e respeito à autonomia, conforme os princípios da bioética principialista.
No que se refere à necropsia – uma vez que não se coloca a questão da autonomia e da beneficência do periciado –, os profissionais devem aplicar corretamente a legislação pertinente 52. No entanto, para além do cumprimento da lei, Costa Filho e Abdalla-Filho 53 chamam atenção para a necessidade de estabelecer referenciais éticos específicos para a perícia criminal, especialmente para o trato com o corpo do falecido e para a relação com os familiares.
O ponto de partida para esse esforço deve ser a Constituição de 1988 54 e a Declaração Universal sobre Bioética e Direitos Humanos (DUBDH) 55, documentos que norteiam a busca por uma sociedade mais igualitária, fraterna, justa e solidária 56-58. Tomando como base esses textos fundamentais, pode-se partir para o problema mais específico de assegurar a autonomia científica e funcional no exercício da perícia, respeitando as diferentes áreas de atuação envolvidas 23,52,53,59,60.
Deve-se garantir espaços seguros para pedestres e ciclistas, de modo a incentivar a caminhada e o ciclismo e favorecer a coexistência de diferentes tipos de transporte, transformando a cidade em um ambiente de promoção da saúde. Em suma, a mobilidade deve ser segura e sustentável.
Para isso, é preciso adequar os limites de velocidade de cada estrada e via urbana – chegando, no máximo, a 50 quilômetros por hora –, bem como garantir ampla e adequada sinalização e adotar faixas de pedestre em 3D. Juntas com a ênfase na educação para a segurança, medidas como essas podem reduzir a morbimortalidade no trânsito. Ademais, com o incentivo à caminhada e ao ciclismo, pode-se motivar a prática de atividade física e aumentar o bem-estar geral, reduzindo a obesidade e doenças não transmissíveis. Os benefícios, inclusive, se estenderiam ao meio ambiente, já que a redução de veículos movidos a combustíveis fósseis atenuaria a poluição por partículas finas, associadas a maior risco de mortalidade por problemas respiratórios e cardiovasculares 61.
O estudo descreveu a mortalidade no trânsito em Roraima a partir de aspectos éticos, legais e epidemiológicos, comparando laudos do IML/RR com dados do MS (Viva Inquérito e SIM). Com base nessa comparação, constatou-se subnotificação de óbitos causados por acidentes de tráfego.
Para resolver o problema, recomenda-se a integração entre órgãos de saúde e instituições como o IML, vinculado à segurança pública, a fim de formar banco de dados unificado, completo e confiável, que subsidie políticas voltadas à realidade local. Assim será possível efetivar ações de prevenção, promoção e proteção à saúde, bem como de reabilitação de vítimas de acidentes.
Como medidas para minimizar o impacto da morbimortalidade no trânsito, recomenda-se ainda espaços seguros para pedestres e ciclistas; adequação do limite de velocidade às diferentes estradas e vias urbanas, respeitando o máximo de 50 quilômetros por hora; ênfase na educação para segurança no tráfego, com ampla mobilização da sociedade; adequada sinalização e adoção da faixa de pedestre em 3D.
Por fim, no que se refere à deontologia, a pesquisa destaca a importância de constante reflexão para nortear condutas que garantam o respeito à dignidade da pessoa humana.
Variáveis distribuídas em blocos para coletar informações:
1.Dados gerais do exame de corpo de delito e necropsia por acidente de trânsito do IML/RR: mês, ano e dia da semana.
2.Perfil da pessoa examinada: idade (menor de 1, 1-4, 5-9, 10-14, 15-19, 20-24, 25-29, 30-34, 35-39, 40-44, 45-49, 50-54, 55-59, 60-64, 70-74, 75-79, 80-84 e ignorada), sexo (masculino, feminino ou ignorado), cor da pele ou raça (branca, preta, amarela, parda, indígena ou ignorada), estado civil (casado, desquitado ou separado judicialmente, divorciado, solteiro, união estável, viúvo ou ignorado) e escolaridade (sem escolaridade, 1ª à 4ª série incompleta do ensino fundamental, 4ª série completa do ensino fundamental, 5ª à 8ª série incompleta do ensino fundamental, ensino fundamental completo, ensino médio incompleto, ensino médio completo, ensino superior incompleto, ensino superior completo ou ignorada).
3.Dados de residência da pessoa examinada: país, unidade da Federação, município, bairro e zona da residência (urbana, rural, periurbana ou ignorada).
4.Dados da lesão: natureza da lesão (contusão; corte/laceração; entorse/luxação; fratura; amputação; traumatismo dentário; traumatismo cranioencefálico; politraumatismo; outra, qual?); parte do corpo atingida (boca/dentes; cabeça; face; pescoço; coluna/medula; tórax/dorso; abdome/quadril; membros superiores; membros inferiores; genitais/ânus; múltiplos órgãos/regiões; outra, qual?); e causa mortis descrita no laudo (choque hipovolêmico; choque hipovolêmico por lesão vascular abdominal; choque hipovolêmico por trauma toracoabdominal; choque misto hemorrágico e cardiogênico por trauma; edema cerebral; fratura na coluna cervical; hemorragia intracraniana; insuficiência de múltiplos órgãos por politraumatismo; insuficiência respiratória; politraumatismo; septicemia em consequência de politraumatismo; septicemia pós-traumática; trauma cranioencefálico; trauma crânio-hemorrágico; trauma raquimedular; prejudicado).
Antonio Alberto de Medeiros Ferreira empreendeu a pesquisa e elaborou o artigo, que é parte de sua tese de doutoramento. Flávia Martão Flório orientou a concepção, o desenho e o desenvolvimento da pesquisa e revisou o artigo. Luciane Zanin de Souza participou do desenho, do desenvolvimento e da revisão do artigo.
Luciane Zanin de Souza – Doutora – zaninsouza@yahoo.com.br
Flávia Martão Flório – Doutora – flaviaflorio@yahoo.com
Correspondência. Antonio Alberto de Medeiros Ferreira – Instituto Médico Legal de Roraima. Av. Venezuela, 2.083, Liberdade CEP 69309-005. Boa Vista/RR, Brasil.


