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Fadiga e satisfação por compaixão em profissionais oncológicos: revisão integrativa
Desgaste y satisfacción por empatía en los profesionales de oncología: una revisión integradora
Compassion fatigue and satisfaction in oncology professionals: an integrative review
Revista Bioética, vol. 31, núm. 1, pp. 1-14, 2023
Conselho Federal de Medicina

Pesquisa


Recepção: 30 Agosto 2021

Revised document received: 7 Dezembro 2022

Aprovação: 8 Fevereiro 2023

DOI: https://doi.org/10.1590/1983-803420233073PT

Resumo: Este artigo busca identificar fatores que podem promover ou prejudicar a qualidade de vida profissional dos profissionais oncológicos segundo critérios de fadiga e satisfação por compaixão. Utilizou-se estudo bibliográfico descritivo, tipo revisão integrativa, sem recorte temporal. Utilizaram-se as bases de dados CINAHL, Embase, Web of Science, PsycINFO, Scopus, MEDLINE e Biblioteca Virtual em Saúde para a pesquisa analisada por três revisores independentes. Incluíram-se estudos primários nos idiomas português, inglês e espanhol. Realizaram-se análise para alcançar os objetivos propostos neste estudo e síntese dos dados para a apresentação em tabelas e categorias temáticas. Como resultados, selecionaram-se 18 artigos para análise entre os 909 encontrados. Evidenciou-se que fatores sociodemográficos, internos e externos aos indivíduos podem alterar a qualidade de vida profissional. Concluiu-se que características intrínsecas e subjetivas, bem como aspectos do ambiente de trabalho, contribuíram para o desenvolvimento da fadiga por compaixão e da satisfação por compaixão.

Palavras chave: Fadiga por compaixão, esgotamento profissional, enfermagem oncológica, qualidade de vida, neoplasia, pessoal de saúde.

Resumen: Este artículo identificó los factores que pueden promover o dificultar la calidad de vida profesional de los profesionales de oncología según criterios de desgaste y satisfacción por empatía. Se utilizó un estudio bibliográfico descriptivo, del tipo revisión integradora, sin corte temporal. El análisis de los datos recopilados en CINAHL, Embase, Web of Science, PsycINFO, Scopus, MEDLINE y Biblioteca Virtual en Salud fue realizado por tres evaluadores independientes. Se incluyeron estudios primarios en portugués, inglés y español. Se realizaron un análisis de los datos, para lograr los objetivos propuestos, y una síntesis para presentarse en tablas y categorías temáticas. Entre los 909 artículos encontrados, se seleccionaron 18 artículos para el análisis. Los factores sociodemográficos, internos y externos a los individuos, pueden alterar la calidad de vida profesional. Se concluye que las características intrínsecas y subjetivas, así como los aspectos del ambiente laboral contribuyeron al desgaste y la satisfacción por empatía.

Palabras clave: Desgaste por empatía, agotamiento profesional, enfermería oncológica, calidad de vida, neoplasias, personal de salud.

Abstract: This integrative review investigates the factors that may promote or harm the quality of life of oncology professionals, according to compassion fatigue and satisfaction criteria. Bibliographic research was conducted on the CINAHL, Embase, Web of Science, PsycINFO, Scopus, MEDLINE and Virtual Health Library databases. Primary studies published in Portuguese, Spanish and English were included. Of the 909 articles found, 18 were selected for analysis by three independent reviewers. Data were summarized in tables and thematic categories. Sociodemographic factors, internal and external to the individual, can alter professional quality of life. In conclusion, intrinsic and subjective characteristics, as well as work environment aspects, contribute to the development of compassion fatigue and satisfaction.

Keywords: Compassion fatigue, burnout, professional, oncology nursing, quality of life, neoplasms, health personnel.

O ambiente hospitalar é um local considerado insalubre, dados os diversos riscos físicos e psicossociais para os profissionais de saúde 1 . Na oncologia, haja vista as características sociais e econômicas da população brasileira, observa-se o diagnóstico tardio dos tumores malignos, o que ocorre em razão de fatores como falta de conhecimento dos sinais e sintomas da doença, dificuldade de acesso e demora a buscar por serviços de saúde 2 - 4 . Desse modo, muitos pacientes acabam por iniciar o tratamento com a doença já em estágio avançado e, muitas vezes, sem possibilidade de cura. Alguns pacientes permanecem por longos períodos em tratamento, possibilitando a formação de vínculos entre profissional, paciente e família, bem como maior sofrimento em casos de óbito 3 .

Sabe-se, ainda, que o ambiente hospitalar pode provocar adoecimento de profissionais, em decorrência de carga excessiva de trabalho, processo insalubre causado por desgaste físico e psíquico diante de situações conflitantes, número insuficiente de recursos humanos, ritmo acelerado e tarefas repetitivas. Acrescenta-se que o ambiente pode colocar enfermeiros oncológicos em maior risco de desenvolver burnout (BO) e, posteriormente, até deixar o emprego, aumentando o nível de rotatividade e gerando maiores custos anuais 4 , 5 .

Verifica-se, assim, que o trabalho pode interferir na saúde dos profissionais, ocasionando acidentes, doenças e incapacidade temporária ou permanente, ocorrências que devem ser investigadas por meio de compreensão mais detalhada sobre o adoecimento do sujeito que cuida de quem está doente. Nota-se que a fadiga provocada pela constante exposição do profissional da saúde a situações de tensão pode levar o indivíduo a adoecer e, consequentemente, ao presenteísmo e absenteísmo no trabalho 5 .

No campo da traumatologia, a análise da fadiga como parte das reações resultantes do contato próximo com o sofrimento ou com o trauma de outras pessoas trouxe à literatura o termo fadiga por compaixão (FC), definido como o estado de exaustão e disfunção biológica, social e psicológica consequente da exposição prolongada ao estresse traumático secundário 6 - 8 . Trata-se de um estado físico e emocional resultante da compaixão vivida por profissionais que cuidam de indivíduos em situação de sofrimento físico e/ou mental. Defende-se que esse estado de fadiga pode afetar qualquer profissional de saúde que desenvolve atividades com grande demanda de energia física e emocional na prestação do cuidado 6 , 7 .

Cunhou-se, em contraste, ao considerar as vivências satisfatórias que promovem bem-estar profissional na esfera do cuidado, o termo satisfação por compaixão (SC), que se refere a sentimentos positivos derivados do ato de ajudar e da recompensa nos esforços para a realização do cuidado 8 . Define-se, assim, a qualidade de vida profissional como a qualidade atribuída pelo profissional a seu trabalho, ocorrendo a partir da integração dos dois polos – a FC e a SC – em trabalhadores da saúde 8 , 9 .

Considera-se relevante, portanto – ao verificar que a qualidade de vida profissional é um construto recente 1 e está em fase de construção em diferentes países –, investigar o que a literatura tem produzido a respeito desse tema no que tange a profissionais de oncologia no contexto interdisciplinar. Assim, torna-se possível identificar os fatores preponderantes para que os profissionais exerçam suas atividades com mais satisfação e previnam danos causados por altas cargas de desgaste físico e mental.

Avalia-se que analisar criticamente os resultados de pesquisas sobre o tema pode contribuir para estabelecer intervenções voltadas ao alívio do sofrimento ou ao fortalecimento dos potenciais de maior satisfação entre profissionais de saúde que atuam em oncologia.

Objetivo

Esta pesquisa tem como objetivo identificar fatores capazes de promover ou prejudicar a qualidade de vida de profissionais oncológicos segundo os critérios de FC e SC.

Método

Trata-se de estudo bibliográfico, descritivo, tipo revisão integrativa da literatura, elaborado conforme as seguintes etapas 10 : 1) identificação do tema e formulação da questão de estudo para elaborar a revisão integrativa; 2) definição de critérios de inclusão e exclusão de estudos; 3) definição das informações a serem extraídas dos estudos selecionados e categorização dos estudos; 4) avaliação dos estudos incluídos na revisão integrativa; 5) interpretação dos resultados; e 6) apresentação da revisão.

Formulou-se, na primeira etapa, a seguinte questão norteadora: Quais são as evidências disponíveis na literatura sobre qualidade de vida profissional, segundo os critérios de FC e SC, de profissionais de saúde na oncologia?

O levantamento bibliográfico foi realizado na Biblioteca da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (USP) com auxílio de um bibliotecário. Utilizaram-se as seguintes bases de dados: CINAHL (112 artigos); Embase (149 artigos); Web of Science (172 artigos); PsycINFO (50 artigos); Scopus (144 artigos); PubMed (168 artigos) e Biblioteca Virtual em Saúde (BVS) (114 artigos). Optou-se por utilizar os seguintes descritores de ciências em saúde (DeCS) e medical subject headings (MeSH): “ compassion fatigue ”; “ compassion satisfaction ”; “ oncology ”; “ cancer ” e “neoplasia”, associados pelos operadores booleanos “ and ” e “ or ”.

Além disso, optou-se por delimitar os termos citados, inserindo, adicionalmente, descritores controlados de maneira apropriada para cada base, considerando estratégias que retornassem resultados mais amplos. Ressalte-se que os descritores utilizados foram aplicados de acordo com as particularidades de cada base de dados e obtidos por consultas ao DeCS e ao MeSH. As estratégias de busca estão descritas no Quadro 1 .

Quadro 1
Estratégias de busca

Quanto aos critérios de inclusão, selecionaram-se estudos primários, nos idiomas português, inglês e espanhol, relacionados à qualidade de vida profissional de profissionais de saúde, segundo os critérios de FC e SC na área oncológica. Excluíram-se estudos que não envolviam seres humanos, aqueles realizados com estudantes da área de saúde, os que envolviam cuidadores informais, pacientes ou familiares, e aqueles envolvendo profissionais que atuavam em pediatria.

Vale ressaltar que não houve restrição de data de publicação. A busca foi realizada em novembro de 2019, e a seleção, leitura e análise dos textos ocorreram entre os meses de janeiro de 2019 e janeiro de 2020. Apreendeu-se um total de 909 artigos, removendo-se 347 textos duplicados, restando 562, que foram submetidos à leitura de títulos e resumos, para selecionar aqueles que atendiam aos critérios de inclusão estabelecidos.

Tal processo foi executado por três revisores, de maneira independente, o que resultou na exclusão de outros 409 artigos (112 estudos pediátricos, 129 pesquisas com cuidadores e profissionais que não eram da área, 52 artigos em idiomas não inclusos e 116 que não envolviam seres humanos). Os 153 artigos restantes foram submetidos à leitura na íntegra. Excluíram-se, em seguida, 135 artigos (45 por não se relacionarem com a oncologia, 69 por não serem estudos primários sobre qualidade de vida profissional e 21 por terem sido realizados com pacientes). O processo de seleção está descrito na Figura 1 .


Figura 1
Fluxograma de seleção dos artigos que compõem a revisão integrativa referente ao período de janeiro de 2019 a janeiro de 2020

Para a extração dos dados, elaborou-se um instrumento que contemplava os seguintes itens: 1) identificação do artigo (periódico e ano de publicação, formação e afiliação dos autores, idioma e país); 2) objetivos; 3) delineamento metodológico (tipo de estudo, amostragem); 4) resultados e conclusões; e 5) fatores que melhoram ou prejudicam a qualidade de vida profissional dos trabalhadores de saúde, conforme os objetivos propostos para esta revisão 11 .

Esse instrumento contempla a identificação dos artigos (periódico de publicação, formação e instituição a que os autores estão vinculados, idioma e país), aspectos de delineamento metodológico do estudo (tipo de estudo, amostragem, objetivos, resultados, conclusões) e fatores que contribuem ou prejudicam a qualidade de vida do profissional de saúde ( Quadro 2 ) 11 . Após a seleção e o estudo dos artigos, realizou-se análise para alcançar os objetivos propostos neste estudo, e os dados para a apresentação em tabelas e categorias temáticas foram sintetizados.

Quadro 2
Relação dos artigos segundo objetivo, população, local do estudo, tipo de instrumento e tipo de estudo

FC: fadiga por compaixão; BO: burnout ; SC: satisfação por compaixão; UTI: unidade de terapia intensiva; STS: estresse traumático secundário (secondary traumatic stress)

Resultados

Verificou-se, no que se refere à caracterização dos 18 estudos 12 - 29 analisados nesta revisão, que dois foram publicados nos anos de 2010 e 2011, 12 foram publicados entre 2016 e 2017, e quatro em 2018. Quanto ao país de origem dos artigos, sete foram realizados nos Estados Unidos; três, no Canadá; um, nos Estados Unidos e Canadá, em conjunto; e um em cada um dos seguintes países: Coreia, Portugal, Espanha, Japão, Israel, China e Brasil.

Verificou-se o predomínio de enfermeiros como participantes dos estudos (em 11 das 18 pesquisas), sendo que três destes analisaram a percepção de médicos oncologistas, e os demais a equipe interdisciplinar, incluindo enfermeiros, técnicos de enfermagem, médicos, técnicos de radiologia, farmacêuticos nutricionistas, psicólogos e assistentes sociais. Sintetizam-se, pelos dados apresentados nesta revisão, resultados de pesquisas realizadas com aproximadamente 3.112 profissionais.

Com relação ao desenho da pesquisa, registrou-se que 13 estudos adotaram abordagem quantitativa, quatro lançaram mão de abordagem qualitativa com análise fenomenológica e um utilizou o método misto. Entre os estudos de abordagem quantitativa, percebeu-se que o instrumento de coleta de dados Professional Quality of Life , versões 4 e 5, foi predominantemente utilizado. Analisou-se o construto qualidade de vida profissional em associação com diferentes abordagens, como exaustão emocional, BO, qualidade do sono, empatia e característica de personalidade. A análise dos dados permitiu que se reunissem os fatores relacionados positiva e negativamente à qualidade de vida profissional ( Quadro 3 ).

Quadro 3
Relação dos fatores de proteção e fatores de risco na qualidade de vida profissional

SC: satisfação por compaixão; FC: fadiga por compaixão; BO: burnout ; STS: estresse traumático secundário ( secondary traumatic stress )

Esses fatores foram categorizados em variáveis sociodemográficas, fatores internos e fatores externos, e estes foram relacionados a construtos e/ou domínios ligados à qualidade de vida profissional. Destacou-se que, nos estudos primários, os pesquisadores utilizaram análise estatística simples.

Com relação às características sociodemográficas, verificou-se que ter idade superior a 40 anos, ser casado, ter maior número de filhos e ser do sexo masculino 12 , 15 promovem a qualidade de vida profissional. Em contrapartida, ser solteiro, mais jovem que seus pares e sofrer com estressores relacionados a finanças pessoais (ter menor poder aquisitivo) 14 são fatores que prejudicam a qualidade de vida profissional. Vale ressaltar que trabalhar com oncologia aumenta o risco para FC 18 .

Salienta-se que, entre os fatores externos que colaboraram positivamente para a qualidade de vida profissional, ambientes de trabalho saudáveis e de apoio são cruciais para o bem-estar, a saúde e a satisfação dos colaboradores oncológicos 14 , além de participação ativa em grupos de suporte emocional e social 15 , educação continuada que aborde FC e desenvolvimento de trabalho em equipe 16 . Os fatores externos que se correlacionam ao aumento de FC envolveram estresse físico 16 , falta de comunicação entre a equipe interprofissional 19 e falta de apoio da instituição 19 .

Os seguintes fatores internos – ou seja, subjetivos – foram identificados como prejudiciais à qualidade de vida profissional: sentimento de impotência diante da realidade da doença, conflito entre crença e realidade, insatisfação com a equipe médica por causa de sua conduta profissional, apego emocional excessivo ao paciente, compaixão pelos pacientes e seus familiares 19 , 26 , inflexibilidade psicológica (baixa resiliência) 21 e comunicação distanciada com pacientes em final de vida 25 .

Já entre os fatores internos que promovem a qualidade de vida profissional, merecem destaque: extroversão 19 , proatividade 25 , 27 , consciência das situações de doença 26 , padrão de personalidade 19 , 26 , franqueza 26 e disponibilidade 26 . Outros fatores se associaram a estes, a saber: ter melhor qualidade de sono 20 , ser capaz de realizar a ressignificação, encontrar propósito na vida e ter estabilidade emocional 20 , sentir empatia 21 , 26 , ter autocompaixão 21 , comunicar-se de maneira aberta e eficaz com pacientes, receber treinamento para cuidado psicológico 16 , 27 , ter religião 28 e ter habilidade para abordagem de final de vida 25 .

Foi possível verificar que o desejo de promover rodas de conversa com os pares e ter capacitação e treinamentos sobre o sentimento de perda e morte do paciente também foi apontado como fator correlacionado à melhor qualidade de vida profissional 13 , 26 , assim como a capacidade de ter empatia e imaginar que os cuidados assistenciais oferecidos poderiam ser os mesmos que um membro de sua família potencialmente receberia 20 - 22 .

Ainda sobre os fatores internos, nota-se que a empatia tem relação negativa com o neuroticismo, quando há tendência de o indivíduo permanecer em um estado emocional negativo (o que pode provocar maior risco para ansiedade, quando comparado a outros traços de personalidade) 26 .

Discussão

Buscou-se, neste estudo de revisão integrativa, identificar fatores que promovem e prejudicam a qualidade de vida profissional dos trabalhadores de saúde em oncologia, segundo os critérios de FC e SC.

Percebeu-se um aumento da produção científica sobre o tema ao longo do tempo, com predomínio de estudos realizados na América do Norte e ausência de pesquisas no Brasil sobre a relação de FC e SC com a qualidade de vida profissional em oncologia. Esse dado merece destaque, pois, dadas as características próprias da doença, profissionais que trabalham diretamente com pacientes oncológicos estão mais suscetíveis a sofrer maiores impactos na saúde física e psicológica, os quais se estendem negativamente para os âmbitos familiar, social e laboral 12 , 19 .

Neste artigo, demonstrou-se que o contato próximo com pacientes oncológicos mobiliza emoções relacionadas ao apego emocional excessivo. Defende-se que essas emoções, associadas ao sentimento de impotência diante da realidade da doença, levam os trabalhadores a correr o risco de desenvolver FC, comprometendo sua qualidade de vida 19 , 25 , 26 , 28 - 31 .

A literatura mostra, consistentemente, que experiências e vivências de sofrimento e angústia relacionadas ao cuidado podem causar esgotamento psíquico (BO), caracterizado por exaustão prolongada e perda de interesse. Essa situação pode ser resultante da rotina de enfrentamento de situações que evidenciam a terminalidade 30 , 31 . Nesse contexto, as dimensões física e psíquica dos trabalhadores podem tanto ser marcadas por equilíbrio, satisfação e desenvolvimento, quanto por desajuste, tensão e, consequentemente, adoecimento 29 , 30 .

A categorização dos estudos permitiu identificar fatores internos e externos ao indivíduo que influenciam o desenvolvimento de SC e FC, fortalecendo evidências que apontam para a promoção da qualidade de vida profissional. Ressalta-se a particular relevância desta análise diante de estudos que apontam a falta de suporte externo e a falta de equilíbrio entre a vida pessoal e profissional como fatores de risco para a FC 7 , 12 .

Assim, esta revisão integrativa apresentou fatores que beneficiam e fatores que prejudicam a qualidade de vida profissional. Entende-se que diversos construtos subjetivos e de difícil mensuração influem na qualidade do trabalho; por isso, estudos com métodos abrangentes indicam avanços na compreensão do fenômeno. O estudo elencou proatividade, habilidade de comunicação com pacientes em final de vida, franqueza, disponibilidade, consciência e empatia como exemplos desses construtos que impactam a qualidade de vida dos profissionais e que apresentam inúmeros desafios a serem enfrentados 1 , 23 - 26 .

Identificaram-se, no estudo qualitativo, componentes importantes de reações cognitivas de enfermeiras que enfrentaram experiências traumáticas de pacientes com câncer. Entre as categorias elencadas, estão a polaridade – que também foi verificada na teoria da qualidade de vida profissional –, a sensação de inadequação profissional, o desenvolvimento de compaixão pelos pacientes e suas famílias, o desejo de apoiar pacientes e familiares, a ruminação sobre si mesmo, a sensação de cumprimento da missão profissional, a insatisfação com a equipe médica, o desejo de se integrar com os colegas, a fuga aos deveres, o conflito entre crença e realidade, a reconsideração do significado da vida e a sensação de impotência diante do câncer 24 .

Esses resultados, aliados à identificação dos fatores que promovem e prejudicam a qualidade de vida profissional apresentados neste estudo, podem contribuir para compreender o início da FC e fornecer a base para identificar fatores de risco e proteção 3 , 4 , 8 , 9 .

Por meio da análise dos estudos, tendo como referencial a qualidade de vida profissional, foi possível identificar os fatores predisponentes por polos positivos e negativos de maneira distinta. Ressaltam-se, no entanto, alguns fatores que merecem atenção para que se avance na distinção entre FC, BO e SC. As correlações entre os níveis de FC, BO e SC com variáveis sociodemográficas de diferentes culturas permitiram confirmar essa polaridade pela similaridade das variações obtidas entre FC e BO e as associações negativas com SC 14 .

Os resultados foram semelhantes aos obtidos em outros estudos que aprofundaram a comparação entre esses construtos, mostrando, ainda, a resiliência como importante mediador dessa relação 8 . Observou-se, em estudo comparativo que analisou os fenômenos de FC, SC e BO entre enfermeiros dos serviços de emergência, nefrologia, cuidados intensivos e oncologia, que aqueles que trabalham em unidades oncológicas foram os que apresentaram níveis de FC mais elevados 1 .

Sabe-se que a promoção da qualidade de vida profissional depende, em grande medida, de ambientes de trabalho saudáveis como fator crucial para o bem-estar, a saúde e a satisfação dos enfermeiros. Afirma-se que a melhoria no local de trabalho pode prevenir sequelas negativas e contribuir para resultados satisfatórios de saúde dos pacientes.

Diante desses dados, sugere-se implementar mudanças institucionais como a criação de políticas e diretrizes para desenvolver intervenções preventivas e de apoio psicossocial para enfermeiros, principalmente no contexto da oncologia. Entende-se que cuidar de pacientes com câncer pode influenciar significativamente o desenvolvimento do estresse, que provoca insatisfação dos funcionários e exaustão mental 15 , 17 .

Verificou-se que a equipe de saúde de unidades de internação hospitalar obteve menor pontuação de SC do que seus pares que trabalham em ambientes ambulatoriais 17 . Embora esta revisão não tenha explorado a miríade de fatores que podem contribuir para o estresse no local de trabalho, a literatura oferece dados para reflexão.

Os fatores de estresse no local de trabalho de pacientes internados diferem daqueles de ambientes ambulatoriais: a demanda de cuidado do paciente é maior, e inclui a exposição a maior número de óbitos, mais complicações decorrentes de tratamentos e doenças e maior gravidade de sintomas clínicos. Além disso, muitas vezes as condições ambientais são inadequadas 1 , 2 .

Encontraram-se vários artigos que mostraram aspectos relevantes para a ocorrência de FC, como a falta de preparo do profissional em lidar com a morte, a falta de compreensão da equipe – especialmente por não concordar em “prolongar” o sofrimento por meio de cuidados paliativos – e a sobrecarga de emoções do paciente e da família projetada na equipe 13 , 19 , 24 - 26 .

Profissionais que estão há mais tempo na oncologia apresentaram menor escore de FC quando comparados a seus pares que acabaram de iniciar a vida profissional. Registrou-se, além disso, que as mulheres enfermeiras também apresentaram FC maior que enfermeiros homens 12 , 14 - 16 .

Estudo recente relata que enfermeiros oncológicos enfrentam dificuldades de comunicação com pacientes: não sabem as palavras certas a usar e temem que possam perturbar o paciente ou a família. A falta de experiência e de treinamento em comunicação diminuem a confiança do enfermeiro em discutir certos tópicos com pacientes e familiares, fato que pode ser agravado por diferenças culturais entre enfermeiros e pacientes 32 .

Os resultados deste estudo fornecem respaldo teórico para um olhar direcionado à promoção da qualidade de vida de profissionais que atuam em oncologia – especialmente profissionais de enfermagem, que exercem atividades de cuidado muito próximas ao paciente e a sua família. Cabe destacar as limitações desta revisão ao reduzido número de estudos que aprofundaram distintamente FC e SC, o que não permitiu uma análise mais completa do construto qualidade de vida profissional.

Os dados apresentados podem respaldar diretrizes para que políticas institucionais e intervenções se desenvolvam e contribuam para a melhoria do cuidado dos pacientes oncológicos nas diferentes fases do tratamento e da doença. Reconhece-se, também, a ausência de ferramentas on-line próprias para o método de revisão, níveis de evidência dos estudos e qualidade destes.

Considerações finais

Conclui-se que os resultados detectaram lacunas no conhecimento relacionado à qualidade de vida profissional em unidades oncológicas, principalmente entre trabalhadores mais jovens e com menor tempo de profissão.

Este estudo permitiu caracterizar a produção científica sobre qualidade de vida profissional segundo os critérios de FC e SC, no que se refere às características metodológicas. Mostrou-se um maior número de investigações de abordagem quantitativa, justificado pelo avanço do instrumento de avaliação Professional Quality of Life . Assim, deu-se preferência a estudos com outras vertentes metodológicas, sobretudo por envolverem construtos subjetivos, como empatia, compaixão e experiências que trazem satisfação ao profissional.

A relação com os demais estudos pesquisados permitiu verificar que os polos negativos e positivos se relacionam com determinados indivíduos em diferentes contextos culturais e laborais. Além disso, identificaram-se os fatores que promovem e que prejudicam a qualidade de vida profissional por meio de categorias relacionadas a variáveis sociodemográficas e fatores internos e externos aos profissionais da saúde.

Percebeu-se que a comunicação com o paciente, a capacidade de empatia e a participação em grupos de apoio emocional contribuem para que os profissionais desenvolvam fatores de proteção da qualidade de vida profissional. Vale alertar que a comunicação diminuída e distanciada do paciente e o menor tempo de trabalho foram identificados como fatores que prejudicam a qualidade de vida profissional.

Portanto, sugere-se a criação de políticas e estratégias institucionais baseadas nesses fatores para que se alcance a melhor efetividade nas ações de promoção e prevenção da saúde do trabalhador. Nesse sentido, são necessárias novas investigações a fim de que esses polos sejam esclarecidos e outras categorias profissionais sejam investigadas em qualquer situação em que exista a relação entre profissional de saúde e paciente.

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Autor notes

Ana Paula Neroni Stina Saura – Doutora – aninha_stina@yahoo.com.br

Izabel Alves das Chagas Valóta – Doutoranda – izabel.chagas@usp.br

Maiara Rodrigues dos Santos – Doutora – maiara.santos@usp.br

Rodrigo Marques da Silva – Doutor – marques-sm@hotmail.com

Ana Lucia Siqueira Costa Calache – Doutora – anascosta@usp.br

Declaram não haver conflito de interesse.

Correspondência: Ana Paula Neroni Stina Saura – Rua Doutor Luiz Migliano, 1870, ap. 32 A, Jardim Caboré CEP 07511-001. São Paulo/SP, Brasil.



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