Resumo: Competências foram definidas como o conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes que um profissional deverá adquirir para exercer determinada atividade de trabalho. O objetivo deste estudo foi avaliar as competências em cuidados paliativos entre os estudantes matriculados em um curso de medicina brasileiro. Todos os estudantes matriculados foram convidados para participar e preencheram a ferramenta Palliative Competence Tool. Os dados obtidos foram calculados em escores entre zero e 100 e comparados entre as dez competências e os ciclos acadêmicos. Os resultados mostraram quatro padrões, sendo o mais frequente a redução dos escores entre estudantes dos ciclos básico e intermediário, com recuperação parcial no estágio. Apenas a competência ética e tomada de decisão mostrou elevação no estágio. Concluiu-se que a aquisição de competências em cuidados paliativos na graduação médica ainda é frágil. Novas estratégias de ensino poderão ser adotadas com intenção de aprimorar a aquisição de competências no futuro.
Palavras chave: Cuidados paliativos, Educação médica, Competência profissional.
Resumen: Las competencias son un conjunto de conocimientos, habilidades y actitudes que debe adquirir el profesional para desempeñar una actividad laboral. Este estudio pretende evaluar las competencias en cuidados paliativos entre los estudiantes de medicina matriculados en el grado de medicina en Brasil. Todos los inscritos recibieron invitación a participar y completaron la Palliative Competence Tool. Los datos obtenidos se calcularon en puntuaciones entre 0 y 100 y se compararon entre las diez competencias y los ciclos académicos. Los resultados mostraron cuatro patrones; el más frecuente fue la reducción de la puntuación entre los estudiantes de ciclos básico e intermedio, con recuperación parcial en las prácticas. Solo la competencia ética y la toma de decisiones presentaron una alta puntuación en las prácticas. Sigue siendo débil la adquisición de competencias en cuidados paliativos en medicina. La adopción de nuevas estrategias de enseñanza puede mejorar la adquisición de las competencias en el futuro.
Palabras clave: Cuidados paliativos, Educación médica, Competencia profesional.
Abstract: Competencies have been defined as the set of knowledge, skills and attitudes that a professional should acquire to perform a certain work activity. This study aimed to assess competencies in palliative care among students enrolled in a Brazilian medical course. All enrolled students were invited to participate and answer the Palliative Competence Tool. The data obtained were calculated in scores between zero and 100 and compared between the ten competencies and academic cycles. The results showed four patterns, the most frequent being a reduction in scores among students in the basic and intermediate cycles, with partial recovery in the internship. Only ethical competence and decision-making increased in the internship. It was concluded that the acquisition of palliative care competencies in undergraduate medical education remains fragile. New teaching strategies could be adopted to improve their acquisition in the future.
Keywords: Palliative care. Education, medical, Professional competence.
Pesquisa
Competências em cuidados paliativos entre estudantes do curso de medicina
Competencias en cuidados paliativos entre los estudiantes de medicina
Palliative care competence among medical students
Recepção: 26 Julho 2022
Revised document received: 18 Abril 2023
Aprovação: 20 Abril 2023
Cuidados paliativos (CP) são definidos como abordagens que melhoram a qualidade de vida dos pacientes – adultos e crianças – e dos familiares que enfrentam problemas associados com doenças potencialmente fatais e atuam através da prevenção e alívio do sofrimento por meio de identificação precoce, avaliação e tratamento impecável da dor e de outros problemas psicossociais e espirituais 1 . Estima-se que 40 milhões de pessoas precisem de CP ao redor do mundo, porém apenas 14% conseguem recebê-los. Uma das barreiras para melhorar a qualidade da assistência paliativa é a falta de treinamento e de conscientização dos profissionais de saúde sobre o assunto 1 , 2 .
Dada a necessidade da assistência médica em CP, a temática está sendo inserida gradativamente na educação médica, seja por meio de disciplina ou de estágio, seja como parte do conteúdo em áreas correlatas, mas nem sempre como formação obrigatória no currículo médico 3 - 7 . Dos 54 países europeus, em apenas nove o conteúdo foi obrigatório 8 ; nos Estados Unidos, 43 de 51 escolas avaliadas incluíam a temática 5 . No Brasil, apenas 14 cursos tinham disciplina que abordava o assunto na grade curricular em 2018 9 e, em 2020, de 191 serviços listados, 37,2% estavam envolvidos com ensino de graduação 10 .
O ensino tem a missão de construir profissionais competentes, com saberes técnicos, habilidades para realizar atividades e atitudes condizentes com o dever profissional. Nesse contexto, competências foram definidas como o conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes que um profissional deve adquirir para exercer determinada atividade. Podem, ainda, ser aferidas de acordo com um padrão de bom desempenho profissional e aprimoradas com treinamento e desenvolvimento 11 , 12 . O papel da educação médica está além de inserir disciplinas em uma grade curricular: trata-se de transformar pessoas em médicos competentes 11 - 15 .
As competências em CP foram descritas por Meekin e colaboradores 16 e aprimoradas por Gamondi, Larkin e Payne 13 , 14 , consistindo em:
Estudantes de medicina e médicos recém-formados ou experientes relataram que não se sentem preparados – ou competentes – para atender pacientes com necessidades paliativas. Além disso, demonstraram sofrimento emocional, falta de conhecimento para manejar sintomas, comunicação frágil para o acolhimento de paciente ou familiares e incerteza se eram qualificados 4 , 17 - 21 .
O Palliative Competency Tool (PalliComp) é um instrumento de pesquisa desenvolvido e validado em língua portuguesa para avaliar competências médicas em CP no nível da abordagem, ou seja, não especializada. Estudos de validação mostraram correlação adequada, padrões compactos e pouco dispersos, com consistência interna adequada para a proposta. Após a validação, é necessário realizar a primeira aplicação do instrumento em maior escala 22 .
O objetivo deste estudo foi avaliar as competências em CP entre os estudantes de um curso de medicina brasileiro utilizando o PalliComp e discutir os resultados à luz da bioética e da educação médica.
Todos os estudantes maiores de idade matriculados no curso de medicina da Universidade Federal do Paraná (UFPR), totalizando 1.080 indivíduos, foram convidados a participar deste estudo. Receberam orientações acerca dos riscos e benefícios e aqueles que aceitaram participar assinaram termo de consentimento livre e esclarecido. A coleta dos dados ocorreu entre maio e junho de 2019.
A participação foi voluntária e os pesquisadores agendaram horário com cada turma. De maneira individual, anônima e sem consultar fontes bibliográficas, os participantes responderam a questões sobre dados demográficos e ao instrumento de pesquisa PalliComp 22 . O tempo de participação foi de até 30 minutos.
O instrumento de pesquisa PalliComp 22 utilizado possui 24 afirmativas, corretas e incorretas, e as respostas são assinaladas em escala Likert de cinco pontos (“concordo totalmente”, “concordo”, “nem concordo nem discordo”, “discordo” e “discordo totalmente”). Os dados obtidos foram inseridos em planilha eletrônica, conferidos e submetidos a estudo estatístico no software R, versão 3.6.1. Foram excluídos apenas os questionários com preenchimento incompleto.
Cada item recebeu a pontuação: +1 (totalmente correto), +0,5 (correto), 0 (alternativa neutra), −0,5 (incorreto) e −1 (totalmente incorreto). Foi dada atenção à correção de afirmativas propositalmente incorretas, que tiveram a pontuação invertida e foram agrupadas por competências e somatória geral. Os escores foram calculados por meio de fórmula – (variável − nota mínima) ÷ (nota máxima − nota mínima) – e transformados numa escala de 0 a 100.
Os dados que caracterizam a amostra foram descritos por frequência absoluta e relativa, média e desvio-padrão e comparados pelos testes qui-quadrado e de Kruskal-Wallis. Compararam-se os escores de acordo com ciclos acadêmicos – ciclos 1 (do 1º ao 4º semestre), 2 (5º ao 8º) e 3 (9º ao 12º) – por meio dos testes de Kruskal-Wallis e Conover para comparações múltiplas. Os escores dos participantes que cursaram ou não a disciplina optativa de CP foram avaliados pelo teste U de Mann-Whitney.
Aceitaram participar do estudo 706 estudantes (65,4% dos matriculados), sendo 35,4% do ciclo 1, 35,7% do ciclo 2 e 28,9% do ciclo 3. Os dados demográficos que caracterizam a amostra estão descritos na Tabela 1 .


A educação é importante para o progresso de pessoas e de toda a sociedade e, de acordo com Delors e colaboradores, está a serviço de um desenvolvimento humano mais harmonioso e autêntico23 . Na área da saúde, os múltiplos avanços científicos trouxeram novas possibilidades de sobrevida aos pacientes adoecidos, e o processo de adoecer e morrer tornou-se prologado para os doentes, de forma que os CP são cada vez mais necessários para melhorar a qualidade de vida ao longo do adoecimento 24 .
A aquisição de competências é complexa e depende da qualidade e forma com que o conteúdo foi apresentado, do cenário a que o estudante foi exposto, das relações que se estabelecem entre professor e estudante, do currículo oculto e da importância que a temática tem para a sociedade 12 , 15 , 25 - 27 . Assim, compreende-se que adquirir competências não é tarefa de uma disciplina acadêmica isolada na graduação.
Ao avaliar a aquisição de competências, é essencial aferir se estudantes – ou futuros médicos – estão adquirindo o que é necessário para o exercício da medicina e, a partir disso, proporcionar melhorias. O curso de graduação em medicina, no momento do estudo, ofertava ensino tradicional e era dividido em três ciclos: básico, clínico-cirúrgico e estágio, com dois anos cada.
A disciplina de CP era ofertada em caráter eletivo e menos de 10% dos estudantes estavam matriculados nela, o que não permitiu estudo dessa variável. Houve diferença da média etária entre os ciclos, uma vez que o aumento de idade é esperado ao longo dos anos de graduação. A aquisição da competência geral não mostrou diferença entre os ciclos acadêmicos.
As competências 1, 4 e 5 – respectivamente, conceito de CP, abordagem psicoemocional e abordagem espiritual – não mostraram aumento dos escores ao longo do curso. Tal fato é importante e preocupante, pois denota que, com o ensino ofertado, não houve acréscimo de conhecimentos, habilidade ou atitudes nessas áreas.
O modelo biomédico atribui a morte às falhas da fisiologia e o profissional formado evita a morte a todo custo, tentando superá-la. O problema é que tal modelo ignora o fim da vida como parte da própria vida, além de dimensões do paciente como valores, emoções, vínculos e crenças. Torralba afirma que a morte ineludível de todo ser humano constitui, simultaneamente, o fracasso e o desafio biomédico28 .
Estratégias inovadoras de ensino cooperaram para a aquisição de competências desejáveis aos CP. A inserção das artes estimulou o entendimento de conceitos básicos, a empatia e a responsabilidade do médico 29 , e o treinamento de comunicação por meio de simulação realística proporcionou reflexão sobre as próprias atitudes 30 , 31 .
A competência 2 abordava o conforto físico do paciente e o manejo de sintomas como dor, dispneia e prescrição de opioides, e, na opinião dos pesquisadores, descreve a atribuição mais primária do médico nos CP. Lamentavelmente, observou-se inesperada redução dos escores dessa competência no ciclo 2 em relação aos ciclos 1 e 3, demonstrando fragilidade do ensino. Ainda, é possível que as vivências do ciclo 2 tenham influenciado negativamente o desempenho dos estudantes, uma vez que os do ciclo 1 apresentaram escores superiores, parcialmente resgatados no ciclo 3.
A insegurança dos médicos diante da abordagem paliativa não é novidade e, frequentemente, os profissionais apontaram tal sentimento à falta de ensino na graduação 3 , 4 , 6 - 8 , 17 - 21 , 29 . No entanto, não se trata apenas de uma questão de ensino, mas de estímulo por meio de políticas educacionais.
Na Alemanha, o ensino de CP tornou-se obrigatório em todas as escolas de medicina a partir de 2009, professores receberam treinamento e estratégias de ensino foram implementadas para que as competências anteriormente descritas fossem contempladas na graduação 31 - 33 . A ausência de interesse dos estudantes pela temática também é um problema e talvez seja motivada por uma sociedade que, de maneira geral, não compreende o que são CP e associam-nos a fracasso, abandono, sofrimento ou morte assistida 34 .
Pacientes em fim de vida relatam sofrimento com questões emocionais e sociais, correlacionando perda da autonomia e necessidade de cuidados à perda da dignidade 35 - 37 . A competência 3 descrevia o apoio às necessidades psicológicas dos pacientes e, neste estudo, o desempenho se mostrou mais elevado entre estudantes iniciantes, com redução persistente ao longo do curso. Infelizmente, o ensino ofertado reduziu a competência dos estudantes em acolher os pacientes em relação ao sofrimento emocional e às incertezas do fim de vida.
É esperado que o médico generalista saiba identificar o sofrimento emocional dos pacientes, seja capaz de apoiá-los na trajetória da doença e oferte acolhimento. Uma hipótese para explicar isso é a redução da empatia entre estudantes de medicina, visto que diversos estudos mostram a deterioração dessa capacidade 38 - 40 .
Em 2015, Hojat e colaboradores 41 descreveram que, conforme se exige mais dos estudantes, exacerbam-se atributos negativos da personalidade, como despersonalização e exaustão emocional. Estratégias educacionais que atentaram para a redução da empatia e abordaram o sofrimento do estudante por meio de roda de conversa e escrita reflexiva mostraram bons resultados 42 - 43 .
Os estudantes avaliados não demonstraram melhora dos escores relacionados à competência 4, que descreve os impactos sociais e econômicos proporcionados pelo adoecimento grave na vida dos pacientes, como trabalho, aposentadoria e outros benefícios sociais. Na mesma linha, mas relacionada ao suporte a família e cuidadores, a competência 6 mostrou desempenho mais favorável no ciclo 1 do que no 2, parcialmente recuperado no estágio, mas sem ultrapassar os estudantes iniciantes. Não se pode afirmar que o curso de medicina tenha influenciado de maneira positiva ou promovido aumento das competências sociais e familiares.
Ter um familiar em fim de vida, algumas vezes dentro da mesma moradia, é fonte de sobrecarga e gera sofrimento, podendo incluir ansiedade, cansaço e ruptura das relações familiares, intensificadas com a piora das condições de saúde e aumento dos cuidados 44 . O estresse do cuidador resulta do desequilíbrio entre as demandas exigidas nos cuidados e a sua disponibilidade de tempo, emocional, social, de recursos financeiros, de capacidades, entre outros 45 .
Estudantes inseridos nas conferências familiares puderam conhecer membros da família envolvidos diretamente nos cuidados e observaram as diferentes dinâmicas que estabelecidas, identificando necessidades socioeconômicas e a sobrecarga imposta aos cuidadores 46 .
A espiritualidade é definida como a dimensão dinâmica da vida humana que se relaciona com a maneira de como as pessoas experimentam, expressam e/ou buscam significado, propósito e transcendência, e a maneira como elas se conectam ao momento, ao eu, aos outros, à natureza, ao significante e/ou ao sagrado 47 . Foi tratada na competência 5 e a amostra avaliada não demonstrou aquisição de competências ao longo do curso.
Pacientes que enfrentam a terminalidade da vida lidam com questões existenciais e o sentido da vida, portanto abordar a espiritualidade faz parte da assistência integral à saúde 47 , 48 . Porém esse tema frequentemente é mal compreendido e negligenciado 49 . Atkinson e colaboradores 50 descreveram resultados satisfatórios com a estratégia acadêmica de breve duração que utilizou o instrumento FICA Spiritual History Tool 51 .
Questões éticas, como o respeito à autonomia do paciente e o processo de tomada de decisão, foram abordadas na competência 7 e, felizmente, os estudantes mostraram elevação gradativa dos escores entre os ciclos 1 e 3, demonstrando que o ensino atuou positivamente nessa área. O cuidado impõe inúmeros desafios éticos e não é uma ação neutra, pois sofre crítica de um julgamento moral 28 .
Geralmente, na graduação em medicina se ensina a bioética principialista, que consiste no respeito à autonomia, beneficência, não maleficência e justiça. De fato, ações médicas que respeitam a autonomia do paciente são fundamentais para a assistência em saúde, mas raramente o ensino de bioética capacita o estudante para compreender o paciente como agente autônomo, ou seja, para r econhecer o direito dessa pessoa de ter suas opiniões, fazer suas escolhas e agir com base em valores e crenças pessoais 52 . Uma pesquisa italiana apontou que os estudantes apreciaram as aulas de bioética, especialmente quando o tema ampliou a visão do mundo e foi integrado à prática clínica 53 .
O trabalho em equipe e a coordenação do cuidado foram contemplados na competência 8. Na graduação, espera-se que o estudante adquira competências para trabalhar junto a outros profissionais da medicina, enfermagem e outras áreas. Trata-se do cuidado integral do paciente, que pode ser demonstrado por meio da construção de um plano de cuidados junto com a equipe multiprofissional. Os estudantes demonstraram escores mais elevados no início do curso, queda no ciclo 2 e elevação no ciclo 3, que, porém, não ultrapassou o ciclo 1. Assim, compreende-se que o curso como um todo não promoveu a aquisição de competências para o trabalho em equipe.
Na terminalidade da vida, as demandas não se restringem apenas à medicina. O planejamento terapêutico é elaborado com a participação dos membros da equipe diretamente envolvidos, que usarão o conhecimento científico para aliviar sintomas e promover qualidade de vida ao paciente, levando em consideração cultura, valores, possibilidades socioeconômicas e o sistema de saúde 54 . Trabalhar em equipe é desafiador e, ao mesmo tempo, necessário. O futuro médico precisa ser apresentado a outros profissionais de saúde e conhecer a atuação deles, bem como aprender a conviver, gerir conflitos, respeitar e se comunicar 55 , 56 .
O relacionamento interpessoal com o paciente, familiares ou equipe se dá por meio da comunicação, habilidade abordada na competência 9, com a qual se constrói a relação terapêutica. Os estudantes tiveram melhor desempenho no ciclo 1 do que no 2, voltando a melhorar no 3, porém de maneira semelhante aos iniciantes. Estudantes manifestaram sensação de ansiedade, exaustão emocional, insegurança e desejo de distanciamento do paciente durante a comunicação de más notícias 57 , mas treinamentos recorrentes de comunicação aumentaram a confiança de estudantes e médicos recém-formados 58 - 61 .
Autocuidado e engajamento na educação continuada foram abordados na competência 10 e, novamente, houve redução dos escores, com recuperação no estágio que não ultrapassou os estudantes iniciantes. Lidar com terminalidade e morte implica conviver com o sofrimento diariamente, portanto, há necessidade de estar atento à própria fragilidade. É esperada a presença de manifestações emocionais e é importante promover espaço para trocas de experiências, o que auxiliará a formação de médicos com atitudes empáticas e capazes de acolher tanto as próprias emoções como as de outros profissionais e pacientes 62 , 63 .
Neste estudo, observaram-se quatro padrões de desempenho ao longo do curso de medicina:
Sem diferença nos escores ao longo da graduação (competências 1, 4 e 5);
Escores em “V”: redução dos escores entre os ciclos 1 e 2, com elevação entre o 2 e o 3, sendo que a elevação no ciclo 3 nem sempre foi estatisticamente distinta em relação ao ciclo 1 (competências 2, 6, 8, 9 e 10);
Escores em “L”: redução dos escores entre os ciclos 1 e 2, sem elevação no ciclo 3 (competência 3);
Elevação dos escores (competência 7).
A aquisição de competências ocorre em etapas, descritas por: 1) incompetência inconsciente – o indivíduo desconhece ou nem percebe a incompetência em determinado assunto; 2) incompetência consciente – o indivíduo percebe que não domina um conjunto de saberes, reconhece o déficit e, se desejar, poderá buscar a aprendizagem; 3) competência consciente – o indivíduo adquiriu o saber, mas, para conseguir executá-lo, precisa de atenção, estratégia e etapas bem descritas; e 4) competência inconsciente – o indivíduo incorporou o saber como “segunda natureza”, executa facilmente e, se desejar, é capaz de ensinar para outras pessoas.
A literatura descreve que, quando estudantes de medicina perceberam a própria baixa performance e, na sequência, tiveram um ambiente acadêmico favorável, houve melhora do aprendizado e do desempenho 64 - 66 .
O PalliComp propõe ao participante responder o grau de concordância com cada afirmativa, que descreve um conhecimento, habilidade e/ou atitude desejáveis. Dessa maneira, os padrões encontrados podem ser explicados pelos conhecimentos adquiridos ou não ao longo do curso, que nem sempre estiveram associados à aquisição de habilidades e atitudes. Ainda, valores ensinados, cultura profissional e currículo oculto exercem pressão acadêmica e, como o padrão em “V” ocorreu na maior parte das competências avaliadas, é provável que vivências do estudante no estágio tenham promovido o resgate das competências ao menos parcialmente.
É importante ressaltar que o PalliComp não tem a proposta de estabelecer um ranking de estudantes competentes ou incompetentes. Trata-se de aferição da condição oportunizada pelo ensino, permitindo planejar iniciativas e melhorias, com possibilidade de nova aferição ao longo do tempo.
A interpretação dos dados obtidos tem limitações, uma vez que o estudo apresenta desenho transversal e cada estudante foi exposto a condições únicas ao longo da formação, que não podem ser replicadas. É provável que o padrão observado no desempenho das competências se repetiria em um estudo prospectivo, que não foi possível devido à pandemia.
Avaliar competências é uma tentativa de facilitar a aquisição de saberes e virtudes desejáveis a médicos generalistas, pois eles precisarão ser competentes nas necessidades assistenciais da população com doenças incuráveis e potencialmente fatais. Os processos de adoecer e morrer não são uma opção: fazem parte da vida humana e do trabalho dos médicos. Dessa maneira, qualificar o ensino médico para as questões relacionadas aos CP é urgente.
A aquisição de competências em CP entre os estudantes matriculados no curso avaliado foi insuficiente. Nove das dez competências avaliadas não mostraram elevação consistente dos escores entre os estudantes do estágio e apenas a competência ética e de tomada de decisão elevou-se no final do curso em relação ao início. Novas estratégias de ensino podem ser adotadas com a intenção de aprimorar a aquisição de competências em CP.
Os pesquisadores agradecem aos estudantes participantes e à coordenação do curso de medicina da UFPR.
Carla Corradi Perini – Doutora – carla.corradi@pucpr.br
Luís Otávio Zatorre Fileno – Graduando – luis.zatorre@gmail.com
Gustavo Belam Fioravanti – Graduando – gustavofioravanti@outlook.com
José Eduardo de Siqueira – Doutor – eduardo.jose@pucpr.br
Correspondência: Úrsula Bueno do Prado Guirro – Rua Padre Camargo, 280, 4º andar, Alto da Glória CEP 80060-240. Curitiba/PR, Brasil.

