Dossiê Mundos de Mulheres 2021: Pensamentos Feministas Afro-Moçambicanos - Ativismos
Fórum Mulher – Coordenação para a Mulher no Desenvolvimento (FM)
Recepção: 31 Outubro 2019
Aprovação: 21 Novembro 2019
O Fórum Mulher (FM) é uma rede de organizações não governamental criada em abril de 1990 e oficializada em 14/04/1993, por iniciativa do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), de Oficiais de Programas Mulher no Desenvolvimento e de diversas outras organizações financiadoras e doadoras de recursos internacionais. Atualmente, conta com 50 membros efetivos, oriundos de organizações nacionais da sociedade civil. O FM define-se como feminista, com o papel de mediador entre sociedade civil e Estado nas relações com as políticas governamentais e no fortalecimento das organizações que lutam pelos direitos das mulheres. Tem como pauta política as transformações de princípios e práticas socioculturais que geram opressões às mulheres, enfrentando as relações de poder hierárquicas entre mulheres e homens, tendo como denominador comum o respeito pelos direitos humanos e a melhoria da posição da mulher na sociedade. Seus objetivos são contribuir para uma sociedade mais justa e igualitária, onde as mulheres e as raparigas gozem do seu direito a uma vida livre de violência, exerçam os direitos humanos, sua autonomia econômica e sua cidadania, bem como influenciar eficientemente as decisões políticas, as atitudes e os comportamentos na sociedade por um maior reconhecimento e observância dos direitos humanos das mulheres. A cada período eleitoral (nas eleições autárquicas e eleições gerais), o FM divulga o Manifesto Político das Mulheres, construído coletivamente em encontros em diferentes locais e com setores das organizações de mulheres, quando é debatido e feito o levantamento das principais agendas para apresentar a candidaturas, buscando seu comprometimento político com a pauta de reivindicação das mulheres. A seguir pode ser conferido o Manifesto para os anos 2018/2019.
A Constituição da República de Moçambique (CRM) estabelece, no artigo 3, que a República de Moçambique é um Estado de Direito baseado no pluralismo de expressão, na organização política democrática e no respeito e garantia dos direitos e liberdades fundamentais, incluindo o sufrágio universal – direito ao voto (art. 73).
Moçambique vai realizar as suas eleições Autárquicas para a escolha dos Presidentes dos Municípios no ano de 2018, e as Gerais para a escolha do Presidente da República e dos Deputados da Assembleia da República no ano de 2019. Este é um momento em que nós, mulheres, reafirmamos por um modelo de desenvolvimento inclusivo – que atenda às nossas necessidades políticas, econômicas, sociais e ambientais.
O manifesto surge como instrumento para dar a voz às mulheres, visibilizando suas preocupações, e exigindo tomar parte dos processos de tomada de decisão. Este documento reflete as preocupações e exigências das mulheres que pretendem se ver espelhadas não só nos manifestos eleitorais dos partidos políticos como também nos diversos programas dos governos.
- Moçambique ocupa o 14º lugar no mundo em relação à representação das mulheres no Parlamento (39,6%), mas existe uma grande disparidade de representação das mulheres nos órgãos de representação local, autarquias, assembleias provinciais. Os homens têm dominado os assuntos e espaços da esfera pública, onde as mulheres, em muitos casos, têm menos controlo e protagonismo no processo da democracia.
- A incidência da pobreza entre as famílias chefiadas por mulheres é maior, ditada pelo limitado acesso a oportunidades e fraco poder de controlo sobre os recursos como terra, trabalho, capital e tecnologia. As mulheres também têm acesso limitado aos recursos, incluindo a posse de terra, e não participam de forma efetiva nos processos de auscultação e de tomada de decisão sobre o acesso e controlo da terra e outros recursos naturais.
- O país continua a enfrentar o rápido agravamento da epidemia do HIV e SIDA, que afeta de forma desproporcional as mulheres e raparigas, e os dados recentes indicam que a taxa de prevalência do HIV e SIDA é de 13%, dos quais mulheres com 15,4% e homens 9,9%.
- A mortalidade materna constitui uma preocupação, com uma taxa de 480/100.000 nascimentos. Os partos assistidos situam-se em 60/100. Dados atuais de Moçambique revelam poucos avanços na redução da mortalidade materna e no alcance do acesso universal aos serviços de saúde reprodutiva. A alta taxa dos casamentos prematuros contribui significativamente para os elevados índices de mortalidade materna.
- Há um índice elevado de fecundidade em Moçambique, onde se tem constatado que mais da metade das mulheres sexualmente activas são raparigas de 16 anos e as casadas ou mães têm 19 anos.
- Os métodos contraceptivos modernos só são usados por cerca de 25% de mulheres.
- As mulheres e raparigas são as maiores vítimas de violência, com destaque para a sexual, física, psicológica, patrimonial, que estão enraizadas em dinâmicas sociais e culturais discriminatórias, que perpetuam a desigualdade de gênero.
- A fraca cobertura e a gestão deficiente do sistema de transportes públicos urbanos têm afetado as mulheres, que têm que recorrer ao transporte inseguro e outros meios para se deslocar dentro e fora das cidades (mylove) que não oferecem comodidade e segurança (pesquisa sobre transporte público).
- Implementação efetiva da lei da Violência Doméstica, garantindo um atendimento integrado e fiável as mulheres, idosas, mulheres com deficiência e albinas.
- Promoção de campanhas regulares de combate à violência, a práticas culturais nocivas, tais como as uniões forçadas e prematuras, as normas sociais, institucionais que perpetuam o controlo do corpo das mulheres e eliminação da violência institucional perpetrada pelo Estado.
- Revisão e implementação da lei da família e a lei das Sucessões, de modo a prevenir conflitos e desestruturação de famílias, bem como acesso às mulheres a herança e propriedade.
- Que os partidos políticos sejam inclusivos e que trabalhem no sentido de atingir a paridade eleitoral, obedecendo ao sistema de lista zebra e a não discriminação das candidaturas nos vários espaços de poder, desde o distrital, municipal, provincial, parlamentar, e indiquem nos manifestos as propostas de postos de tomada de decisões a serem ocupados por mulheres.
- Desenvolvimento de programas de formação e capacitação das mulheres das assembleias municipais, provinciais e nacional em matérias de liderança, democracia, direitos humanos das mulheres, género e participação política.
- Aplicação do fundo partidário para formação política das mulheres (género) como forma de favorecer o seu ingresso e melhores condições de disputa para as candidaturas femininas dentro e fora dos partidos.
- Fortalecimento das unidades técnicas de géneros dos ministérios, de modo que tenham uma ação mais efetiva no cumprimento das políticas de igualdade de género e sua formação sobre Relações de Género.
- Estabelecimento de mecanismos de Inclusão das mulheres no processo de discussão sobre paz e segurança, conforme este estipulado na Resolução 1325 da Organização das Nações Unidas (ONU).
- Garantia de mecanismos institucionais de reabilitação e reinserção de mulheres na sociedade em zonas altamente afetadas pelo conflito armado e actos terroristas.
- Melhoria dos serviços de saúde e ampliação das unidades sanitárias, através do estabelecimento de infraestruturas físicas, tais como hospitais, maternidades, casas de mãe espera, de modo a reduzir a mortalidade materna, e de gestão, transparência e controlo no acesso aos medicamentos.
- Melhoria das políticas condicionantes ao exercício da saúde e direitos sexuais e reprodutivos, incluindo o direito ao aborto seguro, o direito de conhecer e decidir sobre o seu corpo.
- Promoção de campanhas para eliminação dos casamentos prematuros de modo a reduzir os índices de fístula obstétrica e mortalidade materna.
- Expansão dos serviços de planeamento familiar e políticas de controle de natalidade.
- Continuidade no combate ao HIV/SIDA com a melhoria no acesso ao Tratamento, prevenção da transmissão vertical para as mulheres e devem ser representadas nos processos de elaboração, implementação e monitoria das políticas.
- Assegurar que as escolas ou centros de formação são locais de educação e aprendizagem, são locais seguros, onde as raparigas possam circular livremente sem opressão e sem assédio.
- Expandir as infraestruturas físicas educacionais de modo a garantir a inclusão das mulheres e raparigas nos processos de escolarização, diurno e noturno, próxima das suas áreas de residência.
- Fortalecer e melhorar a prestação dos serviços de segurança e ordem pública, com a criação de mais postos policiais nos bairros, e intensificação de serviços policiais nocturnos para facilitar a livre circulação, em particular das mulheres e raparigas.
- Investir de forma coordenada – com outros sectores – na criação de uma rede de transportes eficiente e de qualidade para que o acesso seja inclusivo, incluindo a melhoria das vias de acesso, sobretudo no interior dos bairros em expansão.
- Criar e melhorar os mecanismos de mobilidade pública e de fiscalização nos transportes para que se garanta uma maior comodidade e dignidade dos utentes dos transportes públicos, em particular das mulheres que têm sido as maiores vítimas.
- Combater a pobreza feminina através da aplicação de políticas de inclusão das mulheres nas diversas atividades económicas e acabar com as disparidades de género nos salários e nas pensões.
- Promover políticas de proteção social das mulheres que estão no sector informal para que possam ter acesso à segurança social.
- Garantir que os investimentos rurais sejam realizados com o envolvimento das comunidades, incluindo as mulheres (postos de trabalho, projectos de desenvolvimento, estudos de impacto ambiental, consultas comunitárias, DUAT, compensações e reassentamentos justos).
- Assegurar uma agricultura sustentável com políticas que sejam sensíveis à inclusão dos assuntos de género e ao desenvolvimento da cadeia de valores, promovendo a construção de silos, conservação de sementes nativas e vias de acesso para garantir o escoamento dos produtos.
- Melhorar as políticas de planeamento físico e urbanização para prevenção da destruição de montanhas zonas verdes, terras aráveis e de pasto.
Maputo, agosto de 2018.