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Sofrimentos em quadros embranquecidos: Filmes históricos e representações da escravidão no Rio de Janeiro da Primeira República (1907-1916)
Suffering in Whitened Frames: Historical Films and Representations of Slavery in Rio de Janeiro during the First Republic (1907-1916)
Sofrimentos em quadros embranquecidos: Filmes históricos e representações da escravidão no Rio de Janeiro da Primeira República (1907-1916)
Varia Historia, vol. 39, núm. 80, e23214, 2023
Pós-Graduação em História, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais
Recepção: 04 Maio 2022
Revised document received: 18 Novembro 2022
Aprovação: 19 Janeiro 2023
Resumo: O tema deste artigo é o encontro entre alguns filmes históricos que representaram a escravidão na Antiguidade Clássica e a cena pública do Rio de Janeiro durante a Primeira República, mais precisamente no recorte entre 1907 e 1916. Nosso argumento principal é o de que o consumo desses filmes históricos atuou no embranquecimento das experiências da escravidão no senso comum dos espectadores cariocas do período. A circulação dessas produções cinematográficas teria contribuído, assim, para o apagamento das experiências traumáticas que a escravidão representou para as populações afro-brasileiras. Nossas fontes são os filmes Amor de escrava e A escrava branca, localizados em bases de dados online da Library of Congress e da Cinémathèque Française, além dos anúncios veiculados por diversos jornais por ocasião de suas exibições, coletados na Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional. Em nossa conclusão, enfatizamos como as narrativas dos filmes se apropriaram de procedimentos caros ao gênero massivo do melodrama e, em seu consumo, sobrepuseram-se a alguns referentes próximos à experiência dos espectadores cariocas em torno da escravidão no Brasil.
Palavras-chave: Cinema, Rio de Janeiro, Primeira República.
Abstract: The theme of this article is the encounter between some historical films that portrayed slavery in Classical Antiquity and Rio de Janeiro’s public scene during the First Republic, more precisely in the period between 1907 and 1916. Our main argument is that the consumption of such historical films contributed to the whitening of experiences of slavery in the common sense of carioca spectators of the time. The circulation of such productions thus fostered an erasure of the traumatic experiences that slavery represented for Afro-Brazilian populations. Our sources are the films A Slave’s Love and The Slave, available in online databases of the Library of Congress and Cinémathèque Française, as well as advertisements published by several newspapers concomitantly to their exhibitions and collected in the Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional. In our conclusion, we emphasize how the narratives of the films used procedures related to the massive genre of melodrama and, in their consumption, obscured some references that were closer to carioca spectators’ experiences of slavery in Brazil.
Keywords: Cinema, Rio de Janeiro, First Republic.
Introdução
O período de transição entre o Império e a República foi marcado por diversas batalhas em termos políticos, econômicos, sociais e culturais. As mudanças de uma sociedade escravista para outra de classes precisaram ser acompanhadas de uma forte revisão por parte dos ideólogos do Estado brasileiro a respeito da relação deste com seu povo, bem como dos valores e das práticas que sustentariam a legitimidade e a eficácia dessas transformações (CARVALHO, 1998; COSTA, 2010).
Uma das batalhas mais cruciais para a afirmação da nascente República ocorreu em torno das memórias a respeito das experiências do sistema escravista, extinto quase simultaneamente ao Império. O gesto extremo de Rui Barbosa em queimar uma massa documental referente aos ex-escravos - interpretado de diferentes formas pela historiografia1 - é um vestígio da centralidade que o passado recente tinha para a afirmação da Primeira República e da postura dos ideólogos do regime frente a ele.
Em paralelo, o ideal de branqueamento paulatinamente ganhava força nos debates acadêmicos e políticos, sendo encampado pelo nascente regime republicano (SCHWARCZ, 2005). Acionado a partir de um medo branco (AZEVEDO, 2004), esse ideal foi uma resposta complexa à questão da massa recém-liberta da escravidão. Ao longo de mais de meio século, pautou-se por diversas ambiguidades e transformações (SCHWARCZ, 2005, 23-66).
No âmbito da cultura massiva, diversos autores já se debruçaram sobre a circulação do ideal de branqueamento e de seus efeitos na caricatura, na imprensa e no cinema (SALIBA, 2002; LUSTOSA, 1993; LAPERA, 2012). Todas essas instâncias de expressão foram fontes de legitimidade na afirmação de dito ideal no domínio cultural e reforçaram hierarquias sociais de invisibilidade da população afro-brasileira.
Este artigo pretende debruçar-se em um ponto específico: no encontro entre alguns filmes históricos que encenaram episódios de escravidão na Antiguidade Clássica e a cena pública do Rio de Janeiro durante a Primeira República. Encontramos em nosso levantamento 18 filmes, produzidos por estúdios estrangeiros. Alguns deles alcançaram sucesso comercial nos cinemas cariocas,2 garantindo a presença do público e o lucro do então maior mercado cinematográfico do país (ARAÚJO, 1985).
A questão que guiará este artigo é a conexão entre alguns elementos na narrativa desses filmes históricos,3 a disposição deles na cena pública a partir da exibição cinematográfica - ou seja, o grau de difusão, estimado através do número de projeções - e a conformação de um senso comum nos espectadores de cinema a respeito do passado da escravidão recente no Brasil.
Nosso argumento principal é que o consumo (DOUGLAS; ISHERWOOD, 2004) desses filmes históricos atuou no embranquecimento das experiências da escravidão no senso comum dos espectadores cariocas do período. Em consonância com algumas teorias racialistas que pregavam o branqueamento da população brasileira e com um projeto republicano bastante hierarquizado em termos raciais, esses filmes ativaram leituras do passado próximo no sentido de apagar ou mitigar as experiências traumáticas que a escravidão representou para as populações afro-brasileiras. Isso é, são o vestígio de um investimento ativo em um esquecimento profundo por apagamento dos rastros (RICOEUR, 2007, 455-462) e atuaram na ressignificação da memória coletiva (HALBWACHS, 1990) para construir uma visão edulcorada sobre esse conjunto de experiências passadas.
De modo complementar, outro argumento que lançamos é que a presença desses filmes nos cinemas cariocas seria um indício de um jogo entre a memória impedida e a memória manipulada (RICOEUR, 2007, p. 452-459), na medida em que essas representações operariam como “fenômenos de substituição, sintomas, que mascaram o retorno do recalcado de diversos modos” (RICOEUR, 2007, p. 453), e estariam enquadradas por um silêncio ativo, fazendo com que as memórias em torno da escravidão recente não chegassem à cena pública.
Ao lançarmos esses argumentos, revisitamos a ideia defendida por Brito Broca (2005, p. 157-160) a respeito do uso do passado ligado à Antiguidade Clássica como um sintoma do sentimento de inferioridade racial partilhado por intelectuais e autoridades que ocupavam o debate durante a Primeira República, tais como Olavo Bilac, Euclides da Cunha, Coelho Neto e Hermes da Fonseca. Em suas palavras:
Essa mania da Grécia, como também da latinidade que de há muito prevalecia entre nós, era um meio, por vezes inconsciente, de muitos intelectuais brasileiros reagirem contra a increpação da mestiçagem, escamoteando as verdadeiras origens raciais, num país que estigmatizara a contribuição do sangue negro (BROCA, 2005, p. 157).
Reconhecemos que o autor identificou uma estrutura de sentimento (WILLIAMS, 2002) relevante para a relação entre obras e sua recepção na cena pública.
Em um horizonte paralelo, encontram-se as críticas de Lima Barreto ao helenismo, empregadas em contendas intelectuais, principalmente com Coelho Neto, e exploradas por Barbosa (2017, p. 238-244). Em outros momentos, o escritor também criticou o apagamento da herança africana na cultura brasileira do período, relacionando-o diretamente ao uso desse repertório clássico (BARBOSA, 2017, p. 169-180; SEVCENKO, 1983, p. 123-125).4 Lidas em conjunto, a tese de Broca (2005) e as censuras de Barreto permitem inferir que uma leitura racialmente orientada era dirigida aos produtos que mobilizavam elementos da Antiguidade.5
Mesmo admitindo que nosso esforço inicial para compreender a dinâmica entre esses filmes históricos e o público cinematográfico parte dessas contribuições, algumas diferenças precisam ser sublinhadas. Expandimos nossos argumentos para além dos círculos intelectuais e tentamos localizar tal dinâmica da cultura massiva como um dos movimentos possíveis na relação com o então recente passado escravocrata. O fato de 18 filmes terem sido localizados no circuito exibidor carioca é um relevante vestígio de que a “mania da Grécia” ultrapassou o debate entre intelectuais e alcançou setores com letramento menor, sobretudo as camadas médias, que foram inseridas no mesmo horizonte do “helenismo de oitiva” (BROCA, 2005, p. 153-154). Dito de outra forma, inculcou-se a necessidade de se situar minimamente no referencial da cultura clássica, a partir do potencial pedagógico da então nova mídia.
É preciso pontuar que a cultura massiva pode ser vista como um arranjo complexo de mediações (MARTÍN-BARBERO, 2003), que não engloba uma atuação homogênea nem unilinear de seus meios e atores na esfera pública. Ela precisa ser compreendida dentro de uma perspectiva que atenta “para as articulações entre práticas de comunicação e movimentos sociais, para as diferentes temporalidades e para a pluralidade de matrizes culturais” (MARTÍN-BARBERO, 2003, p. 270).
Nossos argumentos identificam, assim, apenas uma dessas mediações - o embranquecimento da experiência do passado da escravidão - no interior da cultura massiva. Essa certamente não é a única na relação com tal passado, embora possua uma relevância que merece a nossa reflexão. Desde já, ressaltamos que não se trata de impor uma leitura determinista à presença desses filmes na cena pública, mas de conectar o ato de ir ao cinema a processos estruturantes de maior alcance que se mesclam com a circulação de gostos e de repertórios.
Enfatizamos que o principal critério de seleção do corpus de filmes é o número de projeções ocorridas nos cinemas cariocas identificadas ao longo do levantamento, uma vez que se trata não apenas de um forte indício do sucesso comercial, como também do potencial de conformação de um senso comum dos espectadores quanto ao passado da escravidão. Nesse sentido, Amor de escrava (Amour d’esclave)6 e A escrava branca (The Slave)7 ganham destaque pelo seu grau de circularidade no circuito exibidor, pelos mecanismos de que se valeram em suas narrativas e pelos vestígios que deixaram nos periódicos usados como fontes ao longo de nossa pesquisa. Outros critérios foram adotados, embora não sejam tão centrais quanto o primeiro: existência de cópias dos filmes em bases de dados online, o que nos auxiliou em um momento de acesso interditado aos arquivos; presença de dados relevantes sobre as produções em sites de cinematecas; outros vestígios que remetessem às narrativas dos filmes veiculados pela imprensa da época, um indício da popularidade dessas histórias.
Amor de escrava é uma produção de 7 minutos e 43 segundos da companhia Pathé Frères (França), dirigida por Albert Capellani. O plot da narrativa, ambientada em um momento não localizável na Grécia Antiga, é o envolvimento amoroso entre Polymos - um cidadão ateniense livre - e uma escrava, cujo desenlace ocorre de modo trágico. Por sua vez, A Escrava Branca, produção de 11 minutos da companhia Biograph (Estados Unidos), dirigida por David Griffith, acompanha a trajetória de Nerada, cidadã grega livre na Roma Antiga, que recusa a oferta de casamento de um senhor romano rico para se casar por amor com um jovem pintor. Os obstáculos que enfrenta para viver essa relação constituem o cerne da trama.8
Os anúncios com a programação dos cinematógrafos eram veiculados no verso do jornal. Isso lhes conferia um lugar de destaque na economia visual desse meio, visto que não era preciso abrir o impresso para os ler. Ainda, variavam bastante quanto a formato e tamanho. Em sua maioria, continham o endereço do cinema, o preço do ingresso, o horário das sessões, os títulos e uma breve sinopse dos filmes. Essas fontes foram coletadas no acervo de periódicos e da Hemeroteca Digital da Biblioteca Nacional,9 considerando sobretudo jornais de grande circulação que veiculavam anúncios das casas de diversão do Rio de Janeiro, tais como Jornal do Brasil, Correio da Manhã e Gazeta de Notícias. Além dos anúncios, abordaremos também filmes que conseguimos localizar em plataformas de instituições como Library of Congress e Cinémathèque Française, que os disponibilizaram juntamente com informações relevantes sobre sua produção e sua exibição.
A decisão de tomar como foco o período entre 1907 e 1916 parte da consolidação da presença dos cinematógrafos na paisagem urbana carioca e do hábito de ir ao cinema como um importante lazer na vida de muitos moradores do Rio de Janeiro (BERNARDET, 1995). Também afirmamos que esse recorte privilegia um período menos instável da Primeira República, no qual o apagamento em torno do passado da escravidão e das práticas populares ficou mais delineado, sobretudo a partir dos desdobramentos da reforma urbana feita por Pereira Passos (SEVCENKO, 1983).
Como metodologia, adotamos desde o início do levantamento para a análise das fontes textuais o paradigma indiciário, de Carlo Ginzburg (2007), tal como já discutimos em outra oportunidade (LAPERA; SOUZA, 2010). A partir de sinais aparentemente negligenciáveis - os anúncios de cinematógrafos publicados nos jornais nas primeiras décadas do século XX -, acreditamos ser possível remontá-los à estrutura social. Como Ginzburg (2007, p. 177), partimos do pressuposto de que, “se a realidade é opaca, existem zonas privilegiadas - sinais, indícios - que permitem decifrá-la”.
Nesse ponto, é importante destacar que não encontramos fontes qualitativas - programas, folhetos de distribuidores, críticas de cinema, relatos memorialísticos, etc. - que se refiram especificamente à circulação desses filmes no Brasil. Não acreditamos que isso seja um impedimento na tentativa de conectar tais produções e seu consumo a processos estruturantes de maior alcance. Essas lacunas não devem ser preenchidas, mas incorporadas à produção do conhecimento histórico, tal como Ginzburg (2006) preconizou em outro momento.
No caso da análise dos filmes, guiaremos nossa incursão pelo melodrama a partir das considerações feitas por Baltar (2019), Brooks (1995) e Xavier (2003) sobre o gênero e suas relações com a cultura massiva. Partimos do pressuposto de que as representações fílmicas operam uma produção ativa de mundo que informa as práticas (CHARTIER, 1988), não sendo apenas a veiculação de um passado de modo diletante.
Nosso esforço interpretativo dialoga com a tensão exposta por Robert Darnton (1990, p. 55-56) ao se debruçar sobre Danton, de Andrzej Wajda, e o movimento duplo de sua representação da Revolução Francesa para o público polonês dos anos 1980: “é claro que ninguém tem como saber o que vêem os poloneses em Danton, a não ser que se entrevistasse um grande número deles a uma distância segura da polícia. Mas parece provável que muitos episódios do filme assumem um significado especial nas condições que se seguiram à proscrição do Solidariedade”. A distância temporal em relação a nosso objeto, a lacuna das fontes e a ausência dos espectadores nos impõem os mesmos limites.
Duplos embranquecidos no passado: Emoções e engajamentos nos dramas de escravidão no início do século XX
Lewinsky (2012, p. 225-227) situou a restauração de Amor de escrava (1907) dentro de um processo de recuperação de seu diretor, Albert Capellani, como um dos pioneiros do cinema silencioso, iniciado nos anos 1990 e ampliado na década seguinte. Ao analisar o catálogo físico disponível nos arquivos da produtora francesa Pathé Frères, a autora destacou a referência à literatura de figuras como Coupurus e Sienkewicz e a proximidade com o padrão narrativo do romance histórico do século XIX. Ressaltou, ademais, como o foco em um cidadão ateniense comum se ligava a uma intenção do realizador e foi frisado na venda do filme aos exibidores franceses e estrangeiros.
No Rio de Janeiro, o filme estreou em 18 de outubro de 1907 no Cinematographo Parisiense, a primeira sala dedicada exclusivamente à atividade cinematográfica, fundada em agosto do mesmo ano (ARAÚJO, 1985) e frequentada pelo público da Avenida Central, composto em sua maioria pelos setores médios e pela elite, assim como ocorria nas outras salas da região recém-reformada da capital. Foram encontrados registros de exibição de Amor de escrava entre 1907 e 1912, um período muito longo considerando os filmes do período silencioso. Foi, além disso, projetado em ao menos 17 salas de cinema localizadas em dez diferentes bairros do Rio de Janeiro e de Niterói, além de exibições itinerantes por outras cidades no interior do estado.10
Destacamos, ainda, que algumas salas o exibiram mais de uma vez,11 um indício relevante do grau de disseminação e do sucesso comercial alcançado pelo filme. Tal êxito pode ser relacionado à atuação da distribuidora Marc Ferrez & Cia. Segundo Moraes (2014, p. 283-284), a companhia passou em 1907 a deter a exclusividade dos filmes da Pathé Frères no Brasil e a adotar estratégias comerciais agressivas na ocupação das salas de cinema. Essa extensa rede configura um vestígio de que o filme em questão foi bem-sucedido em acionar categorias interpretativas em relação ao tecido social (GINZBURG, 2007), condensando visões de mundo dos espectadores cariocas.
Em Amor de escrava, Polymos é um senhor entediado que se apaixona por uma de suas escravas, e a narrativa acompanha o desenlace dessa relação. Seduzido por sua dança, passa a sonhar com a escrava, e ela corresponde a seu desejo. O interlúdio amoroso é bruscamente interrompido pela esposa do protagonista, que ordena aos guardas a condução da escrava à prisão e o seu posterior envenenamento. Polymos vai até a prisão, reencontra sua amada e, diante de sua morte, constata o envenenamento. Ao ver o cálice com a bebida envenenada, toma-a e agoniza, para desespero da esposa, que também vai à prisão.
O primeiro aspecto da representação veiculada pelo filme é o foco em um cidadão ateniense comum, e não em um personagem mitológico ou de alguma dinastia/realeza. Mesmo sendo um cidadão livre e rico, Polymos é mostrado com características humanas e não sobrenaturais, mitológicas e/ou divinas, em uma representação bastante próxima à do burguês ao longo do século XIX (GAY, 1995; 2002). Esse elemento constitui uma fonte de identificação com o público masculino e dos setores médios.
No filme de Capellani, o personagem do senhor reúne as características da inocência, da abnegação e da benevolência. A figura masculina é retratada como a síntese das qualidades que ajudam a tornar moralmente aceitável a relação de escravidão, enquadrada pelo melodrama em seu caráter de gênero destinado principalmente - embora não exclusivamente - à propagação da visão de mundo das classes superiores (XAVIER, 2003, p. 96-97). A inocência do senhor o coloca como objeto da sedução da escrava, retirando dele a responsabilidade pela traição conjugal. Sua abnegação é, ainda, traduzida no rompimento da hierarquia senhor-escrava e no instante de seu suicídio, ao renunciar à própria vida pelo amor à escrava. Finalmente, a benevolência o faz importar-se com o destino de sua escrava-amada, indo atrás dela no momento da prisão.
Essa representação do senhor em Amor de escrava contribui para uma leitura de mundo que retira dele o peso de sustentáculo do sistema escravista. Efetiva, assim, um esquecimento por apagamento de rastros (RICOEUR, 2007), no qual se impede que a memória do trauma em relação à figura do senhor de escravos possa emergir na cena pública. Como consequência direta, a experiência da escravidão mais recente sairia esvaziada de agentes a serem responsabilizados, no mesmo movimento de representação moderna que acentuou “a identidade de status que aproxima as figuras do palco [aqui, da tela] e da plateia” (XAVIER, 2003, p. 92).
No primeiro plano do filme, Polymos aparece em uma poltrona, bastante entediado. Ordenada por sua esposa, uma escrava entra na sala e começa a dançar para ele. Muito animado com a dança, Polymos levanta e tenta ir em direção à escrava, no que é impedido pela mulher, que manda aquela sair. O plot amoroso tem sua apresentação finalizada na sequência seguinte, na qual a escrava aparece oferecendo flores e, em seguida, beija a boca da estátua de seu senhor. O gesto é testemunhado por Polymos, que corre em direção a ela e pede que ela dance. A sequência é finalizada com um beijo entre os dois.

A dança aparece ainda em outro momento. Após ser conduzido ao leito por um escravo, Polymos dorme. Enquanto isso, a escrava entra em seu quarto e começa a bailar, havendo em seguida uma fusão que indica o sonho do senhor. Nele, a escrava dança junto a um corpo de balé. Nos movimentos desse corpo coletivo, a escrava se destaca, à medida que as outras bailarinas dançam a seu redor e, no momento seguinte, posicionam-se atrás dela, que ganha o primeiro plano da imagem.
Além de ser um símbolo do desejo sexual do senhor em relação à escrava, é possível fazer um paralelismo entre essa representação e a da escrava negra no Brasil, na medida em que o mesmo elemento da dança foi muitas vezes utilizado por crônicas e por outras artes na apresentação daquela como lasciva e maliciosa. Especulamos que, em sua recepção, o filme mobilizou um mecanismo de compensação, no qual o “perigo negro” (SÜSSEKIND, 1982, p. 54) apresentado pela possibilidade de o senhor ser desvirtuado pela sedução da escrava negra e pelas consequências desse ato é amortecido pelo fato de sua narrativa apresentar uma escrava branca.
Essa exposição de um corpo feminino branco em substituição a um corpo negro no filme vai ao encontro da análise de Macário (2005, p. 45-51) sobre os cronistas de outro hábito caro aos cariocas de elite e dos setores médios nas primeiras décadas do século XX: os banhos de praia. Permeadas de referências à cultura clássica greco-romana, as crônicas analisadas pela autora trazem uma exposição da sexualidade de modo mais livre, associada à Grécia Antiga. Entretanto, a autora registra a ambiguidade dessa experiência de transformação na relação com o corpo e as vestimentas:
Para o imaginário que frutificava no seio da burguesia está completamente diferenciada a deleitosa exposição do belo e saudável corpo desportista e o comportamento libertário baseado em um modismo moderno de qualquer ideia de promiscuidade e sensualidade advinda do comportamento das classes economicamente inferiores, simplesmente banidas do plano oficial e elitista de modernização e “regeneração” da sociedade (MACÁRIO, 2005, p. 49).
Podemos inferir, desse modo, que a recuperação da cultura clássica é novamente associada à difusão de hábitos massivos, estando inserida no mesmo jogo de mascaramento de diferenças sociais que é acionado no consumo da narrativa do filme. O corpo a ser exposto nas praias cariocas mais uma vez é lido de acordo com a ideologia do branqueamento e a remoção física dos sujeitos das classes populares dos espaços de sociabilidade caras à burguesia. Isso é, funcionam como um continuum em relação à projeção de imagens nos cinemas cariocas da época.
No idílio amoroso do filme, as partes são igualadas, e há consenso na aproximação entre elas. A representação do encontro entre senhor e escrava como algo pacífico não somente serve como uma justificativa moral para a escravidão em si, mas atua principalmente como um engajamento nessa autoimagem indulgente do homem branco na cena pública (GAY, 2002, p. 72). Nesse ponto, o engajamento proposto pelo melodrama captura a reação sensorial da plateia (BALTAR, 2019, p. 97) para operar como uma chave de leitura que serve como base para a disseminação de um senso comum no qual a escravidão é percebida sob um ponto de vista bastante atenuado. A partir da “mobiliza[ção de] reações sensoriais e sentimentais da plateia” (BALTAR, 2019, p. 100), Amor de escrava desloca a tensão para a relação afetiva senhor-escrava e atua na manipulação da memória, retirando a violência do âmbito público/sistêmico e a condensando em uma relação privada.
Esse passado clássico passa a ser lido de modo bem semelhante ao detectado por Süssekind (1982, p. 25-28) ao analisar o romance Senhora, de José de Alencar. A autora destacou que, embora não abordasse diretamente o sistema escravista, o romance interpelou esse debate através da relação afetiva entre a protagonista e seu marido: “transferindo-se a escravidão para um contexto afetivo, a própria relação de domínio se justifica, é fruto do amor” (SÜSSEKIND, 1982, p. 28).
No caso da produção cinematográfica, a transferência ocorre em relação ao passado: a escravidão aparece, porém em sua roupagem antiga. Apesar de se tratar de um filme de origem estrangeira, não é possível dissociar seu sucesso comercial dos elementos narrativos, tais como a representação do protagonista-senhor e o idílio amoroso senhor-escrava. Podemos inferir, dessa forma, que a popularidade do filme coincide com a construção de uma imagem mais “branda” de senhor nas relações escravistas, que seria mobilizada mesmo em décadas posteriores por ideólogos como Gilberto Freyre e Sérgio Buarque de Holanda em representações históricas de uma escravidão menos violenta (SÜSSEKIND, 1982, p. 34-36).
No filme, o elemento da violência com o qual a escravidão é representada em muitas obras é deslocado da relação entre o senhor e a escrava. A violência é mostrada a partir da conduta da esposa do senhor, cabendo a ela o papel de vilã na narrativa: reprime a relação afetiva, manda prender a escrava e ordena que os guardas sirvam veneno a ela na cela. A redenção do idílio é atribuída ao senhor, que visita a escrava na cadeia, toma o líquido no copo envenenado e morre abraçado a ela, sendo sua morte testemunhada pela esposa.
O modo como a Antiguidade Clássica aparece no filme se assemelha ao detectado por Broca (2005, p. 154) na produção literária brasileira, isso é, “uma Grécia de cartolina, puramente decorativa, nada tendo em comum com o verdadeiro espírito helênico”. Aproximando a obra cinematográfica também a um imaginário colonial sobre a escravidão moderna, é possível inferir que a representação da mulher se encontra muito próxima à de sinhás do sistema escravista no Brasil. Ao abordar o conto O caso da vara, de Machado de Assis, Gomes (2017) sublinha que cabe à sinhá o papel de vilã, ao infligir arbitrariamente um castigo cruel à sua escrava. Apontando no conto uma síntese das contradições da passagem da Monarquia à República, o autor ressalta que “a sala de sinhá Rita tem muito de Brasil, em termos alegóricos, mas também é o registro específico de sua historicidade, em sentido realista” (GOMES, 2017, p. 123). Esse movimento simultaneamente alegórico e realista descrito por Gomes também está presente na relação entre a narrativa do filme e o público carioca do período, podendo a figura da esposa do senhor na Grécia Antiga ser lida em paralelismo àquela da sinhá.
No tópico da repressão, é interessante focar em dois aspectos da representação fílmica. O primeiro deles é a presença cênica dos guardas, que cumprem as ordens da esposa de Polymos, conduzem a escrava para a cadeia e a forçam a tomar a bebida envenenada. Sendo uma das características do melodrama o reposicionamento da lei após o desencadeamento de um conflito (XAVIER, 2003, p. 93), a função dramática desses guardas se comunica com o olhar dos espectadores, na medida em que ela se encontra no mesmo horizonte de expectativas de afirmação da ordem que permeia a cultura burguesa.
Novamente, a representação do filme dialoga com práticas relacionadas à escravidão moderna, dentro do horizonte que Späth e Tröhler (2013) situam sobre o corpo dos atores de cinema que encenaram a escravidão antiga. Os autores apontam que as imagens de Spartacus, Cleópatra, Júlio César e Nero conseguiram sobreviver através da escultura e da pintura. No caso do cinema, estas operam a partir do seguinte dilema:
Para a maioria das personagens antigas, no entanto, surge uma nova tensão, pois nenhuma ficção corporal antiga pode ser vislumbrada. Dessa forma, os atores do século XX são emoldurados com um corpo simbólico que é uma construção moderna desde o início - embora reivindique uma referencialidade antiga12 (SPÄTH; TRÖHLER, 2013, p. 44).
Nesse sentido, consideramos que, ao serem um prolongamento do olhar e da vigilância punitiva da senhora, há uma similaridade entre essa representação e a dos capitães-do-mato na escravidão brasileira, uma vez que estes eram incumbidos de funções bem parecidas, isto é, a punição a transgressões (fugas, rebeliões, etc.) e também exerciam um policiamento dos costumes de modo difuso. Estão, além disso, situados temporalmente próximos à experiência dos espectadores.
O segundo aspecto é a presença de um ator negro no batalhão dos guardas gregos. Mesmo se tratando de um filme estrangeiro, é importante situar que esse homem desempenha um papel bem próximo ao dos personagens negros no cinema brasileiro do período silencioso. Em sua análise sobre a produção desse momento, Carvalho (2003, p. 162) pontua que eram poucos os personagens negros no cinema silencioso realizado no Brasil e avalia que o “negro aparece [nesses filmes] de forma lateral, isto é, quase sempre nas bordas e no fundo dos enquadramentos e sem nenhuma função dramática”. No caso específico dos filmes de ficção, Carvalho (2003, p. 163) é ainda mais contundente em seu diagnóstico: “o desencontro da representação central com o que vemos nas bordas e no fundo do enquadramento é evidente nas cenas de rua como, por exemplo, nos filmes A filha do advogado e O Segredo do Corcunda”. Trata-se de uma estratégia narrativa bastante similar ao consumo desse passado clássico por parte do público carioca, com o destaque de personagens brancas para obliterar a experiência da escravidão brasileira, relegando-a às margens.

A escrava, por sua vez, é apontada como a principal responsável pela sua própria aniquilação. Cabe a ela ser o polo ativo da relação afetiva: seduz o senhor com sua dança, ativa o desejo até em seu sonho, acorda-o do sonho com um beijo. Tendo seduzido seu senhor, torna-se alvo da ira de sua esposa, e o filme apresenta a reação desta como uma consequência dessas ações. A prisão e o envenenamento da cativa são apresentados como a punição moral da violação da ordem e da hierarquia senhor-escrava. Em Amor de Escrava, o estigma da escravidão recai sobre a conduta da escrava, e não sobre a propriedade nem as ações dos senhores, na mesma linha da ideologia do branqueamento, que fazia recair sobre as vítimas, e não sobre os algozes, a culpa pelos males da herança do sistema escravista, resultando em uma responsabilização dessas vítimas nos planos individual e coletivo (ALBERTO, 2011, p. 4-9).
Mais uma vez, é possível, a partir dos elementos melodramáticos do filme, fazer uma leitura que o aproxime da escravidão recente no Brasil. A escrava do filme está muito próxima à representação da mulher negra como lasciva e sedutora, “com atitudes e preocupações próprias às sinhazinhas da casa-grande[, que] funciona principalmente como um ocultamento, via ficção, das condições concretas de vida da mulher negra, objeto de prazer e força de trabalho a serviço de uma sociedade escravocrata” (SÜSSEKIND, 1982, p. 30). Na fruição dessa narrativa pelo público, o apagamento é operado em torno do deslocamento do sofrimento advindo com a escravidão, enfatizando o engajamento melodramático no trágico fim de uma protagonista branca.
Em suma, a dimensão ativa do esquecimento profundo (RICOEUR, 2007) a partir do consumo do filme ocorre em três níveis. No primeiro nível, o senhor da Grécia Antiga atua como um duplo do escravocrata brasileiro para produzir uma visão autoindulgente sobre o papel do homem branco das classes superiores; no segundo, a esposa do senhor, como um duplo da sinhá, catalisa o polo melodramático do mal e se torna a responsável pela crueldade sistêmica da escravidão; no terceiro, a escrava branca condensa o sofrimento provocado pela escravidão, apagando seu referente brasileiro, isso é, a mulher negra escravizada.13
Entre identificações e apagamentos: Representações de senhores e sujeitos escravizados na cena pública da Belle Époque carioca
A reflexão sobre o público de cinema no Rio de Janeiro da Primeira República é necessária à análise do consumo das representações da escravidão. Tendo-se afirmado no mercado de entretenimento carioca a partir do teatro, que era uma de suas diversões principais (MORAES, 2014, p. 212-217), a expansão do cinema inseriu-se no momento da reforma urbana empreendida pelo prefeito Pereira Passos, pautada por um controle da circulação dos sujeitos das classes populares e de elementos culturalmente ligados a ela nas áreas nobres da então Capital Federal (SEVCENKO, 1983).
Em outros momentos, argumentamos que o preço dos ingressos também operava como elemento de segmentação de seu público (LAPERA, 2020), na medida em que os sujeitos das classes mais baixas geralmente não poderiam fazer do cinema um hábito de consumo, embora também fossem aos cinematógrafos, em menor frequência. Também enfatizamos a construção via imprensa de uma autoimagem de um público visto como pertencente aos setores médios e a vontade por parte dos exibidores em selecionar o público dentro dos estratos médios e superiores. Tendo sido escolhidos para a programação dos cinemas em razão de seu potencial comercial, os filmes que retratavam a escravidão clássica encenavam mecanismos ativados pelo melodrama e se dirigiam preferencialmente - embora não exclusivamente - a esse público. Precisamos, ainda, destacar que tal público vinha sendo constituído lentamente no Brasil desde meados do século XIX, a partir do consumo de folhetins que circulavam pelos periódicos (MEYER, 1996, p. 292).
Em paralelo, a maioria da população afro-brasileira enfrentava condições precárias de moradia, trabalho, mobilidade urbana, acesso à educação. Era, por isso, impelida para fora das áreas nobres da capital então recém-reformada e perseguida em suas práticas religiosas e populares (SEVCENKO, 1983, p. 25-36). Tinha, além disso, de lidar com a concorrência da massa de estrangeiros que haviam chegado recentemente à cidade em um cenário de desemprego estrutural. Contava, assim, com pouca renda para o lazer, uma vez que ela deveria ser gasta em sua maior parte com itens de subsistência (CHALHOUB, 2012). A partir de todas as questões estruturais enumeradas, podemos inferir que, no cenário pós-reforma Pereira Passos, um lazer em ritmo de aburguesamento como as salas de cinema não era direcionado de modo prioritário a essa população.
A escrava branca é uma produção da Biograph (EUA) dirigida por David W. Griffith em 1909. Bem menos conhecida que Intolerância (1916) e O nascimento de uma nação (1915), essa obra não foi objeto de análises substantivas pela historiografia do cinema norte-americano, o que demonstra uma certa invisibilidade do filme no panorama das realizações de Griffith.14A escrava branca foi, no entanto, exibido em um intervalo de quase um mês entre as últimas semanas de setembro e a primeira quinzena de outubro de 1909 em quatro cinematógrafos do Rio de Janeiro.15 Vinha sendo anunciado pelo menos uma semana antes de sua estreia,16 um indício do retorno esperado pelos distribuidores e exibidores com sua projeção.
No dia da estreia, o anúncio do Cinema Ouvidor publicado no verso do jornal O Paiz traz informações detalhadas sobre a narrativa do filme, algo bastante incomum para a época17 e mais um vestígio do interesse comercial despertado por ele, a partir da percepção dos exibidores a respeito de um suposto interesse do público.18 Esse padrão foi mantido nos anúncios dos outros cinemas que o projetaram, embora com descrições um pouco mais sucintas.
Um ponto digno de nota a respeito da comercialização do filme é a opção em torno da tradução do título para o português. A tradução literal de The Slave seria A escrava, e a inclusão do adjetivo “branca” no título em português suscita reflexões. Essa escolha pode ser lida como um demarcador racial da escrava, na medida em que serviria para assinalar a diferença entre a protagonista e mulheres negras recém-libertas oficialmente da escravidão. Aqui, enfatizamos que foi uma escolha dirigida especificamente ao público brasileiro. Além disso, o termo “escrava branca” era usado para se referir a mulheres - geralmente oriundas de minorias étnicas e nacionais (sobretudo judias, mas também polonesas, ucranianas, etc.) - forçadas a se prostituírem, sendo alvo de campanhas da imprensa à época e da preocupação de administradores, funcionários públicos e políticos (KUSHNIR, 1996).
A título de comparação, é importante recordar que poucos filmes brasileiros produzidos no período retrataram a experiência da escravidão e, quando o fizeram, focaram prioritariamente em personagens femininas embranquecidas. De acordo com o levantamento realizado por Morettin (1997), o romance mais adaptado no período silencioso a respeito do tema foi A Escrava Isaura, de Bernardo Guimarães. Essa obra literária apresentava o drama na sociedade escravista do século XIX com uma protagonista branca, tendo sido adaptada quatro vezes para o cinema - em 1917, 1922 e duas vezes em 1929 (MORETTIN, 1997, p. 263-288).19
Ambas as linhas convergem para o enredo do filme, uma vez que a escravidão em A Escrava Branca alude a uma relação de cunho afetivo-sexual mediada pela propriedade. Em outra oportunidade (LAPERA, 2015), avaliamos a obra a partir de sua matriz melodramática, sublinhando a ausência de ambiguidade no comportamento das personagens, a centralidade da família e a reafirmação da ordem patriarcal em sua narrativa.
Assim como Amor de Escrava, A escrava branca encena a história a partir de personagens comuns, e não mitológicos, e é ambientado em um momento não identificado na Antiguidade, desta vez em Roma. O triângulo amoroso do filme é formado pela protagonista Nerada, pelo senhor Delécio e pelo jovem pintor Alasko, que se casa com Nerada e com ela tem um filho. A narrativa de A Escrava branca é pautada pela renúncia de Nerada à riqueza de Delécio para se casar com seu amor Alasko e, por consequência, ter uma vida pobre.
Essa abnegação de Nerada, vista como virtude, também foi explorada pela publicidade que tentava atrair o público carioca. O anúncio do Cinema Ouvidor do dia da estreia assim descreveu a conduta da protagonista: “rejeitava os presentes e recusava as propostas do nobre, aceitando a corte de um honesto e pobre [homem], com quem ela casou-se”.20 Tal padrão seria repetido em outros anúncios, como o do Cinema Sul America, veiculado pelo Correio da Manhã: “descreve o sentimento nobre e puro de uma mulher [que recusa] os milhões que um homem lhe oferece, para seguir o nobre impulso que o amor lhe indica”.21

É necessário frisar que a escravidão é representada na obra como voluntária, mesmo que dentro de uma situação-limite. A protagonista Nerada não foi escravizada em razão de algum fator externo (guerra, dominação por outro povo, etc.), mas por decorrência de sua própria vontade, para que sua família não passasse fome e seu filho fosse salvo da situação miserável, fato bastante enfatizado pelos anúncios já mencionados. Assim, os espectadores são estimulados a se engajarem no drama da protagonista, na linha argumentativa de Baltar (2019, p. 103): “o diferencial do melodramático está na articulação dessa pedagogia moralizante, que se faz eficaz pelo caráter de engajamento sentimental - pela dinâmica de mobilização entre público e narrativa”.
Também é possível situar essa representação da mulher como próxima ao papel de gênero destinado a ela no projeto de família republicano, na qual seria a responsável pela sua preservação moral (CAULFIELD, 2000). Tudo isso sob um ponto de vista individual e meritocrático em torno de sua escravização,22 o que insere ainda mais a personagem no espectro burguês do papel social feminino (GAY, 2002, p. 125-132).
A representação da pobreza no filme dialoga com a produção cinematográfica brasileira do período. A análise de Costa (2013) destaca a exclusão da população pobre e majoritariamente negra da produção documental do cinema silencioso no Brasil, sendo esta apresentada de modo secundário e à margem das imagens veiculadas. Em A Escrava branca, é possível afirmar que a encenação da pobreza por um casal protagonista branco atua de modo semelhante.
Outro ponto a ser destacado é a representação do senhor. Sua atuação mostra gestos eloquentes no instante da recusa de Nerada em se casar com ele, o que o mostra como orgulhoso em um primeiro momento. Quando reaparece na ação, é mostrado como o proprietário da (então) escrava e, em um comportamento abnegado ao descobrir sua situação, liberta-a para que volte à sua família.

Esse elemento conecta-se ao final do casal protagonista, visto que seu reencontro é efetivado pelas bênçãos do senhor e é projetado num futuro de união e, principalmente, de perdão. A união e o perdão como valores remetem-se diretamente à representação da escravidão no filme e também são explorados pela propaganda da obra nos periódicos: “[o senhor] reconhece o ideal puro e gigantesco dessa mulher, que o leva ser generoso por sua vez dando-lhe liberdade reconduzindo ao lar doméstico onde a sua volta produz inefável prazer, produzindo amor e arte, mental, moral e física”.23
Nesse ponto, expõe-se a identificação entre o senhor e o espectador de classe média, na medida em que o horizonte de expectativas de suas ações se situa no mesmo espectro de valores burgueses, que condenam a vingança explícita e marcada no corpo (GAY, 1995, p. 167-188). Além disso, a união e o perdão exaltados ao final do filme também podem ser interpretados como a tendência ao apagamento das diferenças no interior de uma cultura burguesa (GAY, 2002, p. 212-216) - o que, no caso brasileiro, era usado para escamotear o sentimento de injustiça em torno das memórias da escravidão.
A representação do senhor nesse filme situa-se de modo complementar à de Amor de escrava. Enquanto, no filme anteriormente analisado, o senhor é o objeto da disputa entre senhora e escrava e alheio à crueldade e à irracionalidade da escravidão, aqui ele aparece como propagador de valores como benevolência e abnegação, mais um traço da repressão aos impulsos agressivos na cultura burguesa a partir do século XIX (GAY, 1995, p. 171-174). Reforça-se, ainda, a mesma autoindulgência do homem branco das classes superiores do filme anterior, colocando-o a par das consequências estruturais do sistema escravista. Essa representação do senhor também foi identificada por Chalhoub (2009) na memória coletiva em torno da escravidão no Brasil, tendo sido mobilizada pelo movimento abolicionista e atualizada após o término legal do sistema escravista, o que mais uma vez situaria os filmes no fluxo de impedimento de que a memória traumática em torno dessa figura emergisse à cena pública.
É possível, igualmente, extrair do comportamento do senhor no filme mais um elemento que o situa paralelamente à experiência da escravidão então recente no Brasil. A libertação da escrava Nerada se dá num horizonte de conquista pelo afeto e pelo apadrinhamento nas relações interpessoais. Esse processo é bastante semelhante ao descrito por Süssekind (1982, p. 12-14) quanto às relações dentro do sistema escravista no Brasil, vistas como uma rede construída a partir dos afetos dos senhores e dos escravos, na qual estima e favor caminhavam lado a lado para atenuar o caráter violento da escravidão. Nesse sentido, o apadrinhamento de Nerada por Delécio pode ser lido a partir da experiência dos espectadores cariocas, familiarizados com sua lógica não apenas em termos de memória coletiva da escravidão, mas também das práticas sociais caras à política e à administração pública durante a Primeira República.24
Tal percepção sobre a relação entre senhores brancos e protagonistas escravas embranquecidas também foi sublinhada por Stam (2008, p. 121-123). Ao se debruçar sobre uma adaptação cinematográfica do romance A Escrava Isaura por parte do diretor Marques Filho,25 o autor destacou que houve a valorização da linhagem paterna (branca) no filme e da protagonista branca interpretando o papel homônimo, em consonância com o romance de Bernardo Guimarães. O autor recuperou, ainda, a crítica publicada no jornal O Estado de São Paulo, que se referiu ao filme como um “poema de amor e sofrimento na era da escravidão negra” (citada por STAM, 2008, p. 123), o que possibilita inseri-lo no mesmo horizonte de apagamento provocado por A Escrava Branca. Desse modo, o esquecimento por apagamento de rastros (RICOEUR, 2007) novamente ocorre pela substituição da mulher negra por uma protagonista branca, e a identificação do sofrimento provocado pela escravidão recai sobre a última - a mesma operação narrativa presente nos filmes aqui abordados.
O último elemento de A Escrava Branca a ser analisado é a representação da família. A saga da protagonista em proteger seu lar e tentar salvar seu filho da fome se situa em uma convenção cara ao melodrama (BROOKS, 1995, p. 35). Esse gênero relaciona a família à fonte de experiência cotidiana para explorar uma polarização moral pautada pela ausência de ambiguidade nas personagens e nas ações (BROOKS, 1995, p. 36-37). Trata-se de um horizonte semelhante não somente àquele preconizado para a Primeira República por seus dirigentes (CAULFIELD, 2000), como também às experiências das famílias brasileiras de sujeitos escravizados no século XIX. Ao avaliar os significados da liberdade para esses sujeitos, Chalhoub (2009) narrou diversas disputas judiciais entre eles e seus senhores. Em muitos casos, houve discussões sobre se as alforrias seriam estendidas aos filhos e se pais e filhos deveriam permanecer juntos após os processos.
O sofrimento materno também encontrou expressão na literatura. Sendo um forte referente em sua época, Mãe, de José de Alencar, destaca “principalmente a maternidade e [atenua] a escravidão” (SÜSSEKIND, 1982, p. 49). Sobre essa obra, Süssekind (1982, p. 49-52) ponderou que Alencar obliterou a condição de escrava da protagonista Joana e colocou o foco no sacrifício materno pelo filho, em uma atitude melodramática, enquanto a escravidão aparece meramente como um pano de fundo. O consumo de A Escrava branca pode ser localizado na mesma linha do esforço de Alencar, embranquecendo a protagonista do sofrimento materno.26
Quanto ao tema da família, merece atenção o destaque dado à criança ao longo da narrativa. Logo na primeira sequência, crianças aparecem jogando flores na direção de Nerada, como se a estivessem saudando, uma espécie de apresentação da “mocinha” do filme e uma marcação evidente do polo do bem e da virtude (XAVIER, 2003, p. 95-99). A próxima aparição de uma criança no filme é justamente a do filho de Nerada e Alasko. Ele está deitado no leito doente, ao que os pais se mostram extremamente preocupados, sendo isso expresso pelo gestual exacerbado das personagens, em mais uma sinalização de sua virtude. Após a ida de Nerada ao mercado para se escravizar, a criança é novamente focada pela câmera. Dessa vez, Alasko a beija e, desesperado, acaricia seu rosto e constata o óbito. Em seguida, o pai a pega nos braços, embalando seu corpo morto, em uma convenção cara ao melodrama de representar a infância como objeto de proteção pelos protagonistas (MEYER, 1996, p. 245-249). Finalmente, após a libertação de Nerada, esta é acolhida por Alasko, que relata a ela a morte da criança.
O foco no sofrimento de uma criança pode ser relacionado à escravidão brasileira então recente, na medida em que, ao longo do século XIX, foi ocorrendo uma série de mudanças a respeito da percepção sobre esse fenômeno. Antes visto sob o prisma exclusivo do domínio privado, ele foi ganhando paulatinamente a esfera pública pelas questões da alforria, da preservação da unidade da família escrava e de seus filhos (CHALHOUB, 2009, p. 122-151). Assim, o fato de A Escrava branca encenar a morte de um bebê branco foi consumido dentro de um circuito que acentuou mais um apagamento do sofrimento coletivo da população afro-brasileira, desta vez em relação à infância.
Podemos afirmar que A Escrava Branca embranquece o sofrimento fortemente presente na memória coletiva dos sujeitos que haviam sido escravizados até décadas anteriores, em um processo de apaziguamento e de autocomiseração por parte das classes superiores em relação à escravidão. A família de Nerada poderia ser lida como o “duplo” embranquecido dessas famílias de sujeitos escravizados, e a comoção em torno da morte da criança foi aumentado pelo fato de ela ser branca. Aqui, o ideal de branqueamento assume sua roupagem melodramática para situar nos holofotes os sujeitos que deveriam ser alvos da compaixão coletiva por parte da audiência.
Em um panorama maior, essa operação de apagamento dos filmes analisados insere-se nas fórmulas do silêncio detectadas por Trouillot (2016, p. 161): além de mitigar a experiência da escravidão em si - haja vista a presença considerável desse conjunto de filmes que retratavam a Antiguidade Clássica no circuito exibidor e os poucos filmes brasileiros do período silencioso que a abordaram e a exclusão da população afro-brasileira dessa produção imagética (CARVALHO, 2003; MORETTIN, 1997) -, houve o esvaziamento da experiência coletiva da escravidão por parte do consumo dessas narrativas fílmicas abordadas. No limite, "o efeito conjunto desses dois tipos de fórmulas é um poderoso silenciamento: o que quer que não tenha sido cancelado pelas generalidades fenece na irrelevância cumulativa de um amontoado de detalhes" (TROUILLOT, 2016, p. 162).
Considerações finais
Não é fácil tentar compreender os motivos do sucesso desses filmes junto ao público carioca, na medida em que há poucas informações disponíveis nas fontes a respeito do consumo em torno deles. Tentamos percorrer esse caminho tendo no horizonte algumas análises sobre esse momento histórico e também sobre a produção cultural anterior ou contemporânea a ele. Em se tratando de produtos midiáticos, o debate normalmente gira em torno das falsificações/manipulações da história, mas pouco se diz sobre os esquecimentos ativamente estimulados por eles na cena pública. Ao longo do artigo, tivemos a intenção de trabalhar essa dimensão, que pode ser bastante reveladora dos apagamentos em torno dos sujeitos historicamente enquadrados. Em seu consumo, tanto Amor de escrava quanto A escrava branca atuaram nessa produção, a partir de “estratégias do esquecimento [que se] enxertam diretamente n[o] trabalho de configuração [narrativa]: pode-se sempre narrar de outro modo, suprimindo, deslocando as ênfases, refigurando diferentemente os protagonistas da ação assim como os contornos dela” (RICOEUR, 2007, p. 455).
Atentos às considerações de Chalhoub (2009, p. 79) sobre uma parte da historiografia que atua na “eliminação do negro da condição de sujeito de sua própria experiência histórica”, nosso intuito foi reconhecer as assimetrias nas quais o então novo meio de comunicação estava imerso. Não é possível desconsiderar o acesso desigual às salas de cinema no período, a vontade dos exibidores em se voltarem para um público eminentemente branco e de classe média, nem o volume expressivo de filmes cujo tema estava diretamente relacionado à Antiguidade Clássica no mercado exibidor carioca, o que inseria esses espectadores no circuito de difusão da “mania da Grécia” (BROCA, 2005, p. 157).27
Os usos do passado clássico não são generalizáveis e, por isso, foi preciso verificar as condicionantes sócio-históricas da exibição cinematográfica no Rio de Janeiro da Primeira República. Desse modo, o emprego de tal repertório para silenciar os efeitos da escravidão dos afro-brasileiros e construir um duplo embranquecido dessas experiências é localizável nesse momento específico e em relação ao público carioca das primeiras décadas do século XX.
Na sociedade republicana, o melodrama histórico funcionou como a reacomodação de tensões sociais e como base para a construção de uma memória coletiva que silenciava quanto aos traumas da escravidão. O branqueamento deixa de ser apenas um “ideal” e passa a informar práticas de consumo e a se cristalizar no senso comum dos espectadores, para além de outros efeitos que já estava produzido tanto nos debates acadêmicos, quanto em diferentes práticas do Estado brasileiro referentes à imigração, ao policiamento e ao controle de pessoas e grupos vistos como potencialmente perigosos (SCHWARCZ, 2005).
Apesar de o consumo desses filmes históricos focados no passado clássico ter sido usado na ativação de um esquecimento profundo (RICOEUR, 2007, p. 437-462) a respeito da experiência da escravidão afro-brasileira, eles não operavam isoladamente na cena pública. Sendo assim, estavam propensos a uma reversão, na lógica do esquecimento de reserva (RICOEUR, 2007 p. 427-462). Esses apagamentos são, inclusive, passíveis de reversão, o que ocorreu de forma mais sistemática tanto no campo da historiografia, a partir dos anos 1980 - com a recuperação de documentações que jogavam luz sobre o papel dos sujeitos escravizados na contestação e na queda do sistema de exploração escravista -, quanto na cultura massiva, a partir dos anos 1990.28
Finalmente, também é possível conjecturar se os filmes analisados não seriam sintomas de ansiedades projetadas na colonização (no caso de Amor de escrava) e no pós-abolição norte-americano (no caso de A escrava branca). Mas esse já seria outro percurso, outro desvio.
Agradecimentos
Agradeço aos pareceristas anônimos da revista Varia Historia, que fizeram leituras atentas e ótimas sugestões para o aprimoramento deste artigo. Também agradeço a leitura do artigo, as sugestões para a pesquisa e o acolhimento da pesquisadora e amiga Marina Caminha, lembrando que todas as escolhas assumidas são de minha responsabilidade.
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