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A ilha desaparecida Vulcanismo nas páginas dos jornais fluminenses
The Missing Island Volcanism in the Pages of Rio de Janeiro’s Newspapers
Varia Historia, vol. 40, e24030, 2024
Pós-Graduação em História, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Minas Gerais

ARTIGO


Received: 21 March 2024

Revised: 8 November 2024

Accepted: 4 October 2024

DOI: https://doi.org/10.1590/0104-87752024v40e24030

RESUMO: Em meados de 1831, Ferdinandea, como foi batizada pelos sicilianos, surgiu no Mar Mediterrâneo, entre a Sicília e a Tunísia. Em junho, terremotos foram sentidos na região e, no começo de julho, pescadores observaram estranha mortandade de peixes no mar e outros sinais incomuns. Em algum momento adiante, a ilha vulcânica emergiu das águas. Pelos cinco meses seguintes, o fenômeno atrairá a atenção do mundo. O novo espaço de terra, situado num ponto estratégico para a navegação, será rapidamente reivindicado tanto pelos britânicos como pelo reino das Duas Sicílias, e ainda despertará o interesse dos franceses. No entanto, enquanto expedições científicas eram enviadas ao local e as disputas prosseguiam, a ilha desapareceu. O frágil material vulcânico de que era formada tinha sido vítima da erosão marinha e, no final daquele ano, já não havia mais nada para ser visto acima do nível do mar. O artigo busca examinar como as notícias sobre o breve surgimento da ilha – que a imprensa ajudou a transformar num evento espetacular – alcançaram as páginas dos jornais no Rio de Janeiro oitocentista.

Palavras chave: história dos vulcões, Ferdinandea, Graham Island.

ABSTRACT: In mid-1831, Ferdinandea, as it was named by the Sicilians, appeared in the Mediterranean Sea, between Sicily and Tunisia. In June, earthquakes were felt in the region and in early July fishermen observed strange fish deaths in the sea and other unusual signs. Later, the volcanic island emerged from the waters. For the next five months, the phenomenon attracted the world’s attention. The new land, located at a strategic point of navigation, was quickly claimed by both the British and the Kingdom of the Two Sicilies, and also aroused the interest of the French. While scientific expeditions were sent to the site and disputes continued, the island disappeared. The fragile volcanic material from which it was formed had fallen victim to marine erosion. By the end of the year, there was nothing left to be seen above sea level. The article examines how news about the brief emergence of the island – which the press helped to transform into a spectacular event – reached the pages of newspapers in nineteenth-century Rio de Janeiro.

Keywords: history of volcanoes, Ferdinandea, Graham Island.

Dois dias levou o mar neste parto, em contrações que duraram todo este tempo, ora raivoso e espumejante, ora tão compassivo em seu ininterrupto lamento que dava vontade de acariciá-lo. Depois, a 15 de julho, a ilha emergiu por inteiro, e o mar pareceu adormecer de repente, como se já estivesse exausto. Andrea Camilleri. Um fio de fumaça (1997)

Em algum momento entre junho e julho de 1831, uma nova ilha emergia no mar Mediterrâneo, entre a Tunísia e a Sicília, resultado de uma erupção vulcânica. Batizada pelos sicilianos de Isola Ferdinandea e pelos britânicos de Graham Island, os franceses a chamaram de L’île Julia, e ainda recebeu outros nomes. Frequentemente, as “lutas onomásticas” são reveladoras de disputas de poder sobre um espaço, como aconteceu no caso da ilha recém-nascida, em que as múltiplas formas como foi nomeada se relacionam às ambições desencadeadas pelo surgimento do novo pedaço de terra (Vermiglio, 2023). O fato é que sua localização a inseria num ponto notavelmente estratégico para a navegação no Mediterrâneo, mais precisamente entre a ilha de Pantelleria e a cidade costeira de Sciacca, no Canal da Sicília, por onde passava o tráfego marítimo, e isso num momento em que os interesses britânicos e franceses já estavam voltados para o norte da África. Desde o início do século XIX, a ilha de Malta, na mesma região, vivia sob domínio britânico. No ano anterior, em 1830, os franceses haviam entrado na Argélia.

Embora hoje não seja possível precisar o momento exato em que a ilha começou a emergir, assim que a novidade se tornou conhecida, navios e expedições científicas foram enviados ao local, produzindo uma rica documentação que, atualmente, serve de fonte para os estudos sobre o evento (Mazzarella, 2012). Em uma região de vulcanismo fortemente presente, onde os estudos sobre o tema já eram relativamente comuns (Pyle, 2017), abrigados, no geral, nos cursos de História Natural, os relatos deixam ver que os contemporâneos não duvidaram se tratar de uma erupção vulcânica.

O Instituto Nacional de Geofísica e Vulcanologia (INGV) da Itália mapeou a área em 2019 (Cavallaro, 2020). A investigação oceanográfica indicou que Ferdinandea foi, na verdade, um dos dez cones existentes no campo vulcânico submarino Graham (Graham Volcanic Field) e que, hoje em dia, encontra-se a nove metros abaixo do nível do mar. Na erupção de 1831, esse cone elevou-se a uma altura de pouco mais de 60 metros acima da linha d’água e alcançou um perímetro de cerca de 1 km, dando origem à pequena ilha. Cinco meses depois, no entanto, o frágil material de que era composto tinha sido completamente desgastado pela erosão marinha e, enquanto as contendas seguiam sendo travadas, o cone voltou a ficar submerso. Assim, quando chegou o mês de dezembro, a ilha havia desaparecido.

A partir dos primeiros navios enviados para observar o fenômeno e dos naturalistas que examinaram a área, as informações começaram a circular e rapidamente migraram para os anais das academias de ciência e, afinal, para as páginas dos jornais. Vários ingredientes faziam desse um acontecimento incomum, capaz de captar o interesse: uma erupção vulcânica no mar, o surgimento de uma nova ilha, sua localização estratégica no coração do Mediterrâneo, os interesses em disputa e o súbito desfecho do caso. Assim, o fenômeno geológico foi transformado em acontecimento midiático, e leitores de várias partes do mundo puderam conhecer a história da ilha desaparecida, inclusive no Rio de Janeiro oitocentista.

O artigo pretende voltar-se para o exame da produção da notícia sobre a “ilha efêmera” ou, mais precisamente, para os caminhos que lhe garantiram uma circulação tão ampla, procurando investigar alguns aspectos de como a imprensa das primeiras décadas do século XIX lidava com as erupções vulcânicas e outras forças geológicas do planeta.

DOS PRIMEIROS RELATOS ÀS PÁGINAS DOS JORNAIS

É difícil precisar quem terá sido o primeiro a avistar a ilhota assim que ela surgiu, mas alguns fenômenos que costumam acompanhar, e mesmo preceder, esse tipo de atividade vulcânica foram relatados. Mr. Swinburne, no comando do Rapid, a serviço da marinha britânica, afirmou ter sentido, no dia 28 de junho, tremores incomuns em seu navio quando navegava entre Sciacca e Pantelleria. Nos primeiros dias de julho, alguns pescadores perceberam uma estranha agitação no mar, outros relataram que a água borbulhava, enquanto peixes mortos subiam à superfície. O capitão Francesco Trefiletti, indo de Malta a Palermo, entre 5 e 8 de julho, falou de uma coluna de água que se elevava em intervalos regulares. No dia 9, Giovanni Corrao, no comando do real bergantim napolitano Teresina, percebendo o comportamento anormal do mar, o cheiro de enxofre pairando no ar e os trovões que ressoavam, julgou tratar-se de uma erupção vulcânica e assim relatou às autoridades. Outras testemunhas mencionaram fogo, raios e uma enorme coluna de material eruptivo que podia ser observada à distância, quando, então, as suspeitas de que se estava diante de um vulcão submarino se transformaram em certeza (Mazzarella, 2012).

Ferdinando II, rei das Duas Sicílias (Sicília e Nápoles), diante dessas primeiras informações, decidiu enviar a corveta de guerra Etna, sob o comando do capitão Raffaele Cacace, para investigar o fenômeno. Como observou Salvatore Mazzarella, em seu livro Dell’isola Ferdinandea e di altre cose (1984), o navio, recém-construído nos então famosos estaleiros de Castellamare di Stabia, parecia ter um nome apropriado para a missão. O capitão, no entanto, devido às condições do navio, segundo alegou mais tarde, não conseguiu se aproximar, mas chegou perto o suficiente para observar o material vulcânico sendo expelido e a atmosfera sobrecarregada de eletricidade. Seu relatório, de 24 de julho, convenceu as autoridades da necessidade de novos esforços de observação.

Na mesma altura, Friedrich Hoffmann (1797-1836), professor de geologia em Berlim, estava na Itália por outras razões, mas a situação que se apresentava era, certamente, uma rara oportunidade de observar um vulcão subaquático em erupção. Conseguindo ajuda para organizar uma rápida expedição, em 18 de julho partiu de Palermo, com mais alguns companheiros naturalistas, em direção ao porto de Sciacca, onde o grupo embarcou no Gesù Maria Giuseppe. Foi com felicidade, como Hoffmann escreveria mais tarde, que, afinal, conseguiram avistar o vulcão, cujos relevos o geólogo definiu assim: “nada mais são do que a borda irregular de um imenso e quase circular abismo” (citado por Mazzarella, 2012). As frágeis condições do pequeno barco não permitiram que se aproximassem como desejavam, mas, ainda assim, julgaram ter tido diante dos olhos um “grande espetáculo”: pedras eram lançadas ao mar, enquanto relâmpagos se agitavam na coluna de material eruptivo que pairava no céu. Um dos naturalistas que integrou o grupo, Rodolfo Amando Philippi (1808-1904), fez esboços que, mais tarde, alcançariam grande circulação. Como deixou registrado em suas Memórias, essa era uma oportunidade de ver algo que acontece poucas vezes na história (Philippi, 2011).1 Na volta, um relato sobre a expedição ao “novo vulcão”, na forma de uma carta enviada ao duque de Serradifalco, foi escrito por Hoffmann. Sua carta-relatório rapidamente foi publicada na imprensa, com alguns desenhos de Philippi.

Desde os primeiros momentos, os jornais locais acompanharam as novidades em relação à ilha. Pode servir de exemplo a matéria publicada no La Cerere: giornale officiale di Palermo e reproduzida no Giornale del regno delle due Sicilie, de Nápoles, em seu número de 28 de julho de 1831, que se iniciava assim: “Já não é possível duvidar, face às notícias que têm chegado, e que continuam a chegar a este Governo, que ocorreu uma erupção subaquática no mar que banha a costa sul da nossa ilha, a 26 milhas da praia de Sciacca [...]”.2 O jornal seguia informando a seus leitores sobre os tremores de terra, as primeiras impressões fornecidas pelo comandante Trefiletti, os peixes mortos, a coluna de cinzas que podia ser avistada de longe e, ainda, a partida do geólogo de Berlim, Hoffmann, para examinar o evento.

A próxima visita de estudos foi a do naturalista e professor da Universidade de Catânia, Carlo Gemmellaro (1787-1866). Nascido na Sicília, filho de uma família próspera, que possuía terras na encosta sul do Etna, interessou-se pela observação dos fenômenos vulcânicos desde jovem. Ingressou no curso de medicina e, assim, pôde frequentar os estudos de história natural. Depois de formado, trabalhou como médico na marinha britânica. Vivendo na Inglaterra, teve a oportunidade de travar contato com a produção dos principais geólogos de seu tempo. De volta à Itália, em 1830, já tendo publicado vários estudos no campo das ciências da Terra, foi nomeado professor da cadeira de História Natural na universidade, onde ficavam então abrigados os estudos de geologia (Cristofolini, 2017). Assim, em 1831, ainda no início da carreira, mas já interessado no estudo do vulcanismo, Gemmellaro foi observar de perto a nova ilha. Produziu um relatório que leu, em 28 de agosto, no salão nobre da Universidade.

Na viagem para o porto de Sciacca, cruzou com Hoffmann, que lhe preveniu das dificuldades que teria para encontrar marinheiros que quisessem levá-lo ao vulcão. Por sorte, conseguiu localizar o mesmo que já havia transportado um viajante inglês poucos dias antes. Em seu relatório, fez um apanhado dos vários testemunhos recolhidos até o momento. Falou de Hoffmann e de seus companheiros naturalistas, também mencionou os desenhos que foram feitos. No entanto, observou: “Mas a maestria e a beleza da erupção, que com pequenos intervalos se sucedia, não se pode exprimir nem com pincel, nem com pena” (Gemmellaro, 1831, p. 19).

Em seguida, descreveu sua própria experiência. Em um primeiro momento, pareceu-lhe que a cratera não passava de uma deserta e triste rocha no meio daquela grande extensão de mar. No entanto, viu subir de seu interior, dois ou três minutos depois, uma imensa quantidade de água turva e borbulhante, que transbordou para o mar, seguida de uma violenta explosão de vapor carregado de cinzas e escória, tudo lançado com uma força indescritível. Para Gemmellaro, havia fogo no centro da explosão3 e os resíduos caíam, ainda incandescentes, na borda da cratera, como uma chuva de fogos de artifício – os maiores eram lançados ao mar –, de uma maneira que, em suas palavras, dificilmente poderia ser descrita. Trovões agitavam o céu e, de tempos em tempos, as detonações recomeçavam. A erupção, que afirmou ter observado de longe, por quatro dias, e de perto, por algumas horas, pareceu-lhe tão grandiosa, que, em sua opinião, ninguém ousaria pisar naquela cratera antes da cessação completa do fenômeno. Daí em diante, afirmando que o naturalista precisava se servir da ajuda da Física e da Geologia para dar uma explicação conveniente “de uma das mais estupendas manifestações da natureza” (Gemmellaro, 1831, p. 30),4 seguiu expondo suas ideias sobre a formação dos vulcões da Sicília e, em particular, sobre a nova ilha.

Entrando na seara das disputas pela posse da terra acabada de emergir, Gemmellaro lembrou a todos, em seu relatório lido na Universidade, que o Malta Government Gazette, o órgão de imprensa do governo britânico que controlava Malta, tinha publicado, no dia 10 de agosto, a notícia de que o capitão Senhouse, da Real Marinha, a bordo do Hind, havia feito uma expedição à ilha na semana anterior. O que a matéria do Gazette dizia era que o capitão, julgando o terreno firme e compacto, foi da opinião de que existia ali uma ilha permanente, e então desembarcou e plantou uma bandeira para marcá-la como propriedade britânica. Gemmellaro pôs em dúvida essa informação, dizendo que não seria possível que o capitão houvesse desembarcado nessa data, quando o vulcão se encontrava em plena atividade. Além disso, também julgou absurdo ele ter considerado a ilha um terreno firme, quando, na verdade, ela não passava de um “aglomerado de cinzas e escória leve” (Gemmellaro, 1831, p. 19).

Contudo, Senhouse, não satisfeito em afirmar ter fincado a bandeira, também batizou a ilha, dando-lhe o nome de Graham, em homenagem ao primeiro lorde do almirantado da marinha britânica. Então, o que Gemmellaro fazia, com suas observações no salão da Universidade, era contra-atacar na defesa das pretensões bourbônicas em duas frentes: por um lado, afirmou que, como o desembarque inglês não teria sido possível, a bandeira, portanto, não estaria lá, por outro, tratou da questão do nome, sugerindo que a ilha fosse batizada em homenagem ao rei das Duas Sicílias, Ferdinando II. Esse ato, em sua opinião, causaria inveja até aos imperadores romanos, como Adriano, cuja memória foi imortalizada em lápides e medalhas. É verdade que esses são objetos perenes, mas acabam, no máximo, na mão dos arqueólogos, enquanto um vulcão “não só não é apenas uma obra de arte, como será universalmente conhecido e estabelecerá uma nova era nos anais das ciências”, argumentou o professor (Gemmellaro, 1831, p. 45-46). Não se sabe se por sugestão de Gemmellaro ou não, mas, em 17 de agosto de 1831, o rei das Duas Sicílias deu à nova ilha o nome de Ferdinandea (Mazzarella, 2012).

Também no início de agosto, o médico inglês John Davy (1790-1868), inspetor de hospitais militares e estudioso de química e mineralogia, visitou a ilha. No final do ano, leu, na Royal Society, em Londres, uma comunicação sobre o novo vulcão que havia surgido no Mediterrâneo. Em sua fala, Davy mencionou as diversas abordagens britânicas à ilha e as informações que haviam sido recolhidas até o momento de sua visita, em 5 de agosto, para, em seguida, listar suas próprias impressões. Afirmou que, naquela data, o vulcão ainda apresentava atividade eruptiva e foi preciso observá-lo do mar. Mas mencionou Senhouse e o desembarque que este tinha sido capaz de realizar, no dia 2, e, ainda, o nome, “Graham Island”, com o qual o comandante da marinha britânica havia batizado a ilha. Além disso, tratou dos exames a que submeteu amostras de água, gás e rochas colhidas no local e que lhe tinham sido oferecidas mais tarde. Por ocasião da publicação de seu relato pela Royal Society, foram inseridas pranchas com gravuras (Davy, 1832).5

Em setembro, foi a vez dos franceses. A Academia de Ciências de Paris enviou à ilha o geólogo Louis-Constant Prévost (1787-1856), acompanhado do desenhista, formado na École des Beaux-Arts, em Paris, Antoine-Edmond Joinville (1801-1849). Eles viajaram no brigue La Flèche, cedido pelo Ministério da Marinha de Luís Filipe. Depois de dois ou três dias difíceis, com o mar muito agitado, em 29 de setembro, finalmente, foi possível desembarcar. Prévost fez medições de temperatura, avaliou a circunferência da ilha, coletou água da cratera do vulcão em diferentes profundidades e recolheu amostras de solo com a ajuda dos marinheiros que o acompanhavam, enquanto Joinville procurava retratar a ilha. No início de outubro, o geólogo prestou contas à Academia e, muito rapidamente, seu relato foi reproduzido na imprensa.6

Lendo o exemplar de novembro da Revue des Deux Mondes (tomo 3/4, 1831), seria possível conhecer o discurso de Prévost na Academia, com suas observações sobre o novo vulcão. O público ficava a par, por exemplo, dos esforços que foram feitos para hastear uma bandeira francesa no ponto mais alto da ilha, com uma placa com os seguintes dizeres: “Ilha Julia. Tripulação do brigue La Flèche. Sr. Constant Prévost, professor de Geologia em Paris; Joinville, pintor. 27, 28, 29 de setembro de 1831”. Segundo Prévost, essa providência havia sido tomada não como “uma ridícula cerimônia de posse” – de um monte de cinzas, surgido no meio do mar –, mas para assinalar a existência da expedição e mostrar o interesse da França pelas questões científicas. O geólogo também tratou do nome escolhido, Julia, afirmando referir-se ao mês em que a ilha surgiu. Não seria difícil para os leitores, no entanto, associar a escolha à monarquia de mesmo nome, iniciada em julho do ano anterior (Monarchie de Juillet), justamente aquela que deu início ao reinado de Luís Filipe (Buffetaut, 2024, p. 77).

Assim, em setembro, o ilhéu vulcânico já possuía pelo menos três nomes de batismo: Graham, Ferdinandea e Julia. Seu desaparecimento, porém, também se processava num ritmo acelerado. Prévost estava convencido de que todo o terreno, composto por um material bastante frágil, de cinzas e escória fragmentada, vinha sendo arruinado dia após dia pelos deslizamentos constantes na borda da cratera e pela força das ondas. Na verdade, essa também tinha sido a opinião de Gemmellaro, e mais ainda de Hoffmann, que retornou à ilha uma segunda vez e percebeu que ela havia diminuído sensivelmente desde sua primeira visita. Hoffmann enviou ao diretor do Observatório de Palermo um relato, datado de 25 de outubro, de sua segunda expedição ao vulcão. O texto foi publicado no Giornale di Scienze Lettere e Arti per la Sicilia, e o leitor pôde, então, conhecer os comentários finais do geólogo, nos quais ele afirmava ser tão acentuado o desgaste da ilha que talvez tivesse desfrutado da sorte de ser o último a ver esse “fenômeno efêmero” (Hoffmann, 1831, p. 13).

Outras expedições à ilha, igualmente divulgadas em periódicos científicos, poderiam ser mencionadas. The Lancet London, o jornal de medicina, mas que na altura abarcava muitos saberes, publicou, em setembro de 1831, uma nota tratando de “um recente vulcão na Costa da Sicília”, assinada por A. Osborne, médico do navio da marinha britânica HMS Ganges (Osborne, 1831). Para mais um exemplo, Walter Scott (1771-1832), o escritor escocês, visitou o vulcão no dia 22 de novembro de 1831. Na ocasião, já doente e incapaz de caminhar sozinho, precisou ser carregado por um marinheiro, que se dispôs a ajudá-lo, segundo o relato que deixou descrevendo a experiência por julgar que as informações que coletou poderiam interessar aos membros da Royal Society (Mazzarella, 2012; Gerkens, 2021, 2022, p. 90-91).7

O percurso das notícias na imprensa parece ter começado pelos veículos oficiais locais, o inglês, de Malta, e os sicilianos, de Palermo e de Nápoles. Um exemplo de como essas gazetas desempenharam um papel importante nas disputas em torno da posse do novo vulcão pode ser colhido na edição de 26 de outubro de 1831 do Giornale del regno delle due Sicilie. A matéria começava dizendo que, como fora noticiado antes, havia surgido uma ilha, na costa sul da Sicília, à qual sua majestade havia atribuído o nome de Ferdinandea, uma vez que pertencia a seus domínios reais. A nota prosseguia observando que alguns jornais, no entanto, haviam publicado a informação de que o governo de “Sua Majestade Britânica” tinha tomado posse da dita ilha por meio de um navio de guerra. O Giornale afirmava, porém, estar autorizado a declarar que essa informação era completamente infundada, uma vez que não passaria na mente do augusto soberano da Grã-Bretanha — e de seu governo — que a ilha, tendo se formado por um fenômeno extraordinário tão próxima da Sicília, não devesse ser considerada propriedade de nosso rei.8

Evidentemente, os jornais oficiais eram um instrumento importante na disputa pela posse da ilha. Todavia, mesmo quando a notícia se espalhou para outros veículos, como os jornais diários, o papel da imprensa não parece ter sido o de um simples meio a partir do qual seria possível acompanhar as novidades; ela também obedecia, de alguma forma, aos agenciamentos em disputa. Dando visibilidade aos atos de posse e às querelas onomásticas, assim como aos esforços de conhecimento das missões científicas, o mundo do impresso transformou-se em um campo de batalha. Era preciso marcar posições entre o público letrado e, assim, cada lado procurou conquistar, com todos os recursos de que dispunha, a opinião pública.

REGISTROS VISUAIS

Ao mesmo tempo em que as notícias se disseminavam pelos jornais, a publicação de outros impressos sobre a ilha, inclusive com registros visuais, crescia.9 No próprio ano de 1831, foi editado, em Nápoles, o livreto Descrizione dell’isola Ferdinandea al mezzo-giorno della Sicilia, de Benedetto Marzolla, cartógrafo do real serviço topográfico (Marzolla, [1831?]). No ano seguinte, saiu publicado em Londres um álbum, Views and Description of the late Volcanic Island off the coast of Sicily, de George Walter Smythe, trazendo uma série de pranchas do vulcão, compostas a partir de esboços tomados em 6 de agosto (Smythe, 1832). Há, também, algumas litografias avulsas, como a que pertence ao acervo do Museu Britânico, com o título de New Volcanic Island. Elevated by submarine eruption, on the South West coast of Sicily, produzida pelo prestigioso litógrafo Ackermann e doada ao Museu em 1832.10

Não se pretende, de maneira alguma, uma investigação sobre as representações visuais de Ferdinandea a partir desses poucos exemplos. Eles foram inseridos aqui apenas para que se aponte a variedade de registros visuais produzidos, obedecendo, por vezes, a linguagens diversas, e que acabaram sendo um caminho por onde a informação circulou. Na litografia do Museu Britânico (Figura 4), produzida a partir do esboço de um oficial (não identificado) do navio St. Vincent, em 1831, o que se vê não é uma ilha, mas um vulcão em violenta erupção, com espectadores num barco a remo, no primeiro plano, à esquerda, minúsculos, diante da força da natureza.


Figura 4
: New Volcanic Island. Elevated by submarine eruption, on the South West coast of Sicily [...]. First observed July 12th. 1831. On Stone by L. Haghe / Published by Ackermann. Litografia colorida à mão, 1831.
Fonte: British Museum.

Os historiadores da arte têm apontado para todo um percurso na cultura visual relacionado à ideia do sublime e, até mesmo, do pitoresco, que esteve presente na representação de vulcões nessa virada do século XVIII para o XIX (Keller, 2008; Diener, 2008). A grandiosidade da atividade vulcânica servia como um bom exemplo de uma natureza aterradora e perigosa, mas, ao mesmo tempo, capaz de evocar o belo em sua outra faceta, a do sublime, tal como havia sido examinada por Edmund Burke (1993) em sua obra Uma investigação filosófica sobre as origens de nossas ideias do sublime e do belo, publicada em Londres em 1757. Esse olhar que oscilava entre o medo e o fascínio também esteve presente, de alguma forma, na produção escrita dos geólogos, como em Hoffmann, por exemplo, quando descreveu a ilha como “um imenso e quase circular abismo”, mas cuja erupção proporcionou um “grande espetáculo” (citado por Mazzarella, 2012), ou quando Gemmellaro falou de “uma das mais estupendas manifestações da natureza” (Gemmellaro, 1831, p. 30).

Já a Descrizione dell’isola Ferdinandea al mezzo-giorno della Sicilia, publicada pelo cartógrafo Benedetto Marzolla, teve origem em plantas e vistas tiradas no dia 27 de outubro por um inglês, cuja identidade não foi revelada, que visitou a ilha a bordo do vapor Francesco I. Segundo a descrição que esse viajante – muito provavelmente um pintor amador – forneceu ao autor, a Prancha VI (Figura 5) foi elaborada para retratar o momento em que o vapor se aproximou do vulcão, no começo da manhã. Nesse registro visual, o que se vê já não é a representação de uma natureza em fúria explosiva, mas uma ilha e um navio, em águas calmas, ao nascer do sol.


Figura 5
: Ferdinandea.
Fonte: MARZOLLA, Benedetto. Descrizione dell’isola Ferdinandea al mezzo-giorno della Sicilia. [Napoli] [1831]. Prancha VI.

TURISMO DE VULCÃO

O vulcão, afinal, tinha se tornado um destino cobiçado –– perigoso, mas, ao mesmo tempo, fascinante ––, e não apenas para os naturalistas. No dia 10 de outubro, o Giornale del regno delle due Sicilie publicou, reproduzido de La Cerere, o extrato de uma carta particular, datada do mês anterior. O texto contava que três amigos, naturais de Sciacca, tinham navegado em direção ao vulcão, com um barco a vela e remos, no dia 25 de agosto. Conseguindo desembarcar na ilha, avistaram dois lagos cujas águas ferviam constantemente. Desejaram recolher uma amostra da água dos lagos, mas não foram capazes porque, para isso, seria necessário caminhar por algum tempo, e os vapores não permitiam. A carta também contava que dois ingleses tinham visitado o vulcão no dia seguinte. Sem conseguirem explorar a ilha, pararam, no entanto, para descansar, e até comeram na praia, antes de retornarem. O jornal ainda mencionava que, da cidade de Sciacca, a olho nu, era possível enxergar as duas elevações laterais que formavam a ilha e a coluna de fumaça que subia ao centro.11

O empenho dos geólogos em se lançarem numa perigosa expedição à ilha, enfrentando os riscos e não se contentando com relatos ou mesmo com amostras trazidas por terceiros, estava de acordo com os princípios que regiam as ciências da Terra, num momento em que o trabalho de campo já se encontrava plenamente consolidado. Os estudos sobre as práticas dos naturalistas, do século XVIII em diante, têm apontado para um desejo constante de apreender o mundo a partir dos próprios olhos. Foi nesse contexto que as “caminhadas geológicas” transformaram as montanhas em laboratórios a céu aberto (Comparato, 2018); mais ainda poderia ser dito dos vulcões, que permitiam um conhecimento de processos que se desenrolavam abaixo da superfície.12 Os relatos dessas experiências, por sua vez, eram cuidadosamente produzidos pelos naturalistas, que o faziam entremeando os dados geológicos levantados com uma narrativa, frequentemente em primeira pessoa, sobre a própria viagem, suas dificuldades, seus perigos e até fatos considerados pitorescos, em uma escrita a meio caminho entre o diário de viagem e os relatórios científicos que surgirão mais tarde.

Assim, para além das disputas sobre a posse da ilha, uma das consequências do papel da imprensa, divulgando o relato dos naturalistas, parece ter sido a de popularizar a ideia da visita ao vulcão. As matérias jornalísticas ajudavam a aproximar o leitor da experiência única vivida pelos naturalistas, mesmo quando ele se mantinha sentado, no conforto de sua casa. Mas não foi só à distância que o público se aproximou da ilha. A leitura dos jornais sicilianos deixa perceber que um fluxo de turistas para o vulcão chegou a ser iniciado, e talvez o inglês mencionado no livro do cartógrafo tenha sido um deles. Quem abriu o Giornale del Regno em 22 de setembro de 1831 pôde ler o anúncio de um passeio, de navio a vapor, “para visitar o novo vulcão da ilha Ferdinandea” e dar uma volta pela Sicília, quando ainda seria reservado tempo para os viajantes conhecerem as renomadas antiguidades de Siracusa, Catânia e Taormina, bem como o Monte Etna, a ilha de Lipari e o antigo vulcão de Stromboli.13 No dia seguinte, o jornal voltou a anunciar o tour em torno da Sicília, para uma visita ao “novo vulcão”.14

Nessas primeiras décadas do século XIX, excursões para áreas vulcânicas ganhavam cada vez mais espaço. Os vulcões do sul da Itália, com seu entorno urbanizado há milênios, garantiam um acesso relativamente fácil, atraindo levas de visitantes para esse “turismo pitoresco”. A região abrigava alguns dos mais famosos vulcões do planeta, como os incluídos no passeio anunciado no jornal (o Etna, na própria Sicília, e o Stromboli, numa ilha ao lado), além de outros, bem próximos.

Do ponto de vista do interesse crescente por esse “turismo de vulcões”, que oferecia uma experiência marcante, não inteiramente sem perigos, mas controlada, o Vesúvio, próximo a Nápoles, foi o que desempenhou o papel mais importante.15 As ruínas de Pompeia e Herculano, redescobertas no século XVIII e escavadas ao longo de todo o século XIX, transformaram-se num dos pontos altos do seleto rol dos destinos percorridos no grand tour e que, mais tarde, seriam incorporados ao passeio romântico à Itália e, finalmente, ao turismo de massa (Sweet, 2012). A visita às ruínas, conjugada com uma subida ao Vesúvio, oferecia ao viajante uma experiência completa, em que era possível contemplar o poder – apenas mais ou menos apaziguado – do vulcão que tinha soterrado as duas cidades.

O desaparecimento prematuro de Ferdinandea fez com que o público do turismo de vulcão, ainda em formação nessas primeiras décadas do Oitocentos, não pudesse usufruir desse destino. Mas, durante uns poucos meses, leitores de várias parte do mundo – recorrendo às narrativas jornalísticas como uma espécie de sucedâneo – puderam sonhar com uma visita à ilha surgida repentinamente no centro do Mediterrâneo.

A NOTÍCIA NA IMPRENSA DO RIO DE JANEIRO

O Jornal do Commercio, o mais importante dos periódicos então em circulação na cidade do Rio de Janeiro, em sua edição de 30 dezembro de 1831, reproduziu uma matéria do jornal francês Courrier. O texto informava que havia sido publicado, nos jornais de Nápoles, um relato dirigido pelo capitão da marinha inglesa, Seahouse (sic), ao vice-almirante Hotham, com o seguinte teor: “Aquele oficial anuncia ter visitado no dia 2 de agosto passado a Ilha Vulcânica, que se acaba de formar ao Sul da Sicília, e que dela tomou posse em nome do Rei da Inglaterra, plantando o pavilhão Inglês depois de uma salva de artilharia”. A matéria ainda mencionava o nome: “Essa ilha foi por ele denominada Graham”. O texto traduzido do Courrier, então, seguia:

A precipitação, com que se apropria de um produto espontâneo da natureza, situado entre a Sicília e a Ilha de Pontilharia (sic), que se acha em uma distância menos de 25 milhas Italianas, e que pertence ao Rei de Nápoles produziu uma impressão penosa. As últimas notícias da Ilha Graham (Nerita) vão até o fim de Agosto. Neste tempo as irrupções vulcânicas tinham cessado [...].16

O leitor do Jornal do Commercio pôde, portanto, se pôr a par tanto do surgimento da ilha como do desenrolar das disputas em torno de sua posse. No começo de 1832, quando o vulcão de fato já havia desaparecido, as notícias ainda circulavam no Rio de Janeiro. Alguns meses eram necessários até que os jornais estrangeiros (e eles tinham o seu próprio tempo de produção), transportados de navios, chegassem à cidade, tempo que só será radicalmente encurtado com a introdução do telégrafo, na segunda metade do século XIX. Assim, em 30 de janeiro de 1832, o Jornal do Commercio trazia a seguinte nota: “A Gazeta de Veneza anuncia que a Ilha vulcânica, que se havia formado no mar da Sicília em frente de Sciacca, começa a baixar, e se transformará brevemente em um grande banco d’areia. Em consequência os navegantes se devem informar bem da posição do futuro banco”.17

Em três de março, era a vez de A Verdade, Jornal Miscellanico alertar seu público: “Cartas de Catânia anunciam que a pequena Ilha vulcânica que aparecera defronte d’esta Cidade vai-se abaixando sensivelmente, bem depressa desaparecerá de todo; mas por muito tempo será fatal aos Navios, que ignorarem sua posição”18. Finalmente, na edição de cinco de abril, A Verdade anunciava o desfecho do caso: “A Ilha Ferdinandea desapareceu: o mar decidiu a questão entre os reis de Nápoles e de Inglaterra”.19

A historiografia tem chamado a atenção para o papel que a imprensa exerceu, no Brasil do século XIX, na esfera da divulgação científica,20 difundindo informações consideradas úteis ou práticas e, sobretudo, aquelas dedicadas a satisfazer um público ávido por novidades. De tempos em tempos, a história da “ilha efêmera” voltava aos jornais, agora já como uma curiosidade, que deveria ser conhecida por todos aqueles que desejassem se considerar bem-informados. Nessas ocasiões, as contendas onomásticas ainda seguiam organizando a forma como os jornais se referiam à ilha, a depender da nacionalidade do veículo de imprensa que estava sendo reproduzido no momento. Uma publicação no Jornal do Commercio, em novembro de 1839, pode servir de exemplo. Retirada do Moniteur Parisien, a matéria intitulava-se “Aparição e desaparição de novas ilhas” e versava sobre o possível surgimento, já rechaçado pelos cientistas, de um grupo de ilhas nos Mares do Chile. Analisando o fenômeno, o jornal afirmava que algumas vezes essas suspeitas não passavam de uma ilusão causada por reflexos ou vapores na água do mar, mas que o surgimento de ilhas vulcânicas era um fenômeno que existia. Daí em diante, listava alguns exemplos tirados da antiguidade e, para juntar um de épocas modernas, referia-se ao aparecimento, no Mediterrâneo, de “uma pequena ilha a que deu-se o nome de Julia” e que “pouco tempo depois tornou a sumir-se debaixo das águas”21.

É possível que o público também tenha se informado sobre o caso da ilha lendo diretamente alguns veículos da imprensa estrangeira – a que a elite letrada da cidade tinha acesso –, sobretudo os franceses, como foi o caso da já citada, mais erudita, Revue des Deux Mondes (que publicou o relato de Prévost), ou do Le Monde Illustré, voltado para o entretenimento22. Este último, retomando o tema agora na perspectiva das revistas ilustradas, publicou, em agosto de 1864, uma matéria reproduzindo três vistas da ilha.23

Ainda seguindo nas publicações editadas fora do país que circularam na cidade, pode ser mencionada, a título de exemplo, uma obra impressa em Portugal. O Diccionario popular histórico, geographico, mythologico, biographico, artistico, bibliographico e litterario, dirigido pelo escritor e jornalista Manoel Pinheiro Chagas e editado em Lisboa a partir de 1876, dedicou um de seus verbetes à Ferdinandea (Chagas, 1876).

Exemplos da longevidade do tema na imprensa do Rio de Janeiro também poderiam ser citados, inclusive para o século XX. A Revista da Semana lembrou-se da “Ilha intermitente”, em agosto de 1939, e nem mesmo o Almanaque do Tico Tico foi capaz de ignorá-la. Na matéria da Revista da Semana, verifica-se que, decorrido mais de um século, a lógica das disputas onomásticas havia se perdido, fazendo a revista confundir reinos e nomes:

Volta agora a falar-se duma curiosa ilha do Mediterrâneo há muitos anos esquecida.

Há pouco mais de um século – exatamente em Julho de 1831 – o capitão dum navio inglês que cruzava ao sul da Sicília descobriu uma ilha que nenhum mapa mencionava. Batizou-a ILHA JULIA e tomou posse dela em nome do rei de Inglaterra.

O rei de Aragão e das Duas Sicílias não concordou com isso e tomou posse, por sua vez, da nova terra, a que chamou ILHA FERDINANDEA. Seguiu-se entre os reinos de Nápoles e de Inglaterra uma querela diplomática. E foi a própria ilha que, ao cabo de alguns meses, pôs termo à pendência, sumindo-se entre as ondas.

Em 1863 fez nova aparição, mas muito mais rápida. E até hoje não dava que falar de si...

Esse jogo das escondidas é devido à atividade vulcânica submarina que persiste no Mediterrâneo central.24 (caixa alta no original)

A matéria referiu-se ao suposto ressurgimento periódico da ilha, daí o título “Ilha intermitente”. Em vários momentos, a imprensa ao redor do mundo anunciou o seu reaparecimento, como em 1846 ou em 1863, o que os vulcanólogos do INGV não consideram possível, uma vez que as erupções no campo Graham são de um tipo único e não se repetem no mesmo cone (Stopponi, 2021).

Finalmente, no Tico Tico, a história da ilha desaparecida havia se transformado em uma “pílula de sabedora” própria dos almanaques.25 “Maravilhas da Natureza. Ilhas que nascem e morrem” foi o título escolhido, e a história de Ferdinandea fez parte dos exemplos selecionados (Almanaque, 1939).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em coletânea publicada recentemente, Islands and the British Empire in the Age of Sail, os organizadores Hamilton e McAleer (2021) chamaram a atenção para as mais variadas possibilidades que as ilhas oferecem como tema de investigação. Peças-chave nos sistemas coloniais, foram alvo de um rico imaginário, consideradas edênicas ou mesmo figurando em universos utópicos. De fato, como entidades multifacetadas – donas de uma natureza paradoxal –, ao mesmo tempo abertas e fechadas, puderam evocar tanto o paradisíaco como o inóspito. Representaram o afastamento, mas também remeteram a conexões (Hamilton; McAleer, 2021). Esses espaços insulares, aparentemente isolados, mas inseridos na ampla conectividade que caracterizou o mundo moderno, participaram de extensas redes transoceânicas.

Contudo, se há uma complexidade que gira em torno do espaço insular, a natureza vulcânica da ilhota examinada aqui a inseria em outro terreno igualmente pleno de dubiedades. A partir das últimas décadas do século XVIII e do início do seguinte, os vulcões foram objeto de uma atenção crescente, e a imprensa fez parte desse movimento (Pyle, 2017). As erupções vulcânicas, sobretudo aquelas em áreas mais facilmente observáveis, como a do Vesúvio, e de outras, no Mediterrâneo, encheram as páginas dos jornais ao redor do mundo durante todo o século XIX, inclusive no Rio de Janeiro (Almeida, 2017). Tais eventos eruptivos, com grande poder destrutivo, eram horrivelmente assustadores, mas, ao mesmo tempo, revelavam uma natureza grandiosa e sublime, capaz de capturar não apenas o interesse da ciência, mas também a imaginação estética (Duffy, 2013). Assim, na década de 1830, os leitores de jornal estavam já bastante familiarizados com os espetáculos que os vulcões proporcionavam.

Desaparecida muito rapidamente, a ilha efêmera não teve tempo de se consolidar em nenhuma dessas perspectivas, nem como vulcão, nem como ilha. Em sua curta existência, no entanto, atraiu, como se procurou mostrar, o interesse de diversas instâncias de poder. Foi esquadrinhada pelo olhar dos agentes de reinos europeus, de academias de ciências, com seus naturalistas, frequentemente acompanhados por artistas desenhistas, tornando-se objeto, em particular, dos vulcanólogos, quando esse saber ainda dava os seus primeiros passos. Cobiçada pelo turismo, outro campo em constituição, afinal chegou à imprensa, alcançando um público para o qual os fenômenos vulcânicos absolutamente não eram novidade. A presença da ilha nas páginas dos jornais fluminenses aponta para a inserção do público leitor local em uma rede mais vasta, formada por uma legião de interessados em fenômenos geológicos extremos que moldam o planeta; para eles, uma súbita erupção vulcânica nas águas do mar Mediterrâneo trazia a sensação de que um espaço conhecido há milênios ainda podia reservar alguma surpresa.

Além disso, a pequena ilha-vulcão, por seu próprio caráter mutável e pelas rápidas transformações que experimentou, apresentou características particulares que ajudaram a aguçar a curiosidade do público. Surgiu no meio do mar, com toda a potência que uma erupção vulcânica carrega, transformou-se em ilha frágil e, em seguida, desapareceu. Tudo isso foi decisivo para que conseguisse unir a força aterradora e sublime dos vulcões com a tópica das ilhas perdidas ou desaparecidas (Martínez, 1998), ou, como quis o Almanaque do Tico Tico, ela representava “as maravilhas da natureza” presentes nas “ilhas que nascem e morrem”. Assim, numerosos elementos contribuíram para que seguisse capturando a imaginação do leitor, mesmo quando já fazia mais de um século que ela não estava mais lá.


Figura 1
: Europe. Exhibiting its present political divisions (c. 1831).
Fonte: The Edinburgh geographical and historical atlas, comprehending a sketch of the history of geography ... and history of each continent, state, and kingdom, delineated. Edinburgh: Published by John Hamilton et al., c. 1831. Detalhe. David Rumsey Historical Map Collection. Stanford University Library.


Figura 2
: Graham Island, Sicily. Desenho, c. 1831, 20,1 cm x 26,6 cm.
Fonte: National Maritime Museum, Greenwich, Londres (PAD8691).


Figura 3
: Graham Island (1832).
Fonte: DAVY, John. Some account of the new volcano in the Mediterranean. Philosophical Transactions of the Royal Society of London, v. 122, 1832.


Imagem 6
: Maravilhas da Natureza. Ilhas que nascem e morrem.
Fonte: Almanaque do Tico Tico para o ano de 1939.

REFERÊNCIAS

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Notes

1 Em suas Memórias, Philippi mencionou, brevemente, as duas visitas que fez à ilha (Philippi, 2011).
2 Tradução livre do autor: “Non si può più dubitare per le notizie qui giunte, e che a questo Governo giungono di continuo, che sia accaduta una eruzione sottomarina nel mar che bagna la costa meridionale della nostra isola a 26 miglia dalla spiaggia di Sciacca [...]”. Giornale del regno delle due Sicilie, 28 de julho de 1831.
3 Sobre descrições de erupções vulcânicas que se serviam de analogias com o fogo, ver Pyle (2017).
4 Tradução livre do autor: “d’una delle più stupende operazioni della natura”. (Gemmellaro, 1831, p. 30).
5 Relato datado de 25 de outubro de 1831, lido em 22 de dezembro de 1831 e publicado pela Royal Society em 1º de janeiro de 1832 (Davy, 1832).
6 Ver Lettre de M. Prévost […] Malte le 5 octobre 1831. Bulletin de la Société Géologique de France. T. 2, 1831 a 1832. Paris: Au Lieu des Séances de La Société, p. 32-38, [1832]. Em 1835, Prévost publicou uma memória sobre a ilha (Prévost, 1835).
7 Para o relato de Walter Scott, ver Gerkens (2021, 2022, p. 90-91). Alexander von Humboldt (1769-1859) também mencionou a ilha no segundo tomo de sua obra Cosmos (Humboldt, 1875, tomo II, p. 40, p. 202).
8 Giornale del regno delle due Sicilie, 26 de outubro de 1831.
9 Para uma análise da iconografia da ilha, ver Pecoraro (2018).
10 New Volcanic Island. Elevated by submarine eruption, on the South West coast of Sicily. First observed July 12th. 1831. On Stone by L. Haghe / Published by Ackermann. Litografia colorida à mão, 1831. British Museum (Ii,3.121). O acervo possui uma duplicata, sem cor (1871,0812.5325).
11 Giornale del regno delle due Sicilie, 10 de outubro de 1831.
12 Para um exemplo de outras possibilidades de interação de naturalistas com vulcões, ver Duarte (2006).
13 Giornale del Regno delle Due Sicilie, 22 de setembro de 1831.
14 Giornale del Regno delle Due Sicilie, 23 de setembro de 1831.
15 A imperatriz Teresa Cristina, esposa de D. Pedro II, era irmã de Ferdinando II, o rei das Duas Sicílias que lutou pela ilha. Ela tinha nove anos quando Ferdinandea emergiu no Mediterrâneo. O casal imperial fez uma excursão ao Vesúvio em 1888, na sua terceira viagem ao exterior, e a visita foi acompanhada pelos jornais no Rio de Janeiro. Em breve, o Vesúvio retornaria às páginas dos jornais com a tristemente famosa morte do jovem líder republicano Silva Jardim na cratera do vulcão, em 1891 (Almeida, 2017). Sobre os estreitos laços entre Nápoles e o Rio, ver Raponi, Knauss e Capobianco (2023). Sobre o Vesúvio na imprensa do século XVIII, ver Mercier-Faivre (2013) e, para o interesse que despertou ao longo do século XIX, ver Pyle (2017) e Cocco (2013).
16 Jornal do Commercio, 30 de dezembro de 1831, p. 2 e 3.
17 Jornal do Commercio, 30 de janeiro de 1832, p. 1.
18 A Verdade, Jornal Miscellanico, 3 de março de 1832, p. 16.
19 A Verdade, Jornal Miscellanico, 5 de março de 1832, p. 72.
20 A produção sobre o tema é extensa, ver referências em Vergara (2020) e em Fonseca (2018).
21 Jornal do Commercio, 3 de novembro de 1839, p. 1.
22 Sobre a difusão da imprensa francesa no Rio de Janeiro e a complexa circulação de textos e imagens entre Paris, Rio de Janeiro e Lisboa, ver Guimarães (2016), Neves (2013) e Luca (2018).
23 Le Monde Ilustré, 20 de agosto de 1864, p. 123-4.
24 Revista da Semana, 19 de agosto de 1939, p. 9.
25 Para uma análise do gênero narrativo dos almanaques, ver Dutra (2023).

Author notes

Editor responsável: Ely Bergo de Carvalho


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