RESUMO
Objetivo: Verificar os hábitos e atitudes de jovens em idade escolar com relação ao uso de estéreos pessoais e avaliar o nível de conhecimento sobre os efeitos nocivos da exposição à música amplificada na audição, antes e após uma palestra educativa.
Métodos: Participaram 58 estudantes do ensino fundamental e médio, entre 10 e 17 anos de idade. Foi realizada palestra educativa, mediante aula expositiva dialogada, utilizando recursos audiovisuais. Para avaliação foram aplicados dois questionários no formato online, antes e após 15 dias da palestra. Realizou-se, também, análise descritiva.
Resultados: A maioria dos escolares relatou fazer uso de estéreos pessoais com fone de ouvido, acima da intensidade média do equipamento e por período inferior a três horas diárias. A queixa mais frequente foi o zumbido. Após a palestra educativa, houve diferença no conhecimento sobre o conceito de perda auditiva e de que música em intensidade elevada, em momentos de lazer, pode causar perda auditiva. Também houve diferença na intensidade utilizada para ouvir música com fone de ouvido, que foi reduzida.
Conclusão: Grande parte dos escolares possuía conhecimento prévio a respeito dos prejuízos da música amplificada, para a audição e, ainda assim, alguns referiram hábitos inadequados. A palestra educativa revelou mudanças significativas em apenas alguns aspectos investigados, evidenciando a necessidade de estruturar ações contínuas na prevenção de perdas auditivas nessa população. A inclusão da escola e da família nas ações educativas e a continuidade dessas ações são fundamentais para mudanças efetivas de hábitos e atitudes das crianças e adolescentes.
Palavras chave: Perda auditiva provocada por ruído, Criança, Adolescente, Educação em saúde, Serviços de saúde para estudantes.
ABSTRACT
Purpose: To verify the habits and attitudes of school-age youths regarding the use of personal music players, and assess their knowledge level about the harmful effects to the hearing of exposure to amplified music before and after an educational lecture.
Methods: A total of 58 elementary and middle school students aged 10 to 17 years participated in the study. We presented an educational lecture using an expository dialogue format with audiovisual resources. To evaluate the students, we applied two online questionnaires before and 15 days after the lecture. Descriptive analysis was also performed.
Results: Most students reported using personal music players with earphones above the mean intensity of the equipment and for fewer than 3 hours a day. The most frequent complaint was tinnitus. After the educational lecture, there were differences in knowledge about the concept of hearing loss and the fact that high-intensity music in moments of leisure may cause hearing loss. There was also a difference in the intensity used to listen to music with earphones, which decreased.
Conclusion: Most students had prior knowledge of the harmful effect of amplified music on hearing and even then, some indicated inadequate habits. The educational lecture showed significant changes in only some of the aspects investigated, reflecting a need to structure continuous actions towards hearing loss prevention in this population. The inclusion of the school and the family in educational actions and the continuity of these actions are fundamental to effective changes in habits and attitudes among children and adolescents.
Keywords: Hearing loss, Noise-induced, Child, Adolescent, Health education, Student health services.
Artigo original
Prevenção da perda auditiva no contexto escolar frente ao ruído de lazer
Prevention in a school environment of hearing loss due to leisure noise
Recepção: 11 Novembro 2015
Aprovação: 18 Fevereiro 2016
A perda auditiva na população jovem, decorrente de atividades de lazer com ruído elevado, vem crescendo substancialmente(1,2,3), causando preocupação entre os pesquisadores(3,4,5,6,7,8). A exposição a níveis de pressão sonora elevados, em atividades de lazer, tem colocado em risco a audição de jovens em todo mundo. Aproximadamente a metade de todos os adolescentes e jovens adultos (12 a 35 anos de idade), em países de média e alta renda, faz uso de dispositivos sonoros pessoais e, 40% desses, estão expostos a níveis sonoros potencialmente prejudiciais, em clubes, discotecas e bares(9). Nesses locais, o abuso frente à exposição à música amplificada é comum. Sabe-se que os níveis de pressão sonora ultrapassaram 104-112 dB(A)(10), e em dosimetria realizada em disc jockeys (DJs), observou-se exposição de 93.2 a 109.7 dB(A)(11).
Atualmente, os estéreos pessoais permitem a reprodução e gravação de sons digitais, podendo atingir fortes intensidades, sem distorção. Quando emitidos por meio de fones de inserção, alcançam níveis de 85 a 115 dB(A) e, em casos extremos, até 120 dB(A)(1). Além do nível da intensidade sonora, outros fatores de risco para a audição seriam a duração da exposição ao ruído e o ambiente de uso desses estéreos, uma vez que a tendência é aumentar o volume quanto maior o ruído competitivo(1).
Um documento publicado pela European Commission - Health & Consumer Protection DG/2008 (Regulamentação do Ruído no Trabalho da Comunidade Européia - Directive 2003/10/EC, que entrou em vigor em 2006) fez referência ao limite de exposição ao ruído de lazer, que pode ser, igualmente, considerado ao de exposição ao ruído no ambiente de trabalho (equivalente a 80 dB (A), para um dia de oito horas de trabalho e cinco dias ou 40 horas de trabalho na semana).
Tal comparação, entre o limite de exposição ao ruído no trabalho e no lazer, visa à prevenção de perdas auditivas relacionadas às atividades de entretenimento, uma vez que não existe uma regulamentação para esse fim. A partir desta perspectiva, ao considerar a média de utilização de estéreos pessoais de sete horas por semana (uma hora/dia), esta média excederá a recomendação proposta na Regulamentação do Ruído no Trabalho, se o nível sonoro ultrapassar a 89 dB (A)(1).
O nível de pressão sonora dos estéreos pessoais portáteis - com o controle de volume no máximo -, medido por meio do sistema de Kemar, varia em torno de 80 - 115 dB (A) em diferentes dispositivos(1).
Estudos anteriores reportaram correlação direta entre longos períodos, tanto diários, quanto em anos, de exposição ao ruído e intensidades elevadas com a presença de sintomas auditivos(5,7,12), sendo o zumbido o sintoma de maior prevalência(5,7).
O ruído em excesso pode aumentar o risco de perda auditiva, que pode ser temporária ou permanente, e de ocorrência de zumbido. A exposição ao ruído excessivo pode causar danos severos nas células cíliadas da orelha interna, mas as mais afetadas são as células cíliadas externas(1,13). O zumbido é um dos principais sintomas relatados pela população jovem, após a exposição excessiva ao ruído(5,7,8).
Em estudos recentes, pesquisadores mostraram que perdas auditivas temporárias podem causar imediato e irreversível dano às fibras do nervo auditivo. Esses danos podem não afetar a detecção de sons, ou seja, a audição pode apresentar-se normal, em relação aos limiares audiométricos, mas pode dificultar a capacidade em processar sinais mais complexos. De acordo com um estudo(13), essa condição é denominada perda auditiva oculta, já que os limiares auditivos se apresentam dentro da normalidade, ocultando, assim, o dano no nervo auditivo. A perda auditiva oculta também pode causar outras queixas auditivas, como o zumbido e a hiperacusia, sugerindo dano no nervo auditivo(13).
Os jovens vêm apresentando atitudes inadequadas quantos aos estéreos portáteis, em relação à duração do uso e ao volume, excedendo uma hora/dia e utilizando em forte intensidade, causando, assim, riscos à audição(3,7,14,15). A maior parte dessa população não apresenta conhecimento sobre os danos na audição, que podem ocorrer devido à exposição excessiva ao ruído(2,4). As consequências que essa exposição pode acarretar são, desde apenas um transtorno temporário, como futura alteração permanente na audição(1,13).
A perda auditiva induzida pelo ruído ainda é considerada um importante problema de saúde e social(1,16), que justifica o desenvolvimento e implantação de estratégias para prevenção e intervenção. Preocupados com a exposição dos jovens ao ruído nocivo à audição, pesquisadores vêm desenvolvendo diferentes programas educacionais em sala de aula, gerando maior conhecimento sobre os danos ocasionados pela exposição excessiva ao ruído, bem como sobre a necessidade da utilização de protetores auditivos. A efetividade de tais programas foi comprovada por meio da aplicação de questionários pré e pós-intervenção, constatando mudanças no comportamento e nas atitudes dos adolescentes, em relação aos hábitos auditivos(3,4,5,6,7).
Nesta perspectiva, quanto mais precocemente se iniciar a conscientização das crianças a respeito dos riscos à audição causados pelo ruído elevado, por meio de campanhas e programas educativos na idade escolar primária, mais efetividade será observada sobre conhecimento, atitudes e intenções dos adolescentes quanto à prevenção da perda auditiva, evitando-se, assim, comportamentos habituais de riscos(5,14,15).
A participação dos profissionais da saúde e dos professores é fundamental nesse processo, para promover a reflexão sobre o tema e modificar comportamentos dos escolares, bem como para incentivar o envolvimento efetivo dos pais, partes essenciais para o sucesso dos programas de prevenção auditiva(15,17).
Este trabalho teve como objetivo verificar os hábitos e atitudes de jovens em idade escolar com relação ao uso de estéreos pessoais e avaliar o nível de conhecimento sobre os efeitos nocivos da exposição à música amplificada na audição, antes e após uma palestra educativa.
Este estudo foi desenvolvido em uma escola da rede pública da cidade de Bauru (SP), tendo sido aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Odontologia de Bauru, Universidade de São Paulo (USP), sob número CAAE 40993314.0.0000.5417. Os responsáveis pelos menores envolvidos assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), atestando sua permissão para a participação do menor e para a publicação dos dados obtidos, garantido o anonimato e a liberdade de retirar seu consentimento a qualquer momento. Os participantes da pesquisa também receberam esclarecimentos sobre os procedimentos e foram convidados a preencher um termo de assentimento online, em que selecionaram o item “concordo em participar”, caso houvesse interesse.
O convite para participar da pesquisa foi feito em duas salas do ensino fundamental (6º e 7º ano) e três salas do ensino médio (2º colegial), quando foram entregues 119 TCLE. A seleção das salas foi realizada de forma aleatória. Apenas 66 alunos participaram de todas as etapas da pesquisa - palestra educativa e questionário pré e pós palestra - sendo a maioria (53,03%) do ensino fundamental e 46,97% do ensino médio. No entanto, apenas 58 foram selecionados para análise (60,35% do ensino fundamental e 39,65% do ensino médio), uma vez que o TCLE assinado pelo responsável não foi devolvido por todos os participantes e um aluno não pôde participar, devido à não autorização do responsável.
Sendo assim, participaram 58 alunos, de ambos os gêneros (56,9% masculino e 43,1% feminino), crianças e adolescentes, com idade entre 10 e 17 anos (média de idade 13,1 anos; DP ± 2,2), usuários ou não de estéreos pessoais, estudantes do ensino fundamental e médio. Os escolares foram selecionados mediante disponibilidade e interesse em participar do estudo.
- Estudante regularmente matriculado no ensino fundamental ou médio;
- Entrega do TCLE assinado pelo responsável;
- Aceite do termo de assentimento;
- Participação em todas as etapas da pesquisa.
Os alunos foram convidados a responder um questionário (Anexo 1), antes e após 15 dias da palestra educativa, composto por questões fechadas, que investigaram o conhecimento, hábitos e atitudes a respeito da exposição à música em intensidade elevada. O questionário foi elaborado pelos autores e estruturado por meio da ferramenta online Google Docs®, totalmente gratuita, que gerou um formulário (http://goo.gl/forms/ll5S2BcHgy). O formulário foi assim constituído: 1) Termo de assentimento aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa; 2) Ficha de identificação; 3) Questionário. A escola forneceu sala equipada com computadores para aplicação do questionário online.
A palestra educativa ocorreu na forma de aula expositiva dialogada, com duração de uma hora, em uma sala de aula disponibilizada pela coordenação da escola. Foram utilizados recursos audiovisuais, como informações escritas, imagens e vídeos, abordando aspectos da audição e possíveis prejuízos causados pela exposição à música amplificada, enfatizando o uso de estéreos pessoais. Ocorreu em dois momentos: inicialmente para alunos do ensino fundamental e, posteriormente, para alunos do ensino médio.
A estatística descritiva determinou a média, desvio padrão e frequência de ocorrência das respostas. Foram aplicados o Teste de Wilcoxon, para comparação dos resultados pré e pós-palestra, relacionados ao escore do volume utilizado ao escutar música com fone de ouvido e o Teste de McNemar, que verificou a significância de mudanças das respostas dos escolares nos questionários pré e pós-palestra. Foram considerados significativos os resultados que apresentaram valor de p≤0,05.
Houve participação reduzida dos alunos do ensino médio em todas as etapas da pesquisa. Assim, a maior parte da amostra (60,3%) foi composta por alunos do ensino fundamental.
Os escolares foram questionados a respeito de queixas que poderiam estar relacionadas à exposição à música em intensidade elevada, podendo ser indicada mais de uma queixa. A maioria (60,3%) apresentou, ao menos, uma queixa, sendo o zumbido a mais frequente (31%) (Tabela 1).
Houve diferença em relação ao conhecimento sobre o conceito de perda auditiva após a palestra educativa, assim como no que se refere ao conhecimento de que música em intensidade elevada em momentos de lazer, como em shows e casas noturnas, pode causar perda auditiva. Nas outras questões, observou-se que alguns escolares adquiriram conhecimento a respeito do assunto. No entanto, não houve diferença na comparação entre os questionários pré e pós-palestra (Tabela 2).
Notou-se que, tanto no questionário pré-palestra, como no pós-palestra, a maioria relatou fazer uso de estéreos pessoais acima da intensidade média do equipamento e por período inferior a três horas diárias (Tabela 3). Houve diferença (p≤0,05) entre o questionário pré e pós-palestra na questão relacionada à intensidade utilizada para ouvir música com o fone de ouvido. Dentre a maioria que fazia uso acima da intensidade média, 31% e 29,3% (pré e pós-palestra, respectivamente) relataram utilizar o equipamento na intensidade máxima.
A redução no número de horas diárias de uso de estéreos com fone de ouvido foi observada após a palestra, porém, não foi significativa.
A preferência dos escolares foi pelo fone de ouvido do tipo inserção (72,4% pré-palestra e 70,07% pós-palestra). Observou-se, ainda, que, em ambos os questionários, 1,7% da amostra referiu não fazer uso de fone de ouvido em estéreos pessoais para ouvir música.
Os resultados deste estudo evidenciaram que se a população de jovens em idade escolar continuar com determinados comportamentos inadequados diante da exposição à música amplificada, há possibilidade de desenvolver algum prejuízo auditivo.
Estudos anteriores apontaram o zumbido como sendo a queixa relatada com maior frequência entre crianças e adolescentes, podendo ser um indicador de risco relacionado à exposição sonora(5,8). Tal achado é semelhante ao encontrado neste estudo, em que a maioria dos adolescentes apresentou uma ou mais queixas, sendo o zumbido a mais referida (Tabela 1). O zumbido pode ocorrer de forma isolada, sem a necessidade da presença de perda auditiva(18). Tal fato pode contribuir para a despreocupação dos jovens, uma vez que apenas o zumbido, de forma isolada, pode, erroneamente, não aparentar riscos consideráveis à saúde auditiva.
Grande parte dos adolescentes apresentou conhecimento prévio a respeito dos efeitos nocivos da música em intensidade elevada para a audição. No entanto, esse conhecimento não provocou mudanças nas atitudes desses jovens, com relação à exposição à música amplificada, uma vez que continuavam com hábitos e atitudes inadequados (Tabela 2), achado semelhante aos de estudos anteriores(8,12,14,15). Em outro estudo(19), a maioria dos estudantes afirmou ter conhecimento de que o ruído em intensidade elevada pode causar perda auditiva, porém, uma pequena parte revelou que não sabe como proteger a audição, ou não se preocupa com a prevenção quanto aos efeitos da exposição à música em intensidade elevada.
A maior parte dos jovens da amostra referiu utilizar fone de ouvido para escutar música (Tabela 3), confirmando os achados da literatura(3,5,8,14,15), destacando-se, apenas, um único escolar que não fazia uso do fone de ouvido. Os estéreos pessoais, por serem portáteis, são equipamentos favoráveis para o uso no dia a dia(12) e a música, por ser considerada um som agradável, é vista como incapaz de causar danos ao indivíduo(20). No entanto, o hábito de ouvir música torna-se um risco à saúde auditiva quando ocorre em intensidade elevada e por longo período de tempo(1), podendo causar danos irreversíveis à audição. Ao considerar o universo de 58 estudantes, dentre os quais apenas um não tinha o hábito de utilizar fone de ouvido, concluímos que intervenções relacionadas à prevenção de perdas auditivas adquiridas por exposição à música em níveis de pressão sonora elevados, são recomendadas.
Frequentemente, é possível escutar a música que está sendo tocada no estéreo pessoal do indivíduo que usa fones de ouvido, isto porque está cada vez mais comum, entre os jovens, a utilização do volume máximo do equipamento. Os resultados do presente estudo mostraram que a maioria fazia uso acima da intensidade média do equipamento (Tabela 3), concordando com outros estudos(7,14,15). Entretanto, após a palestra educativa, foi possível notar mudança significativa no hábito de alguns adolescentes (Tabela 3), os quais, mesmo não sendo a maioria, passaram a ter, como limite, a intensidade média do equipamento. Atitudes inadequadas relacionadas à saúde auditiva e consequências do ruído podem ser causadas pela falta de informação e ausência de atividades educativas interessantes para essa população, dentre outros motivos(21).
Os achados mostraram que a maioria dos adolescentes permanecia exposta à música em intensidade elevada, utilizando fone de ouvido, por período inferior a três horas diárias (Tabela 3), fato este também encontrado em outras pesquisas(3,7), Contudo, em função da intensidade elevada, esses escolares podem adquirir uma perda auditiva.
Outro aspecto importante a ser considerado é o tipo do fone de ouvido, pois, dependendo do modelo, pode favorecer a potencialização do equipamento, acrescentando de 7 a 9 dB no nível de intensidade(1). Entretanto, foi relatado em um estudo(22) que o tipo do fone de ouvido não afetou os níveis de saída, achado atribuído ao método de mensuração. No presente estudo foi observado que a maioria dos adolescentes utilizava fone de inserção, assim como em pesquisas anteriores(1,7,12,22).
Os achados evidenciaram a importância de ações educativas/preventivas para auxiliar na conscientização dos adolescentes diante da exposição à música em intensidade elevada, assim como sugere a literatura(2,8,14,15,19,21,23).
Algumas iniciativas já foram desenvolvidas com o propósito de promoção e proteção da saúde auditiva em escolares. No Brasil, as ações educativas realizadas em escolas e divulgadas como produção de conhecimento são restritas(21,23,24,25,26). Dentre elas, destaca-se o “Projeto Jovem Doutor”, com enfoque na saúde auditiva(24) e que desenvolve um programa de capacitação por meio de teleducação interativa, composto por atividade presencial, utilizando-se recursos audiovisuais e animações icnográficas 3D do CD-ROM/Homem Virtual da Audição(27), tutorial online (Cybertutor) e atividades práticas, como oficina, dinâmica de grupo e multiplicação do conhecimento, gerando oportunidade para que o adolescente possa transmitir o conhecimento para outras pessoas.
Nos Estados Unidos, pesquisadores(4) investigaram a efetividade de uma campanha de prevenção governamental para adolescentes. A campanha ocorreu com base na teoria do comportamento planejado para orientação e mudança de hábitos. Os autores acreditam que a repetição de campanhas de prevenção para adolescentes estabelecerá atitudes adequadas em relação à exposição ao ruído. Em outro estudo(6), foi elaborado um programa piloto – Cheers for Ears – capaz de fornecer aos pré-adolescentes melhoria no conhecimento a respeito do impacto do ruído na audição e no respectivo hábito dos alunos do ensino primário. O programa incluiu atividades multimodais de natureza educacional e interativa, apropriadas para a idade dos alunos, assim como uma avaliação, por meio de questionário em longo prazo, na qual foi observado que as mudanças relacionadas ao conhecimento da audição e ao hábito dos alunos frente à exposição ao ruído foram estáveis e sustentadas por até três meses, após a intervenção.
O programa Dangerous Decibels®, desenvolvido no final da década de 90, nos Estados Unidos, é uma campanha de saúde pública, voltada a crianças e adolescentes, com o objetivo de reduzir, significativamente, a prevalência de perda auditiva e zumbido provocados pela exposição a sons intensos. Utiliza estratégias interativas, elaboradas para o público infantil e adolescente, sobre os efeitos dos sons em intensidade elevada, na audição. Em 2015 a Academia Brasileira de Audiologia (ABA) passou a integrar a rede de parcerias do programa(28). Autores de um estudo(26) verificaram a eficácia de uma versão brasileira do Dangerous Decibels em crianças do 3º ao 5º ano do ensino fundamental e concluíram que programas de conservação auditiva, como Dangerous Decibels, são eficazes na melhoria do conhecimento, atitudes e comportamentos relacionados à exposição a sons potencialmente perigosos.
A Organização Mundial de Saúde(9) publicou um catálogo informativo, elaborado com participação de pesquisadores, enfocando todos os aspectos relacionados à perda auditiva por exposição excessiva ao ruído em situações de lazer. Esse catálogo é útil para que o indivíduo possa adquirir conhecimento sobre a perda auditiva e saber como realizar a proteção da audição, em relação a sons de forte intensidade, durante atividades de recreação.
É importante que os materiais e procedimentos a serem utilizados nas ações educativas sejam cuidadosamente elaborados, de modo que as informações necessárias para a promoção da saúde auditiva e a prevenção de problemas relacionados a mesma, sejam fornecidas por meio de recursos que abranjam as preferências da respectiva faixa etária, despertando o interesse a respeito do tema e fazendo com que os indivíduos participem, de forma ativa, da ação proposta. Acredita-se que a participação ativa dos adolescentes poderá alcançar o sucesso da ação, colaborando, assim, para a formação da consciência crítica e consequente mudança de hábitos e atitudes inadequados frente à música em intensidade elevada.
Um estudo sugere(29), para crianças do ensino fundamental, ações educativas lúdicas, como fantoches, teatro, cartilhas, confecções de cartazes e outras atividades que possam ser compartilhadas com os demais alunos, família e comunidade. Para adolescentes do ensino médio, são propostas oficinas, com enfoque nos interesses do grupo, preferencialmente por meio de atividades práticas, gerando reflexões a respeito dos prejuízos que a exposição ao ruído pode ocasionar na saúde e na qualidade de vida.
Recomenda-se que as ações educativas voltadas à preservação auditiva sejam integradas por profissionais da saúde, escola e pais dos escolares(15,17). Os profissionais da saúde devem assumir o papel de mediadores, promovendo conhecimento sobre a saúde auditiva para os escolares, assim como para os pais e para a escola, pois estes podem contribuir para a eficácia da ação.
A participação da escola é fundamental nesse processo(12,15), podendo proporcionar diversas medidas de intervenção no decorrer da formação do aluno, pois é a segunda maior influência na formação de todo ser humano, depois da família(19). Entretanto, a escola é o meio de informação que pouco contribui para a construção do conhecimento sobre os prejuízos causados pelo ruído(12,19). A implementação de programas educativos possibilitaria a utilização de algumas disciplinas para que o professor pudesse desenvolver estratégias de promoção da saúde auditiva, de modo a dar continuidade às ações educativas, durante o ano letivo(29).
A continuidade da intervenção no ambiente familiar é relevante, mediante o apoio dos pais para auxiliar na manutenção de hábitos mais saudáveis, relacionados à exposição à música em intensidade elevada. Em estudo realizado(17), os resultados mostraram que um número pequeno de pais acredita que seus filhos estejam em risco para adquirirem perda auditiva e, portanto, há pouca cobrança desses pais quanto à proteção auditiva dos filhos. Além disso, a maior parte dos pais possui pouco conhecimento sobre o perigo que a exposição ao ruído pode gerar nos adolescentes, sendo necessário aperfeiçoar o entendimento a respeito do tema a fim de criar programas eficazes de conservação auditiva. Assim, a participação dos pais nas intervenções do comportamento pode ser a parte fundamental para o sucesso dos programas(14,15,17).
Foi observado, no presente estudo, um interesse maior dos escolares mais novos (ensino fundamental) em participarem de todas as etapas da pesquisa, quando comparados aos mais velhos (ensino médio). Dentre alguns comportamentos, destaca-se: parte dos alunos do ensino médio abandonou o local da palestra antes de seu término e não devolveram o TCLE assinado pelos responsáveis. Ressalta-se que o número de alunos do ensino médio convidados a participar do estudo foi maior do que do ensino fundamental e, por não obedecerem a todos os critérios de inclusão, constituíram a minoria da casuística deste estudo.
A partir destas constatações, considera-se importante ressaltar um aspecto do desenvolvimento cognitivo-afetivo da criança, que determina o comportamento nas diferentes fases do seu desenvolvimento: a mudança das relações interpessoais da criança, como da dependência afetiva (busca pela aceitação, aprovação e afeição, normalmente dos pais) para a maior independência e autonomia, observada como parte do desenvolvimento na passagem da criança para a adolescência, faz com que os pais não tenham mais tanta influência nas decisões dos filhos, como em idades anteriores(30). Assim, acredita-se que as ações educativas deveriam ter início nos primeiros anos escolares do ensino fundamental, uma vez que, nesse período, a criança com desenvolvimento típico não se opõe às regras sociais, educacionais e/ou familiares, o que torna a conscientização dos riscos à saúde e manutenção de hábitos saudáveis uma ação de êxito.
Como fator limitador da casuística deste estudo, ressalta-se a baixa adesão dos pais ao TCLE (Resolução CNS 466/12). Observou-se a devolução de apenas metade dos termos entregues para a assinatura do responsável. Não foi possível constatar se o documento foi entregue aos pais e estes não tiveram interesse em assinar, ou se nem mesmo foi entregue aos pais, pelos escolares. É extremamente importante que tal constatação seja considerada no delineamento de pesquisas futuras, uma vez que deverão ser previstas ações para esclarecer e sensibilizar os escolares e seus responsáveis sobre o propósito do TCLE.
Outra limitação do estudo foi a realização de uma única intervenção, visto que ações sistemáticas e contínuas são reportadas como fundamentais para o sucesso dos programas de prevenção de perdas auditivas.
Grande parte dos escolares possuía conhecimento prévio a respeito dos prejuízos da música em intensidade elevada, para a audição e, ainda assim, alguns referiram hábitos inadequados.
A palestra educativa revelou mudanças significativas em apenas alguns aspectos investigados, evidenciando a necessidade de estruturar ações contínuas junto à população alvo, visando a prevenção de perdas auditivas, principalmente ao considerar escolares na fase da adolescência. A inclusão da escola e da família nas ações educativas e a continuidade dessas ações são fundamentais para mudanças efetivas de hábitos e atitudes das crianças e adolescentes.
Ficha de identificação
Nome completo:
Idade:
Série: ( ) 6º ano ( ) 7º ano ( ) 2º colegial
1. Você usa estéreos pessoais (MP3, MP4, celular) com fone de ouvido para ouvir música?
( ) Sim ( ) Não
2. Na escala abaixo, marque em qual intensidade você normalmente escuta música em seu estéreo pessoal, sendo 1 o volume muito fraco (baixo) e 10 o volume muito forte (alto):
Volume muito fraco (baixo) 1__________________________________10 Volume muito forte (alto)
3. Quantas horas por dia você escuta música em seu aparelho?
( ) Menos de 3 horas ( ) Mais de 3 horas
4. Qual o tipo de fone de ouvido que você mais usa?
( ) Coloca dentro do ouvido (fone de inserção) ( ) Fica fora da orelha (fone supra aural)
5. Depois de escutar música com o fone de ouvido você já percebeu algum desses sintomas?
( ) Zumbido (barulho dentro da orelha) ( ) Dor ( ) Tontura ( ) Diminuição da audição
( ) Sensação de ouvido tapado ( ) Nenhum sintoma ( ) Outro:
6. Você sabe o que é perda auditiva?
( ) Sim ( ) Não
7. Você acredita que ruídos ou barulhos muito fortes (altos) podem causar prejuízos na audição?
( ) Sim ( ) Não
8. Você acha que ouvir som forte (alto) ou estar em ambientes com muito barulho, como shows e baladas, pode causar perda de audição?
( ) Sim ( ) Não ( ) Não sei
9. Você acha que ouvir música alta/forte com fone de ouvido em celular, MP3, MP4, pode causar algum prejuízo para a audição?
( ) Sim ( ) Não ( ) Não sei
Aos alunos do programa de Pré-Iniciação Científica da Universidade de São Paulo (USP), Layla Beatriz de Souza Silva e Fellipe Augusto Narcizo, à equipe de direção e professores da Escola Estadual Ernesto Monte de Bauru, que contribuíram para a realização deste trabalho.
*Autor correspondente: Lilian Cássia Bornia Jacob-Corteletti. E-mail: lilianjacob@fob.usp.br