Resumo: Este artigo descreve a noção de palavras, morfemas e sintagmas em Kubeo, avaliando criticamente o status de partículas. Após uma abordagem que aponta as dificuldades analíticas para se definir as fronteiras entre palavras e sintagmas na língua, bem como os diferentes critérios usados para diferenciar tipos de palavras e tipos de morfemas sob um ponto de vista estrutural, funcional e fonológico, estudamos as partículas como uma classe de palavras cuja função principal é a de marcadores pragmáticos. Partículas não são assumidas a priori, mas emergem como resultado de um percurso metodológico, que questiona a necessidade dessa categoria descritiva, cuidadosamente delimitando-a e diferenciando-a de outras classes de morfemas.
Palavras-chave: PartículaPartícula,PalavraPalavra,MorfemaMorfema,SintagmaSintagma,KubeoKubeo.
Abstract: This article describes the definition of words, morphemes, and phrases in Kubeo, with a critical assessment of particle status. After initially pointing out the methodological difficulties of defining boundaries between words and phrases in this language (as well as the different criteria for differentiating word and morpheme types from structural, functional, and phonological points of view), we approach particles as a class of words which mainly act as pragmatic markers. This understanding is not assumed a priori, but rather is the result of a methodological trajectory which questions the necessity of this descriptive category, carefully demarcating it and differentiating it from other classes of morphemes.
Keywords: Particle, Word, Morpheme, Phrase, Kubeo.
DOSSIÊ PARTÍCULAS
O lugar das partículas entre palavras, morfemas e sintagmas em Kubeo
The place of particles among words, morphemes, and phrases in Kubeo
Recepção: 27 Fevereiro 2019
Aprovação: 10 Setembro 2019
Este artigo descreve a noção de palavras, morfemas e sintagmas em Kubeo, avaliando criticamente o status de partículas1.
A noção recorrente do que são partículas possui, em geral, as seguintes características2.: (1) palavra que não possui uma categoria sintática ou que não se encaixa prontamente em uma categoria sintática padrão; (2) invariável; (3) pequeno tamanho fonológico; (4) fonologicamente e/ou morfossintaticamente dependente; (5) semântica de natureza gramatical ou discursiva.
Como vemos, na definição sobre o que são partículas, convergem diferentes conceitos e propriedades que pretendo tornar mais explícitos e independentes neste artigo. Primeiramente, faço a distinção entre propriedades gramaticais, fonológicas e ortográficas do que são palavras (cf. Dixon, 2009). Com relação às propriedades gramaticais de uma palavra, elaboramos as seguintes distinções (expandindo a proposta de Hengeveld; Mackenzie, 2008): (i) tipo de morfemas – ou seja, suas propriedades formais como afixos, raízes e clíticos; (ii) classe de morfemas – ou seja, as propriedades funcionais de um dado morfema na construção semântica e gramatical de uma palavra ou sintagma (incluindo seu papel como morfema lexical ou funcional na formação de classes de palavras como nomes, verbos, adjetivos).
Seguindo a visão estruturalista (cf. Benveniste, 1966, capítulo 3), a palavra é uma unidade linguística igual ou menor do que o sintagma e igual ou maior do que o morfema. Morfologicamente, uma palavra em Kubeo pode ser formada por apenas um morfema (palavra monomorfêmica) ou por mais de um morfema (palavra plurimorfêmica). O Quadro 1 mostra os tipos de palavras morfológicas em Kubeo.
Os exemplos abaixo ilustram os tipos de palavras do Quadro 13. Cada tipo morfológico de palavra está entre colchetes (usaremos colchetes por todo o trabalho para destacar os exemplos), e cada palavra corresponde a um sintagma na função de sujeito4.
As definições dos tipos de palavras morfológicas estabelecidas pelo Quadro 1 requerem uma definição independente dos tipos de morfemas que compõem as palavras. Isso será feito, sobretudo, nas seções “Raízes versus demais tipos de morfemas” e “Afixos e clíticos”. Por outro lado, podemos definir o que é a palavra a partir de evidências independentes da sintaxe (conforme discutido em seguida) e indiretas da ortografia e da fonologia (ver as seções “Palavra ortográfica” e “Palavra fonológica”).
A separação entre morfologia e sintaxe em Kubeo pode ser expressa a partir de um encadeamento de estruturas distintas que formam uma espécie de gradação, baseada (i) na liberdade no ordenamento de constituintes e (ii) no número máximo de elementos integrantes. Vejamos a comparação de diferentes tipos de construções no Quadro 2:
Em um extremo, temos a sintaxe da oração onde a ordem de constituintes é praticamente livre e o número de palavras é irrestrito. Vejamos, por exemplo, a oração em (2), onde cada palavra se encontra separada por colchetes:
Em (2), os sintagmas mínimos são formados por uma única palavra morfológica. No domínio da palavra, não pode haver alteração na ordem dos morfemas, nem a ligação entre os morfemas pode ser interrompida por uma outra palavra. No domínio da oração, qualquer alteração na ordem dos constituintes é permitida, e a ligação entre dois sintagmas também pode ser interrompida por uma palavra ou sintagma independente5.
A ordem dos constituintes em sintagmas menores do que a oração tende a ser menos livre. De um lado, temos sintagmas compostos em que a ordem é mais livre e o número de constituintes é ilimitado. De outro lado, a estrutura de um sintagma simples é muito similar a de uma palavra composta: ambos possuem uma ordem rígida, com no máximo duas raízes e as mesmas propriedades fonológicas6. Vejamos o exemplo (3) para um sintagma nominal (SN) simples e (4) para um sintagma complexo:
Analisamos (3) como um sintagma (e não uma palavra composta) devido à relação funcional que o numeral estabelece com o nome. Primeiramente, na posição do numeral poderia ocorrer uma raiz lexical de outra categoria, como um demonstrativo ou um adjetivo, conforme será discutido a seguir. Semanticamente, o numeral é um operador cardinal sobre o referente do nome, enquanto em uma palavra composta os elementos modificadores têm escopo atributivo não sobre o referente nominal, mas sim sobre o conceito nominal.
O contraste entre palavra composta e sintagma fica ainda mais claro nos exemplos (5) e (6). Em (5), o adjetivo modifica o conceito nominal em uma palavra composta, a qual é, por sua vez, correferente a um demonstrativo; em (6), o adjetivo predica sobre o referente nominal formado pelo sintagma composto ‘demonstrativo & nome’. Notemos, ainda, que há apenas um morfema de gênero flexionando a palavra composta em (5), enquanto tanto o adjetivo quanto o nome estão flexionados e concordando em (6). Em conjunto, estes fatos apontam para a interdependência morfológica de nome & adjetivo em (5) e a relação de modificação sintática em (6).
Quando o modificador é um adjetivo, notamos, ainda, um grau a mais de complexidade na relação gradual entre léxico, morfologia e sintaxe, pois, em palavras como ãi ñemi-kɨ, o adjetivo está lexicalizado junto ao nome, formando um novo nome. Vejamos o contraste entre (7a) e (7b), o primeiro sendo um caso de sintagma simples e o segundo de sintagma lexicalizado em um nome:
Em certos casos especiais, também encontramos um processo de lexicalização a partir do que seria originalmente um sintagma complexo. Isso ocorre sobretudo na onomástica de termos da fauna, como em (1f) e também em uma-ko hũa-ko (rã-f vermelho-f) ‘rã-vermelha (espécie de rã)/rã vermelha’. Nessa construção, teríamos duas leituras possíveis: uma como uma palavra composta, se referindo a uma espécie de rã (‘rã-vermelha’), a outra como um sintagma composto (‘rã que é vermelha’).
Vemos, então, que, sob um ponto de vista estrutural, existem construções que servem como modelo tanto para a formação de uma palavra quanto para a formação de um sintagma. Isso revela um continuum entre léxico, morfologia e sintaxe, evidenciando ainda mais a posição híbrida da palavra na interface entre os diferentes níveis da fonologia e da gramática, como propõe Benveniste (1966). Logo, critérios funcionais são fundamentais para nos ajudar a definir se certos morfemas entretêm uma relação sintática ou morfológica entre si, como vimos para a distinção entre palavras compostas e sintagmas (e como ainda veremos para afixos e clíticos).
A demarcação do domínio da palavra ortográfica que encontramos em Kubeo parece diferenciar a palavra morfológica simples das palavras mais complexas7. Os falantes Kubeo escrevem de maneira sem interrupção as construções formadas por raízes e afixos da palavra. Porém, encontramos variação no uso do espaço em branco entre raízes de palavras compostas, proclíticos, enclíticos e afixos frasais. O uso de hífen também ocorre em algumas palavras compostas. Na falta de um estudo quantitativo mais profundo sobre a palavra ortográfica em Kubeo, posso, no momento, oferecer as seguintes observações no Quadro 3:
As palavras a seguir contrastam minha segmentação morfológica com a variação no uso do espaço em branco e do hífen, conforme as imagens de escrita por falantes nativos de Kubeo. O exemplo (8a) mostra o proclítico i= ‘dêitico proximal’. Em (8b), temos o mesmo proclítico separado por espaço em branco. Ambas palavras foram escritas pelo mesmo falante. Em (9), mostramos exemplos de palavras compostas, também escritas pelo mesmo falante, em que encontramos raízes escritas justapostas, separadas por espaço em branco ou por hífen.
Três processos fonológicos em Kubeo possuem domínios prosódicos que se relacionam com constituintes morfossintáticos8: (1) ‘espraiamento nasal’ - ocorre internamente à palavra morfológica simples e diferencia afixos (alvos de nasalização) versus clíticos e raízes (que bloqueiam a nasalização); (2) ‘domínio acentual’ - se dá internamente à palavra morfológica simples e estendida, diferenciando afixos e clíticos versus raízes (cada raiz é um domínio acentual autônomo); (3) ‘espraiamento tonal’ - ocorre com unidades iguais ou menores do que o sintagma simples, diferenciando-os de sintagmas compostos.
Seguindo a proposta da fonologia prosódica (Nespor; Vogel, 1986), podemos indicar os seguintes domínios prosódicos em Kubeo e sua correlação com os tipos de constituintes morfossintáticos, conforme o Quadro 4:
Notemos que nenhuma das propriedades expostas no Quadro 4 se aplica ao sintagma composto, o qual pertence a um domínio prosódico superior da hierarquia prosódica: a frase entoacional.
Nesta seção, vamos discutir as diferentes classes e tipos de morfemas em Kubeo, isto é, suas propriedades estruturais e funcionais, respectivamente. Começamos com os tipos de morfemas raízes, suas diferentes classes e como se relacionam a afixos e clíticos. Estes últimos serão tópicos da seção “Afixos e clíticos”.
Sob um ponto de vista estrutural, os morfemas são passíveis de uma análise que nota sua posição como constituintes em uma visão linear da palavra, tomando as raízes como centro, conforme o template a seguir:
Toda raiz serve de base para concatenação de um afixo; toda palavra simples ou composta serve de hospedeiro para um clítico. Logo, afixos e clíticos são morfemas presos, no sentido de que não podem ocorrer sem uma base ou sem uma palavra. As raízes, por sua vez, dividem-se entre livres e presas. As raízes livres possuem a propriedade de formar autonomamente uma base morfológica, uma palavra e um sintagma, sem necessidade de um outro morfema.
As raízes presas necessitam de afixos ou raízes para formar uma palavra ou um sintagma autônomo. Os verbos, por exemplo, são raízes presas, sempre requerendo afixos flexionais para formar uma palavra verbal e funcionar como núcleo de um sintagma verbal (SV), ou morfemas derivacionais, para, então, atuarem em outras funções sintáticas.
Outros tipos de raízes são analisados como semilivres. É o caso dos adjetivos, advérbios, demonstrativos e quantificadores. Essas raízes podem formar uma palavra e um sintagma autônomo se estão flexionadas, mas podem também ser usadas sem afixos, desde que funcionem como modificadores em um sintagma simples – ver exemplos de (3) a (7), na seção “A palavra entre a morfologia e a sintaxe”.
O Kubeo possui quatro classes de raízes lexicais: nomes, verbos, adjetivos e advérbios. Existem também quatro classes de raízes funcionais: demonstrativos, pronomes, numerais e quantificadores. Ainda que uma estrita separação entre morfemas lexicais e morfemas gramaticais (ou funcionais) seja problemática, podemos dizer que morfemas como heme- ‘paca’, yawi ‘onça’, ã- ‘comer’, ɨra- ‘grande’ sejam lexicais: eles nomeiam entidades, coisas (concretas ou abstratas), estados, propriedades ou eventos, de modo que são a base do conteúdo proposicional das sentenças. Já os morfemas -ko ‘feminino’, -wa ‘plural animado’, -ame ‘3a pessoa masculino’, ani ‘aquele’ e kuina ‘um’ são funcionais: eles indicam propriedades semânticas mais abstratas, que servem para modificar o significado dos morfemas lexicais, formando subsistemas paradigmáticos nas gramáticas das línguas (e.g. número, gênero, pronomes, demonstrativos, numerais). Os afixos são definidos como uma classe de morfemas funcionais dependentes de certas classes de raízes. Uma classe especial de morfemas são os clíticos que, como veremos mais detidamente na seção “Afixos e clíticos”, possuem características funcionais ou lexicais.
Com base na distinção entre classe de morfema e classe de palavra, podemos analisar que nomes e verbos são classes abertas de morfemas e de palavras. Adjetivos e advérbios formam uma classe fechada de morfemas, mas uma classe aberta de palavras: o número de raízes que pertencem a essas classes é bastante limitado e não parece que a língua esteja criando novas raízes pertencentes a essa classe; por outro lado, são uma classe aberta de palavras, uma vez que é bastante produtiva, na língua, a derivação de lexemas para assumirem uma função morfossintática prototipicamente associada a adjetivos e advérbios.
Sob um ponto de vista morfológico, podemos dizer que, salvo a categoria de pessoa encontrada em pronomes, não existem, em Kubeo, morfemas ou traços flexionais específicos às classes fechadas de lexemas. Demonstrativos, numerais, advérbios e adjetivos, por exemplo, são flexionados com base em traços típicos da morfologia nominal.
Podemos propor uma divisão entre afixos e clíticos em seis tipos de morfemas, conforme sua posição na palavra: afixos da palavra (1 - prefixos, 2 - sufixos), clíticos da palavra (3 - proclíticos, 4 - enclíticos) e morfemas do sintagma (5 - afixos e 6 - enclíticos do sintagma)9. Afixos da palavra combinam-se apenas com raízes ou outros afixos em bases menores ou iguais à palavra. Proclíticos e enclíticos combinam-se com palavras, formando uma ‘palavra estendida’. Já os morfemas do sintagma combinam-se com sintagmas e não palavras.
Os exemplos em (10) ilustram a distinção de morfemas da palavra e morfemas do sintagma, destacando, em sublinhado, os morfemas do sintagma e, em cor vermelha, os afixos e clíticos da palavra. Enquanto os morfemas do sintagma têm escopo sobre mais de uma palavra, marcando o sintagma uma única vez, os afixos em (10a) são repetidos em cada palavra, marcando a concordância, enquanto em (10b) temos a repetição do proclítico em cada palavra e em (10c), a repetição de um enclítico.
Como vemos, afixos e clíticos da palavra possuem uma relação de ‘um para um’ com palavras: cada afixo e cada clítico da palavra pertence a apenas uma palavra. No entanto, enquanto para cada afixo existe apenas uma raiz, para cada clítico pode haver mais de uma raiz, uma vez que palavras compostas podem estar combinadas com apenas um enclítico com escopo sobre ambas as raízes10. Já morfemas do sintagma se combinam com todo um sintagma, de modo que a relação é de ‘um para muitos’: cada morfema do sintagma combina-se com um constituinte formado por uma ou mais palavras. O Quadro 5 resume as informações desta seção.
Afixos da palavra são morfemas funcionais dependentes de uma classe ou subclasse de lexema. Eles funcionam como formativos da palavra, seja flexionando ou derivando um lexema. Além disso, afixos são bastante seletivos com relação à base morfológica. Por exemplo, -a ‘plural inanimado’ se combina apenas com nomes inanimados, enquanto -wa ‘plural animado’, apenas com nomes animados.
Clíticos da palavra são seletivos com relação à categoria da palavra, e não da raiz. Proclíticos são determinantes, portanto, morfemas funcionais, formando uma só palavra com nomes como i=pɨe ‘este aturá’ ou com um enclítico i=ka ‘esta fruta (de pimenta, por exemplo)’. Notemos que a relação sintática é a mesma se o demonstrativo é uma raiz, como ani pɨe ‘aquele aturá’ e ani=ka ‘aquela fruta (de pimenta)’, onde os demonstrativos formam um sintagma simples com os nomes. Ou seja, ainda que proclíticos sejam clíticos da palavra, eles estabelecem com a palavra (ou enclítico) uma relação sintática dentro do SN.
Os enclíticos podem ser divididos em verbais e nominais. Os nominais são, na sua maioria, classificadores e se assemelham a raízes nominais por serem flexionáveis (e.g. i=bo ‘esta coisa redonda’, i=bo-a ‘estas coisas redondas’) e ocorrerem em estruturas morfológicas semelhantes a palavras compostas11. Por exemplo, o nome não contável bia ‘pimenta’ pode ser derivado em um nome contável por classificadores, como bia=ka ‘fruto de pimenta’ e bia=kɨ ‘pé de pimenta’, de maneira similar a uma palavra composta como bia+kahe ‘casca de pimenta’.
Um outro exemplo de enclítico formativo da palavra é o morfema =hĩ- ‘diminutivo’. Ao se combinar com uma palavra, semelhantemente a um classificador ou a uma raiz nominal em um composto, o diminutivo funciona como o núcleo da nova palavra, alterando a forma dos morfemas flexionais de gênero e número. Por exemplo, põe-wa ‘pessoas’ e põe=hĩ-na ‘pessoazinhas’, onde o morfema de plural muda de -wa para -na, uma vez que é o diminutivo que o seleciona, e não a raiz (as formas *põe-na e *põe=hĩ-wa não são possíveis).
Comportando-se como nomes sintaticamente, os enclíticos podem ser combinados tanto com nomes animados quanto inanimados, bem como com outras classes de lexemas, como quantificadores, determinantes, possessivos, verbos nominalizados etc. Isso nos leva a interpretar que os enclíticos nominais sejam, de fato, nomes mais gramaticalizados. Logo, vemos porque é admissível uma palavra formada por um proclítico determinante e um classificador ou diminutivo. As principais diferenças dos enclíticos da palavra para as raízes nominais estão em sua semântica e no fato de os enclíticos não serem morfossintática e fonologicamente autônomos, sempre precisando de um hospedeiro.
Existem dois tipos de enclíticos verbais. Primeiro, temos os morfemas que indicam ‘direção centrípeta’ e ‘direção centrífuga’, que são formas reduzidas dos verbos da ‘vir’ e nɨ ‘ir’. Os exemplos (11a) e (11b) ilustram os dois tipos de construções12.
Como clíticos, estão combinados sintaticamente na função de verbos auxiliares com verbos principais não finitos, e estão sujeitos a certos padrões fonológicos, típicos de clíticos, além de bloquearem o espraiamento nasal13.
Um outro tipo de enclítico verbal é o morfema =ya, que indica ‘evidencialidade reportativa’. Este morfema aparece de maneira regular sempre à direita de um verbo finito ou cópula, seguindo toda classe de morfemas derivacionais e flexionais, e não se nasaliza, conforme os exemplos em (12).
Podemos observar que os clíticos da palavra, com exceção do reportativo, são basicamente morfemas lexicais fonologicamente dependentes. O reportativo é um tipo de enclítico diferente, pois é uma palavra invariável e conta com uma distribuição morfossintática não prevista pelos tipos de sintagma da língua. Isso nos leva a interpretá-lo como uma partícula, conforme será retomado na seção “Partículas”, mais adiante.
Os morfemas do sintagma dividem-se entre aqueles que marcam relações gramaticais e aqueles que marcam relações discursivas ou pragmáticas. Há morfemas do sintagma que se flexionam como lexemas e outros que não fazem isso, comportando-se como morfemas puramente funcionais. E também há aqueles que fonologicamente se comportam mais como afixos, enquanto outros mais como clíticos ou até como palavras autônomas.
Nos exemplos em (10) ilustramos dois morfemas do sintagma: (i) -re ‘não nominativo’, regido por predicados, marca sintagmas em função de objeto diferenciado e certos adjuntos espaciais e temporais, (ii) -ka ‘ablativo’ que marca sintagmas nominais indicativos quanto à origem geográfica, étnica ou a outro tipo de pertencimento social de um outro nome. Podemos, ainda, listar outros morfemas que marcam relações sintáticas em sintagmas nominais, como: (iii) -i ‘locativo geral’, (iv) -rã ‘locativo específico’, (v) -reka ‘mesmo que X’, (vi) -pe ‘similar a X, como X’, e (vii) -i ‘possessivo’. Todos são marcas de caso. Fonologicamente, os morfemas que não começam com consoantes surdas podem ser nasalizáveis, mostrando que se comportam como os afixos da palavra. Assim, dado ainda que estes morfemas não são flexionáveis e possuem uma função sobretudo sintática, vamos classificá-los como ‘afixos do sintagma’.
Um morfema do sintagma à parte é a cópula em Kubeo, cujo paradigma está ilustrado no Quadro 6. O paradigma divide-se entre dois tipos de morfemas: os três primeiros são invariáveis e usados, sobretudo, no tempo presente, enquanto o último é uma raiz que pode se combinar com qualquer tipo de flexão verbal e, por isso, é usada quando informações morfossintáticas para além de pessoa, número e gênero são necessárias. Todas as formas são nasalizáveis e se comportam como afixos no nível fonológico. Além disso, a cópula claramente possui uma função gramatical bem definida14.
Algo de especial na sintaxe das cópulas é que elas se combinam com sintagmas focalizados na relação entre sujeito e predicado. Os exemplos em (13) mostram a cópula flexionada combinada ora com o predicado ora com o sujeito.
A cópula nos apresenta um comportamento complexo. Fonologicamente, assemelha-se a afixos. Morfologicamente, assemelha-se a raízes verbais por ser flexionável, como os enclíticos verbais, por exemplo. Sua função gramatical é bem definida como a dos afixos do sintagma, porém sua distribuição é sensível a fatores discursivos, e não apenas a fatores semânticos ou gramaticais. A cópula, portanto, possui, ao mesmo tempo, propriedades únicas, bem como propriedades compartilhadas com todos os tipos e classes de morfemas que vínhamos discutindo até então. É, portanto, uma classe de morfema especial, por suas propriedades formais e funcionais sui generis.
Existe, ainda, um conjunto de morfemas que podem ser agrupados por sua função de codificar relações discursivas e pragmáticas15. Estruturalmente, combinam-se com sintagmas ocorrendo após os ‘afixos do sintagma’. Assim, ainda que não possamos verificar o status de todos estes morfemas como afixos ou enclíticos, vamos tratá-los como enclíticos (seguindo a mesma heurística adotada para com os afixos do sintagma). O exemplo (14) apresenta o morfema =rɨ̃ ‘interrogativo de 2a pessoa’ de predicados verbais. Este morfema concatena-se ao sintagma focado em uma sentença interrogativa, como exemplificado em (14a) e (14b). Seu status como clítico ou afixo não pode ser determinado por propriedades fonológicas.
Resumimos no Quadro 7 os principais pontos discutidos nesta seção sobre afixos e clíticos. Os tipos de morfemas estão agrupados em cinco grandes grupos, representados por tons de cinza e branco no Quadro 7, sendo eles: afixos da palavra, clíticos da palavra, afixos do sintagma, cópula e enclíticos do sintagma.
O que caracteriza as partículas sob um ponto de vista funcional, segundo minha análise para o Kubeo, é que elas expressam algo independente do conteúdo proposicional e da estrutura gramatical de uma oração, ou, conforme definido por Fraser (1996, p. 168), são marcadores pragmáticos, “[...] pistas codificadas linguisticamente que assinalam as intenções comunicativas potenciais de uma falante [...]”16. É importante notar que nem todos os marcadores pragmáticos são partículas, mas todas as partículas são marcadores pragmáticos, ainda que algumas delas possam desenvolver outras funções. Sob um ponto de vista formal, as partículas podem pertencer a diferentes tipos de morfemas, como clíticos e raízes, por exemplo
Nas próximas seções, vou discutir a função de marcador pragmático em Kubeo conforme realizada por diferentes classes de morfemas: (i) morfemas como nomes, verbos, advérbios e conjunções em funções pragmáticas derivadas, (ii) interjeições e (iii) partículas.
O morfema bahu ‘corpo, si mesmo, intensificador’ é bastante polissêmico e multifuncional em Kubeo. Como núcleo de um SN, ele pode ser usado referencialmente como termo para ‘corpo’; combinado a pronomes, expressa construções reflexivas e recíprocas. Quando modifica expressões locativas, como em (15a), e temporais, como em (15b), funciona como um intensificador. Quando modifica um outro nome, passa a ter uma função discursiva de ‘ênfase’, conforme as traduções dos exemplos (15c) e (15d) expressam. A sintaxe de bahu é a de um elemento da frase nominal, como se pode ver no exemplo (15d), em que ele vem antes do afixo do sintagma -re ‘não nominativo’.
A palavra kari funciona como um advérbio e seu significado básico é ‘agora’, ‘hoje’, como em kari ñami ‘hoje à noite’. Na análise de Salser, J. e Salser, N. (1977), kari funciona discursivamente como um marcador do fio central de uma narrativa. O uso de kari como marcador pragmático tende a variar bastante entre os falantes, uma vez que há pessoas que o usam com frequência, enquanto outras não muito. A seguir, apresentamos esta palavra em dois contextos: no final de orações, onde marca um ponto final em uma sequência de eventos, como em (16a); e no meio de uma oração, marcando a todos os constituintes que o falante julgar serem importantes para o entendimento de sua mensagem, como em (16b).
Quando usado em uma função discursiva, kari possui uma sintaxe particular, não aparecendo dentro de um sintagma, como demonstra sua posição após marcadores de foco, como mia e apa, em (16b), ou um vocativo, como em (16a). Isso o diferencia de bahu, cuja sintaxe está sempre dentro dos limites do SN. Notemos, ainda, que bahu e kari são dissílabos e sempre aparecem como palavras independentes17.
Outro morfema que adquire funções de marcador pragmático é aru, cuja função principal é sintática, como conjunção coordenativa ilustrada em (17a). Seu uso pragmático pode ser visto em (17b), onde aparece ao final de uma sentença, no sentido de demandar ao ouvinte uma resposta, como uma tag-question, e (17c), onde aparece como um elemento para iniciar uma conversação. Notemos que aru é dissílabo e sempre aparece como uma palavra independente.
As interjeições são uma classe de palavras à parte, cuja função é expressar estados emocionais do falante com relação a algum fator motivador no contexto ou discurso. Sintaticamente, são palavras que não se combinam com sintagmas menores do que a sentença, e muitas vezes formam sentenças independentes. As partículas são distintas, pois exploram outras dimensões pragmáticas e nunca formam uma sentença independentemente.
Em Kubeo, as principais interjeições são: bi ‘não, nada’, haɨ ‘aprovação’, hɨ ‘sim, positivo’, hɨ̃hɨ̃ ‘confirmação’, pɨ ‘poxa!’, hede ‘pronto, fim’, hã ‘surpresa’, aha ‘desgosto, raiva’ (aha çĩa se falante masculino, aha iko se falante feminino), agɨ ‘dor’. Algumas interjeições passaram a integrar certas expressões idiomáticas, como é o caso de hɨ ‘sim, positivo’, incorporado ao verbo a- ‘dizer’, para expressar a noção de ‘obedecer’: hɨ a-bi ‘ele obedeceu’.
Talvez o caso mais complexo seja da interjeição bi ‘não, nada’. Essa palavra não é usada para formar a negação padrão em Kubeo, a qual é expressa por sufixo verbal. Bi pode ser usado como uma resposta negativa a qualquer pergunta ‘sim/não’ ou no início de respostas mais elaboradas, como no exemplo (18a). Em certos usos, bi se comporta como uma partícula que introduz uma sentença negativa, como em (18b). Também é usado nas expressões idiomáticas com o significado de bi+ha- (nada+passar) ‘morrer, desaparecer’ e com significado de ‘silêncio’ em bi=da (nada=precisamente).
Assim, observamos que, ainda que a maioria das interjeições forme uma classe de palavras à parte e tenha função e distribuição sintática semelhante entre si, algumas delas passam a funcionar em outros contextos pelo tecido fluido da gramática, como formativos lexicais, modificadores sintáticos de verbos e partículas com escopo sobre a sentença.
A função principal das partículas é a de marcador pragmático. Sintaticamente, partículas não formam sentenças independentes (ao contrário de interjeições). Além disso, cada partícula somente pode ocorrer uma única vez na sentença, ainda que em uma sentença possa haver mais de uma partícula. Algumas partículas organizam-se como paradigmas e outras possuem distribuições morfossintáticas distintas. Isso mostra que cada uma desempenha uma função específica no nível da sentença.
A partícula monossilábica ɨ é usada de maneira opcional e exclusivamente como uma tag-question ao final de sentenças interrogativas. Está separada prosodicamente do resto da sentença por uma breve pausa. Logo, podemos caracterizá-la como uma palavra independente. Veja alguns exemplos:
Com relação ao morfema =rɨ̃ ‘interrogativo 2a pessoa’18, é importante notar que a estratégia principal para se fazer perguntas em Kubeo é o uso de um padrão entoacional. O verbo da oração aparece em uma forma não finita e, fora =rɨ̃ (e palavras interrogativas), não há outro marcador morfossintático de perguntas na língua. Isso nos sugere que se trata de uma partícula enclítica do sintagma usada como um elemento adicional para reforçar um ato ilocucionário que demanda mais enfaticamente uma resposta do ouvinte.
Os morfemas i-kɨ ‘afirmativo masculino’ e i-ko ‘afirmativo feminino’ são partículas com status de palavras independentes que indexam o gênero do locutor19. Sua função é a de reforçar um ato de fala declarativo, em que o falante indica sua crença em um dado estado de coisas (20a). Com predicados marcados pelo evidencial reportativo, temos a mesma função, ainda que o locutor não tenha sido a fonte primária de informação, como em (20b). Logo, não ocorrem em orações interrogativas, porém podem ocorrer com orações imperativas, como em (20c).
A distribuição sintática de i-kɨ e i-ko mostra que essas partículas são os últimos morfemas dos sintagmas com os quais se combinam, podendo estar acentuados, devido à sua estrutura dissilábica, ou mesmo átonos, em razão de geralmente estarem ao final de um constituinte prosódico. A vogal inicial é nasalizável somente em fala rápida, mostrando que este é um processo fonético, e não fonológico (cf. Chacon, 2012, capítulo 3). Sintaticamente, podem se combinar a outros constituintes não verbais, como em (21a) e (21b), mostrando ter uma distribuição sintática bastante livre.
Um outro marcador pragmático apa ‘turno’ realça um constituinte ou outro elemento da sentença e demanda uma posição do ouvinte com relação a este elemento focado. Em (22a), vemos que o falante foca em si mesmo em uma frase retirada de uma canção de namoro, onde apa é bastante recorrente quando o enamorado fala de si. Em (22b), o foco muda do ouvinte para o locutor. Em (22c), o foco está em uma nova situação na qual o falante se baseia. Em (22d), apa muda o foco para o ouvinte junto ao verbo no modo imperativo permissivo20.
Apa é morfologicamente invariável. Analiso como uma partícula com status de palavra independente, pois fonologicamente se comporta como uma palavra fonológica e sintaticamente pode se combinar com diferentes partes do discurso, se situando à direita dos sintagmas que ele modifica.
O reportativo =ya fora analisado como clítico da palavra, enquanto um tipo de morfema, dada sua disposição a se concatenar apenas com verbos e cópulas21. É importante distinguir o reportativo do discurso direto. O discurso direto serve para atribuir uma fala a uma pessoa, enquanto o reportativo atribui o conhecimento do fato sendo declarado pelo falante. Em termos funcionais, o reportativo faz parte do sistema obrigatório e gramatical de expressão da evidencialidade no modo declarativo que possui quatro categorias22: presenciado, inferido, assumido e reportativo. Em termos estruturais, o reportativo combina-se com o paradigma de primeira mão (e.g. eda-bi ‘ele chegou (eu vi)’ > eda-bi=ya ‘diz que ele chegou’). Enquanto o discurso direto é compatível com qualquer evidencial, o reportativo não se combina com o paradigma do evidencial inferido e do assumido. O evidencial inferido requer que o falante assuma perante o ouvinte que ele possui evidências de primeira mão de que a situação declarada acontecera; já o assumido se baseia em uma conjectura que o falante faz sobre um estado de coisas para assumir que um fato ocorreu ou vai ainda ocorrer. Desse modo, a restrição combinatória com os outros evidenciais decorre de um conflito lógico-pragmático. Isso nos sugere que o discurso direto possui um escopo mais amplo; o reportativo e outros evidenciais possuem escopos semântico-pragmáticos distintos: o primeiro tem escopo sobre a oração, os evidenciais têm escopo sobre o predicado. Uma vez que verbos e cópulas são núcleos do predicado, fica clara, então, a posição do reportativo como uma partícula enclítica à palavra-núcleo de um predicado.
Por último, o Kubeo possui um conjunto de morfemas que, de diferentes maneiras, enfatizam certos constituintes ou aspectos semânticos de uma oração. Os exemplos em (23) são do morfema =ta= ‘delimitador’, que pode ser enclítico ou proclítico a depender de questões prosódicas, cuja função é decorrente da semântica da oração, da estrutura informacional do discurso e do jogo pragmático estabelecido entre falantes e ouvintes. Em (23a) a (23c), mostramos sua função como intensificador ou marcador de ênfase de modificadores verbais e nominais. Com verbos no aspecto progressivo, ele determina o início aspectual da ação – a exemplo de (23d). Com argumentos, ele implica foco contrastivo – a exemplo de (23e). Precedendo a um pro-verbo, ele ocorre na função de enfatizar o conteúdo de um predicado anterior a que o pro-verbo retoma – a exemplo de (23f). Com conjunções, ele reforça relações de casualidade entre diferentes sentenças – a exemplo de (23g).
A liberdade sintática e a natureza funcional deste morfema somam-se a dois outros fatores que nos levam a analisá-lo como um tipo de enclítico do sintagma. Em termos distribucionais, =ta ‘delimitador’ segue a afixos e clíticos da palavra, bem como afixos do sintagma, e pode vir antes dos morfemas de cópula, como em (23d), ou os seguindo, como em (23f). Fonologicamente, tem como hospedeiro tanto a palavra anterior, que lhe serve de base semântica, quanto uma posterior. Pode também aparecer acentuado (independente, sob um ponto de vista métrico). A análise que proponho é que este é um morfema essencialmente pragmático e que desenvolve funções mais gramaticais, como aspecto inceptivo – em (23d) – ou intensificador de modificadores verbais e nominais – exemplos (23a) a (23d) –, a partir de um processo de extensão funcional. Seria, assim, uma partícula que desempenha eventualmente a função de morfemas típicos da morfossintaxe dos sintagmas verbal e nominal, algo como a imagem espelhada de morfemas como bahu e kari, que seriam nomes e advérbios que desenvolveram funções pragmáticas.
Como vimos, existem três tipos de marcadores pragmáticos em Kubeo. Alguns morfemas são primariamente identificados como nomes, advérbios ou conjunções, possuindo uma função adicional como marcadores pragmáticos. Outros, como interjeições e partículas, são essencialmente marcadores pragmáticos, mas podem também estender seu uso a outras funções que mais diretamente se relacionem ao conteúdo proposicional da oração. As partículas e interjeições diferenciam-se por fatores funcionais e formais: funcionalmente, enquanto as partículas codificam informações relevantes para a expressão de atos ilocucionários, as interjeições codificam estados emocionais; formalmente, as partículas são adjuntos de constituintes sintáticos, enquanto interjeições não estão sintaticamente relacionadas a nenhum constituinte da sentença e podem constituir sentenças autônomas. No Quadro 8, oferecemos um resumo das propriedades formais e funcionais das partículas.
Neste artigo, discutimos a noção de palavras, morfemas e sintagma, tomando como base aspectos formais e funcionais. Notamos como a palavra é um constituinte transicional entre morfologia e sintaxe, de modo que existem certas ambiguidades entre a estrutura da palavra e do sintagma. Para boa parte das classes de morfemas, encontramos uma forte correlação entre forma e função, sejam morfemas lexicais sejam funcionais.
As partículas foram apresentadas como uma classe de morfemas cuja função principal é a de marcador pragmático. Vimos que outros morfemas também podem funcionar como marcadores pragmáticos, seja em função primária (como interjeições) seja em função secundária (como certos nomes, advérbios e conjunções). Dentro de suas funções primárias, partículas e interjeições diferenciam-se, pois as primeiras expressam informações sobre o ato ilocucionário e as últimas, sobre o estado emocional do locutor.
Sob o ponto de vista formal, existem partículas que constituem palavras independentes, outras que são enclíticos do sintagma ou enclíticos da palavra, mas sempre funcionam como adjuntos de sintagmas, nominais, verbais ou oracionais. O fato de haver partículas pertencendo a tipos de morfemas distintos, ainda que guardem semelhanças no que tange à sua função pragmática, é análogo ao que vimos para a classe dos nomes e dos verbos, as quais podem ser expressas por tipos de morfemas distintos (como raízes ou enclíticos), ainda que possuam as mesmas funções semânticas, como expressões referenciais e núcleos de predicados, respectivamente. Em todos os casos, vemos que partículas são, antes, uma classe de morfemas (como nomes, verbos, conjunções, interjeições etc.), e não um termo descritivo para caracterizar tipos de morfemas como ‘sufixos’, ‘enclíticos’ etc.
No Quadro 9, resumimos o lugar de partículas na gramática Kubeo, ao compará-las com outras classes e tipos de morfemas, selecionados unicamente a título de ilustração.
Na introdução deste artigo, listamos os pontos – (1) a (5) – que em geral são elencados como características de partículas por diferentes linguistas. Estes mesmos pontos encontram-se abaixo, seguidos de comentários sobre as suas relevâncias para descrever as partículas em Kubeo:
Logo, ainda que existam casos que fogem ligeiramente à norma, vemos que a noção de partículas é útil para a descrição de aspectos da gramática Kubeo, bem como se correlaciona com as principais características atribuídas a esse termo tipologicamente.
*Autor para correspondência: Thiago Costa Chacon. Universidade de Brasília. Instituto Central de Ciências - ICC SUL. Mezanino B1, 69. Brasília, DF, Brasil. CEP 70910-900 (thiagocostachacon@gmail.com, thiago_chacon@hotmail.com).