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Territorialidades e exercícios de autonomia: grupos sociais e moradia popular autoproduzida no Maranhão, Brasil
Territorialites and autonomy exercises: social groups and self-produced popular housing in Maranhão
Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, vol. 17, núm. 3, e20210057, 2022
MCTI/Museu Paraense Emílio Goeldi

ARTIGOS CIENTÍFICOS


Recepção: 17 Maio 2021

Aprovação: 14 Fevereiro 2022

DOI: https://doi.org/10.1590/2178-2547-BGOELDI-2021-0057

Resumo: Apesar do quantitativo de moradias produzidas por inúmeros programas estatais, a prática da construção popular sem formalização ou participação de técnicos da área continua prevalecendo em todo o país como alternativa habitacional dos despossuídos. Resultado de pesquisa sobre moradia popular no Maranhão, este texto parte dos modos de vida das camadas populares rurais e urbanas do estado para demonstrar que, além de fornecerem abrigo e qualificarem espaços de vida, tais construções representam exercícios de autonomia e resistência social que enfrentam pressões sistêmicas variadas. Diferentemente dos procedimentos impositivos da política habitacional estatal, as decisões familiares para autoprodução da moradia estão intrinsecamente relacionadas com especificidades socioespaciais que caracterizam a arquitetura vernacular e, ao levarem em conta regime de posse da terra, estrutura familiar, práticas produtivas e acesso à renda, os construtores demonstram capacidade de concepção e gerenciamento na produção de seus espaços, aspectos a considerar nas análises acadêmicas e em parcerias profissionais, evitando criminalização e subordinação das práticas populares.

Palavras-chave: Territorialidade, Autonomia, Grupos sociais, Moradia popular, Maranhão.

Abstract: Despite the number of housing units built by government programs in recent years, informal construction of public housing—which lacks formal technical aid—still prevails throughout the country as an affordable alternative for the poor. Based on field research of popular housing in rural and urban Maranhão, this text demonstrates that the living arrangements, in addition to providing shelter and quality living spaces, demonstrate autonomy and social resistance in the face of multiple systemic pressures. Unlike the imposed state housing policy procedures, family decisions for the self-production of housing are intrinsically related to socio-spatial particularities that characterize vernacular architecture. By taking into account the land tenure regime, family structure, productive practices, and access to income, builders demonstrate the capacity to design and manage the production of their spaces. These are important features to consider in academic analyses and professional partnerships to avoid devaluation and even criminalization of popular practices.

Keywords: Territoriality, Autonomy, Social groups, Low-income housing, Maranhão.

INTRODUÇÃO

Desde a segunda metade do século passado, quando a industrialização brasileira de baixos salários já expunha seus efeitos urbanos, principalmente no Rio de Janeiro e em São Paulo, pesquisas acadêmicas investigam nas periferias das cidades a denominada ‘autoconstrução popular’ (Ferro, 2006; Maricato, 1982; Valladares, 1983; Sampaio, 1990). O sentido tomado por essa conceituação passou a relacionar intimamente a casa feita pelos trabalhadores urbanos pobres à ideia de improviso, desperdício, precariedade e sobretrabalho, negando-lhes implicitamente princípios de planejamento e gestão. Cinco décadas depois da criação do mercado imobiliário habitacional, considerada uma alternativa reformista para o déficit de moradias populares (Oliveira, 2006) e das 8,87 milhões de unidades produzidas por programas estatais (Biderman, 2019), um diagnóstico nacional “do setor da arquitetura e do urbanismo” constatou a persistência daquelas práticas em todo o país (CAU/BR, 2015). Mais uma vez, as construções populares voltavam à discussão, agora apoiadas por órgãos profissionais de arquitetos e urbanistas por meio das possibilidades de financiamento público para assistência técnica da Lei nº 11.888, de 24 de dezembro de 2008, visando orientar as construções populares em todo o país.

Contrastando com os enfoques depreciativos sobre as construções populares das grandes cidades, estudos semelhantes sobre moradias, mas tradicionalmente voltados para povoados e pequenos núcleos populacionais (I. Costa & Mesquita, 1978; Weimer, 2005), têm reconhecido significativos valores nas edificações tradicionais brasileiras, vinculando-as a fenômenos sociais presentes nos processos históricos e a identidades nacionais diversas (Oliver, 2006; Rapoport, 2005 [1980] citados em S. Santos & S. Costa, 2017). Reconhecida mundialmente sob diversas denominações – primitiva, tradicional, popular (Andrade, 2016, p. 28) –, esta arquitetura “é influenciada por condições geográficas, climáticas, por aspectos culturais específicos” e tem sua conceituação mais aceita como “vernacular”, pois “sua manifestação ocorre de maneira diferenciada e singular em diversas partes do mundo” (S. Santos & S. Costa, 2017, p. 221).

Identificando relações entre o popular e o vernacular na arquitetura, S. Santos e S. Costa (2017, p. 226) citam Oliver (2006) para afirmar que o “termo popular também pode ser empregado”, ressaltando que cabe atentar para o processo construtivo, pois “há uma diferença entre as construções vernaculares ou populares construídas pela comunidade e a edificação popular construída para pessoas da comunidade”. Esse é um entendimento que classifica as ‘autoconstruções’, urbanas ou rurais, como arquitetura vernacular ou popular e considera a produção estatal de habitação social como algo que se refere à arquitetura popular. Descartando dos interesses deste artigo tais produtos (ou mercadorias) e considerando que “o neologismo ‘vernacular’, quando aplicado à arquitetura, restringe-se ao campo acadêmico e especializado, não sendo facilmente compreendido fora dele” (Sant’Ana, 2013, p. 53), adotamos como referência conceitual do nosso objeto de estudo a “arquitetura popular” acrescida do termo autoprodução, inequívoca expressão que a identifica com o vernacular, pois, de fato, todas elas são “construídas pela comunidade” a partir de conhecimentos adquiridos pela prática cotidiana coletiva, conforme reconhecem Kapp e Baltazar (2012):

Arquitetura vernacular ou construção vernacular, em analogia com a língua vernacular, designa práticas tradicionais baseadas em conhecimento empírico e recursos locais, desenvolvidas ao longo de muito tempo por muitas pessoas. Tais práticas podem ter padrões e códigos, mas eles nunca são fixados ou formalizados, nem são transmitidos via educação formal. Construtores vernaculares ensinam uns aos outros e aprendem fazendo e, eventualmente, conversando sobre o que fazem. Uma vez que a produção é motivada por um valor de uso, não há divisão social do trabalho, isto é, cisão hierárquica entre atividades materiais e intelectuais, embora haja divisão funcional do trabalho

(Kapp & Baltazar, 2012, p. 253).

Este artigo considera que as construções populares compartilham das mesmas bases sociais, condição esta que assemelha seus processos de produção. Rurais ou urbanos, os artífices vernaculares e construtores de mutirões se encontram em situação periférica e marginal em relação ao capitalismo, sistema de reprodução social dominante, mas não homogêneo, baseado na divisão e na venda do trabalho e na produção de valores de troca sob a dinâmica da acumulação (Harvey, 2005).

Em regiões isoladas, onde prevalecem práticas de trocas e inexiste distinção entre trabalho manual e intelectual, a ‘arquitetura vernacular’, reconhecida e valorizada por setores da academia, vai se transmudar na ‘autoconstrução’ das favelas, mocambos, palafitas, barriadas e vilas, onde vivem os pobres urbanos das grandes cidades, periféricas ao sistema mundial, identificadas e desconsideradas por alguns outros campos do saber acadêmico. Entretanto, a expansão territorial, própria da inescapável demanda por acumulação do sistema capitalista (Harvey, 2005), por longo tempo ausente das regiões onde se originaram e se consolidaram as práticas vernaculares arquitetônicas, vem impactando e transformando as relações sociais que sustentam estas práticas (Gonçalves, 2002; Little, 2002-2003; A. Almeida, 2008; Velho, 2009). Se outrora eram virtuosas, hoje tais práticas estão mais próximas das inseguranças e precariedades próprias da ‘autoconstrução’, pois, sendo “muito dinâmico e inevitavelmente expansível”, o capitalismo “cria uma força permanentemente revolucionária, que, incessante e constantemente, reforma o mundo em que vivemos” (Harvey, 2005, p. 43).

No Brasil, foram os programas nacionais de desenvolvimento capitalista, iniciados na década de 1930, que constituíram a “força permanentemente revolucionária” para “reforma do mundo”, ganhando impulso com a construção de Brasília e a ocupação do Centro-Oeste nas décadas de 1950-1960, daí se expandindo para a Amazônia entre 1970 e 1980 (Arcangeli, 1987; Aguiar, 2015), provocando a “urbanização acelerada” do Maranhão (Burnett et al., 2016). Essa ação combinada vem resultando em ameaças e conflitos por desterritorialização de povos originários e comunidades tradicionais do estado (CPT, 2019, 2020), comprometendo suas formas de reprodução social e reforçando correntes migratórias de centenas de famílias camponesas para as periferias urbanas (Lima, 2008; Schmink & Cordeiro, 2008).

A insegurança fundiária e as dificuldades de acesso aos recursos naturais são situações que comprometem os processos construtivos tradicionais, obrigando a se recorrer a alternativas possíveis, principalmente nos centros urbanos, onde o saber é reinventado naquilo que já foi entendido como “vernacular metropolitano” (Kapp & Baltazar, 2012, p. 254). É nesse contexto, de retorno das assessorias técnicas, que a “ida a campo” para encontros de classes sociais em torno dos espaços de vida dos despossuídos irá contrapor diferentes visões e valores sobre viver e morar, mas principalmente de trabalhar e construir (Ferro, 2006). Entre as necessidades dos ‘beneficiários’ e o saber de especialistas-técnicos, a iminente relação alerta para a assimetria em favor do saber acadêmico e profissional (Kapp, 2003), reforçado pela fragilidade social das camadas populares brasileiras (J. Santos, 2009). Por outro lado, dada a impossibilidade de resolução da questão habitacional pelo sistema capitalista (Engels, 1974; Bolaffi, 1982; Villaça, 1986) via programas estatais ou melhorias habitacionais, deve-se entender a Lei nº 11.888 apenas como uma ‘janela de oportunidades’ de trabalho para os arquitetos, mas também com premissas eleitorais que condicionam o apoio do poder local (Burnett, 2020).

Buscando refletir sobre essas práticas desde o interior do meio social em que se realizam, este artigo busca ultrapassar a aparência e oferecer uma outra compreensão do fenômeno da ‘autoconstrução’. Tais práticas devem ser entendidas como “meios de reprodução social, presentes de forma diferente em todas as sociedades” que “dependem da objetivação do capital, da natureza e composição do capital a transmitir e do estado dos mecanismos de reprodução disponíveis” (A. Costa & Rodrigues, 2002, p. 116). Fica claro, então, que, enquanto perdurarem condições adversas de distribuição de capitais nos termos de Bourdieu (1996), as construções populares devem ser entendidas como expressão material de comportamentos sociais incorporados:

As estratégias de sobrevivência e reprodução são um conjunto de lógicas e práticas articulando o tradicional e o moderno, resultantes das transformações e readaptações das sociedades a novos contextos, centradas na família como grupo de organização e gestão das mesmas e implicando uma dispersão de recursos, atividades e rede de relações

(A. Costa & Rodrigues, 2002, p. 117).

Caberia, pois, entender a construção da casa popular pelos seus moradores como algo além das chamadas “estratégias de sobrevivência”, o que para alguns se refere ao “desenvolvimento de atividades marcadas pelo caráter ocasional ou circunstancial pelas quais as pessoas se voltam para alcançar o mínimo indispensável à sobrevivência” (Petrini et al., 2012, p. 166). Uma conceituação assim das práticas populares encontra sua expressão arquitetônica na ‘autoconstrução’, que reduz os exercícios construtivos dos despossuídos ao ‘mínimo indispensável’, negando à obra qualquer valor para além da sobrevivência imediata.

Ao decidir pela edificação de sua moradia, com custos temporais e materiais, a família assume a direção de um processo no qual os “próprios usuários tomam as decisões sobre a construção e gerem os respectivos recursos” (Kapp et al., 2009, p. 11): uma gestão complexa, que inclui o trabalho, voluntário ou não, da própria família, de amigos e parentes, a contratação de terceiros e a aquisição dos materiais, aconselhando rever a simplificação em torno do fenômeno. À medida que o termo ‘autoconstrução’ sugere a ocupação do lugar dos técnicos por leigos, em uma ação fora das normas ou irregular, esvazia-se o processo de seu significado social, isto é, de suas práticas como exercícios de autonomia com vistas a unificar trabalho manual e mental.

A autonomia entendida como o “direito de se autogovernar” e “a capacidade de dar a si mesmo suas próprias normas” (Kapp, 2003, p. 98) explica tanto a persistência da autoprodução da moradia, à margem de muitas das disposições sociais hegemônicas (Bourdieu, 1996), quanto sua condenação e interdição pelo mainstream sob prevalência da heteronomia da divisão social do trabalho (Bicca, 1984). Desse ângulo, autoproduzir moradias tem o mesmo sentido de autoproduzir assentamentos populares: igualmente à margem das normas – aqui urbanísticas, lá arquitetônicas –, sua inscrição como ‘direito de autodeterminação’ parece depender da legalização de seus procedimentos pela ordem estabelecida:

Também nesse sentido, a autonomia só existe quando há algo de heterônomo em jogo, quando há algo de exterior, de outro. Mas, a autonomia como capacidade de autodeterminação pode ocorrer à revelia das forças heterônomas, ao passo que, como direito de autodeterminação, ela é concedida por essas forças mesmas

(Kapp, 2003, p. 98).

Por essa perspectiva, a qual considera a autoprodução da moradia popular enquanto processo complexo envolvendo decisão e adesão familiar em torno de um projeto comum, favorável ao fortalecimento do trabalho autônomo de grupos sociais despossuídos, este artigo propõe entender estas práticas como ‘estratégias de resistência e autonomia’. Para isso, apresenta e discute resultados de pesquisa sobre moradias populares autoproduzidas, desenvolvida durante dois anos, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FAPEMA) do estado em áreas rurais e urbanas do Maranhão. Na primeira seção, a partir da caracterização de grupos sociais rurais e urbanos do estado, são identificados seus diferentes regimes de posse da terra, estrutura familiar e atividades produtivas, indispensáveis para identificar suas relações com o território (Quijano, 1988; Little, 2002-2003; Lefebvre, 2001), contextualizando decisões sobre processos construtivos. Posteriormente, tomando o espaço rural como determinante de tais práticas sociais transpostas ao urbano, são apresentados processos construtivos de 98 das 284 moradias coletadas em diferentes regiões do estado.

Nas considerações finais, constata-se que há, na autoprodução das moradias populares no Maranhão, a existência de um padrão construtivo unindo projeto e canteiro às reais necessidades e possibilidades familiares, por meio de ofícios que representam unificação de trabalho intelectual e manual (Ferro, 2006; Bicca, 1984; Kapp, 2020). As moradias resultantes de tais práticas indicam um saber popular incorporado principalmente no meio rural, forçosamente reproduzido no urbano, convivendo com limitações que determinam novas práticas e produtos, mas confirmam seus processos como exercícios de autonomia familiar (Kapp & Baltazar, 2012). Os resultados da pesquisa recomendam o reconhecimento, pelo campo profissional da arquitetura, da capacidade de gestão popular das moradias autoproduzidas, até aqui o mais efetivo enfrentamento da questão habitacional, a qual, levada adiante pelos despossuídos, é afirmação de posse e produção de saberes, os quais, como tradições, possuem “ciclos que acabaram de começar, outros que já terminaram, e outros que se encontram em todos os estágios de desenvolvimento intermediários e que existem simultaneamente na mesma sociedade”, como afirmado por Fathy (1980, p. 39), devendo ser entendidos “como suportes de saberes, práticas e de crenças: eles organizam uma ‘paisagem’ vivida pela comunidade e participam de sua identidade” (Lévi-Strauss, 2006, p. 80 citado em Mesquita, 2017, p. 10).

GRUPOS SOCIAIS NO MARANHÃO: TERRITÓRIO, MODOS DE VIDA E PRODUÇÃO DA MORADIA

TERRITORIALIDADE, RELAÇÕES SOCIAIS, REGIMES DE POSSE E OCUPAÇÃO DA TERRA RURAL E URBANA

Parte-se do conceito de grupo socioespacial visto como aquele que não apenas compartilha um ambiente de vida e trabalho, mas tem participação nas origens e na produção desse espaço comum (Lefebvre, 2001; Kapp, 2018). Constituindo a tríade dinâmica que une “território-territorialidade-territorialização”, pois “a sociedade se territorializa, sendo o território sua condição de existência material” (Gonçalves, 2002, p. 230), o conceito de “cosmografia” utilizado por Paul Little (2002-2003) permite captar o sentido dessa relação como representação de “saberes ambientais, ideologias e identidades – coletivamente criados e historicamente situados [–]”, que “um grupo social utiliza para estabelecer e manter seu território”. Além disso, “inclui seu regime de propriedade, os vínculos afetivos que mantém com seu território específico, a história da sua ocupação guardada na memória coletiva, o uso social que dá ao território e as formas de defesa dele” (Little, 2002-2003, p. 254).

Focando aquelas territorialidades à margem dos espaços do Estado-nação, domínio do público e do privado, “duas caras da mesma razão instrumental, cada uma encobrindo a dos agentes sociais que competem pelo lugar de controle do capital e do poder: a burguesia e a burocracia” (Quijano, 1988, p. 24), a pesquisa considerou a posse não capitalista da terra como ‘razão histórica’ fundante de tais cosmografias e o principal critério para delimitar os sujeitos a pesquisar. Identificados pela relação comum com o espaço de vida, em posição exterior ou marginal ao sistema econômico dominante, tendo a base de sua reprodução social no exercício de trabalhos manuais sem qualificação tecnológica, tais grupos adotam formas não monetárias de conquista do espaço, sofrendo, por isso, insegurança fundiária, baixas condições de renda e limitadas possibilidades de mobilidade social.

Organizados em famílias nucleares, a produção de suas vidas encontra-se fortemente fincada tanto nos componentes e escalas de parentesco quanto em redes mais amplas de solidariedade (Woortmann, 1981, 1990), vizinhanças que determinam o capital social disponível e compensam as limitações de seus capitais econômico e cultural (Bourdieu, 1996). Presente tanto nas práticas de afazeres múltiplos quanto no enfrentamento das ameaças sistêmicas, públicas ou privadas, a solidariedade cotidiana é, assim, aspecto decisivo para constituição, fortalecimento e resiliência da cosmografia do grupo social. Do ponto de vista da terra, suporte material dos grupos sociais, “este novo olhar analítico pode detectar semelhanças importantes entre esses diversos grupos – semelhanças que ficam ocultas quando se empregam outras categorias –, vincular essas semelhanças a suas reivindicações e lutas fundiárias” (Little, 2002-2003, p. 253).

Entendendo ‘reivindicações e lutas fundiárias’ como processos de consolidação e defesa de territorialidades, o uso e a ocupação do espaço são práticas cotidianas para confirmação da apropriação coletiva, de forma que as relações dos grupos sociais com as áreas que ocupam são oriundas de situações diversas e podem estar fincadas em condições originárias, de conquista, desbravamento, ocupações consentidas, ou não, que resultaram, em alguns casos e por meio de lutas políticas, na sua inscrição como direito coletivo (A. Almeida, 2008; OIT, 2011; Naciones Unidas, 2018). Tomando como referência estudos de Schmink e Cordeiro (2008) e Schmink (2011) sobre os seringais da Amazônia, verifica-se semelhança com o processo descrito pelos autores , pois a expansão da venda de terras, conjugada a constantes pressões exercidas por latifundiários nos territórios florestais, fez com que a mobilização dos seringueiros, previamente organizada em torno de demandas como direitos civis e sociais, passasse a reivindicar também o direito ao uso da terra e à sua proteção, como forma de garantir a permanência do seu sustento e a manutenção dos seus modos de vida (Allegretti, 2002; Keck, 1995 citados em Schmink, 2011).

Assim, ainda que posses materiais da terra incluam territórios rurais e ocupações urbanas, processos históricos e vínculos coletivos com o espaço são determinantes para identidade e coesão do grupo, condições estas que fortalecem a cosmografia das populações tradicionais do campo, assim como desequilíbrios entre razão instrumental e razão histórica (Quijano, 1988) expressam as fragilidades dos assentamentos urbanos, sob pressão constante da economia de mercado. As condições de construção do direito comum sobre os territórios urbanos são também agravadas pelo “desaparecimento do sujeito econômico livre” que “afetam a família” (Adorno & Horkheimer, 1985, p. 89) e submergem os ocupantes no assalariamento e na individualização, esgarçando os interesses comuns entre os moradores. Entretanto, os mutirões construtivos urbanos comprovam a persistência da solidariedade comunitária, espaços de unificação de antigos e novos conhecimentos construtivos, fragmentados pela cidade e reunificados pela prática coletiva (Maricato, 1978; Kapp & Baltazar, 2012). Tudo isso ocorre em “um contexto de ‘perda’ de tradições e de um excesso de escolhas relacionadas à atividade construtiva”, dando lugar ao que Rapoport (1969) “denomina de ‘idioma moderno folk’” (citado em Sant’Ana, 2013, p. 59).

No Brasil, terras indígenas, territórios de remanescentes quilombolas e assentamentos de reforma agrária constituem, em diferentes níveis de segurança jurídica, os espaços de tais conquistas legais. Pela frágil inserção do Maranhão na dinâmica da economia nacional, eles correspondem a porções significativas do território estadual (Cabral, 1992; A. Almeida, 2008), tanto no bioma Amazônia quanto no Cerrado, conforme a Figura 1.


Figura 1
Maranhão: terras indígenas, quilombolas e assentamentos.
Mapa: F. L. Burnett, C. R. P. Souza e M. F. Moniz Filho (2020)

Além de tais grupos nas áreas rurais, foram considerados também aqueles cujos espaços não se encontram sob direito coletivo ou individual: os posseiros – migrantes das secas do Nordeste de 1940/1950, praticantes da pequena agricultura em terras devolutas nos vales dos rios Mearim e Pindaré (Velho, 2009) –; os colonos – instalados pelo Estado em lotes da colonização planejada nas proximidades dos rios Turiaçu e Buriticupu (Arcangeli, 1987; Aguiar, 2015) –; as quebradeiras de coco-babaçu das regiões dos sertões e cocais – desde 1990, com organização autônoma interestadual (MIQCB, 2020) –; e os agregados – moradores de favor em terras particulares de latifundiários, com permissão para plantar, pagando foro e prestando serviços (L. Costa, 1978).

Para identificação dos grupos sociais no espaço urbano maranhense, o foco da pesquisa considerou a ‘urbanização acelerada’ dos anos 1960-1980, que, impulsionada por grandes empreendimentos empresariais rurais, fez a população urbana maranhense saltar, em 50 anos, de 400 mil para 4 milhões de habitantes (Burnett et al., 2016). Mas tratava-se de uma urbanização predominantemente ‘ruralizada’, pois, até o Censo de 2010 (IBGE, 2010b) contabilizava 125 municípios (ou quase 60% do total de 217) com menos de 10 mil habitantes e mais de 80% (182 municípios) com até 20 mil (Burnett et al., 2016, p. 21). Com história distinta dos grupos rurais, esses moradores de assentamentos urbanos muito raramente acumulam trajetórias históricas semelhantes às das áreas metropolitanas do país (Boschi & Valladares, 1983), pois, tendo baixa capacidade associativa, adotam estratégias de resistências em pequena escala e buscam alianças baseadas “nas estruturas do mundo econômico” (A. Costa & Rodrigues, 2002, p. 117).

Esses grupos sociais urbanos, acampados, no dizer de Auguste Comte, nas franjas da cidade, mas subsumidos no sistema econômico hegemônico, têm suas cosmografias relativizadas, o que impossibilita uma identificação baseada em relações com a terra, pois todos se igualam pelo status de ‘ocupantes’ e por inserções dependentes da dinâmica da cidade capitalista (Souza, 2009). Essas características levaram a pesquisa a adotar o critério classificatório das atividades produtivas, quase sempre informais e/ou combinadas, tomando as análises de J. Santos (2009) como principal referência. Assim, foram considerados dois grupos: o “trabalhador elementar” – que “expressa a elevada depreciação social do trabalho braçal e despojado de habilidades comportamentais e cognitivas mais valorizadas” – e o “empregado doméstico” – que usa “suas habilidades básicas de cuidado do lar para prover a reprodução social de famílias de estratos mais vantajosos” (J. Santos, 2009, p. 467). A partir de tais classificações elásticas, explicitadas e diferenciadas por meio dos trabalhos de campo, foi possível estabelecer um padrão de vida relacionando grau de urbanização da cidade com práticas produtivas dos moradores, que mesclam prestação de serviços e atividades alternativas, de difícil mensuração, pois “o trabalho informal é um mundo opaco por definição: se trata de atividades econômicas não registradas” (Vales, 2021, p. 2).

Com seus territórios sob cerco político e econômico de forças exógenas e endógenas, os assentamentos populares urbanos submetidos à economia das trocas monetárias apresentam forte componente ideológico de inclusão subordinada, o que é expresso tanto nos esforços dos “batalhadores brasileiros” (Souza, 2009) quanto nas miragens positivistas de regularização urbanística, que, prometendo acesso à cidadania plena, têm como determinante a segurança jurídica do mercado de terras (Castro & Bernardini, 2019). Para os grupos sociais urbanos, essa prevalência do domínio privado sobre o público potencializa a ‘razão instrumental’ em detrimento da ‘razão histórica’ (Quijano, 1988) e tem consequências sobre as condições de visibilidade/invisibilidade do território, embaçando a memória coletiva, o uso social e as formas de defesa do território (Little, 2002-2003). Que consequências tais dinâmicas acarretam na autoprodução urbana da moradia em comparação com as rurais?

OS ASSENTAMENTOS POPULARES PESQUISADOS

Considerando o histórico de produção do território maranhense e o caráter periférico de sua inserção nacional, em que a prevalência da mais alta taxa nacional de população rural (IBGE, 2010a) comprova a permanência de territorialidades e cosmografias, a pesquisa decidiu dedicar maior tempo e recursos técnicos e financeiros na investigação da realidade rural, tomada na pesquisa como referência analítica das práticas construtivas dos grupos sociais urbanos. Essa decisão, que resultou no quantitativo superior de moradias rurais, com 2/3 do total pesquisado, justifica-se pela recente e frágil urbanização do estado (Burnett et al., 2016), pois, mesmo em polos urbanos de caráter regional, predominam vínculos e atividades rurais (Lima, 2008; Burnett, 2020), com um percentual significativo de casais jovens que, migrantes da zona rural, enfrentam a vida urbana sem o apoio de redes familiares. Diferentemente das urbanizações seculares, a construção da sociabilidade das periferias urbanas no Maranhão ainda tem como referência as áreas rurais, e seu entendimento exige mais do que tipologias classificatórias produzidas por estudos urbanos.

A seleção das famílias entrevistadas ocorreu a partir de escalas de aproximação, contemplando, nas áreas rurais, tanto a distribuição espacial dos grupos sociais selecionados (Figura 1) quanto a existência de conflitos fundiários (CPT, 2019) nas cinco mesorregiões do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – à época ainda vigentes, mas substituídas posteriormente pelas regiões geográficas. A escolha das áreas urbanas utilizou como matriz básica a Rede de Influência das Cidades (REGIC) (IBGE, 2007), conforme a Figura 2, combinando centralidade regional e aumento populacional recente, principais vetores da autoprodução de ocupações populares, pois inexistem em nível estadual dados estatísticos sobre os ‘aglomerados subnormais’ do IBGE.


Figura 2
Maranhão: relações entre centralidades, 2007.
Fonte: Maranhão (2013).

Fazendo coincidir destinos rurais e urbanos para otimização dos recursos, a escolha dos assentamentos populares obedeceu a referências diversas, sistematizadas a partir da revisão bibliográfica que incluiu trabalhos científicos nas áreas da sociologia, antropologia, geografia, arquitetura e urbanismo, apoiada por dados atualizados sobre socioeconomia do Maranhão, estatísticas de conflitos sociais pela terra, coleta de notícias na imprensa e nas redes sociais, sempre na ótica comum do status de produção de tais espaços pelos grupos sociais selecionados.

Somando 25 pesquisadores, entre docentes e graduandos, alternados ao longo dos dois anos das atividades, o trabalho de campo foi desenvolvido entre maio de 2018 e junho de 2019, em 34 dos 217 municípios maranhenses, totalizando 284 moradias registradas – 189 rurais e 95 urbanas. O apoio de dezenas de colaboradores – representantes de associações de moradores, sindicatos de trabalhadores, lideranças comunitárias, conselheiros de colegiados diversos, professores, religiosos, vereadores, secretários e funcionários municipais, estaduais e federais – foi indispensável para o contato inicial e o aceite das famílias para acesso às suas moradias e histórias. Para otimização dos recursos, a equipe de campo se dividia entre as tarefas de interlocução com os chefes de família – entrevistas compiladas em formulários, gravadas quando possível – e os registros gráficos das moradias e de seus anexos no lote.

A seleção das famílias a serem entrevistadas em cada um dos assentamentos pesquisados ocorria por ocasião da visita, conforme variáveis que incluíam, além da indispensável disponibilidade dos moradores, a tipologia construtiva tradicional predominante e diferenciada do lugar, contemplando variadas situações de qualidade construtiva e estado de manutenção. A colheita das informações junto aos entrevistados compreendeu dados sobre a família, o lugar e a moradia – composição, faixas etárias, assistência social, ocupação da terra, atividades produtivas, acesso a serviços e infraestrutura, regime de construção e aquisição dos materiais –, bem como um levantamento arquitetônico e cadastro fotográfico do imóvel e de seus anexos. Na Figura 3, estão identificados e quantificados os municípios selecionados e as moradias pesquisadas nas cinco mesorregiões em que se dividia o estado.


Figura 3
Maranhão, quantitativo de moradias visitadas conforme mesorregiões e áreas urbanas e rurais.
Mapa: F. L. Burnett, C. R. P. Souza e M. F. Moniz Filho (2020).

CARACTERIZAÇÃO DOS ENTREVISTADOS: FAMÍLIA, TRABALHO E RENDA

Do ponto de vista da família nuclear que predomina na ocupação das moradias urbanas, tal como registrado em estudos de Woortmann (1981), na área rural prevalecem os chefes de família mais idosos em comparação aos que vivem na cidade, aqui jovens adultos migrantes nas ocupações urbanas. De forma semelhante, a família extensa – parentes sanguíneos – sempre compõe a vizinhança imediata dos que vivem no campo, formando uma rede de apoio próxima e constante, com filhos casados e raramente em coabitação com os pais, fato que teria suas razões na impossibilidade de divisão do comando da cozinha, espaço estratégico nas moradias populares (Woortmann, 1981).

Essa realidade tem menor ocorrência nos assentamentos urbanos, nos quais raramente são encontrados parentes mais velhos, sendo comum a presença de irmãos e irmãs, recém-chegados do campo e temporariamente sob o mesmo teto até conquistarem a própria moradia. Além de privados do apoio cotidiano nos trabalhos domésticos, essa ausência dos idosos implica não contar com benefícios de prestação continuada, como pensões e aposentadorias, os quais, na zona rural, favorecem toda família. Afora essa renda, estão os pescadores registrados nas colônias – que recebem, três meses por ano, o ‘seguro-desemprego do pescador artesanal’ – e os filhos e maridos, contratados para trabalho fora do povoado – que enviam a maior parte do ganho mensal para suas famílias (Woortmann, 1990) –, compondo rendas garantidas de acesso ao consumo alimentar, aquisição de eletrodomésticos, compra de materiais e contratação de mão de obra para construção da moradia.

Afazeres múltiplos são comuns no cotidiano dos trabalhadores, divididos entre a produção e a prestação de serviços, com atividades rurais demandando força de trabalho superior à da família, oportunizando práticas coletivas voluntárias, retribuídas por meio da ‘troca de dia’ (Conceição, 1980), expressões nos casos do plantio e colheita, coleta e quebra de coco-babaçu, tapagem de casas e produção de carvão vegetal. Nas cidades, serviços domésticos – cozinha, lavagem de roupa e faxina – são combinados com biscates diversos – ajudante de pedreiro, pintor ou carpinteiro, serviços de entrega em domicílio e vendas em áreas públicas. Apesar de tarefas coletivas persistirem como necessidade nas cidades, a periferização dos bairros populares e os longos deslocamentos casa-trabalho acabam por dispersar espacialmente os membros familiares, resultando na individualização dos afazeres no entorno e no interior da moradia. Raramente atuando como força de trabalho solidária, a família dos bairros populares dispõe somente dos fins de semana para exercer trabalhos compartilhados, seja a construção da casa ou melhorias do espaço público em suas imediações. Já na zona rural, além da prática de semeadura e colheita compartilhadas, o uso relativamente livre do tempo nas atividades agrícolas, que acontece segundo as estações climáticas e não pela divisão semanal ou diária, permite um controle e planejamento do tempo familiar mais relacionado com prioridades e encargos próprios da família e dos indivíduos.

Como a produção agrícola dos grupos rurais se caracteriza pelo aprovisionamento para consumo familiar, sua comercialização depende do excedente, feita de forma inconstante, na própria casa, em feiras ou sedes municipais, exigindo organização dos produtores, pois o transporte costuma ser raro e custoso. Regra geral, devido a condições tecnológicas, força de trabalho e dimensão das terras disponíveis, poucos conseguem volume e regularidade para aderir a programas como o de Aquisição de Alimentos (PAA) da agricultura familiar. A criação de pequenos e médios animais ‘na solta’ se inviabiliza quando é feita próxima de fazendeiros e pecuaristas que praticam apreensões e abates, pois o custo da ração não permite a criação confinada. A constituição de baixa densidade populacional nas periferias de pequenas e médias cidades do estado possibilita que as famílias mantenham pequenas hortas, criem algumas galinhas e mesmo porcos, praticando pesca e roça nas proximidades. Quando próximos a centros maiores, alguns assentamentos urbanos oferecem aulas de reforço escolar, vendas de produtos alimentícios, serviços digitais diversos, pequenas manufaturas de vestuário, bares e casas de show no próprio lote, gerenciados pelos moradores ou terceirizados para apresentações de bandas da região.

Esse é o contexto socioeconômico e espacial nos quais os grupos rurais e urbanos do Maranhão determinam a construção de suas moradias, assentadas em territórios conquistados e produzidos em processos com diferentes escalas de marginalização das razões instrumentais do Estado e do capital. Assim como as demais e múltiplas atividades desenvolvidas para reprodução social, as necessidades e possibilidades familiares de acesso a meios técnicos, tempo de execução e capacidade de gestão levam à determinação dos processos construtivos e seus resultados, nos quais predomina o saber empírico e os exercícios de decisão e de planejamento.

AUTOPRODUÇÃO DA MORADIA POPULAR RURAL E URBANA NO MARANHÃO

Do total de 284 moradias pesquisadas em todo o estado, foram selecionadas 98 para análise (Tabela 1), tomando-se como referência os dados sobre materiais construtivos populares do Maranhão do Sistema de Informações Básicas do Ministério da Saúde (SIAB) (Brasil, 2013). A distribuição dos materiais entre os grupos sociais apontou, na área rural, a presença de maior variedade entre posseiros (37) e remanescentes de quilombolas (14), em contraposição aos agregados (cinco), colonos e quebradeiras de coco, cada um com uma moradia. Em situação intermediária, povos originários e assentados da reforma agrária aparecem com sete moradias, enquanto os ocupantes, grupo social urbano, somam 26 famílias pesquisadas.

Tabela 1
Maranhão: material predominante da moradia por grupo social.

Com uma moradia de palha e outra de madeira, os indígenas têm na taipa de mão o material preferencial de suas moradias, com baixa taxa de substituição por alvenaria cerâmica em algumas aldeias, inclusive por meio da contratação de mestre de obra e equipe (Figura 4B). Ainda que as limitações logísticas da pesquisa, restringindo o trabalho de campo a apenas uma das etnias presentes no estado – a Tenetehara-Guajajara – e a um de seus territórios – a Terra Indígena (TI) Rio Pindaré –, pareçam insuficientes para explicar a especificidade construtiva constatada entre indígenas, cujos materiais e formas de suas moradias se assemelham às dos demais grupos sociais pesquisados, cabe ressaltar alguns aspectos sociológicos da questão.


Figura 4
A) Mutirão de troca da cobertura de palha de agregado em Caxias, Maranhão; B) empreitada global em aldeia indígena em Bom Jardim, Maranhão.
Fotos: F. Burnett (2018).

Com um longo histórico de “relações interétnicas” que remontaria ao início do século XVII e, conforme Diniz (1994, pp. 17-18), contaria sucessivamente períodos de “escravidão, servidão, transição, patrão-cliente e política indigenista”, muitos autores defendem que a identidade social atual dos Guajajara foi determinada pelo longo contato com a “sociedade nacional”, a qual “os condena ao desaparecimento pela via do contato, entendido como um poder transformador atribuído ao ‘todo poderoso’ homem branco” (E. Almeida, 2019, p. 55). Essa leitura tem outros entendimentos, que se referem “à capacidade nativa de manipular elementos à sua volta”, pois, “inspirados em seus heróis culturais”, os Guajajara “se jogam a misturar coisas: natureza, relações sociais, gentes, crenças etc.” Já presente “nas narrativas cosmológicas, a manipulação dos elementos, que podemos chamar simplesmente de mistura, surge como uma ‘arte’ na vida Tentehar” (E. Almeida, 2019, p. 58).

Seria justamente esta “capacidade nativa de manipular elementos à sua volta” que poderia esclarecer o percurso construtivo das moradias dos Guajajara, desde o tapiri de “palha quebrada” da década de 1960, descrito por Conceição (1980), passando pelos dados coletados em 1977 por Diniz (1994):

Nessas aldeias, o casario é enfileirado, as casas são retangulares e o teto de duas águas. A cobertura e as paredes são feitas com folhas das palmeiras babaçu e/ou inajá. Algumas, porém, eram cobertas com pequenos pedaços de madeira da árvore sapucaí ou palha de pati, enquanto que as paredes eram de taipa ou apenas de paus roliços. Essas moradas, embora semelhantes às dos habitantes da zona rural ou das periferias urbanas, diferem pela ausência ou menor número de janelas e de divisões internas

(Diniz, 1994, p. 31).

Concordando que “nenhuma sociedade, desde que consiga sobreviver, pode deixar de capturar e transfigurar em seus próprios termos culturais tudo que lhe é proposto ou imposto” (Albert & Ramos, 2002, p. 15 citado em E. Almeida, 2019, p. 168), pode-se entender as práticas construtivas assimiladas pelos Guajajara da TI Rio Pindaré como hibridismo cultural, “que reverte os efeitos da recusa colonialista, de modo que outros saberes ‘negados’ se infiltrem no discurso dominante e tornem estranha a base de sua autoridade – suas regras de reconhecimento” (Bhabha, 1998, p. 165).

Nesta perspectiva, o moderno e o tradicional não deveriam ser vistos como opostos, pois interagem nas diversas dimensões da vida de uma comunidade, não podendo ser considerado “. . . nem transplante alienado, nem desajuste com a própria realidade: tentativas de organizar o mundo moderno sem abdicar da história”

(Canclini, 2008, p. 111 citado em Strachulski, 2020, p. 226).

Contrariando entendimentos e atitudes que ignoram ou condenam “essa forma que a gente tem de usar celular, de usar carro (quem tem condição), de usar casa com energia, de usar roupa, até de falar o português . . . ” (Arão Marizé, 2018, em entrevista concedida a E. Almeida, 2019, p. 193), o ato de “conferir autoridade aos hibridismos culturais que emergem em momentos de transformação histórica” significa entender que “. . . o ‘direito’ de se expressar a partir da periferia do poder e do privilégio autorizados não depende da persistência da tradição”. Ao contrário, “. . . ele é alimentado pelo poder da tradição de se reinscrever através das condições de contingência e contraditoriedade que presidem sobre as vidas dos que estão ‘na minoria’” (Bhabha, 1998, pp. 20-21).

Ao entender que a “existência fronteiriça” daquele que “habita a borda de uma realidade ‘intervalar’” (Bhabha, 1998, p. 35) é, por excelência, “um lugar de hibridismo”, e que “a construção de um objeto político que é novo, nem um e nem outro, aliena de modo adequado nossas expectativas políticas”, Bhabha (1998) estabelece que estas construções acabam “necessariamente mudando as próprias formas de reconhecimento do momento da política” (Bhabha, 1998, p. 51).

O que é irremediavelmente distanciador na presença do híbrido – na reavaliação do símbolo da autoridade nacional como signo da diferença colonial – é que a diferença de culturas já não pode ser identificada ou avaliada como objeto de contemplação epistemológica ou moral: as diferenças culturais não estão simplesmente lá para serem vistas ou apropriadas

(Bhabha, 1998, pp. 165-166).

Entretanto, a assimilação passiva de elementos exógenos, na dinâmica do polo capitalista dominante sobre o dominado, constitui uma face do hibridismo que deve ser problematizada. Para Cevasco (2006, pp. 136-137), perante o processo de globalização, é necessário manter a postura crítica e entender “a quem esta cultura serve”, “quais seus fundamentos” e as relações entre “inclusão e exclusão”. Nesse sentido, o estranhamento em relação à moradia indígena mostra todo seu pré-conceito quando estudamos simultaneamente as comunidades quilombolas, historicamente à margem da ‘sociedade nacional’, negando-se a aceitar a inclusão subordinada ofertada pelo sistema. Com trajetórias de intercâmbios sociais e mesmo maritais com os indígenas (A. Almeida, 2008), os ex-escravizados não estão sujeitos aos estereótipos que pesam sobre os povos originários, e, ainda portando valores culturais ancestrais, suas escolhas construtivas não provocam as mesmas reações de estranhamento.

Os remanescentes de quilombolas se dividem entre o uso do adobe e da taipa de mão, compartilhando a mesma situação dos assentados, que usam a taipa de mão e o tijolo cerâmico através de financiamentos disponibilizados pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), sendo o tijolo o mais adotado pelos ocupantes urbanos, os quais, como os posseiros, utilizam todos os materiais. Com pouca incidência na mostra, colonos e quebradeiras de coco empregam ambos artefatos e, em conformidade com a imposição dos donos das terras para evitar demandas de indenização por benfeitorias, todos os agregados estão limitados ao uso da taipa de mão.

REGIMES DE CONSTRUÇÃO

Para classificação das moradias conforme o regime de construção adotado, a pesquisa se baseou nas informações dos moradores sobre os processos de autoprodução, que comportam uma variedade de combinações, prova da liberdade que dispõem, claro que vinculadas às condições gerais de vida familiar. Agrupando os casos em dois grandes modos de construção – autoconstrução, sem troca monetária, e contratação, quando há trabalho remunerado –, as situações contemplam desde modos puros de cada um deles a combinações simples e complexas da mão de obra (Tabela 2).

Tabela 2
Maranhão: autoprodução da moradia conforme regime de construção.

Há situações de composição familiar cuja força de trabalho é suficiente para parte significativa do trabalho, contando com ajuda externa para serviços de maior envergadura, como a tapagem de paredes ou coberta das casas; também há em casos contrários, quando a idade avançada dos chefes de família ou o fato de os filhos serem menores demanda o apoio de parentes e vizinhos ao longo de toda a construção. Entre essas duas situações, combinam-se várias formas de solidariedade, quando se revezam os participantes e as orientações técnicas para as tarefas, conforme o saber apropriado pelos colaboradores. Por outro lado, quando inexistem tais condições, a contratação – parcial ou total – acontece, implicando poupança para dar conta dos encargos do serviço e uma nova etapa de planejamento da obra se impõe, seja pela venda antecipada da produção ou criação, seja pela percepção programada de benefícios certos. A contratação, que pode envolver amigos e parentes, implica deferência ao trabalho profissional contratado e, ainda, em caso de filhos da família, a remuneração é reconhecida como consequência do saber adquirido fora do lugar, nunca sendo visto como algo injusto, que ignoraria o investimento dos pais na criação ou educação do trabalhador. Nas Figuras 4A e 4B, há imagens das duas formas de produção da moradia: o mutirão entre parentes e amigos e a contratação por empreitada.

CONCEPÇÃO E DETERMINAÇÃO DAS MORADIAS AUTOPRODUZIDAS

Considerando que autoprodução das moradias resulta de “práticas tradicionais baseadas em conhecimento empírico e recursos locais, desenvolvidas ao longo de muito tempo por muitas pessoas”, e que os “construtores vernaculares ensinam uns aos outros e aprendem fazendo e, eventualmente, conversando sobre o que fazem” (Kapp & Baltazar, 2012, p. 253), cabe entender que o processo de concepção e representação de um projeto de arquitetura pelos seus moradores se insere no campo do vernacular que, diferentemente do erudito, parte de tipos consagrados pelo uso, mas não constitui sistemas fechados ou intocáveis pelos produtores-usuários (Kapp, 2020). Pensados a partir de conjunto de ambientes básicos – sala, dormitórios e copa-cozinha –, os projetos populares se atêm a tais modelos ou incluem, desde a concepção ou depois da obra, terraços, alpendres e banheiros. Qualquer referência à pobreza ou à limitação de tais práticas ignora essas determinações sociais e nem de longe pode ser assemelhada à miséria espacial das ‘unidades habitacionais’ estatais, pensadas para ganhos econômicos e políticos a partir de custo de obra e rapidez de execução/inauguração.

Ainda que muitos dos exemplares pesquisados partam da concepção simples, riscando no chão um retângulo cujas dimensões são determinadas pelo número dos ambientes, o processo construtivo sem hierarquia externa ou heteronomia está aberto para modificações que acontecem durante a obra ou, mais comumente, por meio de ajustes pós-ocupação, por usos não previstos ou por parte de novos membros familiares. As variações expostas na Tabela 3, que percorrem todos os materiais pesquisados, mostram a dinâmica das obras, juntamente com a durabilidade de moradias que acompanham a própria história familiar.

Tabela 3
Maranhão: material predominante, características familiares, área coberta e idade da moradia.

As dimensões e a durabilidade das moradias comprovam a resistência e a adaptabilidade de todos os materiais pesquisados, podendo-se afirmar que a escolha dos materiais, que obedece a uma série de variáveis, e o acesso, não apenas em termos financeiros, mas em termos de extração, são determinantes. A diferença maior entre eles é a periódica substituição – caso das paredes e cobertas de palha, com vida útil de até quatro anos – ou a manutenção principalmente da taipa de mão pela desagregação do material junto ao solo e à presença de insetos xilófagos. As Figuras 5 e 6 demonstram a versatilidade dos materiais e as tipologias construtivas.


Figura 5
A-B) Palha e telhas cerâmicas em áreas rural e periurbana inundáveis, Cajari e Pindaré Mirim, Maranhão; C-D) taipa de mão em ocupação periurbana e comunidade quilombola, Miranda do Norte e Alcântara, Maranhão; E-F) adobe em fazenda e comunidade quilombola, Carolina e Brejo, Maranhão.
Fotos: Laboratório de Análise Territorial e Estudos Socioeconômicos (LATESE/UEMA) (2018).

Figura 6
A-B) Madeira em bairros periféricos, Turiaçu e Imperatriz, Maranhão; C-D) tijolo maciço em bairros periféricos, Zé Doca e Estreito, Maranhão; E-F) tijolo cerâmico em área rural e bairro periurbano, Viana e Paço do Lumiar, Maranhão.
Fotos: LATESE/UEMA (2018).

UM SISTEMA DA AUTOPRODUÇÃO DA MORADIA POPULAR NO MARANHÃO

Como síntese da pesquisa sobre autoprodução da moradia popular no estado, um fluxograma foi construído visando articular componentes do processo – grupos sociais, regimes de posse e ocupação da terra e regimes de autoprodução da moradia – com suas relações internas referentes às duas vertentes das obras, a autoconstrução e a contratação (Figura 7). O fluxograma pretende aprofundar o conhecimento produzido e contribuir para valorizar e disseminar processos populares de construção, mas apresenta-se ainda como uma estrutura inicial, necessitando de ajustes e complementações.


Figura 7
Fluxograma da autoprodução da moradia popular no Maranhão.

Reproduzindo a sequência da investigação, o fluxograma parte dos grupos sociais, seus regimes de ocupação e posse da terra para enfocar as práticas de produção da moradia, bifurcando-se na autoconstrução e na contratação, com suas respectivas formas de organização do trabalho no canteiro. Um desenvolvimento possível para esse esquema inicial seria aprofundar diferentes implantações rurais e urbanas, métodos de projeto/concepção relacionados aos regimes de produção e uso dos materiais, de forma a contribuir no reconhecimento do direito construtivo dos despossuídos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A autoprodução da moradia, quando entendida como autoconstrução, escamoteia o processo construtivo levado a bom termo pelas camadas populares, mas aponta para a contradição que, fundada na impossibilidade da produção imobiliária capitalista de incluir todos como consumidores, permite variados graus de trabalho livre e coletivo. O domínio ideológico exercido pela divisão do trabalho, que se opõe aos vínculos entre intelecto e mão (Morris, 1966 citado em Kapp, 2020), somado à desvalorização dos modos de vida dos trabalhadores brasileiros, tem feito com que muitos entendimentos acadêmicos se mantenham na aparência da questão, justificando processos exógenos de dominação via oferta imobiliária capitalista que, “no espaço de viver”, se expressa “na definição da qualidade e dos padrões de vida da força de trabalho”, buscando “que se adaptem às exigências da acumulação e da produção de mercadorias” (Harvey, 1982, p. 20).

No campo da arquitetura, a ausência de uma instância de projeto separada e prévia às construções populares é um dos aspectos mais questionados na autoprodução da moradia popular (Ferro, 2006), porém a defesa da ideia do planejamento da obra, apartado dos moradores, está subsumida à necessidade da produção de mais valor via mercadorias genéricas, que encontra respaldo na posição ocupada pelos técnicos da engenharia e arquitetura. Ao priorizar o espaço rural, mais próximo da natureza, sem intermediação industrial, mas também onde a tradição do pensar e fazer se expressa no saber-fazer da própria vida, a pesquisa possibilitou relativizar a autoprodução no urbano, em que a “conjunção de práticas populares informais e métodos formais de construção” ocorre sob a condição de exploração e dependência sistêmica e onde “as práticas imitadas e os recursos à mão não provêm da natureza, mas de um contexto urbano dominado por uma indústria heterônoma da construção” (Kapp & Baltazar, 2012, p. 254). Em tal situação, a “ingênua busca da criação arquitetônica popular” resulta “bastante frustrada[,] dada a articulação rígida de todos os elementos que se compõem na determinação do produto” (Maricato, 1982, p. 91).

O aprendizado extraído das conversas com famílias de trabalhadores urbanos e rurais constitui outra realidade, despercebida e não refletida, sobre ambientes de vida e trabalho estranhos para a maioria da nossa sociedade, incluindo professores e profissionais da arquitetura. Entendida em seu contexto, a produção autônoma dos grupos sociais tem sua base na organização espacial, em que a moradia se insere e se constitui em diversidades de implantação, organização interna, sistemas e materiais construtivos.

A pesquisa aponta para a prevalência, no Maranhão, da autoconstrução (58,16%) sobre a contratação de mão de obra (41,83%) para produção da moradia, tanto nos assentamentos rurais quanto nos urbanos. Confirma o caráter adverso do urbano, onde, apesar da predominância de trocas monetárias, ali as obras autoconstruídas (43,54%) suplantam as produzidas no espaço rural (38,88%), condição explicada pelas características familiares citadinas, onde predominam casais jovens, sem qualquer aporte de assistência social, com reduzidos vínculos de parentesco nas proximidades. Em geral, são os empregos precários na construção civil, principalmente de ajudantes de pedreiros, que permitem a muitas famílias assumirem obras de alvenaria cerâmica, material que, na área rural, implica a contratação dos construtores por empreitada.

Observa-se uma relação entre os regimes de autoprodução e os materiais de construção pesquisados, em que práticas tradicionais de extração direta dos componentes – principalmente a palha e a taipa de mão, estando em menor percentual o adobe – se impõem na autoconstrução, por meio do trabalho familiar, com ou sem o mutirão de amigos e parentes. Principalmente os dois primeiros materiais são encontrados com maior incidência nas áreas rurais, sendo este o ambiente onde também se constata a melhor qualidade construtiva, com moradias construídas há 20 anos, dispondo de bons acabamentos de reboco e piso.

Considerando que o tempo de construção das moradias registradas varia consideravelmente – de casas recém-edificadas a outras com mais de 40 anos –, independentemente dos materiais utilizados, pode-se afirmar que todos os sistemas construtivos se mantêm vigentes. Mais do que determinada por grupos sociais, a opção pelo material de construção considera variáveis, tais como: condição de posse da terra – com os agregados limitados a construir em taipa de mão –; características do lugar e acesso a materiais – áreas alagadas e praias no bioma amazônico, com predomínio das palafitas de madeira –; e disponibilidade de recursos financeiros para obras de alvenaria cerâmica.

Nas áreas urbanas, o uso da palha e da taipa de mão assume condição de transitoriedade, visando à posse imediata de uma ocupação recente, ainda que a permanência da exclusão produtiva da família possa levar à permanência dessa moradia, condição presente no Maranhão, com os mais altos índices nacionais no uso desses materiais. Edificadas em locais com maior visibilidade social, tais moradias improvisadas sustentam muitos dos argumentos do senso comum sobre a precariedade intrínseca da arquitetura popular de terra que, condenada como alternativa habitacional, tem justificado oferta de ‘moradia digna’ (Burnett, 2019).

Porém, considerando que a reestruturação produtiva, as crises sucessivas do capitalismo, com o fim do pleno emprego e do estado de bem-estar social – fatores que, somados aos efeitos sociais perversos da pandemia da covid-19, tendem a piorar as condições de vida da maioria da população –, tais preconceitos fortalecem processos de dominação cultural e política exercidos sobre os despossuídos. Contestando esses entendimentos, as práticas de autoprodução da moradia popular devem ser valorizadas não apenas por sua capacidade construtiva, mas principalmente como exercícios de resistência e autonomia relevantes para os espaços de vida de seus moradores, vinculados às suas territorialidades enquanto saberes e identidades.

Focando tais considerações, os resultados da pesquisa têm contribuído para a atuação do Núcleo de Pesquisa e Extensão para o Habitat Urbano e Rural (Athuar), em atividade desde 2017 por meio de ações de pesquisa e extensão em cursos latu e stricto sensu vinculados à Universidade Estadual do Maranhão (UEMA). Publicada em formato de livro digital e físico, a pesquisa foi divulgada em evento on-line e debatida com os diretores dos oito cursos de Arquitetura e Urbanismo atualmente vigentes no Maranhão (cinco deles em São Luís, dois em Imperatriz, um em Caxias). Intitulada “Moradia popular e o ensino de arquitetura no Maranhão” (Athuar UEMA, 2020), a roda de conversa discutiu as possibilidades de inclusão do tema nos currículos pedagógicos, problematizando reflexões e ações do campo profissional e institucional com a atuação na assistência técnica à ‘moradia de interesse social’.

AGRADECIMENTOS

Às centenas de famílias moradoras de povoados e bairros populares do Maranhão, que gentilmente abriram suas casas aos pesquisadores; à Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA) e à UEMA, que financiaram e apoiaram o projeto de pesquisa “A moradia popular autoconstruída no Maranhão: regimes de propriedade, formas de produção, morfologia e tipologia urbana e rural”, desenvolvido no âmbito do Departamento de Arquitetura e Urbanismo e do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Socioespacial e Regional.

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Notas

Burnett, F. L., Souza, C. R. P., & Moniz Filho, M. F. (2022). Territorialidades e exercícios de autonomia: grupos sociais e moradia popular autoproduzida no Maranhão, Brasil. Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas, 17(3), e20210057. doi: 10.1590/2178-2547-BGOELDI-2021-0057

Autor notes

Responsabilidade editorial: Richard Pace

Autor para correspondência: Frederico Lago Burnett. Universidade Estadual do Maranhão. Arquitetura e Urbanismo. Rua da Estrela, 472. São Luís, MA, Brasil. CEP 65010-200 (burnett@professor.uema.br).



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