Artigo

EFEITOS DO MODELO DE FINANCIAMENTO NA AUTONOMIA DAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS: ANÁLISE SOB O ENFOQUE INSTITUCIONAL

EFFECTS OF THE FUNDING MODEL ON THE AUTONOMY OF PUBLIC UNIVERSITIES: ANALYSIS UNDER THE INSTITUTIONAL APPROACH

EFECTOS DEL MODELO DE FINANCIACIÓN SOBRE LA AUTONOMÍA DE LAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS: ANÁLISIS BAJO EL ENFOQUE INSTITUCIONAL

Thaís Alves da Silva
Universidade Estadual de Maringá, Brasil
João Marcelo Crubellate
Universidade Estadual de Maringá, Brasil

EFEITOS DO MODELO DE FINANCIAMENTO NA AUTONOMIA DAS UNIVERSIDADES PÚBLICAS: ANÁLISE SOB O ENFOQUE INSTITUCIONAL

REAd. Revista Eletrônica de Administração (Porto Alegre), vol. 28, núm. 1, pp. 33-63, 2022

Escola de Administração da UFRGS

Recepção: 06 Julho 2021

Aprovação: 17 Fevereiro 2022

RESUMO: Este ensaio buscou discutir, sob o enfoque institucional, os efeitos do modelo de financiamento sobre a condição de autonomia das universidades públicas brasileiras. Nesse sentido, avalia-se a possibilidade de haver padrões de respostas organizacionais distintos entre modelos de autonomia que ampliam e que reduzem a dependência de recursos externos competitivos para as universidades. Desse modo, visou suscitar as proposições iniciais para a compreensão de um modelo alternativo de autonomia universitária capaz de superar os problemas presentes nos modelos com foco na redução do financiamento público implantados em diversos países no escopo da New Public Management (NPM). Assim, discute-se que as reformas na autonomia universitária não necessariamente precisam resultar no agravo das pressões e conflitos advindos da complexidade de lógicas institucionais; mas, que um modelo de autonomia baseado na garantia de financiamento estatal direto pode permitir que as universidades identifiquem e usufruam benefícios a partir da complexidade. Como resultado foram delineadas seis proposições teóricas que auxiliam a compreensão das circunstâncias em que as universidades, mesmo como organizações estratégicas, orientadas por objetivos e responsabilizadas por suas ações e resultados, podem ao mesmo tempo: assegurar a autonomia substantiva real; gerenciar as relações com stakeholders evitando excessos prejudiciais de influência externa; assegurar efetividade da autonomia substantiva exercida em nível estratégico; preservar a identidade organizacional fundamentada na lógica dominante do ensino superior; bem como estabelecer interações mutuamente benéficas entre representantes de lógicas concorrentes.

Palavras-chave: Complexidade Institucional, Respostas Organizacionais, Autonomia Universitária, Lógica de Mercado, Lógica Acadêmica.

Abstract: This essay sought to discuss, under the scope of institutional complexity, the effects of university autonomy on the academic dimension of higher education; as well as evaluating the possibility of different organizational response patterns between models of autonomy that expand and reduce the dependence on competitive external resources for universities. In this sense, it aimed to raise the initial proposals for the understanding of an alternative model of university autonomy capable of overcoming the problems present in models focused on reducing public funding implemented in several countries within the scope of New Public Management (NPM). Thus, it is argued that reforms in university autonomy do not necessarily need to result in the aggravation of pressures and conflicts arising from the complexity of institutional logics; but, that an autonomy model based on the guarantee of direct state funding can allow universities to identify and enjoy benefits from complexity. As a result, six theoretical propositions were outlined that help to understand the circumstances in which universities, even as strategic organizations, oriented by objectives and accountable for their actions and results, can at the same time: ensure real substantive autonomy; manage stakeholder relationships by avoiding harmful excesses of external influence; ensure the effectiveness of the substantive autonomy exercised at the strategic level; preserve the organizational identity based on the dominant logic of higher education; as well as establishing productive interactions between concurrent logics.

Keywords: Institutional Complexity, Organizational Answers, University Autonomy, Market Logic, Academic Logic.

Resumen: Este ensayo buscó discutir, en el ámbito de la complejidad institucional, los efectos de la autonomía universitaria en la dimensión académica de la educación superior; así como evaluar la posibilidad de diferentes patrones de respuesta organizacional entre modelos de autonomía que amplían y reducen la dependencia de recursos externos competitivos para las universidades. En este sentido, tuvo como objetivo plantear las propuestas iniciales para la comprensión de un modelo alternativo de autonomía universitaria capaz de superar los problemas presentes en los modelos enfocados a la reducción de la financiación pública implementados en varios países en el ámbito de la Nueva Gestión Pública (NGP). Así, se argumenta que las reformas en la autonomía universitaria no necesariamente tienen que resultar en el agravamiento de las presiones y conflictos que surgen de la complejidad de las lógicas institucionales; pero que un modelo de autonomía basado en la garantía de financiamiento estatal directo puede permitir que las universidades identifiquen y disfruten de los beneficios de la complejidad. Como resultado, se esbozaron seis propuestas teóricas que ayudan a comprender las circunstancias en las que las universidades, aun como organizaciones estratégicas, orientadas por objetivos y responsables de sus acciones y resultados, pueden al mismo tiempo: asegurar una autonomía sustantiva real; gestionar las relaciones con las partes interesadas evitando excesos dañinos de influencia externa; asegurar la efectividad de la autonomía sustantiva ejercida a nivel estratégico; preservar la identidad organizacional basada en la lógica dominante de la educación superior; así como establecer interacciones productivas entre lógicas concurrentes.

Palabras clave: Complejidad institucional, Respuestas organizacionales, Autonomía Universitaria, Lógica de mercado, Lógica académica.

INTRODUÇÃO

Em um contexto de globalização de culturas e práticas, cada vez mais diferentes pressões institucionais têm afetado as organizações de forma concomitante (DURAND; JOURDAN, 2012). Essa situação é predominante em campos institucionais relativos ao setor público, nos quais relações de dependência de recursos requerem interação organizacional com uma ampla gama de partes interessadas (stakeholders) (BENNEWORTH; JONGBLOED, 2010), sendo algumas destas os principais atores fornecedores de recursos essenciais (PACHE; SANTOS, 2010b; DURAND; JOURDAN, 2012).

No âmbito do setor público tem sido atribuída às organizações de ensino uma multiplicidade de funções e significados que geram pressões ambientais complexas e até mesmo conflitantes derivadas de diferentes campos com os quais tais instituições mantêm relacionamento (MEYER; SCOTT; STRANG, 1987). No caso das organizações de ensino superior, sua finalidade tem se direcionado crescentemente à busca do progresso socioeconômico em um contexto de desenvolvimento da sociedade do conhecimento. A universidade passou a ser concebida como “ator organizacional” assumindo um caráter integrado, com foco em gestão e liderança, orientada para objetivos e responsabilizada por suas próprias decisões e ações (KRÜCKEN; MEIER, 2006). Essa nova visão sobre a universidade tem pressionado mudanças na forma de regulação estatal destas organizações no escopo da New Public Management (NPM). Nesse sentido, a garantia de autonomia se tornou tema proeminente nas discussões sobre a forma como a universidade deve ser organizada, administrada e financiada (MAASSEN; GORNITZKA; FUMASOLI, 2017).

O conceito de autonomia institucional no ensino superior é tema de discussões na literatura internacional em razão da complexidade e do caráter multidimensional das operações desempenhadas pelas universidades, abrangendo desde a autonomia na elaboração de currículos ou metodologias de ensino, até a autonomia de gestão financeira e estratégica (IWINSKA; MATEI, 2014; ESTERMANN, 2015). O significado da autonomia universitária é relativo aos diferentes sistemas de ensino superior em cada contexto nacional específico, logo, países distintos empregam diferentes níveis de autonomia em aspectos diferenciados da atividade do ensino superior a depender de características culturais, tradições do setor educacional, objetivos políticos e da percepção sobre a função da educação superior na economia. De forma ampla, a autonomia institucional é analisada em termos de relações entre o Estado e as universidades, o que define o nível de controle exercido pelas autoridades públicas sobre o ensino superior (CHIANG, 2004; ESTERMANN, 2015; ESTERMANN; NOKOLLA; STEINEL, 2011; IWINSKA; MATEI, 2014).

Com uma abordagem institucionalista Enders, Boer e Weyer (2013) discutem como a narrativa dominante tem se afastado das crenças tradicionais da autonomia universitária fundamentada na confiança institucional e liberdade profissional, uma vez que narrativas emergentes têm trazido a ideia de “nova autonomia organizacional” (regulatory autonomy) das universidades, vislumbradas como atores estratégicos sobre os quais se exerce o controle governamental. As preocupações sobre esse tema se verificam, por exemplo, no contexto europeu, onde, em decorrência de crises financeiras e econômicas prolongadas e da influência de novas tecnologias, tem se agravado a tendência de os governos interferirem nas atividades do ensino superior, o que tende a comprometer a liberdade acadêmica que, estreitamente vinculada à autonomia universitária, é considerada aspecto indispensável para o bom funcionamento e sustentabilidade das universidades como instituições (STOICA; SAFTA, 2013; ESTERMANN, 2017). Tal ideia se estende também à relação entre instituições de ensino superior e os demais atores externos em seu campo de atuação, o que inclui organizações de financiamento público e privado, parcerias com organizações industriais ou não-governamentais, entidades internacionais, entre outros (IWINSKA; MATEI, 2014).

Nesse sentido, muito tem sido avaliado sobre o efeito do financiamento na autonomia universitária. Discute-se se haveria uma relação linear em que: quanto mais financiamento, maior a autonomia. Contudo, estudos como o de Chiang (2004) questionam a simplicidade dessa perspectiva, uma vez que a compreensão da natureza complexa da autonomia universitária requer que esta seja definida pelo menos em âmbito político e contextual. Recentemente, as propostas de reforma do ensino superior têm evidenciado uma mudança do padrão de gestão e financiamento das universidades públicas, reduzindo o apoio financeiro do Estado e ampliando a influência e dependência de atores externos (KETTUNEN, 2008; JARERNSIRIPORNKUL; PANDEY, 2018). Desse modo, universidades capazes de tomar decisões autônomas poderiam aproveitar as oportunidades relacionadas a mecanismos de mercado com maior flexibilidade (VERDENHOFA, 2016). Segundo Estermann (2015) a concepção de autonomia normalmente está ligada à capacidade de as universidades atraírem financiamento via estruturas de renda diversificadas, como é o caso do sistema de ensino público europeu onde se inseriu uma lógica de estímulo à competição por fontes de financiamento (BLEIKLIE; KOGAN, 2007).

Assim, a concessão de maior independência financeira para as universidades em relação aos governos fundamenta-se na redução do financiamento estatal direto e, por conseguinte, tem ocorrido crescente pressão para o envolvimento entre a universidade e atores externos visando a busca de fontes alternativas de recursos (CHRISTENSEN, 2011a; 2011b; LAO, 2015; ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018; BALTARU; SOYSAL, 2018; LEIŠYTE, 2019). Isso, na visão de Christensen (2011a; 2011b), significa aumento da dependência de partes interessadas externas que representam fontes de financiamento externo competitivo, tendência que mitiga a autonomia tradicional baseada na garantia de financiamento público capaz de proteger as universidades da exposição e influência excessiva de stakeholders.

Esse contexto de reforma representa a redução da autonomia real das universidades, impulsionada pela ampliação dos elementos de gestão, enfraquecimento de elementos acadêmico-profissionais e incremento da pressão ambiental (CHRISTENSEN, 2011b). Logo, a crescente influência de partes interessadas no processo decisório universitário, gera demandas conflitantes para a universidade, que passa a lidar com pressões crescentes derivadas de um duplo propósito: agir segundo a responsabilidade acadêmica ou praticar a “comercialização do conhecimento”; o que tem representado limitações ao pleno exercício da liberdade acadêmica (BENNEWORTH; JONGBLOED, 2010; LAO, 2015; HOLSTEIN; STARKEY; WRIGHT, 2016; JARERNSIRIPORNKUL; PANDEY, 2018; GESCHWIND et al., 2019; LEIŠYTE, 2019).

Contradições como estas, inerentes à atuação das universidades, são frequentemente abordadas em pesquisas no âmbito da Teoria Institucional, principalmente quando se destacam as prescrições de comportamento contrastantes entre lógicas acadêmicas e lógicas de mercado (GREENWOOD et al., 2011; MAMPAEY; HUISMAN, 2016; PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018; DAVID; VAN DER SIJDE; VAN DEN BESSELAAR, 2018; LEIŠYTE, 2019). Nesse sentido, Thornton, Jones e Kury (2005) apontam que a complexidade institucional é comum em entidades de ensino superior, geralmente influenciadas por lógicas distintas (SHIELDS; WATERMEYER, 2018).

No caso do Brasil, a autonomia universitária prevista na Constituição Federal de 1988, é debate constante, sobretudo, considerando o escasso entendimento sobre os efeitos da autonomia nas universidades públicas que, por sua finalidade social e dependência de financiamento estatal, sujeitam-se a uma série de limitações legais e de prestação de contas (RANIERI, 2015; BENNEWORTH; JONGBLOED, 2010). Apreensões conflitantes surgem, sobretudo, quando se destacam as diferenças entre o funcionamento das universidades públicas em geral, em relação ao modelo de autonomia das universidades estaduais paulistas. Este é considerado uma exclusividade brasileira ao assegurar o repasse de recursos públicos, além de ampliar o escopo de gestão administrativa, financeira e patrimonial, mantida a autonomia didático-científica fundamentada na liberdade acadêmica (RANIERI, 2015); o que o diferencia das abordagens de autonomia baseadas na NPM adotadas em muitos países, em que o financiamento estatal direto tem sido continuamente reduzido.

A autonomia universitária é considerada tema de relevância mediante evidências e discussões que indicam que as universidades não podem ter bom desempenho se não tiverem condições de atuação autônoma (IWINSKA; MATEI, 2014; VERDENHOFA, 2016; MAASSEN; GORNITZKA; FUMASOLI, 2017). Todavia, em alguns estudos de cunho sociológico institucionalista, isso é questionado pelo argumento de que não há um modelo único para o bom desempenho das universidades, pois o contexto e as características organizacionais precisam ser considerados (ENDERS; BOER; WEYER, 2013). Nesse âmbito, discute-se como a autonomia igualmente concedida a setores universitários distintos pode ter resultados contrastantes e, como o desempenho superior das universidades estaduais paulistas em relação aos demais setores pode ter relação com as particularidades de seu modelo de autonomia diferenciado (DURHAM, 2006; RANIERI, 2015).

Em suma, é necessário avaliar a complexidade institucional com que as universidades públicas lidam dentro das tendências recentes de reforma do setor público que têm implicado em mudanças na autonomia concedida a estas organizações, sobretudo, acerca do padrão de financiamento. É necessário também considerar a dependência de atores poderosos de nível de campo capazes de condicionar padrões variados de resposta organizacional estratégica e estrutural que afetam a legitimidade social percebida, bem como a capacidade de acesso a recursos (GREENWOOD et al., 2011). Nesse sentido, de uma perspectiva institucional, uma questão relevante é compreender de que modo as universidades moldam as expectativas, pressões e influência externas, o que representa preocupação com o exercício da autonomia real, e não apenas formal, sobretudo, na dimensão acadêmica (MAASSEN; GORNITZKA; FUMASOLI, 2017).

Diante destas apreensões, pergunta-se: quanto à forma de lidar com a complexidade institucional, de que modo o modelo de autonomia universitária paulista, fundamentado na garantia de recursos públicos, difere dos modelos de autonomia baseados na dependência de financiamento externo competitivo? Desse modo, o objetivo deste ensaio é discutir, sob o enfoque institucional, os efeitos do modelo de financiamento sobre a condição de autonomia das universidades públicas brasileiras.

Este ensaio se justifica por suscitar as proposições iniciais para a compreensão de um modelo alternativo de autonomia capaz de superar os problemas presentes nos modelos implantados em diversos países sob escopo da NPM. Atenção é dada para o fato de que as reformas na autonomia universitária não necessariamente precisam resultar no agravo das pressões e conflitos derivados da complexidade institucional. Pelo contrário, um modelo de autonomia baseado na garantia de financiamento estatal direto, a exemplo das universidades estaduais paulistas, pode permitir que as organizações do ensino superior extraiam e usufruam os benefícios advindos da complexidade.

Essa abordagem permite esclarecer em que circunstâncias as universidades, mesmo como organizações estratégicas, orientadas por objetivos e responsabilizadas por suas ações e resultados, conseguiriam concomitantemente: assegurar a autonomia acadêmica real; gerenciar as relações com stakeholders evitando problemas derivados de excessos de influência externa, e; preservar a identidade organizacional fundamentada na lógica institucional dominante do ensino superior. Esse modelo alternativo de autonomia poderia mitigar problemas de dissociação entre meios e fins a nível de campo que agravam a complexidade institucional para as organizações no ensino superior (GRODAL; O'MAHONY, 2015), condição em que as políticas e práticas implementadas pelo Estado não contribuem para o seu objetivo final de criar bem-estar público (HLADCHENKOA; WESTERHEIJDENA; BOER, 2018).

Além disso, a compreensão das implicações da inserção de lógicas de mercado na atuação das universidades sobre a autonomia acadêmica individual e institucional tem sido um assunto em aberto (BLEIKLIE; KOGAN, 2007). O entendimento sobre a complexidade institucional e respostas organizacionais, além da importância teórica, tem implicações práticas ao contribuir com indivíduos que formulam políticas, para que tenham conhecimento das forças que moldam os comportamentos em instituições com contextos tão variados como as instituições de ensino (GREENWOOD, et al., 2011). Ademais, a influência das ações organizacionais requer melhor compreensão, uma vez que tais ações não se destinam apenas a promover a mudança, mas também à manutenção de lógicas coexistentes, aspecto menos enfatizado nos estudos existentes (LOK, 2010; SMETS; GREENWOOD; LOUNSBURY, 2015; GREENWOOD et al., 2011).

1 COMPLEXIDADE INSTITUCIONAL E AUTONOMIA UNIVERSITÁRIA

As organizações estão incorporadas em sistemas institucionais que definem lógicas, redes de atores e fluxos de recursos capazes de moldar a estrutura, ações e crenças organizacionais (BERTELS; LAWRENCE, 2016). A abordagem de lógica institucional, como vertente dominante dos estudos em teoria institucional na atualidade, tem se preocupado com o estudo da heterogeneidade e dos processos de mudança organizacional (THORNTON; OCASIO; LOUNSBURY 2012; SMETS; GREENWOOD; LOUNSBURY, 2015). Lógicas institucionais podem ser definidas como um conjunto amplo de princípios que contribuem para a interpretação da realidade social, permitindo às organizações agir com confiança dentro dela, a partir da compreensão do que é concebido como comportamento apropriado e necessário para se obter sucesso (THORNTON, 2004; GREENWOOD et al., 2011).

As organizações agem em conformidade com lógicas visando auferir legitimidade perante atores externos de referência, bem como garantir o acesso a recursos controlados por esses públicos poderosos (GREENWOOD et al., 2011). Desse modo, as lógicas institucionais difundidas por atores de campo são capazes de moldar o comportamento organizacional (BERTELS; LAWRENCE, 2016) universitário de formas distintas: lógicas estatais disseminadas por agências governamentais, por exemplo, enfocam o comportamento apropriado no atendimento às normas e regras (LEE; LOUNSBURY, 2015); lógicas da ciência pregam a busca pelo conhecimento e publicação aberta; lógicas de negócios, por sua vez, defendem a retenção e propriedade sobre os resultados de pesquisas científicas, bem como sua exploração para fins comerciais (GREENWOOD et al., 2011).

Assim, há dificuldades para que as organizações estabeleçam relações de conformidade com múltiplas demandas ambientais descoordenadas que representam lógicas conflitantes (D. AUNNO; SUTTON; PRICE, 1991). Lógicas conflitantes são antagonismos nos arranjos organizacionais exigidos pelos diferentes atores institucionais em nível de campo, e, por operarem em múltiplas esferas institucionais, as organizações se sujeitam a regimes regulatórios, ordens normativas e/ou culturais contraditórias, que podem levar à paralisia ou ruptura organizacional (PACHE; SANTOS, 2010b). Logo, a situação em que as organizações precisam lidar com prescrições contraditórias advindas de lógicas institucionais distintas que afetam sua atuação de forma concomitante caracteriza a complexidade institucional (GREENWOOD et al., 2011; DURAND; JOURDAN, 2012). A complexidade pode ser analisada em relação ao número de lógicas que influenciam simultaneamente as organizações em determinado campo institucional (se duas ou múltiplas lógicas), e em relação ao grau em que as múltiplas lógicas são incompatíveis quanto aos objetivos, motivações, práticas e cursos de ação que prescrevem (GREENWOOD et al., 2011).

As pesquisas sobre complexidade institucional comumente a consideraram um estado transitório entre períodos de dominação de lógicas distintas (SMETS; GREENWOOD; LOUNSBURY, 2015). Entretanto, percebeu-se que na realidade muitas organizações apresentam natureza institucionalmente complexa e precisam lidar continuamente com lógicas concorrentes que influenciam suas práticas e estruturas organizacionais, como é o caso das universidades (SAUERMANN; STEPHAN, 2013), bem como de outras entidades de caráter social em que a coexistência de múltiplas lógicas é algo normal e duradouro (KRAATZ; BLOCK, 2008; MCPHERSON; SAUDER, 2013; BESHAROV; SMITH 2014).

Contudo, as organizações não são apenas instâncias de lógicas ambientais e institucionais, onde os atores executam roteiros pré-determinados, mas são lugares onde pessoas e grupos dão sentido a essas lógicas (BINDER, 2007). Assim, as respostas organizacionais à complexidade institucional dependem do modo como múltiplas lógicas são refletidas nas estruturas e práticas da organização. Desse modo, a complexidade institucional, além de criar circunstâncias conflituosas para as instituições, é vivenciada de forma e em graus diferentes de acordo com atributos internos e com a posição que a entidade ocupa dentro do campo (GREENWOOD, et al., 2011). Nesse sentido, comumente, a organização está incorporada em uma lógica dominante e, por questões de dependência de recursos e legitimidade externa, passa a desenvolver mecanismos de resposta que permitam a aderência a lógicas emergentes (GREENWOOD, et al., 2011; DURAND; JOURDAN, 2012). Em suma, as lógicas não são simplesmente implementadas de cima para baixo, pois existem pessoas reais e contextos reais que trazem experiências próprias para questionar essas lógicas e recombiná-las com lógicas de outros domínios conforme o contexto (BINDER, 2007).

1.1 Efeitos das Reformas do Setor Público no Modelo de Autonomia Universitária

A autonomia é um tema discutido tanto no nível do sistema universitário e educacional como um todo (o campo) como no nível institucional individual (MAASSEN; GORNITZKA; FUMASOLI, 2017), e relaciona-se ao conceito de liberdade acadêmica, tema abordado em pesquisas acerca de reformas no ensino superior em diversos países. A concepção de autonomia universitária se subdivide em quatro dimensões principais interdependentes: autonomia organizacional, financeira, de pessoal e acadêmica (DECLARAÇÃO DE LISBOA, 2007 apudVERDENHOFA, 2016; ESTERMANN, 2015).

A autonomia organizacional refere-se à liberdade para determinar a estrutura, regulamentos e estatutos da universidade, celebração de acordos e eleição dos administradores e reitores. A autonomia financeira refere-se à liberdade para decidir sobre questões de atração e distribuição de financiamento, taxas de matrícula ou mensalidades, modo de utilização dos lucros, entre outros. A autonomia de pessoal tem relação com questões de recrutamento, remuneração e planos de carreira. E, finalmente, a autonomia acadêmica consiste na liberdade docente para decidir sobre currículos, métodos de ensino, orientações, formas de condução de pesquisas, entre outros aspectos (DECLARAÇÃO DE LISBOA, 2007 apudVERDENHOFA, 2016; ESTERMANN, 2015). Enquanto a dimensão acadêmica da autonomia refere-se àqueles atores individuais que conduzem o ensino e a pesquisa diretamente, as demais dimensões referem-se à organização em si (DURHAM, 2006; ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018). Em muitos casos, dentro de uma estrutura de governança compartilhada, o próprio corpo docente, além de exercer a autonomia acadêmica, detém pelo menos uma função consultiva em questões administrativas e orçamentárias (ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018).

Estreitamente vinculada à autonomia acadêmica está a ideia de liberdade acadêmica, entendida como a liberdade do profissional individual em conduzir ensino e pesquisa para buscar a verdade, expressar suas opiniões científicas e profissionais, mesmo que em uma abordagem crítica, dentro de um contexto onde se garante a liberdade de escolha, sem riscos de punição ou rescisão do contrato de trabalho, apesar da necessidade de sujeição a instrumentos de avaliação (BERDAHL, 1990; WICKS, 2004; STOICA; SAFTA, 2013; MAASSEN; GORNITZKA; FUMASOLI, 2017; MATEI; IWINSKA, 2018; KRISSANAPONG, 2004; DURHAM, 2006; MATEI, 2017; ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018; JARERNSIRIPORNKUL; PANDEY, 2018).

A liberdade acadêmica individual inter-relaciona-se com a liberdade institucional, citada por Aberbach e Christensen (2018), sinônimo das dimensões de autonomia financeira e administrativa (organizacional e de pessoal). Para Durham (2006) enquanto a liberdade acadêmica é o fundamento da atuação da universidade, a autonomia administrativa, de pessoal e financeira seriam dimensões instrumentais à liberdade acadêmica. De modo semelhante, Berdahl (1990) classifica a autonomia em duas partes: a processual, fundamentada na ideia de auto governança que inclui práticas administrativas, financeiras e de pessoal; e a substantiva, com fundamento na liberdade acadêmica.

Assim, observa-se duas vertentes principais da autonomia institucional no ensino superior (CHRISTENSEN, 2011b): o aspecto organizacional, financeiro e de pessoal agregam-se em um conceito definido como autonomia processual, no qual o ator em análise é a própria universidade; enquanto o aspecto acadêmico vincula-se ao conceito de autonomia substantiva, no qual o ator em foco consiste no conjunto de profissionais que lidam com ensino e pesquisa dentro da universidade (Quadro 1). Ademais, o nível de autonomia exercido em cada um desses aspectos pode variar a depender do tipo e das características da organização. Esse aspecto é apontado por Estermann (2015), segundo o qual em grande parte dos países da Europa as universidades detêm autonomia acadêmica apesar de existirem restrições nas outras áreas, além disso, também destaca que comumente restrições na autonomia financeira implicam na limitação das outras dimensões da autonomia.

Quadro 1
Caracterização das vertentes da autonomia universitária.
Caracterização das vertentes da autonomia universitária.

Considerando que a autonomia processual e substantiva são interdependentes, acredita-se que somente é possível desfrutar de autonomia acadêmica a entidade que também detém autonomia organizacional, financeira e de pessoal, a consequência disso seria o alcance de melhorias no desempenho organizacional (BERDAHL, 1990; DURHAM, 2006; STOICA; SAFTA, 2013; IWINSKA; MATEI, 2014; ESTERMANN, 2015; VERDENHOFA, 2016; MASSEN; GORNITZKA; FUMASOLI, 2017).

Ademais, é importante destacar que o atributo de autonomia não significa independência em relação ao Estado (STOICA; SAFTA, 2013), portanto, não elimina a sujeição a mecanismos de controle e prestação de contas (JARERNSIRIPORNKUL; PANDEY, 2018), pois, conforme Durham (2006) as universidades como instituições são criadas e reconhecidas socialmente para desempenharem funções sociais específicas que as legitimam, assim, sua autonomia não se fundamenta em interesses próprios da organização.

Entende-se que a autonomia, quando concedida a entidades estatais como as universidades públicas, permite maior flexibilidade em assuntos acadêmicos, de gestão financeira, recursos humanos, administração e demais aspectos, conforme apontado por: Lao (2015), em estudo sobre o ensino superior tailandês; por Stoica e Safta (2013), acerca das universidades da Europa; e por Roness et al. (2008), em relação a entidades públicas da Noruega, Irlanda e Bélgica. Desse modo, o conceito indica nível relativo de independência na tomada de decisões, considerado, no caso das universidades europeias por exemplo, indispensável para o bom funcionamento destas instituições. Nessa concepção a autonomia é entendida como um ponto de equilíbrio entre a regulação estatal e mecanismos de mercado, assim como entre controle estatal e liberdade de auto governança da organização, algo que varia entre contextos nacionais distintos (VERDENHOFA, 2016; ESTERMANN, 2015; STOICA; SAFTA, 2013; MAASSEN; GORNITZKA; FUMASOLI, 2017).

Nesse sentido, Stoica e Safta (2013) explicam que as universidades europeias têm liberdade de estabelecer sua missão, estratégia institucional, estrutura, atividades, organização e gestão de recursos humanos e materiais, desde que atendidos os limites legais e os padrões de qualidade impostos pela administração pública. Por conseguinte, os autores enfatizam que o conceito de autonomia universitária no contexto europeu não pode ser confundido com independência em relação ao Estado.

Já entre os países nórdicos, o estudo de Nokkola e Bladh (2014) evidencia que o nível de autonomia institucional das universidades é relativamente elevado se comparado com as dos demais países europeus, apesar de serem observadas restrições no exercício da autonomia financeira. Ainda, nestas universidades existem preocupações relacionadas à liberdade na pesquisa, aspecto que tem sido limitado à medida que novas formas de gestão foram implementadas nas instituições em meio à tendência de concessão de maior autonomia formal a estas entidades.

Problemas inerentes à obtenção de níveis mais elevados de autonomia formal também foram relatados no estudo de Lao (2015) segundo o qual, conforme as universidades tailandesas se tornaram mais autônomas perante o Estado, passaram a enfocar apenas os aspectos legais e financeiros dessa condição, o que levou a problemas de gestão, distribuição desigual de recursos e obsessão por rankings internacionais em detrimento da construção de uma estrutura favorável a ensino e pesquisa de qualidade. Huang, Pang, Yu, (2016), por sua vez, destacam o contexto das universidades chinesas onde as recentes reformas da autonomia universitária têm provocado a incorporação crescente de práticas gerenciais dentro das instituições de ensino, o que tem demandado dos acadêmicos assunção de responsabilidades por diversas novas tarefas gerenciais, enquanto permanecem submetidos ao arcabouço regulatório governamental, em função da dependência de recursos públicos. Uma consequência disso é que, apesar de reconhecida pelo Estado, a liberdade acadêmica experienciada pelas universidades chinesas é limitada como instrumento de proteção dos princípios acadêmicos em relação às pressões externas.

Historicamente, a abordagem da autonomia esteve centrada tanto na autonomia profissional dos acadêmicos (ENDERS, 2006) para a gestão administrativa da universidade, quanto em sua liberdade na condução do ensino e pesquisa livres de influências ou sanções. Assim, os atores organizacionais em foco eram os profissionais acadêmicos e não a própria universidade. Todavia, atualmente, em um contexto global de reformas relacionadas à forma de regulamentação e financiamento do ensino superior, a concepção de universidade centrou-se na ideia de uma instituição social que merece posição especial em termos de autonomia institucional e acadêmica considerando as relações entre a educação superior, o estado e a sociedade (ENDERS; BOER; WEYER, 2013).

Essa tendência se desenvolve em um contexto de mudança de narrativa sobre a atividade substancial das universidades. Em geral, a narrativa tradicional dominante nesse meio era a de universidade como instituição de compromisso social, baseada no financiamento estatal, na auto-gestão acadêmica e no compromisso normativo com o conhecimento, concebendo a educação como bem público (CHRISTENSEN, 2011b; DRORI; DELMESTRI; OBERG, 2016; JARERNSIRIPORNKUL; PANDEY, 2018).

Todavia, nas últimas décadas a tendência de reformas do setor público baseada na NPM trouxe mudanças nas relações entre governos e universidades (CHRISTENSEN, 2011b). Dentre essas mudanças pode-se elencar: o direcionamento para o ensino superior em massa; a preocupação com a adequação do ensino e pesquisa às demandas da economia e da sociedade (NAIDOO, 2008); a transformação da atuação das universidades em algo politicamente mais visível e economicamente mais estratégico e competitivo (MARGINSON, 2006; JARERNSIRIPORNKUL; PANDEY, 2018; BRUCKMANN; CARVALHO, 2018); e a transição de modelos de controle estatal para modelos de supervisão e controle de produção e desempenho (em substituição ao controle de processos) (ENDERS; BOER; WEYER, 2013). Estes aspectos delineiam a concepção de uma “nova liberdade” das universidades em relação aos governos (ENDERS; BOER; WEYER, 2013). Isso fez emergir, uma nova narrativa acerca da governança universitária, baseada em um novo modelo de controle estatal, a chamada “autonomia regulatória”, que busca o alinhamento entre a atuação das universidades e os objetivos do governo visando melhorias no desempenho (ENDERS; BOER; WEYER, 2013; BLEIKLIE; ENDERS; LEPORI; 2013). Tal narrativa envolveu, sobretudo, incentivo à substituição do controle direto formal do Estado sobre as universidades para uma condição de maior autonomia no ensino superior (ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018). Tal aspecto, é discutido, por exemplo no caso de universidades da Holanda em que a autonomia organizacional concedida pelo governo passou a ser empregada como ferramenta de regulação (ENDERS; BOER; WEYER, 2013).

Em geral, a justificativa para essas reformas foi que as burocracias profissionais nas universidades foram ineficientes e incapazes de atender a requisitos de: equidade liberdade de escolha; priorização dos interesses da sociedade; alcance de resultados satisfatórios baseados na eficiência e eficácia, e; aceitação do controle externo (CARVALHO; SANTIAGO, 2016; JARERNSIRIPORNKUL; PANDEY, 2018; BRUCKMANN; CARVALHO, 2018). Para sanar tais deficiências adotou-se a percepção de que as universidades precisariam se tornar “organizações completas” em termos de identidade, hierarquia e racionalidade (SEEBER et al., 2015). Para isso seria preciso substituir estruturas burocráticas colegiais e profissionais por estruturas de decisão mais flexíveis e autônomas capazes de atender a demandas diversas de atores externos por meio da diversificação institucional de programas, de clientela e de fontes de financiamento (JARERNSIRIPORNKUL; PANDEY, 2018; GESCHWIND et al., 2019). Este aspecto foi estudado, por exemplo, em universidades da Tailândia, onde a autonomia foi percebida como requisito para garantir autogoverno e excelência (JARERNSIRIPORNKUL; PANDEY, 2018).

Em síntese, entre as principais mudanças implementadas no funcionamento das universidades estão: o maior engajamento para atender aos alunos prestando serviços a um “mercado estudantil”; a crescente profissionalização do pessoal administrativo (ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018), cuja participação relativa tem aumentado em relação ao pessoal acadêmico sobretudo, pela maior necessidade de atendimento a demandas de controle, regulação e de atores externos (BALTARU; SOYSAL, 2018); o incentivo à implantação de uma gestão com mais planejamento estratégico via estruturas racionais, processos padronizados e responsabilidades definidas, sujeita a controle e prestação de contas (JARERNSIRIPORNKUL; ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018; PANDEY, 2018; GESCHWIND et al., 2019). Tais mudanças têm estimulado a chamada “virada gerencial”, processo caracterizado pelo incentivo à alteração da identidade organizacional no ensino superior (KRÜCKEN; BLÜMEL; KLOKE, 2013; GESCHWIND et al., 2019).

A identidade organizacional é entendida como conjunto de reivindicações a categorias sociais padronizadas pelo arcabouço institucional (KRAATZ; BLOCK, 2008). Esta atua como um filtro que permite à entidade interpretar e responder a mudanças no ambiente institucional por meio de estratégias, bem como ajuda a delimitar os atributos que a tornam diferente das demais organizações no mesmo patamar institucional (GLYNN, 2008; KING; FELIN; WHETTEN, 2010). Dentro do contexto de reformas, as universidades têm sido pressionadas a substituir sua identidade tradicional por uma identidade gerencial (SEEBER et al., 2015), seguindo lógicas que pregam maior preocupação com a disciplina orçamentária, eficiência via redução de custos e avaliação de desempenho (GESCHWIND et al., 2019). Nesse sentido, tornam-se proeminentes questões de planejamento racional, delegação de tarefas dentro de uma estrutura hierárquica, processo decisório top-down e sistemas de controle formalizados (GESCHWIND et al., 2019).

Outro aspecto importante das reformas na governança do ensino superior é a substituição do predomínio de docentes no processo decisório, que passou a ficar a cargo de representantes de diferentes grupos de atores internos e externos à universidade, comumente nomeados e não eleitos (ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018). Quanto a isso Bleiklie e Kogan (2007) explicam que a governança universitária foi originalmente representada pela noção de uma “república de estudiosos”, em que a autonomia institucional e a liberdade acadêmica relacionam-se estreitamente e a liderança é exercida por profissionais acadêmicos independentes tomando decisões colegiais. Mas, passou a se fundamentar na noção de uma “organização de stakeholders” em que a autonomia institucional, dentro de uma estrutura hierárquica, embasa a estratégia dos líderes que buscam atender as necessidades das principais partes interessadas, sendo o corpo docente apenas uma entre várias delas (BLEIKLIE; KOGAN, 2007; BLEIKLIE; ENDERS; LEPORI; 2013; STENSAKER et al., 2014; MAMPAEY; HUISMAN, 2016; JARERNSIRIPORNKUL; PANDEY, 2018).

1.2 Lógicas Conflitantes no Âmbito da Autonomia Universitária

Quando se trata das responsabilidades do ensino superior, com o passar do tempo, espera-se cada vez mais que as universidades se envolvam com funções sociais novas e mais complexas que ampliam essas responsabilidades para além das missões tradicionais da universidade, de modo a abranger novas obrigações, como desenvolvimento econômico e sustentabilidade (HAYTER; CAHOY, 2016). A tendência recente é que as universidades se tornem organizações empreendedoras, mercantilizadas e orientadas para a prática do mercado (JAIN; GEORGE, 2007; RHOTEN; POWELL, 2010; DRORI; DELMESTRI; OBERG, 2016). Com a crescente autonomia formal delegada pelos governos, estas organizações passaram a configurar atores estratégicos que necessitam competir no mercado global por legitimidade e recursos (KRÜCKEN; MEIER, 2006; BALTARU; SOYSAL, 2018). Um exemplo é o caso de programas de financiamento governamental no Reino Unido que têm requerido que as universidades estabeleçam relações de cooperação com parceiros do mercado dispostos a financiar pesquisas acadêmicas visando ampliar seu impacto econômico (PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018).

Isso ocorre, pois as propostas recentes de reforma do ensino superior têm demonstrado claramente uma mudança do padrão de gestão e financiamento: do Estado para os atores externos do Mercado (MARGINSON, 2006). Conforme Estermann (2015) essa ideia de autonomia está ligada à capacidade de as universidades atraírem financiamento adicional, argumentando que estruturas de renda diversificadas contribuem para o alcance da autonomia institucional. Nesse sentido, emergem discussões sobre a natureza dessa autonomia que seria fundamentada na concessão de maior independência financeira para as universidades em relação aos governos, consistindo na redução do financiamento estatal direto e incentivo à busca por fontes de financiamento externo competitivo (CHRISTENSEN, 2011a; 2011b; ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018; BALTARU; SOYSAL, 2018; LEIŠYTE, 2019). Tal apreensão é apoiada por Lao (2015) que ressalta que as universidades públicas autônomas têm sido pressionadas a se tornarem financeiramente mais independentes do Estado, uma vez que a maioria das reformas direcionam estas instituições a atuarem de forma mais próxima ao modelo do setor privado, como ocorrido nas últimas décadas em países europeus (CHRISTENSEN 2011a; MAMPAEY; HUISMAN, 2016; ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018; BRUCKMANN; CARVALHO, 2018).

Dado o incremento da colaboração entre a universidade e partes interessadas do setor privado (ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018; MAMPAEY; HUISMAN, 2016), tem aumentado a capacidade de essas últimas influenciarem e responsabilizarem a universidade por sua atuação, representando interesses que, muitas vezes, interferem ou limitam a liberdade acadêmica (JARERNSIRIPORNKUL; PANDEY, 2018; BENNEWORTH; JONGBLOED, 2010; GESCHWIND et al., 2019). Isso gera demandas conflitantes inerentes, por exemplo, ao conteúdo das pesquisas, à propriedade dos resultados obtidos, a questões financeiras relacionadas, entre outros aspectos (GESCHWIND et al., 2019). Assim, Holstein, Starkey e Wright (2016) salientam a dificuldade da formação de estratégias devido à tensão decorrente do duplo propósito da universidade: a responsabilidade acadêmica e a “comercialização do conhecimento”. No âmbito acadêmico o acesso a prestígio profissional e recursos é determinado pelo impacto das contribuições científicas no meio acadêmico; enquanto os critérios para distribuição de recompensas na “ciência comercial” pautam-se em indicadores de mercado (PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018).

Assim, percebe-se que a estratégia organizacional da universidade tem se adaptado para atender a demandas da lógica de negócios, sobretudo, nos casos de condução de pesquisas aplicadas em parceria com o setor privado, o que demanda o atendimento simultâneo à lógica da ciência e à lógica dos negócios (DAVID; VAN DER SIJDE; VAN DEN BESSELAAR, 2018). Em suma, pode-se considerar a existência de duas principais lógicas institucionais concorrentes que afetam organizações de ensino superior público: a Lógica Acadêmica e a Lógica de Mercado (LAM, 2010, 2011; MURRAY, 2010; MAMPAEY; HUISMAN, 2016; DAVID; VAN DER SIJDE; VAN DEN BESSELAAR, 2018; PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018; LEIŠYTE, 2019).

Com base nas definições de Merton (1973), a lógica institucional da ciência, ou Lógica Acadêmica tem relação com atividades de ensino e pesquisa desempenhadas sob o escopo de: universalismo, segundo o qual todos os acadêmicos contribuem para a ciência; comunalismo, que se refere à colaboração para pesquisa e igualdade de acesso a bens científicos; ceticismo, relativo ao escrutínio das argumentações científicas como requisito para sua aceitação; e desinteresse, que consiste na ausência de intenção de ganho pessoal com os resultados das pesquisas. Ademais, são características da atividade científica a incerteza e a dependência mútua entre pesquisadores na produção do conhecimento (DAVID; VAN DER SIJDE; VAN DEN BESSELAAR, 2018). Em suma, a pesquisa acadêmica tende a ser mais básica, com maior ênfase na autonomia dos cientistas, impulsionados pelo desejo de enfrentar desafios intelectuais, cujos resultados serão amplamente divulgados (LACETERA, 2009; PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018).

Para Geschwind et al. (2019) a lógica tradicional no ensino superior tem sido baseada na colegialidade, processo decisório consensual de baixo para cima, foco na preservação da identidade, valores e interesses do grupo profissional docente, e no financiamento público (CHRISTENSEN, 2011b). Desse modo, a Lógica Acadêmica pode ser concebida como a lógica dominante da organização (DURAND; JOURDAN, 2012). O pessoal acadêmico tende a tentar combinar essa lógica dominante com a Lógica de Mercado na tentativa de estabelecer uma conformidade alternativa (DURAND; JOURDAN, 2012; DAVID; VAN DER SIJDE; VAN DEN BESSELAAR, 2018); o que é visualizado em muitos estudos com foco em centros de pesquisa, também conhecidos como centros de colaboração “universidade-indústria” (LIND; STYHRE; AABOEN, 2013).

A participação em um centro de pesquisa tende a ser entendida como uma maneira de demonstrar relação satisfatória com a indústria (LIND; STYHRE; AABOEN, 2013). Além disso, a comunidade acadêmica tem interesse no financiamento significativo da pesquisa pelo setor privado e nas possibilidades de aprendizado prático para seus alunos via contato com experiências derivadas do meio empresarial e industrial (ELMUTI; ABEBE; NICOLOSI, 2005).

David, Van Der Sijde e Van Den Besselaar (2018), com base em Merton (1973) e Mitroff (1974), caracterizam a Lógica de Mercado (ou lógica do negócio), segundo os seguintes elementos: particularismo, que se refere a limites na produção de conhecimento; solitarismo, relativo ao sigilo de resultados; dogmatismo, que tem relação com a aceitação de regras incontestáveis, e; interesse pessoal.

Seguindo essa lógica as organizações estabelecem estruturas gerenciais com foco em eficiência, redução de custos, controle de recursos e avaliação de desempenho para alcance de objetivos predefinidos com os quais os gerentes se identificam, e para os quais criam estratégias racionais para lidar com mudanças do ambiente (GESCHWIND, 2019). A distribuição de tarefas e o processo decisório ocorrem de cima para baixo com enfoque na estrutura hierárquica e no gerenciamento de linha (GESCHWIND, 2019). O foco de controle não está nos inputs, regras e procedimentos burocráticos, mas nas metas, resultados e acompanhamento do desempenho (CHRISTENSEN, LÆGREID, STIGEN, 2006; HVIDMAN; ANDERSEN, 2013).

A lógica institucional do mercado influencia os interesses e os modos pelos quais as empresas aproveitam oportunidades de colaboração com o setor acadêmico (LIND; STYHRE; AABOEN, 2013). Assim, as empresas avaliam possibilidades de transferência de conhecimento e tecnologia que melhorem sua receita e competitividade no mercado via processos de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) a custos menores (ELMUTI; ABEBE; NICOLOSI, 2005; LIND; STYHRE; AABOEN, 2013).

Por conseguinte, pela ótica de negócios a pesquisa deve ser aplicada ao atendimento de demandas do mercado, seus resultados devem ser obtidos em prazo determinado, sem divulgação aberta para a comunidade (ELMUTI; ABEBE; NICOLOSI, 2005; LIND; STYHRE; AABOEN, 2013; DAVID; VAN DER SIJDE; VAN DEN BESSELAAR, 2018), seu desenvolvimento ocorre dentro de uma coordenação hierárquica e os novos conhecimentos e/ou tecnologias decorrentes do processo são recompensados pelo incremento dos lucros (LACETERA, 2009; PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018).

Nesse caso, a Lógica de Mercado é concebida como lógica minoritária do ensino superior por desempenhar um papel menos significativo nos objetivos e práticas universitários, sobretudo, pelo fato de seus representantes externos controlarem uma parcela menor dos recursos necessários às universidades públicas (DURAND; JOURDAN, 2012; PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018). No entanto, a Lógica de Mercado é comumente entendida como concorrente em relação à Lógica Acadêmica dadas as prescrições conflitantes de comportamento organizacional (LAM, 2010, 2011; MURRAY, 2010; LIND; STYHRE; AABOEN, 2013; DAVID; VAN DER SIJDE; VAN DEN BESSELAAR, 2018; LEIŠYTE, 2019). Uma síntese das principais distinções entre as lógicas mencionadas e interesses de seus representantes é apresentada no Quadro 2.

Quadro 2
Distinções entre Lógica Acadêmica e de Mercado na Colaboração em Pesquisas.
Distinções entre Lógica Acadêmica e de Mercado na Colaboração em Pesquisas.

Assim, a complexidade institucional em âmbito universitário caracteriza-se tanto pela existência de mais de uma lógica afetando a organização, como pela incompatibilidade entre as lógicas ao pregarem objetivos legitimados distintos e prescreverem meios de ação diferenciados; o que traz implicações conflitantes para funções, habilidades, práticas, protocolos, critérios de desempenho entre outros aspectos (GREENWOOD et al, 2011; PACHE; SANTOS, 2010b).

Essa relação de complexidade tem consequências para a autonomia acadêmica dentro dos atuais movimentos de reforma que ampliam a necessidade de financiamento externo: a Lógica Acadêmica caracteriza pleno exercício da autonomia substantiva, enquanto a Lógica de Mercado, dentro desse contexto tem influenciado diretamente a autonomia processual e, como consequência, também a autonomia substantiva. Essa ideia se fundamenta na definição de Christensen (2011b) segundo o qual dentro das universidades existem duas hierarquias separadas: a hierarquia acadêmica e a hierarquia administrativa/financeira/técnica que deve apoiar a primeira. O nível crescente de autonomia, tem dado mais poder e liberdade aos administradores da universidade e diminuído a liberdade dos profissionais acadêmicos individuais que nela atuam (JARERNSIRIPORNKUL; PANDEY, 2018), de modo que tem havido cada vez mais interferência da administração em assuntos acadêmicos (ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018).

Desse modo, observa-se que no âmbito da NPM a concessão de maior autonomia tem surtido efeitos diretamente na hierarquia administrativa/financeira/técnica (o aspecto processual da autonomia universitária). Todavia, apesar da crença na relação entre maior autonomia institucional e desempenho, essas reformas, em geral, não acarretaram os resultados esperados (MAASSEN; GORNITZKA; FUMASOLI, 2017). Acerca disso, existem argumentos que indicam que a autonomia não é condição suficiente para a qualidade acadêmica (LAO, 2015).

Tais dificuldades podem ser mais bem compreendidas ao considerar que existem diferenças entre a autonomia formal (“no papel”) e a autonomia real (“na prática”) (ENDERS; BOER; WEYER, 2013; ESTERMANN, 2015) também chamada “autonomia viva” (MAASSEN; GORNITZKA; FUMASOLI, 2017). Regras formais para autonomia podem ser implementadas na prática ou não (ENDERS; BOER; WEYER, 2013), e isso afeta a autonomia real das universidades que representa sua capacidade de agir de forma independente dentro de um espaço que lhe permite manobrar os limites impostos por atores externos, tais como o Estado, entidades privadas e a sociedade em geral (ESTERMANN, 2015; MAASSEN; GORNITZKA; FUMASOLI, 2017). O nível de autonomia formal e real varia entre contextos nacionais específicos. Um exemplo é o modelo de financiamento governamental dos Estados Unidos que concede mais autonomia formal do que real para as universidades, diferindo do sistema universitário norueguês onde, apesar da restrita autonomia formal, as universidades têm elevada autonomia real (ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018).

Assim, Christensen (2011b) e Aberbach e Christensen (2018) discutem como as universidades, devido às reformas no escopo da NPM, estão em uma situação paradoxal: se por um lado, estão adquirindo mais autonomia formal em questões financeiras, gerenciais e de tomada de decisões por meio de projetos do governo para torná-las menos dependentes de recursos públicos; por outro lado, estão perdendo autonomia real por estarem mais expostas a relatórios, sistemas de controle e de incentivo financeiro, pressão para obterem recursos de fontes não governamentais e para serem mais competitivas, o que as tornam mais dependentes de atores do ambiente externo.

Isso acontece pois os governos têm conseguido influenciar cada vez mais as universidades a implantarem e seguirem políticas de atuação que atendem às preferências do próprio Estado, bem como de demais partes interessadas com as quais há dependência de recursos. Além disso, grupos discentes têm se tornado mais influentes, enquanto os docentes têm perdido cada vez mais espaço no processo decisório organizacional frente a uma administração profissional mais poderosa (ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018).

Por conseguinte, sabendo que as reformas da NPM têm afetado diretamente a autonomia processual das universidades, é possível questionar as consequências potenciais para o pleno exercício da Lógica Acadêmica, uma vez que a autonomia processual formal não é garantia de autonomia substantiva (acadêmica) real (ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018).

Em síntese, conforme Figura 1, modelos de autonomia universitária nos moldes da NPM têm visado reduzir o volume de recursos estatais diretos e aumentar os recursos externos para as universidades. Essa maior dependência de financiamento externo competitivo, seguindo a lógica de mercado, tem implicações diretas para a autonomia processual que se torna mais formal em relação ao Governo (devido à menor dependência de recursos públicos). A maior dependência de recursos externos aumenta a influência de partes interessadas representantes da lógica de mercado dentro da universidade, o que tende a limitar o exercício da autonomia substantiva vinculada à lógica acadêmica. Como resultado, se agrava a relação de conflito entre lógica acadêmica e a lógica de mercado, e se reduz a autonomia substantiva real da universidade em decorrência da maior sujeição a exigências e interesses de partes interessadas externas.

Relação entre o modelo de autonomia NPM, lógicas institucionais e dimensões da autonomia universitária.
Figura 1
Relação entre o modelo de autonomia NPM, lógicas institucionais e dimensões da autonomia universitária.

1.3 Modelos de Autonomia Universitária no Brasil

No contexto brasileiro, a matéria regulatória sobre autonomia universitária centrou-se, desde o princípio das discussões legislativas em problemas de financiamento com destinação de verbas e controle na esfera pública, na garantia de um ensino público gratuito e na gestão democrática das organizações educacionais, com participação de estudantes, professores e funcionários (RANIERI, 2018; BRASIL, 1988; BRASIL, 1996). Assim, autonomia é um conceito que supõe limites e controles, internos e externos (RANIERI, 2015), e está previsto no art. 207 da Constituição Federal: “Art. 207. As universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão.” (BRASIL, 1988). Esta previsão constitucional tem sido amplamente discutida quanto ao seu sentido no direito público brasileiro. Nesse âmbito, autonomia é entendida como poder: derivado, pois somente pode ser exercida se submissa ao ordenamento jurídico que lhe dá origem; funcional, pois se destina ao cumprimento de funções públicas, e; limitado, pois não representa soberania ou independência (RANIERI, 2015, 2018).

Apreensões sobre a efetividade da autonomia nas universidades brasileiras e seus resultados contrastantes no desempenho são permeados pelo mito de que há um único modelo institucional ideal para o ensino superior. Tal modelo consiste no da universidade pública e gratuita, que associa ensino, pesquisa e extensão, dentro de uma condição de autonomia que somente se efetiva via auto-gestão democrática exercida por docentes, alunos e funcionários (DURHAM, 2006). O artigo 207 (CF, 1988) agrega tanto a ideia de autonomia substantiva (didático-científica) fundamentada na Lógica Acadêmica, quanto processual (administrativa e de gestão financeira e patrimonial), influenciada pela maior inserção da Lógica de Mercado no contexto da NPM.

As universidades públicas brasileiras, comumente instituídas na forma de autarquias, têm prerrogativas garantidas pelo regime jurídico de direito público relacionadas principalmente a questões curriculares, contratação de servidores e fixação de vencimentos, plano de carreira docente e outras providências de ordem orçamentária, financeira e patrimonial (DURHAM, 2006; RANIERI, 2018, BRASIL, 1996) reiteradas nos artigos 53 e 54 da LDB. Nesse sentido, “As universidades mantidas pelo Poder Público gozarão, na forma da lei, de estatuto jurídico especial para atender às peculiaridades de sua estrutura, organização e financiamento pelo Poder Público, assim como dos seus planos de carreira e do regime jurídico do seu pessoal” (BRASIL, 1996, art. 54). Além disso, quanto à profissionalização da gestão, são os membros do corpo docente que, tradicionalmente, se ocupam das atividades de planejamento e gestão econômico-financeira (SAMPAIO, 2014).

Sendo entidades da administração pública indireta, financiadas com recursos públicos previstos no artigo 169 da Constituição Federal (1988), submetem-se às normas de direito administrativo e financeiro bem como ao controle dos Tribunais de Contas. Nesse sentido, destaca-se a obrigatoriedade de atendimento aos preceitos contábeis e orçamentários da Lei 4.320/1964, bem como aos limites de gastos e instrumentos de controle interno e externo, previstos na Lei Complementar nº 101/2000 (Lei de Responsabilidade Fiscal - LRF). Nesse ponto, emergem algumas questões que revelam restrições à efetividade do artigo 207 (CF,1988), e discute-se que a estrutura da administração pública brasileira, visando garantir o rígido controle centralista e burocrático sobre as entidades que a integram, acaba limitando as possibilidades de adaptabilidade e flexibilidade, consideradas características essenciais para o exercício da autonomia real (DURHAM, 2006). Isso se vincula, sobretudo, a condições de financiamento que afetam a eficácia da atuação autônoma, assim como apontado por Estermann (2015), acerca do contexto europeu, em que a gestão financeira das universidades está sujeita a excessiva burocracia que onera e limita a gestão eficiente dos recursos.

Um exemplo disso se observa ao considerar o disposto no art. 19 da LRF, que limita a 60% da receita corrente líquida a despesa total com pessoal para os estados, abrangendo todos os entes da administração direta e indireta, incluindo, neste caso, as universidades. Assim, discute-se como tais limitações de gastos podem interferir na autonomia de atuação das universidades, considerando que, vinculadas ao princípio da indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão, o gasto com pessoal docente para desempenho de atividade acadêmica tende a ser elevado em função do regime de trabalho em dedicação exclusiva e integral (RANIERI, 2015). Em geral, nestas universidades são relatados diversos problemas de cunho administrativo e financeiro que limitam o pleno desempenho da autonomia, relacionados essencialmente a restrições do regime de direito público, burocracia estatal e contingenciamento de despesas (RANIERI, 2018).

Também fundamentado no artigo 207 da Constituição Federal (1988), o modelo de autonomia das universidades estaduais paulistas, assumiu uma perspectiva diferenciada em relação às demais universidades públicas brasileiras, e seu aprimoramento institucional contou com ampla participação das próprias universidades públicas, do Executivo, do Legislativo, do Tribunal de Contas, do Judiciário e do Ministério Público (RANIERI, 2015). Criado pelo Decreto Estadual nº 29.598/89 (BRASIL, 1989) este modelo de autonomia abrangeu a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP) e a Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP). Determina atualmente o repasse para estas universidades, em duodécimos mensais, de 9,57% das receitas arrecadadas pelo estado a título de Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS). Essa regulamentação confere um montante substancial de recursos às universidades paulistas, sobretudo considerando que o estado de São Paulo é o que mais arrecada ICMS em comparação aos demais estados brasileiros, sendo exemplo o último relatório comparativo disponibilizado pelo Conselho Monetário de Política Fazendária (CONFAZ, 2021), segundo o qual em 2018 o estado de São Paulo arrecadou um total de R$ 139.810.491.000,00, equivalente a 30,1% da arrecadação total de ICMS no Brasil.

Com a garantia de parcela do ICMS arrecadado as universidades podem executar o orçamento de acordo com o planejamento aprovado por seus órgãos colegiados, sujeitando-se a menores restrições burocráticas e políticas. Diferindo, portanto, do modelo anterior no qual os recursos eram repassados sob demanda em função da dependência do controle centralizado da política de liberações financeiras do governo gerando disputas anuais por verbas públicas (ASSIS, 2012). Isso impossibilitava as universidades de se autoadministrarem, pois o seu orçamento global era definido anualmente pela Secretaria Estadual de Economia e Planejamento com base nos gastos de períodos anteriores.

Com o novo modelo de autonomia as universidades paulistas passaram a ter condições de gerir seus próprios recursos, o que demandou também maior responsabilidade institucional em relação a: acompanhamento do comportamento de parâmetros econômicos e de arrecadação estadual; seleção de prioridades; negociações salariais; propostas de investimento; contenção de despesas; e controle no uso dos recursos (ASSIS, 2012; RANIERI, 2018). Esse modelo se assemelha ao das universidades tailandesas descrito por Lao (2015) e Jarernsiripornkul e Pandey (2018), segundo os quais a autonomia não significa eliminação do apoio financeiro do Estado às universidades, mas sim, mudanças na forma como os orçamentos são alocados e os gastos monitorados, assim, as universidades autônomas passam a receber subsídios “em bloco”, sem direcionamento do gasto, em vez de orçamentos por rubricas. Estermann (2015) destaca que na maioria dos países europeus as universidades também recebem seu financiamento na forma de subvenções em bloco, e que em apenas em alguns sistemas (países da Europa Oriental e Mediterrâneo Oriental por exemplo) os orçamentos de itens por rubrica ainda são empregados de modo que as entidades não podem transferir fundos entre as linhas orçamentárias.

Ainda, o desenvolvimento do modelo de autonomia das universidades paulistas é subdividido por Ranieri (2015) em duas fases desde sua implementação em 1989: a fase inicial, que vai de 1989 até 1996, em que o âmbito da autonomia é considerado mais importante do que os seus limites, pelo fato de a ideia de autonomia universitária ainda não ser totalmente compreendida pelos atores envolvidos em sua implementação, logo, a jurisprudência teve papel importante na interpretação do art. 207 da Constituição Federal; e a fase atual (a partir de 1996) em que a compreensão dos limites e aplicação de controles na atuação autônoma passaram a ser concebidos como mais importantes que o âmbito, contexto em que se torna relevante a accountability na atuação das universidades (SASSAKI, 2016; KRÜCKEN; MEIER, 2006).

Essa ênfase nos controles se verifica, sobretudo, em decorrência de situações de desequilíbrio financeiro com despesas com pessoal, como ocorrido na USP entre 2010 e 2013. Acerca disso Muzy e Drugowich (2018) explicam que de 1995 a 2013 a receita proveniente do ICMS repassada às universidades cresceu significativamente e a USP vinha atrelando seus gastos, sobretudo com folha de pagamento, à evolução dessa receita. Contudo, diversos fatores externos condicionam essa arrecadação, ou seja, trata-se de uma receita cuja arrecadação não está sob o controle das universidades. A partir de 2010 a arrecadação passou a demonstrar sinais de estabilização, contudo, as despesas continuaram em tendência crescente, inclusive, havendo contratação de grande número de servidores técnicos e docentes, e alterações na estrutura de carreira. Em 2012 os gastos totais da universidade superaram o montante de ICMS recebido.

Essa situação se agravou ao longo dos anos seguintes com a redução dos repasses do ICMS a partir de 2014. Isso demandou a adoção em 2017, pelas universidades estaduais paulistas, de Parâmetros de Sustentabilidade Econômico-Financeira estabelecendo limites de gastos de até 85% dos recursos mensais com folha de pagamento, constituição de reserva de contingência, elaboração de planejamento plurianual, de investimentos e para despesas que onerem exercícios orçamentários subsequentes (USP, 2017; MUZY; DRUGOWICH, 2018). Nesse contexto, a autonomia e a responsabilidade referem-se aos meios pelos quais as universidades conseguem gerenciar as diversas expectativas advindas de dentro e fora da instituição (KRAATZ; BLOCK, 2008).

Apesar de tais circunstâncias, em geral, os resultados da implementação do modelo de autonomia paulista são considerados satisfatórios em âmbito acadêmico. Considera-se que apenas nestas universidades o princípio constitucional de autonomia foi aplicado de forma efetiva, ainda mais considerando que neste regime de vinculação orçamentária as mudanças burocráticas geradas pela transição entre governos têm interferência reduzida no princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão. Tal aspecto é demonstrado pelos indicadores de desenvolvimento, qualidade e produtividade que estas universidades apresentam (ASSIS, 2012; RANIERI, 2015, 2018).

Esse desempenho pode ser constatado a partir da análise dos principais rankings universitários internacionais tais como o Times Higher Education (THE) e o QS World University Rankings, onde as universidades paulistas aparecem frequentemente com elevadas posições entre as universidades brasileiras. Por exemplo, na última edição do ranking QS (QS World University Rankings 2022) USP, UNICAMP e UNESP aparecem respectivamente como primeira, segunda e quinta melhores colocadas entre as universidades brasileiras. Este ranking considera 6 critérios de qualidade no ensino superior: reputação da universidade segundo o meio acadêmico, reputação da universidade segundo o mercado de trabalho, proporção de professores em relação aos alunos, citações do corpo docente, proporção de docentes internacionais e proporção de estudantes internacionais (QS QUACQUARELLI SYMONDS, 2021).

Já conforme o último THE, a USP, UNICAMP e UNESP ocupam respectivamente o segundo, terceiro e décimo primeiro lugar entre as melhores universidades da América Latina. Os critérios utilizados por este ranking abordam cinco áreas principais de análise: ensino (ambiente de aprendizagem); pesquisa (volume, receita e reputação); citações (influência da pesquisa); perspectiva internacional (funcionários, alunos e pesquisa); e renda da indústria (transferência de conhecimento) (TIMES HIGHER EDUCATION, 2021).

Nesse ponto, também é importante destacar as principais diferenças entre as universidades públicas brasileiras em geral e as universidades estaduais paulistas no que se refere à governança. Nas universidades públicas em geral há autonomia acadêmica, sendo o corpo docente capaz de desfrutar de plena liberdade de ensino e pesquisa conforme garantias constitucionais e da LDB. A auto-gestão democrática é exercida pela comunidade acadêmica, o que leva à maior preocupação com questões educacionais e de pesquisa, mas acaba limitando a capacidade de a universidade controlar aspectos administrativos e de gestão financeira e estratégica com eficiência (DURHAM, 2006; RANIERI, 2018). Em geral, estas universidades carecem de autonomia administrativa e de gestão financeira e patrimonial por estarem cerceadas pela estrutura burocrática de controle estatal, apesar disso, a Lógica Acadêmica é predominante.

Admitindo que lógicas possam se reforçar mutuamente (GREENWOOD; DIAZ; LORENTE, 2010) avalia-se o caso das universidades estaduais paulistas. Estas, dada a ampliação da autonomia administrativa e de gestão financeira e patrimonial moldada em processos de nível de campo pelo governo do Estado de São Paulo (via asseguração de recursos públicos em “bloco”), têm apresentado os melhores indicadores de desempenho em ensino e pesquisa no país (ASSIS, 2012; RANIERI, 2015, 2018).

Nestas universidades a lógica de liberdade acadêmica também se manifesta pelo fato de a autonomia em relação a ensino e pesquisa ser exercida pelo próprio corpo docente, assim como nas demais universidade públicas. A auto-gestão democrática também é exercida pela comunidade acadêmica (SAMPAIO, 2014), representando o grupo de atores organizacionais mais influente, dada a estrutura de governança e propriedade estatal, e identidade focada na narrativa do ensino e pesquisa de qualidade advindos essencialmente da universidade pública. Contudo, estas organizações tiveram de se adaptar a um perfil mais voltado à gestão estratégica, competitividade e accountability, características da identidade mais gerencial de organizações da iniciativa privada. Isso ocorreu à medida que o Estado, apesar de garantidor do financiamento, deixou de exercer controle excessivo e centralizado sobre a administração dos recursos da universidade.

Desse modo, como demonstrado na Figura 2, modelos de autonomia universitária semelhantes ao paulista garantiriam maior volume de recursos estatais diretos à universidade, sem limitar o acesso a recursos externos. Essa menor dependência de financiamento externo competitivo, nos moldes da lógica de mercado, afeta diretamente a autonomia processual que se torna menos formal em relação ao Governo (devido à maior dependência de recursos públicos). A menor dependência de recursos externos reduz a influência de partes interessadas representantes da lógica de mercado dentro da universidade, concedendo espaço para que a autonomia processual seja capaz de apoiar com efetividade a autonomia substantiva vinculada à lógica acadêmica. A consequência disso pode ser a redução de conflitos e a construção de relações de complementaridade entre lógica acadêmica e de mercado, além do aumento da autonomia real da universidade em decorrência da menor sujeição a exigências e interesses de partes interessadas externas.

Relação entre o modelo de autonomia paulista, lógicas institucionais e dimensões da autonomia universitária.
Figura 2
Relação entre o modelo de autonomia paulista, lógicas institucionais e dimensões da autonomia universitária.

A partir destas apreensões foram formuladas as seguintes proposições teóricas que se complementam em relação ao efeito da dependência de recursos externos no modelo de autonomia sobre o alcance da autonomia substantiva (acadêmica) real pelas universidades.

Proposição 1: Quanto menor a dependência de recursos externos competitivos no modelo de autonomia universitária, maior a autonomia substantiva “real”, em função da maior liberdade de gerenciamento de relações com partes interessadas não-governamentais.

Proposição 2: Quanto menor a dependência de recursos externos competitivos no modelo de autonomia universitária, menor a autonomia processual “real”, em função da menor liberdade de gerenciamento de relações com partes interessadas governamentais.

Estas proposições apresentam caráter amplo e desdobram-se em proposições mais específicas relacionadas às respostas organizacionais da universidade em termos de: gerenciamento de relações com partes interessadas; efetividade da autonomia substantiva exercida em nível organizacional; preservação da identidade baseada na lógica dominante, e; estabelecimento de interações mutuamente benéficas entre lógica dominante e lógica minoritária.

2 RESPOSTAS ORGANIZACIONAIS À COMPLEXIDADE INSTITUCIONAL NO ENSINO SUPERIOR

Ainda que todas as universidades lidem em algum grau com as pressões geradas pela complexidade institucional, seus padrões de resposta a essa condição podem variar entre organizações dependendo de fatores que influenciam seu grau de sensibilidade a determinadas lógicas em detrimento de outras, assim como sua capacidade de associar lógicas concorrentes (GREENWOOD et al., 2011). Esses fatores são atributos que filtram as lógicas institucionais que advém do campo e afetam a organização, tais como: a posição da organização dentro do campo, a estrutura, a governança e propriedade, e a identidade (GREENWOOD et al., 2011).

Quanto à posição no campo, entende-se que as entidades em posições periféricas detêm maior discrição e flexibilidade de resposta à complexidade, enquanto que entidades posicionadas na região central do campo tendem a ser insensíveis à complexidade por estarem inseridas significativamente nos arranjos institucionais existentes; contudo, a situação de entidades localizadas nos limites de lógicas institucionais é tema que carece estudo (GREENWOOD et al., 2011).

No âmbito da estrutura organizacional, as pressões institucionais são interpretadas e significados lhes são atribuídos, representados e defendidos por atores ocupantes de posições hierárquicas na entidade, e que têm motivações específicas (GREENWOOD et al., 2011). No entanto, quanto mais diferenciada (estruturalmente complexa) a organização, maior a tendência de enfrentar complexidade institucional, pela presença de múltiplas comunidades intraorganizacionais compostas por atores que importam para a entidade as lógicas às quais foram expostos (GREENWOOD et al., 2011).

Além disso, ressalta-se a forma de governança, uma vez que o padrão de respostas organizacionais à complexidade institucional normalmente reflete os interesses do grupo mais influente; logo, a escolha de qual lógica priorizar e das ações a serem tomadas será influenciada pelos atores com mais poder dentro da organização (GREENWOOD et al., 2011). A propriedade também interfere na receptividade a múltiplas lógicas, de modo que as respostas à complexidade institucional refletem a dependência de recursos da organização em relação a atores institucionais presentes no campo (GREENWOOD et al., 2011). Este aspecto é evidenciado por Lounsbury (2001) por exemplo, segundo o qual universidades financiadas com recursos governamentais têm maior alinhamento de suas respostas aos interesses do governo financiador.

Ainda, a identidade organizacional também molda o nível de discrição da entidade para definir e priorizar o padrão de resposta à complexidade institucional; e os atores organizacionais tendem a acatar ou resistir a pressões de nível de campo dependendo do alinhamento dessas pressões à identidade da organização (SAUDER; ESPELAND, 2009; GREENWOOD et al., 2011). Também importa considerar a medida em que a organização valoriza sua identidade institucional ou o grau em que a identidade é tomada como garantida pelos atores organizacionais (GREENWOOD et al., 2011).

Em suma, entende-se que a resposta às demandas conflitantes decorrentes da complexidade institucional depende não somente do caráter das demandas, mas também da forma como essas demandas são representadas dentro das entidades (KIM et al., 2007); considerando que estas tendem a acatar mais facilmente as demandas exercidas por atores institucionais poderosos, em relação aos quais existe dependência de legitimidade e de recursos (OLIVER, 1991; PFEFFER; SALANCIK, 1978; PACHE; SANTOS, 2010b). Assim, as respostas da organização à complexidade institucional são afetadas por sua dependência de atores institucionais influentes no nível de campo, o que influencia a definição de respostas estratégicas e estruturais.

2.1 Dependência De Atores Institucionais Influentes No Nível De Campo

Considerando, com base em Binder (2007), que as organizações de ensino superior que recebem mais financiamento estatal são forçadas a se tornarem cada vez mais burocráticas e racionalizadas; e que estas também podem se beneficiar de investimentos privados que as tornam mais “empresariais”, podendo afetar seu engajamento em atividades que produzem benefícios sociais (HAYTER; CAHOY, 2016); é relevante abordar questões de poder relativas aos proponentes de lógicas institucionais em nível de campo (GREENWOOD et al., 2011). Nesse sentido, o controle de recursos escassos é a condição necessária para que relações de dependência de poder, também conceituadas como “ordens de dominação”, se estabeleçam entre uma organização e os atores do campo (RANSON; HININGS; GREENWOOD, 1980). No entanto, as organizações normalmente tendem a buscar meios de combater sua dependência em relação aos principais detentores de recursos (DURAND; JOURDAN, 2012).

A influência exercida pelos atores poderosos afeta a forma como a organização se estrutura, bem como suas práticas para interagir e se relacionar com outras partes (RANSON; HININGS; GREENWOOD, 1980). Portanto, conforme a disponibilização de recursos se altera de um período para outro, as organizações necessitam realizar adaptações de atributos estruturais, tais como: na hierarquia do processo decisório, na configuração departamental, no arsenal de procedimentos aceitos, entre outros; visando assegurar acesso a recursos escassos (RANSON; HININGS; GREENWOOD, 1980).

Neste escopo, Greenwood et al. (2011) consideram que a resposta de uma organização a demandas conflitantes de atores dominantes no campo depende do seu nível de dependência de recursos controlados por eles. Essa apreensão aparece, inclusive, nas discussões de relação de poder de Pache e Santos (2010b), segundo as quais as organizações tendem a atender a demandas advindas de referentes institucionais dos quais dependem para garantir acesso a recursos indispensáveis tais como: autorização para atuar, pessoal, financiamento, entre outros (PACHE; SANTOS, 2010b). Os autores também avaliam a forma como uma organização responde quando partes interessadas influentes mantêm opiniões contraditórias sobre as formas de ação apropriadas.

Nos campos institucionais ocorrem processos que moldam as formas de ação das entidades e variam em termos de estrutura, critérios de legitimidade e arranjos de recursos e poder (DIMAGGIO; POWELL, 1983). Ademais, Pache e Santos (2010b) destacam que também existem variações relacionadas à natureza da demanda gerada por esses processos, assim como na forma de imposição e monitoramento dessa demanda. Para estes autores importa o grau de fragmentação do campo, entendida como a circunstância em que há grande número de organizações não coordenadas (atores sociais ou referentes institucionais) dos quais os membros do campo dependem; e o grau de centralização do campo, que representa a sua estrutura de poder e reflete a participação de atores poderosos, bem como sua capacidade instituir e impor suas demandas institucionais (MEYER; SCOTT; STRANG, 1987; PACHE; SANTOS, 2010b).

Os atores poderosos incluem, sobretudo: autoridades reguladoras, que exercem poder legal coercitivo sobre as entidades; organizações educacionais e profissionais, que exercem pressões normativas de socialização e acreditação (GREENWOOD; SUDDABY; HININGS, 2002); e grandes financiadores que influenciam o comportamento da entidade por meio de relações de dependência de recursos (PACHE; SANTOS, 2010b). Desse modo, sabe-se que normalmente organizações do setor público tendem a ser mais receptivas a determinados atores centrais, tais como: agências reguladoras que lhes autorizam operar; grupos profissionais estreitamente vinculados a normas e identidades fortes, como é o caso da classe docente no ensino público superior; e financiadores principais que concedem os recursos necessários para a continuidade das operações, sobretudo, como no caso das universidades, quando os usuários finais não pagam pelo custo total do serviço prestado (PACHE; SANTOS, 2010b).

Demandas institucionais conflitantes emergem principalmente em campos altamente fragmentados, em que demandas concorrentes surgem devido ao grande número de referentes institucionais; e em campos moderadamente centralizados, em que há equilíbrio de poder no campo, pois os referentes institucionais são poderosos o suficiente para impor sua demanda à organização, mas não para dominar o campo e mitigar conflitos (PACHE; SANTOS, 2010b).

A fragmentação do campo tem se tornado proeminente na sociedade moderna em função da amplitude de instituições especializadas que influenciam a atuação das organizações; enquanto que a centralização tem reduzido pois o Estado, por exemplo, como autoridade central, tem concedido cada vez mais aos atores poderosos do campo a autoridade para controlar entidades complexas como é o caso das universidades públicas (PACHE; SANTOS, 2010b). Nesse sentido, os projetos de reforma do setor público no âmbito da NPM, em geral, por sua tendência de conceder autonomia formal às universidades via redução do financiamento estatal direto (CHRISTENSEN, 2011a; 2011b; LAO, 2015; ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018; BALTARU; SOYSAL, 2018; LEIŠYTE, 2019), têm originado crescente dependência de recursos controlados por atores poderosos do campo. Por meio de pressões de conformidade derivadas da dependência de recursos as demandas institucionais penetram nas organizações através da ação de atores externos vinculados a organizações profissionais, órgãos reguladores ou agências de financiamento, que as propagam e as monitoram quanto a sua implementação (DIMAGGIO; POWELL, 1983; OLIVER, 1991; PFEFFER; SALANCIK, 1978).

Internamente, as demandas institucionais também são transmitidas por funcionários, gestores, membros de conselho de administração ou voluntários, que, vinculados a determinada lógica, incentivam a adoção de certos padrões de práticas, valores e normas. Comumente por meio de processos de contratação, intencionais ou não, atores representantes de diferentes lógicas institucionais são inseridos na organização. Consequentemente, demandas institucionais concorrentes passam a ser representadas internamente em diferentes graus a depender do quanto seus membros aderem a elas e as promovem (PACHE; SANTOS, 2010b).

No caso das universidades públicas, na medida em que se amplia a dependência de recursos externos competitivos controlados por atores poderosos do campo, tende a aumentar a participação e influência de atores externos representantes de lógicas distintas da lógica universitária dominante, criando as chamadas “organizações de stakeholders” (BLEIKLIE; ENDERS; LEPORI; 2013; STENSAKER et al., 2014; MAMPAEY; HUISMAN, 2016); acompanhando a tendência de engajamento com públicos cada vez mais diversificados, seguindo a narrativa de “governança em rede” (BENNEWORTH; JONGBLOED, 2010). Nesse sentido, as partes interessadas têm poder para influenciar as ações e a condição de legitimidade da universidade (BENNEWORTH; JONGBLOED, 2010; MAMPAEY; HUISMAN, 2016).

Considerando, segundo Aberbach e Christensen (2018), que os recursos administrativos das universidades estão cada vez mais vinculados a partes interessadas externas, sobretudo em termos de potencial de obtenção de recursos para ensino e pesquisa, o processo decisório mudou consideravelmente tanto pela redução da influência do corpo docente, quanto pela ampliação da representatividade de partes interessadas externas nos conselhos universitários. Nesse sentido, destaca-se a necessidade de gestão de partes interessadas, que corresponde à utilização de estratégias proativas e defensivas para criar, manter e reparar relações consensuais com stakeholders (MAMPAEY; HUISMAN, 2016). Assim, as universidades tomando decisões com base em sua lógica dominante (acadêmica) precisam direcionar atenção às demandas de partes interessadas críticas que contrariam os valores relacionados a essa lógica central. Nestes casos, a universidade tende a adotar estratégias defensivas de redução de conflitos (MAMPAEY; HUISMAN, 2016)

Para Mampaey e Huisman (2016) as organizações, por meio de análise criteriosa, classificam as partes interessadas segundo a importância do relacionamento que mantêm, visando a manutenção de relações apenas com as mais relevantes. Assim, considerando o argumento dos autores de que as universidades tendem a evitar estabelecer laços de rede fortes com partes interessadas que agem segundo uma lógica institucional distinta da sua lógica dominante (acadêmica), delineou-se a seguinte proposição:

Proposição 3: Quanto menor a dependência de recursos externos competitivos no modelo de autonomia universitária, mais fracas as relações de rede estabelecidas com partes interessadas representantes de lógicas institucionais diferentes da lógica dominante da universidade.

Acerca disso, Benneworth e Jongbloed (2010) demonstraram que a redução da influência de partes interessadas é possível na medida em que os laços de rede com a organização se enfraquecem. Estudar esta perspectiva é importante, como aponta Greenwood et al. (2011) pois é necessário compreender melhor de que forma as identidades institucionais são afetadas quando profissionais representantes de diferentes lógicas são contratados e/ou passam a influenciar as decisões organizacionais. Em outra perspectiva, admitindo que as universidades autônomas vêm assumindo identidades mais gerenciais, discute-se se a dependência crescente de financiamento externo competitivo também pode implicar na efetividade da autonomia substantiva exercida pela administração universitária em nível estratégico; permitindo que decisões sobre aceitação de projetos de pesquisa financiados externamente estejam sendo baseadas em preferências de atores individuais, que podem destoar dos interesses da organização como um todo.

Proposição 4: Quanto menor a dependência de recursos externos competitivos no modelo de autonomia universitária, maior a efetividade da autonomia substantiva exercida pela administração universitária como estratégia organizacional segundo a Lógica Acadêmica.

Esta proposição é apoiada por achados do estudo de Geschwind (2019) em universidades suecas, que indica que quanto mais financiamento externo competitivo, menor o poder dos gestores, por meio da estratégia organizacional, para interferir na atividade de pesquisa; e maior o poder dos acadêmicos individuais para decidir sobre a aceitação de critérios, prazos e fontes de financiamento de pesquisa segundo critérios próprios negociados diretamente com financiadores externos.

2.2 Respostas Estratégicas e Estruturais

Para Pache e Santos (2010) o próprio conflito nas prescrições institucionais é o que torna possível a agência dentro de uma estrutura institucional. Assim, dada a influência das relações de dependência de atores influentes externos e a forma de representação interna de demandas institucionais concorrentes, é preciso considerar os diferentes padrões estratégicos e estruturais de respostas à complexidade institucional. Quanto à perspectiva estratégia sobre como as organizações lidam com a complexidade institucional, alguns estudos formularam tipologias de resposta que englobam desde a aceitação e conformidade, até o desafio e esquivança a lógicas concorrentes.

Para Oliver (1991) a resposta à complexidade institucional pode consistir em: Aquiescência, aos arranjos exigidos por constituintes institucionais externos, por meio do hábito, imitação ou cumprimento voluntário a requisitos impostos; Compromisso, para atender as pressões por meio de alteração da demanda e/ou da resposta via equilíbrio de expectativas concorrentes, pacificação dos constituintes institucionais, ou barganha de mudanças nas demandas existentes; Evitação de conformidade à pressão via ocultação da inconformidade (conformidade simbólica), dissociação de processos técnicos do contato externo, ou saída do domínio em que a pressão ocorre; Desafio a uma das demandas para mitigar a contradição por meio de rejeição, contestação ou ataque às pressões impostas; e Manipulação, para alterar requisitos institucionais cooptando, influenciando ou controlando as fontes das pressões para reduzir divergências. Fundamentados nesse arcabouço, Pache e Santos (2010b, p. 463) argumentam que “[...] a natureza do conflito institucional (meios versus objetivos) interage com o grau de representação interna (ausência, única ou múltipla) para moldar a experiência de demandas conflitantes e influenciar as estratégias mobilizadas pelas organizações em resposta”.

Kraatz e Block (2008) por sua vez, admitem quatro tipos diferentes de resposta: Resistir ou Eliminar as tensões advindas da pluralidade de lógicas excluindo ou marginalizando uma ou mais de suas identidades, o que inclui negar a validade das reivindicações externas, atacar a legitimidade das entidades que fazem reivindicações, além de tentar cooptar ou controlar essas entidades, ou escapar de sua jurisdição (PRATT; FOREMAN, 2000); Compartimentalizar identidades (BINDER, 2007; PRATT; FOREMAN, 2000) como forma de se relacionar de forma independente com vários grupos que disseminam lógicas institucionais, representando, contudo, uma forma de dissociação segundo a qual uma organização apenas assume compromisso cerimonial e simbólico com certas lógicas, preservando sua identidade central; Equilibrar várias lógicas institucionais díspares, por meio do incremento da cooperação entre as identidades, de modo a criar elos entre elas (PRATT; FOREMAN, 2000; BINDER, 2007); e Emergir como instituições por direito próprio, destacando-se de seu ambiente institucional por meio da construção de uma identidade nova e duradoura capaz de resguardar a organização de múltiplas pressões externas (KRAATZ; BLOCK, 2008).

Diferentemente, uma perspectiva estrutural para avaliar respostas à complexidade institucional enfoca a forma como a estrutura organizacional reflete múltiplas lógicas institucionais, ou o envolvimento com uma lógica alternativa (GREENWOOD et al., 2011). Nesse contexto, Pache e Santos (2010a) destacam como as organizações têm buscado de forma crescente integrar lógicas concorrentes por meio da formação de estruturas híbridas o que garante às organizações o acesso a recursos e legitimidade externa (DURAND; JOURDAN, 2012, HEINZE; WEBER, 2015).

Arranjos híbridos são considerados comuns e necessários entre universidades, que somente são consideradas legítimas se adotarem estruturas capazes de abarcar múltiplas dimensões sociais de sua atuação; equilibrando objetivos profissionais relacionados à Lógica Acadêmica, e comerciais relacionados à Lógica de Mercado (GREENWOOD et al., 2011). Com embasamento em abordagens de ambidestria, consideram-se dois tipos de estrutura: híbridos misturados e híbridos estruturais diferenciados (GREENWOOD et al., 2011).

Híbridos misturados consistem em estruturas organizacionais que combinam práticas de múltiplas lógicas institucionais dentro de uma mesma organização como forma de auferir o desempenho desejado e ao mesmo tempo garantir legitimidade perante atores do campo (BINDER, 2007; D. AUNNO; SUTTON; PRICE, 1991; PACHE; SANTOS, 2010a; SMETS; GREENWOOD; LOUNSBURY, 2015; TRACEY; PHILLIPS; JAVIS, 2011; GREENWOOD et al., 2011). Uma forma de alcançar este objetivo seria, conforme Battilana e Dorado (2010), por meio da construção de uma identidade organizacional híbrida, forte o suficiente para ser capaz de conciliar pressões advindas de múltiplas lógicas institucionais. Ainda, essa forma de hibridização seria adequada em situações em que não há experiência prévia com determinada lógica (GLYNN, 2008; KRAATZ; BLOCK, 2008; LOK, 2010; GREENWOOD et al., 2011).

Organizações que adotam esta forma de hibridização lidam com dificuldades inerentes ao gerenciamento de pressões advindas da própria combinação de lógicas dentro uma mesma estrutura; sobretudo, considerando os riscos de desvio de missão, ou seja, quando o equilíbrio entre as lógicas combinadas não é mantido, e uma lógica tende a predominar (PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018). Além disso, tentam auferir colaboração produtiva entre representantes de lógicas distintas por meio da formalização, que visa distinguir práticas principais de práticas eventuais de cada lógica (RAMUS; VACCARO; BRUSONI, 2017). Ainda, é possível que tentem obter legitimidade em relação aos atores externos por meio da combinação de elementos puros de lógicas diferentes, processo conhecido como acoplamento seletivo (PACHE; SANTOS, 2013).

Híbridos Estruturais Diferenciados consistem em estruturas compartimentalizadas em subunidades (ou espaços distintos) onde se manifestam identidades, práticas, e padrões normativos derivados de lógicas institucionais distintas (KRAATZ; BLOCK, 2008; PRATT; FOREMAN, 2000; GREENWOOD et al., 2011). Ou seja, a organização é composta por diversos “espaços de lógica única” (PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018). Esse tipo de hibridização é coerente nos casos em que a organização não deseja se sujeitar aos riscos e custos relacionadas à ampla reestruturação de práticas (PACHE; SANTOS, 2013) e à alteração da identidade organizacional (BATTILANA; DORADO 2010). No entanto, essa estrutura tende a gerar alguns desafios às organizações, tais como: dificuldades de integração dos espaços de lógica única; problemas de coordenação e cooperação entre subunidades; e risco de fragmentação organizacional (GREENWOOD et al. 2011).

Contudo, em estudo recente no ensino superior sobre centros “universidade-indústria”, Perkmann, Mckelvey e Phillips (2018) desafiaram a ideia de que os híbridos estruturais são sempre formados por “espaços de lógica única”, demonstrando a existência dos chamados “espaços híbridos”, compartimentos organizacionais em que se manifesta a influência tanto da lógica dominante da organização quanto de lógicas minoritárias. Nesse tipo de estrutura, que os autores denominaram Híbridos Estruturais Reais, a combinação de lógicas dominante e minoritária ocorre dentro de espaços organizacionais delimitados (que podem apresentar níveis diferenciados de hibridismo) e não ao longo de toda a organização, o que facilitaria o gerenciamento da complexidade institucional (PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018). Híbridos Estruturais Reais também enfrentam dificuldades semelhantes às que existem nos demais modelos de hibridismo, no que se refere ao gerenciamento das tensões dentro dos espaços híbridos, bem como ao gerenciamento da inter-relação entre o espaço híbrido e a organização como um todo (PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018).

No entanto, a criação e manutenção destes “espaços híbridos” ocorre por meio de tipos de ações organizacionais que buscam claramente a preservação da lógica dominante da organização. O primeiro tipo é a Alavancagem da Lógica Dominante no “espaço híbrido”, em que determinadas práticas da lógica dominante são utilizadas para alcançar objetivos da lógica minoritária e satisfazer interesses de seus representantes. O segundo tipo é a Hibridização da Lógica Dominante no “espaço híbrido”, em que se busca a compatibilidade com a lógica minoritária por meio da adaptação de práticas da lógica dominante. E o terceiro tipo é o Reforço da Lógica Dominante, em que se desenvolvem práticas para proteger o “espaço híbrido” do possível excesso de influência advindo da lógica minoritária, sendo o espaço ancorado de volta para a organização como um todo (PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018).

Desse modo, a formação de Híbridos Estruturais Reais interfere menos na identidade organizacional, pois cada espaço híbrido ainda terá sua lógica dominante bem definida, que é a mesma da organização como um todo; isso minimiza problemas de legitimação, diferindo dos Híbridos Misturados, em que a combinação de lógicas diferentes por toda a organização resulta na construção de uma identidade distinta, podendo ocasionar problemas de legitimidade externa. Híbridos Estruturais Reais também têm menor necessidade de mecanismos conciliatórios para garantir a integração entre espaços distintos, pois em todos os espaços organizacionais a lógica dominante é a mesma; diferindo dos Híbridos Estruturais Diferenciados, que apresentam lógicas diferentes entre os espaços, podendo levar à fragmentação de sua identidade principal, e, portanto necessitam de meios de negociação entre espaços de lógica distinta e formalização de práticas para garantir sua integridade (PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018).

Os autores explicam que a criação de espaços híbridos parece ser comum em universidades, sobretudo, nas situações em que é necessário mesclar aspectos da atividade acadêmica tradicional com as pesquisas aplicadas em colaboração com a indústria e o mercado. Assim, nesses espaços as universidades são capazes de lidar com os conflitos decorrentes da complexidade institucional gerenciando a realização de atividades que divergem de sua identidade principal, e atendendo interesses e necessidades de atores externos influentes (PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018).

Contudo, Perkmann, Mckelvey e Phillips (2018) presumem que quando as organizações estão sob forte pressão coercitiva para aceitar e aderir a práticas de uma lógica alternativa, a criação de “espaços híbridos” não seria uma resposta eficaz, sendo necessário adotar meios mais amplos de incorporação das práticas e normas da lógica distinta por toda a entidade, tal como nos Híbridos Misturados (D. AUNNO; SUTTON; PRICE, 1991; RAAIJMAKERS et al., 2015). Por outro lado, quando a organização não está sob forte pressão coercitiva para se conformar a uma lógica alternativa (DIMAGGIO; POWELL, 1983), ela tende a ter maior poder discricionário para decidir sobre o nível de conformidade e concordância que pretende estabelecer em relação à lógica distinta; portanto, nestes casos, passa a ser viável estabelecer “espaços híbridos” tais como nos Híbridos Estruturais Reais.

No caso das universidades públicas sujeitas a reformas no âmbito da NPM, em muitos países, tende a haver pressão coercitiva exercida pelos governos para se conformarem a um padrão de financiamento advindo de fontes externas competitivas, sobretudo, devido às constantes reduções do financiamento governamental para essas organizações (CHRISTENSEN, 2011a; 2011b; LAO, 2015; ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018; BALTARU; SOYSAL, 2018; LEIŠYTE, 2019). Assim, considerando este arcabouço teórico define-se a seguinte proposição:

Proposição 5: Quanto menor a dependência de recursos externos competitivos advindos de pressão coercitiva no modelo de autonomia universitária, maiores as condições para adoção de respostas estruturais à complexidade institucional capazes de preservar a Lógica Dominante da universidade.

A defesa da lógica dominante pela universidade condiz com o argumento de Mampaey e Huisman (2016), segundo o qual essas organizações tendem a adotar estratégias defensivas de redução de conflitos sempre que lidam com stakeholders que se opõem aos valores da lógica acadêmica. Esta abordagem é relevante, pois, como como aponta Greenwood et al. (2011), existem preocupações relacionadas à capacidade de as organizações preservarem sua identidade original vinculada à lógica dominante quando necessitam aderir a práticas derivadas de lógicas distintas. Ademais, esta proposição se fundamenta nas evidências encontradas por Perkmann, Mckelvey e Phillips (2018) nos centros universidade-indústria de universidades da União Europeia. Estas, apesar de submetidas a pressões de atores externos com interesses comerciais, formuladores de políticas públicas e até grupos de atores internos à organização, mantiveram algum poder discricionário para decidir sobre seu padrão de resposta à complexidade institucional relacionada a conflitos entre Lógica Acadêmica e de Mercado, e este padrão consistiu na formação de “espaços híbridos”.

Assim, as organizações tendem a concordar com determinada lógica minoritária na medida em que dependem de recursos e legitimidade advindos de seus representantes no campo (PFEFFER; SALANCIK, 1978). Logo, havendo margem de discricionariedade para decidir quanto ao nível de adequação da Lógica Dominante à Lógica Minoritária, é possível definir estrategicamente meios vantajosos de atendimento às partes interessadas da lógica minoritária, de modo a ampliar o acesso aos recursos necessários (DURAND; JOURDAN, 2012).

McPherson e Sauder (2013), de modo semelhante, explicam que, dado o poder discricionário das organizações, as lógicas dominante e minoritária podem ser empregadas de modo criativo, inclusive como instrumentos de resolução de conflitos. Nesse sentido, Híbridos Estruturais Reais consistem em uma solução para que a organização consiga minimizar efeitos prejudiciais do conflito entre demandas institucionais distintas (restringindo-os a “espaços híbridos”), e, ao mesmo tempo, extrair os benefícios potenciais da complexidade institucional por meio do envolvimento da Lógica Dominante com a Lógica Minoritária (PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018).

Essa condição pode ser relacionada ao caso das universidades paulistas que, por estarem sujeitas a limites burocráticos relativamente flexíveis no nível de campo concedidos pelo modelo de autonomia diferenciado, podem ter adquirido maior capacidade discricionária (GREENWOOD et al., 2011) para conciliar as lógicas Acadêmica e de Mercado, tratadas como concorrentes em outros modelos de autonomia. Desse modo propõe-se que:

Proposição 6: Quanto menor a dependência de recursos externos competitivos no modelo de autonomia universitária, maiores as condições para adoção de respostas à complexidade institucional que permitam que diferentes lógicas interajam de forma mutuamente benéfica.

Esta proposição também se apoia nas evidências encontradas do estudo de Perkmann, Mckelvey e Phillips (2018) em que centros universidade-indústria estudados correspondiam a espaços criados com propósito de permanência (diferindo dos “espaços de mudança”) em que grupos heterogêneos, representantes de diferentes lógicas institucionais, interagiam de forma a gerar resultados satisfatórios e condizentes com a lógica dominante da universidade. Além disso, a proposta de estudar este aspecto ajuda a preencher a lacuna de estudos sobre Híbridos Estruturais Diferenciados e, principalmente, Híbridos Estruturais Reais, que, segundo os autores, foram negligenciados em grande parte das pesquisas empíricas sobre padrões de resposta estrutural.

Em geral, estudar o tipo de resposta de universidades à complexidade institucional no âmbito de modelos de autonomia baseadas em padrões distintos de financiamento é relevante, pois, como destacado por David, Van Der Sijde e Van Den Besselaar (2018) poucos estudos se ocuparam em avaliar as ações de universidades ou acadêmicos para lidar com a complexidade institucional gerada pela Lógica Acadêmica e de Mercado assumindo a possibilidade de integrá-las.

3 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo deste ensaio foi discutir, sob o enfoque institucional, os efeitos do modelo de financiamento sobre a condição de autonomia das universidades públicas brasileiras. Como resultado, foram delineadas seis proposições teóricas capazes de guiar estudos futuros para a compreensão de um modelo alternativo de autonomia para as universidades públicas, que supere os problemas encontrados nos modelos do âmbito da NPM, que se baseiam na maior dependência de recursos externos competitivos (CHRISTENSEN, 2011a; 2011b; LAO, 2015; ABERBACH; CHRISTENSEN, 2018; BALTARU; SOYSAL, 2018; LEIŠYTE, 2019).

Nesse sentido, um modelo alternativo, seguindo os moldes da autonomia das universidades estaduais paulistas embasada no Decreto Estadual nº 29.598/89, teria como fundamento não a pressão coercitiva para buscar financiamento externo competitivo, mas a garantia de financiamento estatal direto pelos governos. Essa mudança no padrão de financiamento teria implicações para a capacidade de exercício efetivo da autonomia substantiva real. Logo, sugere-se que: à medida que a dependência de recursos externos competitivos reduz, a universidade tem maior liberdade para gerenciar seu relacionamento com partes interessadas não-governamentais, e, desse modo, usufrui de maior autonomia substantiva real (Proposição 1); ao mesmo tempo, devido à menor liberdade de gerenciamento de relações com partes interessadas governamentais, a autonomia processual real tende a ser reduzida (Proposição 2).

Considerando que as universidades lidam com a complexidade institucional derivada da influência simultânea da Lógica Acadêmica, dominante, e da Lógica de Mercado, minoritária (LAM, 2010, 2011; MURRAY, 2010; GREENWOOD et al, 2011; MAMPAEY; HUISMAN, 2016; PERKMANN; MCKELVEY; PHILLIPS, 2018; DAVID; VAN DER SIJDE; VAN DEN BESSELAAR, 2018; LEIŠYTE, 2019); e que as relações de conflito entre essas lógicas tendem a se agravar quanto maior for a dependência de atores externos representantes da lógica minoritária detentores de recursos competitivos; argumenta-se que o modelo alternativo de autonomia discutido, permitiria um padrão diferenciado de repostas organizacionais da universidade em relação ao gerenciamento de relações com stakeholders. Assim, este estudo propõe que, conforme a dependência de recursos externos competitivos diminui, a universidade tende a estabelecer relações de rede mais fracas com partes interessadas que representam lógicas institucionais diferentes da lógica dominante da universidade (Proposição 3). Ainda, assumindo a tendência de identidades organizacionais com maior poder gerencial e que a autonomia substantiva deve passar a ser exercida em nível organizacional e não apenas individual, pressupõe-se que a menor a dependência de recursos externos competitivos aumenta a efetividade da autonomia substantiva exercida pela gestão universitária como estratégia organizacional (Proposição 4).

O modelo alternativo de autonomia também pode permitir que as universidades se protejam dos possíveis excessos de influência advindos da lógica minoritária (de Mercado) e preservem sua identidade principal baseada na lógica dominante (Acadêmica). Nesse sentido, quanto menor a pressão coercitiva para a busca de recursos externos competitivos, maiores as condições de as universidades adotarem respostas (estratégicas e estruturais) à complexidade institucional que auxiliem na preservação da lógica dominante (Proposição 5).

Assim, observa-se que as reformas na autonomia universitária não devem implicar necessariamente o agravo das pressões e conflitos entre Lógica Acadêmica e de Mercado dentro da universidade. Em vez disso, um modelo de autonomia que garanta financiamento estatal direto pode permitir que estas organizações identifiquem e usufruam os potenciais benefícios relacionados à complexidade institucional. Portanto, argumenta-se que a menor dependência de recursos externos competitivos gera maiores condições para as universidades responderem à complexidade institucional utilizando práticas que viabilizem a interação mutuamente benéfica entre Lógica Acadêmica e de Mercado (Proposição 6).

Em síntese, essa abordagem chama a atenção para a necessidade de estudar empiricamente as circunstâncias em que as universidades conseguem se estabelecer como organizações completas, estratégicas, orientadas por objetivos e responsabilizadas por ações e resultados; e, ao mesmo tempo, capazes de exercer autonomia substantiva real, gerenciando suas relações com stakeholders de modo a evitar excessos prejudiciais de influência externa; além de preservar sua identidade organizacional fundamentada na lógica acadêmica, dominante no ensino superior. Isso pode representar uma solução futura para as dificuldades que as universidades enfrentam, derivadas do excesso de complexidade institucional gerado pelas políticas e práticas implementadas pelo Estado na intenção de conceder autonomia via redução das garantias de financiamento público. Ainda, é preciso compreender via estudos empíricos as circunstâncias em que a transposição do modelo de autonomia paulista para outros estados é viável, considerando os diferentes níveis de arrecadação tributária entre governos estaduais.

Em suma, admite-se que à medida que as políticas públicas de reforma se direcionem à ideia de autonomia universitária assegurada por recursos governamentais, a dissociação entre meios e fins a nível de campo, apontada por Grodal e O'mahony (2015) e Hladchenkoa, Westerheijdena e Boer (2018), tende a ser mitigada, e, por consequência, haverá redução dos conflitos inerentes à complexidade institucional no ensino superior.

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