Artigo

ESCALABILIDADE DA INOVAÇÃO SOCIAL EM UM BANCO COMUNITÁRIO2

SCALABILITY OF SOCIAL INNOVATION IN A COMMUNITY BANK

ESCALABILIDAD DE LA INNOVACIÓN SOCIAL EN UN BANCO COMUNITARIO

Júlia Mitsue Vieira Cruz Kumasaka
Universidade de São Paulo, Brasil
Barbara Braga Cruz
Universidade Federal do Ceará, Brasil
Fernanda Salvador Alves Alves
Universidade Federal do Paraná, Brasil
Andréa Torres Barros Batinga de Mendonça
Universidade Federal do Paraná, Brasil

ESCALABILIDADE DA INOVAÇÃO SOCIAL EM UM BANCO COMUNITÁRIO2

REAd. Revista Eletrônica de Administração (Porto Alegre), vol. 28, núm. 1, pp. 232-261, 2022

Escola de Administração da UFRGS

Recepção: 17 Agosto 2020

Aprovação: 29 Março 2022

RESUMO: O processo de escalabilidade da inovação social ocorre quando ela busca aumentar o seu impacto social em relação aos seus usuários ou alcançar mais beneficiários. Tendo em vista a importância do tema e sua pouca exploração por artigos científicos com casos empíricos, o presente estudo busca verificar como ocorre o processo de escalabilidade da inovação social, descrevendo os elementos que dificultam e os que auxiliam esse processo usando como base o modelo proposto por Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016). Para isso, foi realizada uma pesquisa no Banco Palmas, primeiro banco comunitário do Brasil. Como resultado, foi possível observar que além dos fatores destacados pelo modelo utilizado, os canais de comunicação de mídia tiveram um papel fundamental da difusão da inovação social. Além disso, as experiências do líder e da própria organização em relação aos negócios tradicionais não foram observadas. Ademais, melhor do que receber recursos de fontes filantrópicas seria se a Inovação Social conseguisse ser independente financeiramente. Entre as contribuições práticas, são fornecidos elementos que os gestores que desejam aumentar o impacto de sua inovação social devem analisar para planejar suas ações.

Palavras-chave: Inovação social, Escalabilidade, Difusão, Empreendedorismo Social, Banco Comunitário.

Abstract: The scalability process of social innovation occurs when it seeks to increase the social impact in relation to its users or reach more beneficiaries. In view of the importance of the theme and its little exploration by scientific articles with empirical cases, the present study seeks to verify how the process of scalability of social innovation occurs, understanding the elements that hinder and those that assist this process using the model used by Morais-da-Silva, Takahashi and Segatto (2016). For this, a research was held at Banco Palmas, the first community bank in Brazil. As a result, it was possible to observe that in addition to the factors highlighted by the model used, the media communication channels played a fundamental role in the diffusion of social innovation. In addition, how to experience the leader and organize your own relationship with traditional businesses has not been observed. Furthermore, better than receiving resources from philanthropic sources, seriously an Social Innovation (SI) managed to be financially independent. Practical contributions include elements that managers who increase or impact their social innovation must analyze to plan their actions.

Keywords: Social Innovation, Scalability, Diffusion, Social entrepreneurship, Community bank.

Resumen: El proceso de escalabilidad de la innovación social ocurre cuando busca incrementar su impacto social en relación a sus usuarios o llegar a más beneficiarios. Teniendo en cuenta la importancia del tema y su escasa exploración por artículos científicos con casos empíricos, el presente estudio busca verificar cómo ocurre el proceso de escalabilidad de la innovación social, entendiendo los elementos que dificultan y los que asisten a este proceso utilizando como base el modelo propuesto. por Morais-da-Silva, Takahashi y Segatto (2016). Para ello, se llevó a cabo una investigación en el Banco Palmas, primer banco comunitario de Brasil. Como resultado, se pudo observar que además de los factores resaltados por el modelo utilizado, los canales de comunicación mediática jugaron un papel fundamental en la difusión de la innovación social. Además, no se observaron las experiencias del líder y de la propia organización en relación a los negocios tradicionales. Además, mejor que recibir recursos de fuentes filantrópicas, sería si innovación social (IS) lograra ser financieramente independiente. Entre las aportaciones prácticas, se aportan elementos que los directivos que deseen incrementar el impacto de su innovación social deben analizar para planificar sus acciones.

Palabras clave: Innovación social, Escalabilidad, Difusión, El emprendimiento social, Banco Comunitario.

INTRODUÇÃO

A inovação social envolve uma mudança de prática social (D`AMARIO; COMINI, 2020; HÖLSGENS; LÜBKE; HASSELKUSS, 2018) a partir de uma mudança que possui como principal objetivo trazer benefícios sociais (ASHTA et al., 2020). Apesar da literatura de inovação social ser considerada diversa em definições e entendimentos por alguns autores (D`AMARIO; COMINI, 2020; HÖLSGENS; LÜBKE; HASSELKUSS, 2018; RABADJIEVA; BUTZIN, 2019), o ponto comum entre elas é o fato dessa inovação gerar um impacto social significativo.

Cada vez mais ela se configura como uma alternativa viável e eficaz para superar problemas sociais que as tecnologias e inovações tradicionais não possuem o foco de sanar (MULGAN, 2007; MOULAERT et al., 2005) ou que não conseguem resolver sozinhas sem a perspectiva social de longo prazo (HÖLSGENS; LÜBKE; HASSELKUSS, 2018).

Em um processo de difusão, a inovação é comunicada por canais ao longo do tempo entre os membros de um sistema social e envolve as expectativas e julgamentos convergentes ou divergentes entre esses atores. A difusão de inovações compreende nessa perspectiva quatro elementos principais que norteiam a curva desse processo: a inovação em si, a comunicação e os canais em que percorre ao longo do tempo e os membros do sistema social (ROGERS, 2003).

Quando se trata das inovações sociais, a difusão é chamada de escalabilidade e tem como benefício o maior número de favorecidos e uma melhora nas soluções propostas, aumentando o impacto social das inovações (MULGAN, 2007; BHATT E ALTINAY ,2013; MORAIS-DA-SILVA, TAKAHASHI E SEGATTO, 2016; MORAIS-DA-SILVA E SEGATTO, 2018). Assim, a importância de se estudar a difusão de inovações sociais está em responder aos desafios de transformar algo novo em uma prática comum de impacto social, buscando entender como se constitui esse processo, a partir dos elementos que o compõe, como os atributos da inovação são percebidos, quais vantagens percebidas na adoção e como esses elementos influenciam a taxa de adoção dessas inovações (HÖLSGENS; LÜBKE; HASSELKUSS, 2018).

Porém, na meta-síntese com estudos de caso que analisaram a escalabilidade da inovação social realizada por Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016) percebeu-se que o tema ainda é pouco explorado. Em conformidade com isso, Bolzan, Bitencourt e Martins (2019) realizou um estudo bibliométrico e constatou que o tema é recente, já que a primeira publicação com esse foco foi em 2002, chegando em 2019 com um pouco mais de 40 artigos publicados.

A pouca exploração da temática também é ressaltada por outros autores (ASHTA et al., 2020; JOHANSSON; STEFANSEN, 2020; STEINFIELD; HOLT, 2019); Ashta et al. (2020) argumentam que é importante que sejam feitos mais estudos que abordem casos de sucesso e de fracasso de escalabilidade de inovações sociais para que seja gerado mais conhecimento na área.

Outra informação, comprovada com o estudo de Bolzan, Bitencourt e Martins (2019), é que, apesar do Brasil ser um dos países com maior número de estudo sobre o tema, apenas 5 artigos de autores brasileiros foram encontrados, com apenas 4 sendo estudos de caso no âmbito nacional. Assim, é possível perceber que é um campo com potencial para ser explorado e analisado sobre a real adaptação dos modelos propostos internacional ou nacionalmente no contexto brasileiro.

Nessa perspectiva, o presente estudo busca responder à seguinte pergunta: como ocorre a escalabilidade da inovação social e quais elementos auxiliam e/ou dificultam esse processo? Nesse sentido, o objetivo geral do estudo é analisar o processo de escalabilidade da inovação social em um banco comunitário/Banco Palmas, descrevendo os elementos que dificultam e os que auxiliam esse processo. Para isso, usou-se o modelo proposto por Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016), atendendo o seu chamado para inclusão e exclusão de elementos.

As características do caso selecionado são descritas no tópico de procedimentos metodológicos, mas vale ressaltar a motivação para a sua escolha. Além de ser o primeiro banco comunitário do Brasil, o Banco Palmas difundiu a sua metodologia de trabalho e seus conhecimentos por grande parte do território nacional. Como resultado, passou a liderar a Rede Brasileira de Bancos Comunitários (INSTITUTO BANCO PALMAS, 2019), ampliando seu impacto social nacionalmente.

1 INOVAÇÃO SOCIAL

Para Bignetti (2011), a inovação social (IS) é o efeito do conhecimento destinado às carências da sociedade por meio da participação e contribuição de todos os atores envolvidos e possibilitando respostas duradouras para os problemas sociais. Assim, a inovação social compreende o contentamento das necessidades humanas por meio de mudanças nas relações sociais, em especial às novas formas de governança, incluindo a maior participação dos membros da sociedade e ampliando a capacidade sociopolítica dos seus cidadãos. Além disso, também pode buscar aumentar o acesso aos recursos mínimos para satisfazer as necessidades básicas das pessoas envolvidas ou beneficiadas (MOULAERT et al., 2005).

Por se tratar de uma inovação, a IS apresenta uma nova combinação de elementos, mas com o foco em proporcionar um impacto social positivo. Elas também são diferentes das inovações tradicionais por não buscar vantagem competitiva. Para Mulgan (2007), as inovações sociais raramente possuem elementos totalmente novos, mas apresentam uma combinação de aspectos que já existem, porém com propósitos antes diversos, e que agora atenderão às demandas sociais.

Além disso, as inovações sociais não precisam ser tecnológicas, mas sim possuir potencial para auxiliar em um futuro sustentável. Esse auxílio também não necessariamente será uma mudança radical na sociedade, podendo ser uma nova perspectiva de como produtos ou serviços podem ser fornecidos (HÖLSGENS; LÜBKE; HASSELKUSS, 2018) para atender mais eficientemente a população.

Quando pensando nos processos de inovação social propriamente ditos, Tardiff e Harrison (2005) afirmam que alguns aspectos são interessantes de serem entendidos. Primeiro, o modo de coordenação, ou seja, como acontecem os processos de avaliação das atividades, de mobilização dos atores, de participação e de aprendizagem. Em segundo, os meios utilizados para se alcançar parcerias, consensos entre os diferentes atores envolvidos, empoderamento e a difusão. E, em terceiro, as restrições enfrentadas, podendo estar relacionadas com os regimes institucionais rígidos, tensão entre os participantes, incertezas, entre outras.

Muitos pesquisadores entendem que o processo de criação e implementação da inovação social é o que a define, partindo da cooperação entre diferentes atores. Ela se consolida como um processo de aprendizagem coletiva que acontece com a participação dos beneficiários em diversos níveis e com a consequente construção do conhecimento (CLOUTIER, 2003).

Assim, é possível observar que diferentes processos que constituem uma inovação social, desde a sua constituição até suas rotinas diárias e o que é necessário ser feito para que o impacto social alcance os beneficiários esperados. Dentro dessa perspectiva, focando nos processos de desenvolvimento das inovações sociais, o quadro 1 apresenta alguns modelos encontrados na literatura.

Quadro 1
Etapas do processo de inovação social segundo a literatura
Etapas do processo de inovação social segundo a literatura

Analisando todos os modelos propostos é possível perceber que apesar das diferenças em relação aos números de fases e níveis de detalhamento de cada autor sobre cada fase, de uma forma geral, os autores propõem fases bastante similares, principalmente levando em consideração que, como Morais-da-Silva e Segatto (2018) afirmam ao final do seu estudo, existe um movimento de retorno, ou seja, a inovação social não passa por casa fase de forma linear e não retrógrada.

Mas, mais importante ainda, é perceber como, nos seis modelos citados, a difusão da inovação social sempre está presente, mesmo que representada por outro termo, como escalabilidade, crescer em escala ou solução para ser expandida. Dessa forma, é perceptível a importância decisiva da disseminação da inovação social no seu processo de desenvolvimento e para que ela consiga efetuar o seu impacto positivo para o máximo de pessoas possíveis.

1.1 DIFUSÃO DA INOVAÇÃO SOCIAL

A conceituação inicial de difusão da inovação partiu de Rogers (2003) e aborda um processo em que uma inovação é comunicada por certos canais ao longo do tempo para membros de um sistema social. Nesse conceito, se percebe que a difusão envolve quatro elementos que se configuram numa curva S de difusão: a inovação em si, a comunicação e os canais envolvidos, o tempo e o sistema social.

É importante ressaltar também que, nem todas as inovações são unidades de análise equivalentes que devem ser comparadas de maneira igualitária, portanto algumas características são necessárias de serem observadas quando se trata da difusão. Rogers (2003) acrescenta que essas características envolvem a vantagem relativa percebida da inovação em relação à inovação anterior; a compatibilidade em que a inovação é percebida como consistente com os valores existentes, experiências passadas e as necessidades dos adotantes em potencial; complexidade como forma de perceber as dificuldades no entendimento e no uso das inovações por parte dos membros do sistema social; experimentabilidade como a possibilidade da inovação ser testada, e; a possibilidade de observação dos resultados da inovação pelos individuais, o que faz com que, quanto mais visível for os resultados da inovação, maior a tendência da mesma ser adotada.

A difusão pode ocorrer de forma estratégica ou organicamente (PATIAS et al., 2017; WESTLEY; ANTADZE, 2010). Quando é possível planejá-la, deve ser observado se será expandida no seu local de origem, aumentando o número de beneficiários ou serviços oferecidos, ou para outros locais geográficos (BOLZAN; BITENCOURT; MARTINS, 2019; MORAIS-DA-SILVA; TAKAHASHI; SEGATTO, 2016), e se será compartilhado o conhecimento com o uso de canais de comunicação, como os acadêmicos, ou repassado pela prática, inclusive pelos próprios usuários (MORAIS-DA-SILVA; TAKAHASHI; SEGATTO, 2016; PATIAS et al., 2017). Nessa perspectiva, Steinfield e Holt (2019) afirmam que os beneficiários não devem ser considerados apenas receptores, pois são capazes de promover, reproduzir e inovar, e por isso são fundamentais no processo de difusão.

O processo de difusão da IS pode ser lento (DEES; ANDERSON; WEI-SKILLERN, 2004) e não ser simples. Pois o sucesso da IS pode estar muito relacionado com o contexto em que está inserido (RABADJIEVA; BUTZIN, 2019; UPADHYAYA; ROSA, 2019) e os diferentes stakeholders envolvidos (ASHTA et al., 2020; STEINFIELD; HOLT, 2019). Superar uma falta de compatibilidade histórica, de valores e ideologias comum aos stakeholders pode ser demasiadamente complexo, como também outros fatores já institucionalizados no contexto em que se quer atuar (ASHTA et al., 2020; JOHANSSON; STEFANSEN, 2020).

Além disso, outros aspectos importantes para o uso e a replicação da IS precisam ser considerados, tais como a complexidade do conhecimento prévio necessário, a facilidade de acesso dos usuários aos recursos (inclusive de informação), e a capacidade de adquirir os conhecimentos que precisam desenvolver. Dependendo disso, as IS podem ser de três tipos: 1) independentemente reproduzidas pelos próprios beneficiários diretos, 2) facilitadas com o auxílio de um agente externo, como uma organização da sociedade civil, ou 3) complexas no nível de empresas sociais ou outros tipos de organizações precisarem ser continuamente responsáveis pelo desenvolvimento da IS (STEINFIELD; HOLT, 2019).

Além disso, alguns elementos podem facilitar a aceitação dos beneficiários diretos e indiretos. Exemplos disso são a IS já possuir dados e evidência positivas de sucessos ou impactos alcançados (JOHANSSON; STEFANSEN, 2020), utilizar de diferentes formas de comunicação para informar a sociedade sobre a IS (ASHTA et al., 2020) e compatibilizar as necessidades percebidas pelo público-alvo (RABADJIEVA; BUTZIN, 2019), principalmente se há uma crise em relação aquele serviço ou produto, pois isso impulsionará a sua aceitação (ASHTA et al., 2020). Ademais, quando a inovação não busca romper com o sistema vigente, estando alinhada com os seus interesses, atores do regime atual tendem a não ser um empecilho (HÖLSGENS; LÜBKE; HASSELKUSS, 2018). Em alguns casos podem se tornar parceiros e fomentadores da escalabilidade.

Um aspecto que pode ter tanto impactos positivos e quanto negativos para a difusão é a flexibilidade da IS em se adaptar aos diferentes contextos e públicos, sendo facilmente modificada. Se por um lado, essa característica pode ser extremamente importante para facilitar o processo ou para adequação aos impactos desejados, por outro pode fazer com que a ideia original seja demasiadamente alterada, perdendo características transformadoras (HÖLSGENS; LÜBKE; HASSELKUSS, 2018; JOHANSSON; STEFANSEN, 2020). Isso pode significar uma mudança na essência da IS e a dissipação do seu impacto social. A partir do momento que existe a tentativa de expansão, a forma como o significado da IS vai ser interpretado é imprevisível, pois depende dos aspectos socioculturais dos envolvidos (RABADJIEVA; BUTZIN, 2019).

Analisando diferentes atores ou elementos que podem facilitar ou dificultar o processo estudado, Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016) sintetizaram as informações encontradas em diferentes estudos de caso e propuseram o modelo apresentado pela figura 1 abaixo.

Fatores promotores da escalabilidade da IS
Figura 1
Fatores promotores da escalabilidade da IS
Fonte: traduzido de Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016).

O modelo apresenta dois tipos de aspectos: os internos, podendo ser relacionados com o empreendedor ou com a organização, e os externos à instituição ou grupo que está fazendo a gestão da inovação social. Também é dada atenção às organizações que podem ser facilitadoras do relacionamento de elementos internos e externos (MORAIS-DA-SILVA; TAKAHASHI; SEGATTO, 2016). Esses agentes podem fornecer recursos, mitigar riscos envolvidos e ensinar o que for possível e necessário (STEINFIELD; HOLT, 2019).

No caso do empreendedor, são necessárias capacidades relacionadas com liderança, principalmente no quesito motivação, experiência em gestão e habilidade política. Já sobre a organização, são critérios importantes: a credibilidade e reputação construídas, uma cultura de participação entre os atores, o treinamento dos colaboradores, a menor dependência possível dos líderes, a resiliência estrutural e a estratégica para se adaptar a diferentes contextos. Além disso, são fatores relevantes a qualidade da solução oferecida, o uso de inovações incrementais para atender aos novos beneficiários, a experiência nos negócios e em parcerias focadas na escalabilidade, a facilidade em desenvolver competências e aprendizagem organizacional (MORAIS-DA-SILVA; TAKAHASHI; SEGATTO, 2016).

Já entre os aspectos externos estão: suporte governamental, filantropia como uma fonte de recursos, parcerias para captar recursos financeiros e de competências, envolvimento dos membros da comunidade local e a existência de outras empresas sociais para que exista a troca de experiências, a imitação e até a possibilidade de fusão (MORAIS-DA-SILVA; TAKAHASHI; SEGATTO, 2016).

Outros autores também argumentam a importância dos formuladores de políticas públicas para facilitar o desenvolvimento da IS (DEES; ANDERSON; WEI-SKILLERN, 2004) e como o seu impacto pode ser intersetorial e internacional (JOHANSSON; STEFANSEN, 2020). Já a captação de recursos financeiros é dita por Bolzan, Bitencourt e Martins (2019) como o maior desafio enfrentado para a escalabilidade da IS.

2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS

Para alcançar o objetivo de analisar o processo de escalabilidade da inovação social, descrevendo os elementos que dificultam e os que auxiliam esse processo usando como base o modelo proposto por Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016), foi escolhido o método qualitativo de pesquisa, a partir da análise do estudo de caso do Banco Palmas.

A pesquisa qualitativa foi utilizada pelas pesquisadoras por buscar entender o fenômeno no seu contexto real e considerarem a sua interação com os participantes e entrevistados como fundamental para a profundidade dos achados (CRESWELL, 2010). Além disso, o estudo é considerado descritivo por buscar descrever características do fenômeno a partir de conceitos constructos bem definidos (BABBIE, 2016).

A unidade de análise, detalhada no item 2.1, foi escolhida por ter alcançado a difusão geográfica (nacionalmente) da sua metodologia, considerada inovadora, e passando a liderar a rede de bancos comunitários no Brasil (INSITUTO BANCO PALMAS, (2019). Assim, o seu impacto social é observado tanto em nível local quanto nacional.

Para a coleta de dados, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com os principais gestores que participaram do processo de escalabilidade (descritos no quadro 2), bem como análise documental, envolvendo o acervo disponível no site oficial, assim como trabalhos acadêmicos relacionados, no que diz respeito ao histórico, evolução e projetos criados a nível local e nacional a partir do Instituto. A análise documental foi utilizada, sobretudo, para reiterar datas, nomes e eventos citados pelos entrevistados, por meio de triangulação de dados (YIN, 2010), confrontando dados fornecidos pelas entrevistas e provenientes da análise documental.

Quadro 2
Perfil dos sujeitos entrevistados
Perfil dos sujeitos entrevistados

A fim de compreender como o Instituto Banco Palmas, criado a partir de um banco comunitário dentro da periferia de Fortaleza, promoveu a difusão da metodologia dos bancos comunitários em todo o Brasil e, assim, entender o processo de escalabilidade, foram entrevistados o coordenador do Instituto Banco Palmas, que também é o fundador do Banco Palmas e um dos principais responsáveis pela implantação de bancos comunitários no País, explicando a metodologia aplicada na comunidade; a líder do projeto Elas - Emancipadas, que também é líder comunitária no Conjunto Palmeiras e participa de atividades que integram os projetos do Instituto Banco Palmas às demandas da comunidade, além de realizar a divulgação, a nível nacional e internacional, das políticas públicas implantadas no bairro por meio do Instituto; uma participante do projeto PalmasLab, integrante de uma equipe de desenvolvimento de soluções em tecnologia da informação no campo das finanças solidárias utilizadas dentro da rede de bancos comunitários; e, por fim, uma participante voluntária do projeto Elas - Emancipadas, com ações de orientação para as mulheres da comunidade local e arredores. Todos os entrevistados são moradores do Conjunto Palmeiras.

Foram realizadas entrevistas em abril de 2019, totalizando 3 (três) visitas à sede do Instituto Banco Palmas e 2 (duas) visitas a unidades que mantém projetos do Instituto, como o Elas Emancipadas e PalmasLab, localizadas na comunidade do Conjunto Palmeiras, em Fortaleza. As entrevistas foram gravadas, gerando um total de 4 horas e 10 minutos de gravação. Em seguida, foram transcritas gerando 50 páginas. O quadro 3 detalha essa informação.

Quadro 3
Descrição das entrevistas realizadas
Descrição das entrevistas realizadas

Para análise dos dados, as três etapas sugeridas por Bardin (2006) para conduzir uma análise de conteúdo foram realizadas: 1) pré-análise, para que temas relevantes e possíveis codificações fossem organizadas 2) exploração do material, com as suas codificações e leituras mais aprofundadas e focadas e 3) tratamento dos resultados, inferência e interpretação, com a análise do que foi encontrado e com base na literatura estudada.

Dessa forma, as ideias iniciais foram sistematizadas e foi feita a escolha dos documentos a seres analisados por meio do levantamento de informações disponíveis no site oficial e em publicações sobre o Instituto Banco Palmas em canais de comunicação que evidenciassem o processo de escalabilidade de acordo com a literatura. A partir dessa sondagem, os dados foram codificados, classificados, caracterizados, e, posteriormente, realizada a análise da difusão da IS.

O Software Atlas TI 7.5 foi utilizado para auxiliar na etapa de codificação das entrevistas e dos documentos analisados. Os códigos e questões norteadoras (apresentados no quadro 4 abaixo) foram estabelecidos a priori para entender como a IS se desenvolveu para em seguida analisar a sua difusão.

Quadro 4
Descrição dos códigos de desenvolvimento da IS
Descrição dos códigos de desenvolvimento da IS

Já os elementos do modelo utilizado como base para o presente estudo e exemplos das questões norteadoras utilizadas para identificá-los no caso analisado estão apresentados no quadro 5 abaixo.

Quadro 5
Códigos utilizados com base no modelo de Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016)
Códigos utilizados com base no modelo de Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016)

2.1 UNIDADE DE ANÁLISE

O Banco Palmas é o primeiro banco comunitário do Brasil, sendo uma organização do Terceiro Setor, fundada em 1998 no Conjunto Palmeiras - periferia da cidade de Fortaleza (CE) - pioneira na difusão da metodologia de banco comunitário de desenvolvimento no país (INSTITUTO BANCO PALMAS, 2010). Em uma iniciativa da Associação de Moradores do Conjunto Palmeiras (ASMOCONP), juntamente com moradores da comunidade, decidiu-se criar um projeto de geração de renda e emprego para o bairro, incentivando o consumo local (ARAÚJO ET AL., 2021) e aliando o crescimento da economia local à melhoria do bem-estar da população (INSTITUTO BANCO PALMAS, 2010). Outros resultados positivos que podem ser citados são o fortalecimento da cultura local, da solidariedade, mais capacitações para a população local, entre outros (ARAÚJO ET AL., 2021).

A partir do surgimento do Banco Palmas, foi criado, em 2003, o Instituto Banco Palmas como uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP). O seu objetivo é realizar a difusão da metodologia de banco comunitário, ocorrendo, a princípio, nos municípios do Ceará, como em Paracuru (CE), onde foi implementado o segundo banco comunitário do Brasil, o Banco PAR. A partir de então, com o apoio da Secretaria Nacional de Economia Solidária (SENAES), passou a atingir outros municípios, como Palmácia (Banco Serrano) e Santana do Acaraú (Banco BASSA), e outros Estados, como Espírito Santo (Banco BEM e Banco Terra) e Rio de Janeiro (Banco Maricá), com o objetivo de garantir o acesso ao microcrédito a produtores e consumidores locais, através de correspondente bancário, empréstimos e moeda local (INSTITUTO BANCO PALMAS, 2019).

Mesmo que outros bancos comunitários tenham surgido de dificuldades sociais semelhantes (SILVA JÚNIOR, 2007), ao se adaptarem à realidade da comunidade em que foram desenvolvidos, a referência do Banco Palmas se tornou mais distante dessas iniciativas. Com a criação do segundo banco comunitário e de outros em processo de criação, o Banco Palmas passou a ter o papel de replicar a sua experiência. Para que isso ocorresse, foi necessário definir conceitos sobre como isso poderia se adaptar a cada realidade. Assim, a metodologia foi aperfeiçoando-se, ou seja, ganhando certo nível de maturidade por meio das práticas construídas, para que apresentasse uma melhor definição de banco comunitário (SANTOS, 2018).

Nesse sentido, em 2006, o Instituto Banco Palmas, por meio da realização da Oficina Metodológica dos Bancos Comunitários, visando sistematizar a metodologia, reuniu todos os bancos comunitários existentes na época e criou a Rede Brasileira de Bancos Comunitários. De acordo com o Instituto Banco Palmas (2019), a Rede possui a seguinte definição: ‘Uma articulação de todos os bancos comunitários criados no Brasil, a partir da experiência e da metodologia desenvolvida pelo Banco Palmas, e que estão de acordo com o termo de referência e o marco teórico conceitual dos Bancos Comunitários. Todos esses bancos recebem uma espécie de “marca de certificação” da Rede’ (INSTITUTO BANCO PALMAS, 2019).

A Rede Brasileira de Bancos Comunitários tem registro de 120 (cento e vinte) bancos comunitários, espalhados por 21 estados e Distrito Federal, sendo a maioria localizada na região Nordeste (56 bancos comunitários), seguida pelas regiões Norte e Sudeste, com 26 bancos cada, região Centro-Oeste (10 bancos) e região Sul (2 bancos) (INSTITUTO BANCO PALMAS, 2019). Os bancos que integram a Rede atuam em diferentes comunidades, tais como áreas urbanas e rurais, regiões amazônicas, quilombolas, favelas e bairros periféricos das cidades (INSTITUTO BANCO PALMAS, 2019).

Em 2014, um instrumento de consolidação das ações promovidas até então pelo Instituto Banco Palmas foi criado: a organização não-governamental (ONG) Instituto Banco da Periferia, fundada por líderes do Conjunto Palmeiras, Banco Palmas e outros profissionais da área de bancos comunitários. Com o objetivo de reunir as ações de apoio ao Banco Palmas, como auxílio na criação e assistência técnica aos bancos comunitários, assessoria aos projetos de desenvolvimento, apoio tecnológico e de pesquisa da Rede Brasileira de Bancos Comunitários, a fim de facilitar o acesso a serviços financeiros nas comunidades de baixa renda. (INSTITUTO PERIFERIA MARICÁ, 2020). Junto à Rede Brasileira de Bancos Comunitários, o Instituto Banco da Periferia dá suporte na criação de moedas sociais digitais e bancos comunitários digitais pelo Brasil (INSTITUTO PERIFERIA MARICÁ, 2020).

Como destaca Borges (2010), apesar da existência de experiências de bancos comunitários fora do Brasil, o Banco Palmas criou uma metodologia própria, diferenciada do formato de outros países, por meio do Instituto Banco Palmas, que se tornou responsável por reaplicar a metodologia de bancos comunitários em diversos locais. Dessa forma, o Instituto Banco Palmas é percebido como uma inovação social capaz de promover a melhora da qualidade de vida daqueles em situação de vulnerabilidade social e que, por meio do engajamento de diversos atores sociais, gera impacto em nível local e se tornou referência com sua metodologia centrada na geração de renda e desenvolvimento social, construindo uma rede de bancos comunitários.

3 PRINCIPAIS ACHADOS

Na perspectiva de compreender como ocorre o processo de escalabilidade no contexto do caso em questão, buscou-se neste trabalho entender como o Banco Palmas, juntamente com as parcerias realizadas, chegou ao patamar de desenhar uma metodologia de bancos comunitários de desenvolvimento difundida para além das fronteiras da periferia da cidade de Fortaleza (CE), bem como os elementos que dificultaram e que auxiliaram nesse processo de escalabilidade. Para isso, o presente tópico é organizado de acordo com o modelo teórico usado, sendo dividido em três subtópicos: Desenvolvimento e difusão da IS, Elementos externos à organização e Elementos internos à organização.

3.1 DESENVOLVIMENTO E DIFUSÃO DA IS

O desemprego e a falta de renda foram os grandes motivadores do surgimento do Banco Palmas, já que “as pessoas eram, em sua maioria, desempregadas, o comércio local não empregava ninguém, então o grande desafio era ter uma solução de geração de renda local pra que as pessoas pudessem continuar vivendo no bairro” (E1, 2019).

Com a identificação dessa problemática, foram realizadas várias reuniões com produtores, comerciantes e outros moradores da comunidade com o objetivo de articular debates acerca das questões que envolviam a geração de renda local. Então, a comunidade entendeu o problema e encontrou, na criação de um banco, a solução para aquele contexto. Dessa forma, a identificação da oportunidade da inovação não foi realizada por um líder ou empreendedor específico como no caso exposto por Perrini et al. (2010), esse processo ocorreu de forma interativa entre a comunidade. O que pode comprometer o futuro da organização no momento que o atual gestor se afastar da liderança, uma vez que os processos não estarão tão organizados.

O entrevistado E1 (2019) enfatiza que, em um primeiro momento, os moradores desconheciam a concepção de banco comunitário, porém, o reconhecimento acerca das dificuldades do bairro e após inúmeras assembleias realizadas de forma que eles pudessem entender, a ideia foi concebida: “inventamos de fazer um banco sem a menor noção do que é um banco, imagina, naquela época, 20 anos atrás, nós éramos líderes comunitários, entendia nada de economia” (E1, 2019).

Portanto, o Banco Palmas apresentou-se como resposta para promover a dinâmica de produção e o consumo local, no qual os moradores eram os principais agentes do desenvolvimento. Assim, a ideia de criar um banco comunitário mostrou-se válida a fim de gerar trabalho e renda para a comunidade, promovendo o consumo dentro do bairro e criando um sistema de geração da economia local: “era uma coisa muito simples, era estimular que as pessoas pudessem produzir e consumir aqui umas das outras” (E1, 2019). Dessa forma, o projeto foi colocado em prática e ajustado conforme a demanda e os desafios enfrentados. A participação de várias pessoas do Conjunto Palmeiras nesse desenho da solução foi importante também para que ela estivesse alinhada com as necessidades e desejos da comunidade local, como definido por Rabadjieva e Butzin (2019). Ações sociais que estejam em conformidade com o coletivo tem mais chances de serem de sucesso, uma vez que já foram anteriormente planejadas, discutidas e pensadas por aqueles que realmente vão fazer uso da solução.

Assim, a inovação do Banco Palmas consistiu em desenvolver a economia na própria comunidade, como afirma o entrevistado E1 (2019):

A grande sacada do Palmas foi dizer que quem faz a oferta é a demanda, então se a gente tiver um consumo local, uma base de consumidores funcionando, o comércio vai surgir espontaneamente. Se tiver gente pra comprar aqui, vão surgir os comércios, vão surgir as indústrias, as empresas, né, então o foco do Banco era criar uma forma do povo comprar aqui. Como é que fazia? Emprestando dinheiro, agora tem que ser um dinheiro local, que só se circulasse aqui (E1, 2019).

Diferente do que a maioria dos autores defende sobre a necessidade de ter certeza da eficácia de uma inovação social para que em seguida se possa fazer a difusão, Dobson et al. (2017) afirmam que a escalabilidade pode ser feita enquanto acontece o desenvolvimento, pois adaptações ao modelo original podem ser feitas durante o próprio processo, ou seja, cada processo de difusão funciona como um teste. Mas no caso em análise, a difusão só começou quando o Banco Palmas estava bem consolidado no meio e pela população local (SILVA JÚNIOR, 2007), ou seja, já tinha alcançado visibilidade e confiança. Isso permite que as ações de escalabilidade sejam mais direcionadas às práticas que efetivamente sejam necessárias para a difusão e sucesso da organização.

O Instituto Banco Palmas foi gerado a partir da consolidação do Banco Palmas, como instrumento de transformação social, para melhorar a qualidade de vida dos moradores do Conjunto Palmeiras, tendo como foco também a criação de “instrumentos de difusão, sistematizando de forma pedagógica a experiência do banco, de forma a possibilitar a comunicação com outros municípios e com o Poder Público” (SILVA JÚNIOR, 2007; MELO NETO SEGUNDO, 2003). Percebe-se aqui o interesse de difundir uma IS e criar uma rede de apoio a comunidades que não tivessem acesso a serviços bancários como anteriormente o Banco Palmas, a região não tinha.

Diferentes tipos de estratégias para a difusão podem ser escolhidas e combinadas. De uma forma geral, elas podem ser voltadas para um crescimento organizacional interno (aumentando o impacto social no seu local original com mais recursos disponíveis), um crescimento externo (ampliando a inovação social geograficamente), ou como ocorreu no caso em questão, o compartilhamento aberto de informações para outros atores (LYON; FERNANDEZ, 2012; MORAIS-DA-SILVA; TAKAHASHI; SEGATTO, 2016). Ao combinar informações, pode-se crescer de forma cooperativa. Alianças agregam no funcionamento de organizações, uma vez que há compartilhamento de recursos, de forma cooperativa, ou seja, com cooperação, mas também competição.

A iniciativa de aumentar seu impacto social também não foi totalmente da liderança do Banco Palmas. Em contraponto com a literatura abordada, a difusão aconteceu de forma mais orgânica (PATIAS et al., 2017; WESTLEY; ANTADZE, 2010), ou seja, não foi planejada e operacionalizada pelos gestores do banco. Ao perceber a grande demanda por auxílio na constituição de outros bancos comunitários, criou-se o Instituto Banco Palmas para fornecer as informações necessárias e ajudar como for possível. Dessa forma, uma ideia local se transformou em algo nacional, como afirma o entrevistado E1 (2019): “o Banco Palmas não nasceu em Harvard, não nasceu em Nova York, não nasceu na USP. Isso nasceu na periferia de Fortaleza e eu tenho muito orgulho disso, a gente ter criado uma coisa que pautou o país todo”.

A figura 2 a seguir apresenta a linha cronológica dos principais fatos que influenciaram e marcaram a difusão da metodologia do Banco Palmas pelo país.

Linha cronológica dos principais fatos na difusão da metodologia do Banco Palmas
Figura 2
Linha cronológica dos principais fatos na difusão da metodologia do Banco Palmas

Os outros bancos comunitários brasileiros criados após o Banco Palmas não pertencem ao Instituto, mas fazem parte da Rede Brasileira de Bancos Comunitários, instituída para sistematizar a metodologia criada pelo Banco Palmas. Assim, pode-se considerar que ele atua como um agente facilitador do processo de difusão, nas localidades onde um novo banco comunitário está sendo desenvolvido (STEINFIELD; HOLT, 2019). A Rede Brasileira de Bancos Comunitários pode ser vista como uma forma de transformar a IS em algo capilar, escalável e de interesse nacional.

3.2 ELEMENTOS EXTERNOS À ORGANIZAÇÃO

Os elementos externos são: suporte governamental, filantropia como uma fonte de recursos, parcerias para captar recursos financeiros e de competências, envolvimento dos membros da comunidade local e a existência de outras empresas sociais para que exista a troca de experiências, a imitação e até a possibilidade de fusão (MORAIS-DA-SILVA; TAKAHASHI; SEGATTO, 2016).

O Banco Palmas inicia seu desenvolvimento com a indignação da população do bairro acerca das condições em que se encontravam e a decisão de que a própria comunidade tem o poder de fazer a mudança. Dessa forma, desde a concepção da ideia do negócio até a operacionalização atual, as pessoas da comunidade participam ativamente, como exemplifica o entrevistado E1 (2019): “então teve várias assembleias populares, 96 assembleias com os moradores do bairro pensando que projeto seria esse e se chegou a esse modelo de projeto”.

Outro aspecto percebido que pode ser ressaltado é que para busca de recursos relacionados com as competências de seus colaboradores, prioriza-se sempre as pessoas da própria comunidade, o que também condiz com Bhatt e Altinay (2013) acerca da importância de aproveitar o capital social da comunidade que se desenvolve organicamente ao longo do tempo. Isso permite estimular ainda mais o crescimento social local, fazendo com que pessoas antes sem oportunidade e condições tivessem a sua frente um novo sonho e interesse.

Em relação à filantropia como uma fonte de recursos, o entrevistado E1 (2019) afirmou que instituições estrangeiras, principalmente da Alemanha e Holanda, foram as primeiras a acreditarem na ideia do Banco, investindo e sendo responsáveis por doações que resultaram no fundo de crédito inicial. Esse aspecto merece destaque, pois nota-se que instituições de outros países entenderam e buscaram auxiliar o Banco Palmas antes do que as organizações do Brasil. Isso demonstra a falta de confiança ou entendimento acerca das inovações sociais que existia no país na época da criação do Banco.

As parcerias para a captação de recursos financeiros e de competências foram fundamentais para o processo de crescimento e difusão da metodologia utilizada pelo Banco Palmas. O papel fundamental das parcerias é destacado também por Le Ber e Branzei (2010), Murphy et al. (2012) e Kolk e Lenfant (2015). Algumas das parcerias citadas nas entrevistas foram: Caixa Econômica Federal (CEF), Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), empresas (como o Mercadinho São Luiz), a prefeitura de Fortaleza com o projeto de Ecopontos, as universidades (principalmente USP e UFBA) que criaram incubadoras para atender bancos comunitários, entre outros.

A colaboração da SENAES também foi bastante citada, pois forneceu recursos para a expansão, inclusive com convites para o Banco Palmas ensinar sua metodologia em outros estados a fim de criar de novos bancos comunitários, podendo essa ser considerada uma organização ponte, de acordo com o modelo de Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016). Novamente, aponta-se a atuação de um órgão externo (como a Rede Brasileira de Bancos Comunitários) que auxilia na escalabilidade da IS e na sua atuação local e nacional.

Porém, com outras instâncias do governo, o Banco enfrentou confrontos com instituições públicas, como o Banco Central. Segundo o entrevistado E1 (2019), o governo não compreendia que a comunidade não estava criando um “novo dinheiro”, mas que ele seria apenas complementar à moeda nacional. Conforme Freire (2011), a moeda social não tem o poder de afetar o controle e a quantidade de moeda circulante. Assim, a população possui a liberdade para escolher utilizar ou não a moeda social como instrumento de troca, pois sua essência está na confiança que os indivíduos têm nela e, geralmente, adota-se o sistema de lastro na moeda oficial correspondente. O Banco Palmas atravessou dois processos judiciais, em 2003 e 2005, até que o Banco Central passou a legitimar as atividades do Banco, isto é, que não configuravam como crimes contra o Sistema Financeiro Nacional e, posteriormente, reconheceu o papel dos bancos comunitários como instrumentos de políticas públicas em prol do desenvolvimento econômico e social.

Ainda, após o conflito inicial, a relação entre o Banco Central e o Banco Palmas possibilitou parcerias com instituições financeiras como BNDES, que “é de onde o banco retira seu fundo de crédito” (E1, 2019). Numa parceria com a CEF, o Banco Palmas passou a trabalhar como correspondente bancário, o que “proporcionou o acesso da população ao pagamento de contas e recebimento de salários próximos de onde vivem, algo que não existia no passado” (E2, 2019). Outra parceria foi com o Banco do Brasil, ao promover cursos de capacitação financeira para líderes comunitários e colaboradores do Banco Palmas, que disseminação os ensinamentos de educação financeira na comunidade. Já a cooperação com a SENAES é vista como estratégica no apoio e na disseminação do Banco Palmas, o que o levou a um reconhecimento e expansão em nível nacional.

Entretanto, existe ainda uma relação difícil com o Poder Público, nas esferas municipal e estadual: “com a prefeitura mesmo tudo aqui é difícil, tudo que o Banco vai precisar, pra fazer algum apoio, tudo é mais difícil, os de fora dão mais apoio do que o próprio Poder Público daqui, né” (E4, 2019).

Assim, é possível perceber que o maior empecilho encontrado para a consolidação da inovação social, além do seu desenvolvimento para chegar à escalabilidade foram as barreiras com o governo. Primeiramente com a tentativa de impedir o seu funcionamento e depois, sendo uma reclamação o momento da coleta de dados desta pesquisa, da falta de apoio, principalmente no âmbito local. Isso pode estar relacionado com a dificuldade de superar as ideologias e valores (ASHTA et al., 2020; JOHANSSON; STEFANSEN, 2020), além do medo de haver um rompimento do sistema vigente (HÖLSGENS; LÜBKE; HASSELKUSS, 2018).

Vale destacar que Manning e Roessler (2013) destacaram a importância de intermediários para as parcerias, mas isso não foi observado no presente caso. Todas as parcerias foram elaboradas e desenvolvidas diretamente entre o Banco Palmas e a organização parceira, apesar das lógicas institucionais diferentes entre eles.

Mesmo com todo o auxílio financeiro recebido, esse é ainda um aspecto preocupante, pois muito dos recursos financeiros do Banco Palmas ainda não são próprios, não permitindo que ele seja totalmente independente. Isso poderia ser evitado com um marco regulatório que permitisse que os bancos comunitários pudessem oferecer todos os serviços que um banco tradicional possui, como afirmou o entrevistado E1 (2019). Dessa forma, o modelo de negócio é capaz de ser autossuficiente financeiramente, como Cordeiro (2019) destacado por necessário, o que impossibilita que o Banco consiga ser autossuficiente são as atuais legislações brasileiras.

A existência de outras empresas sociais não foi vista como algo relevante como facilitador. Porém, a mídia teve um papel forte na divulgação e explicação do que era o banco, até para a aceitação dos próprios moradores do bairro e em seguida para o resto do Brasil. Isso pode ser observado na fala do entrevistado E1 (2019): “Acho que a imprensa contribuiu muito, teve um boom de jornalismo, porque era muito exótico, 20 anos atrás, imagina, então a imprensa divulgou muito, o Jornal Nacional com três dias de Banco Palmas. O William Bonner anunciou o Banco Palmas no Jornal Nacional...”

Nessa perspectiva, Patias et al. (2017) dizem que a inovação social ratifica sua institucionalização de maneira formal, com o uso dos meios de comunicação, principalmente os acadêmicos, e/ou de maneira informal, como no repasse de informação entre os próprios atores. No caso em análise, é notada a real importância da mídia aberta, principalmente por serem os meios de comunicação mais acessados pelo público atendido pelo Banco Palmas. Assim, nota-se a importância de levar a informação para os beneficiários almejados, como dito por Ashta et al. (2020). Aponta-se assim, uma diferença entre esse caso e o modelo teórico testado, com a inclusão de um item (a mídia) que pode influenciar positivamente na criação e escalabilidade da IS.

3.3 ELEMENTOS INTERNOS À ORGANIZAÇÃO

É possível observar que as lideranças comunitárias foram importantes na constituição do Banco. Porém, mesmo após o crescimento da IS ela continua dependente do seu fundador, pois ele ainda é responsável pela maioria dos projetos criados. Um ponto interessante é que esse fundador não apresenta uma experiência prévia em gestão de negócios, mas sim na atuação como líder de grupos sociais.

Antes da criação do Banco Palmas, o fundador sempre teve participação ativa na construção dos alicerces do bairro e das lutas pela melhoria da qualidade de vida da comunidade, tornando-se um porta-voz do Conjunto Palmeiras (RABELO, 2017). Assim, a sua habilidade política é evidenciada na experiência nos mutirões e sua posição gerencial desde o início nas questões envolvendo o bairro o ajudou a construir, juntamente com a comunidade, a ideia do Banco Palmas (RABELO, 2017).

Nessa perspectiva, a entrevistada E4 (2019) observa que o perfil motivador do fundador auxilia no entendimento de que a comunidade é capaz de se mobilizar em prol de um objetivo, juntamente com o apoio de grandes lideranças: “porque, assim, quando o Banco Palmas tá envolvido, assim, o seu Joaquim [fundador] motiva muito, as pessoas, sabe, ele não desiste fácil, mas com o Banco Palmas, eu acho, melhorou bastante pra comunidade”.

Além de realizar a gestão interna, o empreendedor passou a viajar pelo país e pelo mundo levando o projeto do Banco Palmas para outros contextos. Para isso, começou a participar da implantação da metodologia dos bancos comunitários, dando palestras sobre sua experiência no papel de gestor e promovendo discussões acerca da ideia de que uma comunidade deve revelar seu potencial de crescimento e gerar transformações econômicas e sociais, por mais pobre que seja.

A experiência em negócios relacionada com a organização em si e com processos anteriores de escalabilidade também não foi observada. A escalabilidade começou pelas parcerias, mas quando o processo foi iniciado, o Banco Palmas não possuía experiência anterior em processos de difusão como os que ocorreram. Só após virar um “case de sucesso” é que outras organizações passaram a procurar suas lideranças para entender o seu funcionamento com o intuito da replicação (SILVA JÚNIOR, 2007). Novamente, destaca-se a cooperação como uma fonte essencial para a escalabilidade da IS. Com cooperação, as organizações (de qualquer setor ou tipo) podem receber recursos que garantam sua vantagem competitiva.

Em relação à repercussão fora da comunidade acerca das atividades promovidas pelo banco, a entrevistada E3 (2019) relata: “a gente recebe bastante mensagem também, de pessoas de outras cidades, como elas podem fazer empréstimo pra começar seu negócio, só que a gente só funciona aqui no bairro, né, no Conjunto Palmeiras”.

Assim, nota-se que sua difusão está diretamente ligada às suas reputação e credibilidade construídas a partir da percepção de qualidade dos serviços oferecidos por pessoas e organizações interessadas na sua replicação em outras localidades. Então, como definido por Jahansson e Stefansen (2020), as comprovações de sucesso com evidências auxiliaram o processo de difusão.

A resiliência estrutural e estratégica também pode ser observada no Banco Palmas, pois a metodologia de banco comunitário já está presente em todas as regiões do país (INSTITUTO BANCO PALMAS, 2019). Isso só é possível devido às adaptações feitas de acordo com o contexto de atuação. Essa flexibilidade possibilita a difusão geográfica da IS (HÖLSGENS; LÜBKE; HASSELKUSS, 2018; JOHANSSON; STEFANSEN, 2020), mas também faz com que o Instituto Banco Palmas não tenha controle acerca de como a metodologia está sendo realmente utilizada. Essa possível distorção da IS é ressaltada por Rabadjieva e Butzin (2019) como um ponto negativo dessa falta de rigidez. Porém, os conceitos basilares são repassados e, como já dito, é essa resiliência estrutural que possibilita a alta difusão.

A cultura organizacional é participativa para seus próprios funcionários, e também em relação à comunidade, corroborando com a afirmação de Bhatt e Altinay (2013) de que os próprios beneficiários podem e devem estar ativamente envolvidos no processo de inovação social, pois isso contribui para o seu sucesso. O entrevistado E1 (2019) explica:

A grande participação, o grande controle se dá diariamente pelo fato de ser um banco da comunidade, então qualquer morador a qualquer momento pode entrar e falar com qualquer funcionário, com qualquer diretor porque eles são daqui. O grande barato do banco comunitário é que sua natureza já é comunitária, os funcionários são daqui. Eles moram aqui, a participação é direta, não tem um modelo de gestão engavetado, tem mais ou menos as áreas de atuação. Às vezes, eu falo isso e o pessoal pensa que é uma baderna, né, todo mundo fala o que quer e tal, não, é um modelo que cada qual tem suas responsabilidades, tem suas funções, mas a comunidade pode interagir sem passar por uma hierarquia, então pra você chegar no gerente não precisa falar com o subgerente e tal (E1, 2019).

Inovações incrementais na metodologia do banco foram observadas principalmente no contexto da era digital. Essas mudanças também mostram a capacidade da organização em aprender e desenvolver as competências necessárias para alcançar seus objetivos. Assim, a partir da criação da lei das moedas eletrônicas no Brasil, o Banco Palmas lançou a moeda social digital por meio da plataforma E-dinheiro. “Nós mergulhamos nisso aí, acabamos as moedas de papel, todas as moedas são digitais, hoje a plataforma é digital, chama-se E-dinheiro, e com o serviço digital tem uma série de serviços que a outra [moeda física] não podia ter, como pagamento de boletos... é um aplicativo como se fosse o Banco do Brasil” (E1, 2019).

Ainda segundo o entrevistado E1 (2019), a moeda digital passou a representar um papel importante na promoção da inclusão financeira dentro do bairro e que também passa a acompanhar as mudanças ocorridas no sistema financeiro, no que se refere ao processo de digitalização da moeda.

Assim, tais avanços se tornam sustentações para o Banco Palmas em momentos de limitação e inibição das políticas de incentivo ao crescimento dos bancos comunitários: “a gente tem que buscar inovar cada vez mais pra que isso não morra, que aconteça mais outras coisas, que a gente tenha mais possibilidades, mais condições de dar suporte às famílias do bairro, né” (E2, 2019).

Vale ressaltar também que, com o crescimento da carteira de clientes, ou seja, com o aumento da aceitação do Banco Palmas e da moeda social pelos moradores da comunidade ao longo dos anos, o banco percebeu a necessidade de abraçar tecnologias que facilitariam na gestão dos seus recursos, utilizando-se de softwares mais avançados, que fornecessem dados mais robustos sobre a carteira de clientes ativos do banco. Assim, a consolidação de um banco comunitário também exige uma gestão profissional, além de controle contábil e monetário, devendo, assim, ser acompanhado de incrementos quando necessários (INSTITUTO BANCO PALMAS, 2019).

O resumo do que foi discutido nessa seção em relação à presença dos elementos ressaltados pelo modelo de Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016) como fatores promotores da escalabilidade da inovação social está sintetizado na figura 3 abaixo.

Modelo adaptado de Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016) de acordo com os resultados da pesquisa
Figura 3
Modelo adaptado de Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016) de acordo com os resultados da pesquisa

Além do que já foi ressaltado pelo modelo de Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016), outros elementos facilitaram o processo de difusão da IS estudada. Os canais de comunicação de mídia, como canais televisivos, rádios e redes sociais, tiverem um papel fundamental na disseminação do Banco Palmas como uma organização de sucesso e alto impacto social. A mídia também foi citada como tendo um papel relevante no caso de Medeiros e Gómez (2020), mas quais tipos de mídias e como ocorreram esse auxílio não foi especificado. Ademais, apesar do empreendedor social não possuir experiência em negócios ou em empreendedorismo, ele possuía conhecimentos e vivências relacionados com a liderança de grupos sociais.

Entre as contribuições teóricas desta pesquisa, destaca-se a colaboração com a literatura que aborda a escalabilidade da inovação social, testando empiricamente um modelo teórico. Além disso, ressaltou-se aspectos complementares ao modelo de Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016). Aspectos diferentes do modelo podem ser vistos quanto à ressalva sobre o forte papel da mídia e das universidades na consolidação e expansão de uma inovação social. Acerca desses dois pontos, dos diversos estudos consultados, nenhum destacou as universidades como um ator de muita importância para o desenvolvimento e escalabilidade da inovação social estudada. Entre as contribuições práticas, são fornecidos elementos que os gestores que desejam aumentar o impacto de sua inovação social devem analisar para planejar suas ações.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O objetivo da presente pesquisa foi verificar como ocorre o processo de escalabilidade da inovação social, entendendo os elementos que dificultam e os que auxiliam esse processo usando como base o modelo proposto por Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016).

Em conformidade com o modelo, destacam-se a importância da liderança com a sua capacidade de motivar e suas habilidades políticas. Também foi relevante a manutenção da participação popular na gestão, a credibilidade e reputação adquiridas pela qualidade da solução oferecida, a resiliência estrutural e estratégica, as inovações incrementais para atender aos novos beneficiários e a facilidade em desenvolver competências e aprendizagem organizacional. Além disso, a filantropia como uma fonte de recursos, as parcerias para captar recursos financeiros e de competências e o envolvimento dos membros da comunidade local foram pontos importantes para a difusão da IS.

Por outro lado, a experiência em negócios do empreendedor e da organização, a experiência em parcerias para a escalabilidade e a existência de outras empresas sociais não foram observadas na situação estudada, mas isso não teve um impacto relevante no seu desenvolvimento. Porém, a falta de apoio do governo foi uma grande dificuldade para a IS analisada. Apesar da dependência dos líderes não ter sido alegada como uma preocupação, é importante que isso seja reduzido para que a organização continue prosperando após uma futura troca de liderança.

Assim, estudos futuros podem buscar identificar se a contribuição das universidades é uma característica de inovações surgidas no Brasil, na região Nordeste ou se ocorre apenas em casos isolados. Para Cordeiro (2019), existem claras diferenças entre os casos estudados em pesquisas internacionais e em pesquisas brasileiras.

Além disso, as experiências do líder e da própria organização em relação aos negócios tradicionais não foram observadas. Ademais, melhor do que receber recursos de fontes filantrópicas, como dito no modelo de Morais-da-Silva, Takahashi e Segatto (2016), seria se a IS conseguisse ser independente financeiramente para que não dependesse de parcerias e auxílios externos. Essa independência poderia ser alcançada, de acordo com o entrevistado E1, caso fosse permitido que os bancos comunitários pudessem oferecer todos os serviços que um banco tradicional possui. Discussões acerca dessa possibilidade também podem ser feitas em estudo futuros.

A principal limitação da pesquisa é o fato de que não pode generalizar seus achados, além de só uma organização ter sido analisada. A perspectiva transversal do estudo também pode ser considerada uma limitação, já que informações do passado, quando o processo de difusão ocorreu, podem ser perdidas.

Assim, é sugerido que pesquisas futuras expandam o campo de análise para IS que trabalham com outros setores e em outros contextos sociais para que outras realidades sejam analisadas, além dos bancos comunitários, identificando se os achados desse estudo se diferem com essas mudanças. Ademais, revisões sistemáticas buscando identificar os fatores que auxiliam e dificultam o processo de escalabilidade da inovação social considerando o contexto mundial e restringindo a estudos no Brasil, poderiam favorecer o entendimento de quais características são gerais, própria do fenômeno da inovação social, e quais são dependentes do contexto onde a inovação social atua. Após um maior amadurecimento do tema, com mais estudos de caso, seria também interessante buscar uma generalização de achados com uma pesquisa quantitativa.

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Autor notes

2 O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.
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