RESUMO
Objetivo: Realizar uma revisão sobre a Síndrome de Prader-Willi (SPW) com base nas publicações mais recentes e fornecer recomendações ao pediatra geral para diagnóstico precoce e seguimento.
Fonte de dados: Artigos publicados nas bases Pubmed e SciELO. A pesquisa não foi limitada a um período e incluiu todos os artigos das bases de dados.
Síntese dos dados: A SPW é uma síndrome genética rara, resultante da perda do imprinting gênico expresso no cromossomo paterno 15q11-q13, sendo caracterizada por alterações endocrinológicas, como deficiência de hormônio de crescimento, obesidade, insuficiência adrenal central, hipotireoidismo, hipogonadismo, além de alterações comportamentais e déficit intelectual. Há outras comorbidades associadas, como distúrbios de sono, escoliose, constipação, problemas dentários e alterações de coagulação. O protocolo de seguimento da SPW do Instituto da Criança da Universidade de São Paulo se baseia em quarto pilares principais: dieta, exercício físico, terapia com hormônio de crescimento humano recombinante (rhGH) e manejo comportamental e cognitivo. A dieta deve ser restrita a 900 kcal/dia, de acordo com a Pirâmide Alimentar do Prader-Willi, e o exercício físico deve ser diário, aeróbico e postural. A terapia com rhGH é fortemente recomendada pela literatura científica internacional e deve ser iniciada assim que for realizado o diagnóstico da síndrome. O manejo do comportamento é realizado com estratégias para estabelecer rotina e regras.
Conclusões: Se a SPW se tornar mais familiar ao pediatra geral, o diagnóstico e o tratamento começarão mais precocemente, o que irá melhorar a qualidade de vida e os cuidados desses pacientes.
Palavras-chave: Síndrome de Prader-Willi, Hormônio de crescimento, Comportamento, Dieta, Tratamento.
ABSTRACT
Objective: To carry out a review about Prader-Willi Syndrome based on the most recent data about the subject and to give recommendation for the general pediatricians for early diagnoses and follow-up.
Data sources: Scientific articles in the PubMed and SciELO databases. The research was not limited to a specific time period and included all articles in such databases.
Data synthesis: The Prader-Willi Syndrome (PWS) is a rare genetic disorder resulting from the loss of imprinted gene expression within the paternal chromosome 15q11-q13. PWS is characterized by endocrine abnormalities, such as growth hormone (GH) deficiency, obesity, central adrenal insufficiency, hypothyroidism, hypogonadism and complex behavioral and intellectual difficulties. PWS individuals also may present other comorbidities, such as sleep disorders, scoliosis, constipation, dental issues and coagulation disorders. The follow-up protocol of the Children’s Institute at Universidade de São Paulo is based on four main pillars: diet, exercise, recombinant human growth hormone (rhGH) therapy and behavioral and cognitive issues. The diet must include a caloric restriction of 900 kcal/day, according to the Prader-Willi Eating Pyramid and exercise plan is focused on daily aerobic exercises and postural therapy. The rhGH therapy is highly recommended by the international scientific literature and must be started as soon as the diagnostic is made. The management of behavioral issues is based on strategies to establish routine and rules.
Conclusions: If the general pediatrician becomes more familiar with PWS, the diagnosis and treatment will start earlier, which is essential to improve the quality of life and care for these individuals.
Keywords: Prader-Willi Syndrome, Growth hormone, Behavior, Diet, Treatment.
ARTIGO DE REVISÃO
SÍNDROME DE PRADER WILLI: O QUE O PEDIATRA GERAL DEVE FAZER - UMA REVISÃO
PRADER-WILLI SYNDROME: WHAT IS THE GENERAL PEDIATRICIAN SUPPOSED TO DO? - A REVIEW
Recepção: 02 Fevereiro 2017
Aprovação: 12 Maio 2017
A Síndrome de Prader-Willi (SPW) é um distúrbio genético raro que resulta da perda da expressão gênica no cromossomo paterno 15q11-q13. Sua taxa de prevalência é 1/10-30.000, sendo caracterizada por anormalidades endocrinológicass devido à insuficiência hipotalâmica,hipofisária e dificuldades físicas, comportamentais e intelectuais complexas.1
Atualmente, a maioria dos países em desenvolvimento pode chegar a um diagnóstico precoce, com cerca de 8,6 semanas de vida,2 porém mesmo em centros de referênciaa média do diagnóstico ocorre aos 3,9 anos. O propósito dos critérios diagnósticos clínicos mudou nas últimas décadas.3 Em 1993, quando os testes genéticos ainda eram muito limitados, criou-se um consenso que serviu de orientação para o diagnóstico, conhecido como o critério de HOLM.4 Gunay Aaygun et al., em 2001, objetivando um diagnóstico precoce, propôs características suficientes da SPW que deveriam levar à solicitação do teste de DNA: hipotonia com sucção débil abaixo de 2 anos de idade, hipotonia com história de sucção débil e atraso global de desenvolvimento entre 2 e 6 anos de idade e hiperfagia e comprometimento cognitivo após os 6 anos de idade.3 Como os aspectos da síndrome podem não ser específicos ou aparecer apenas com o tempo, os critérios clínicos podem muitas vezes não identificar casos de SPW. No entanto, nas últimas décadas, testes genéticos moleculares foram disponibilizados para o diagnóstico definitivo da SPW, e os critérios clínicos foram reconhecidos como uma triagem inicial para a indicação do teste genético.3
Três diferentes mecanismos genéticos podem levar à SPW: a deleção paterna na região cromossômica 15q11-q13, que ocorre em aproximadamente 70% dos casos; disomia uniparental materna do cromossomo 15 (UPD15), presente em aproximadamente 25% dos indivíduos afetados, enquanto cerca de 2% dos pacientes com SPW apresentam padrão anormal de metilação e expressão gênica15. Esses pacientes apresentam um defeito no centro de imprinting. O risco de recorrência em deleção e casos de UPD é menor que 1%, enquanto nas famílias em que o paciente apresenta defeito de imprinting, pode chegar a 50%.5,6 Portanto, a identificação do mecanismo gênico em cada paciente é mandatória para o aconselhamento genético e depende da eficiência e confiabilidade do teste genético.
Uma estratégia eficiente para o diagnóstico de rotina dos pacientes com SPW consiste na análise da metilação, que permite o diagnóstico de 99% dos pacientes com SPW e não requer amostras parentais. Em pacientes com padrão de metilação e cromossomos normais, recomenda-se uma reavaliação clínica para determinar se são indicadas investigações adicionais no DNA.
A SPW é a principal causa genética da obesidade em crianças, e a sua abordagem inicial pode melhorar a qualidade dos cuidados, podendo proporcionar a esses indivíduos uma perspectiva de vida melhor.
O peso, o comprimento e o índice de massa corporal (IMC) de lactentes com SPW costumam estar na faixa normal ao nascimento, porém evoluem com hipotonia associada a deficiências de sucção e alimentação, bem como déficit de crescimento.
De acordo com Miller, existem sete fases nutricionais diferentes para as quais os indivíduos com SPW normalmente progridem. Na fase pré-natal (fase 0), há movimentos fetais reduzidos e restrição de crescimento. Do nascimento até os 9 meses de idade (fase 1a), o lactente é hipotônico, tem problemas de alimentação e apetite reduzido. Após esse período, os pacientes começam a ganhar peso progressivamente. Apesar de uma ingestão calórica normal, eles ganham peso devido à redução do metabolismo (fase 1b: 9 meses a 2 anos, fase 2a: 2 a 4,5 anos). Após 4,5 anos (fase 2b), o aumento de peso se associa ao aumento do interesse pela comida, mas não à hiperfagia. Por volta dos 8 anos de idade, se estabelece a hiperfagia, caracterizada pela procura de alimentos e falta de saciedade. Alguns indivíduos com SPW progridem para a fase 4 na vida adulta, quando há algum grau de saciedade.7
Na primeira infância, há atrasos no desenvolvimento motor e de linguagem, com os marcos alcançados em média no dobro da idade normal. Deficiências intelectuais e/ou de aprendizagem são variáveis e geralmente evidentes quando a criança atinge idade escolar.8
Pacientes com SPW podem apresentar vários distúrbios endócrinos diferentes, sendo a maioria deles causados por insuficiência hipotalâmica hipofisária.
O fator de crescimento semelhante à insulina 1 (IGF-1) e a proteína 3 de ligação do fator de crescimento semelhante à insulina (IGFBP-3) têm valores baixos em pacientes com SPW, e ocorre deficiência do hormônio de crescimento (GH - growth hormone) em 40 a 100% das crianças.9
O GH é um agente anabólico que aumenta a massa corporal magra (LBM) e diminui a massa gorda em uma variedade de condições. Recomenda-se discutir a terapia com rhGH no momento do diagnóstico, sendo que o teste de GH não é obrigatório antes do início do tratamento com o mesmo.7 Um dos motivos mais importantes para tratar pacientes com SPW com rhGH é a melhora da composição corporal, aumento da massa magra e redução da massa gorda, uma vez que a história natural da SPW mostra aumento progressivo da massa gorda com a idade.10,11
A terapia com rhGH em combinação com um estilo de vida saudável permite neutralizar o curso clínico da SPW ao prevenir a obesidade, uma grande ameaça para esses pacientes.
Outro importante ganho coma terapia com rhGH é o efeito positivo nos marcadores de desenvolvimento, como QI verbal, comunicação adaptativa, habilidades cognitivas e linguagem.12,13 As crianças que iniciaram o tratamento antes dos 12 meses de idade apresentaram QIs não-verbais e QI-compostos mais altos do que as crianças que iniciaram o tratamento entre 1 e 5 anos de idade.14
A terapia com rhGH não demonstrou nenhum efeito adverso nos parâmetros de glicose, perfil lipídico, densidade mineral óssea ou pressão arterial, embora os níveis de insulina, HOMA-IR e IGF-1 possam aumentar, como esperado, durante a terapia. Não houve correlação clara entre a terapia com rhGH e o desenvolvimento de escoliose, mas recomenda-se acompanhamento rigoroso por sua alta prevalência na SPW, especialmente durante a puberdade.11,12
A reposição do GH em crianças com SPW tem benefícios e riscos bem definidos, embora os dados se limitem a adultos com SPW.15 Relatos de tratamento com rhGH em adultos com SPW indicam melhora na composição corporal, com aumento de massa magra, redução da gordura corporal total, adiposidade subcutânea e gordura visceral, mas discreto aumento na glicemia de jejum após 12 meses de tratamento.16
Os critérios de exclusão para início da terapia com rhGH em pacientes com SPW incluem obesidade grave, diabetes não controlada, apneia obstrutiva do sono grave não tratada, câncer ativo e psicose ativa. Bebês e crianças com SPW devem começar com uma dose diária de 0,5 mg/m2/dia, com ajustes subsequentes para 1,0 mg/m2/dia a cada 3-6 meses, de acordo com a resposta clínica. Adultos com SPW devem receber dose inicial de 0,1 a 0,2 mg/dia. A subsequente titulação da dose deve basear-se em resposta clínica, idade e níveis de IGF-I adequados ao sexo na faixa de 0 a +2 SDS.17
Em um estudo com 25 crianças com SPW selecionadas aleatoriamente, realizado por van Wijingaarden et al., 60% delas apresentaram insuficiência adrenal central, embora tivessem níveis normais de cortisol salivar matinal. Isso sugere que a insuficiência adrenal se torna aparente apenas em condições de estresse. Portanto, recomenda-se monitorar os níveis de cortisol antes de iniciar o tratamento com rhGH e avalia-lo nas situações de grave comorbidade. Van Wijingaarden et al. também sugeriram que a hidrocortisona deveria ser usada durante fase aguda de doenças graves que acometam o paciente (Tabela 1).18

O hipotireoidismo, particularmente de origem central, está presente na SPW, tendo sido documentado em até 25% desses indivíduos.
Em geral, a função tireoidiana é normal no nascimento e o tratamento não deve ser rotineiramente prescrito para jovens com a síndrome. É importante realizar a triagem da função tireoidiana regularmente, pois o hipotireoidismo pode contribuir para o atraso no desenvolvimento psicomotor, prejudicar o crescimento linear na infância e aumentar a massa adiposa e a hipotonia.19
O hipogonadismo é muito comum entre pacientes com SPW, e sua apresentação é extremamente variável. Geralmente apresenta-se como hipoplasia genital, puberdade atrasada, desenvolvimento puberal incompleto e infertilidade, mas puberdade precoce e pubarca prematura também podem ocorrer.
A sua etiologia na SPW é heterogênea e se deve a uma combinação de disfunção hipotalâmica e gonadal primária, além dos hormônios sexuais (testosterona e estradiol) geralmente encontrarem-se abaixo do normal.
Embora os benefícios da reposição de hormônios sexuais no hipogonadismo sejam bem conhecidos, existem poucos relatos na literatura e ainda não há consenso sobre quando ou como isso deve ser feito.20
A obesidade e suas complicações são as principais causas de morbidade e mortalidade em indivíduos com SPW. Evidências sugerem base hipotalâmica e resposta neural anormal à ingestão de alimentos.21 Na SPW resposta da saciedade é atrasada, reduzida ou ausente aos alimentos.22 A etiologia da obesidade é atribuída principalmente a um baixo metabolismo basal e a um nível circulante elevado de grelina do que a um aumento da ingesta calórica.23
O peso máximo em portadores de SPW geralmente é alcançado no final da adolescência e início da idade adulta. Para esses pacientes, a incerteza e a oportunidade relacionadas ao consumo de alimentos são uma fonte constante de estresse. Assim, apresentam sinais de ansiedade e outros sintomas de estresse quando responsáveis por sua própria regulação alimentar. A principal implicação desses achados para o manejo da SPW é que a supervisão do ambiente alimentar é criticamente importante. Aconselhamento precoce, restrição calórica e recomendações dietéticas podem ajudar a manter uma relação peso/altura normal.7
Até o momento, a intervenção farmacológica com inibidores de apetite (sibutramina), agentes antiabsorção (orlistat), topiramato ou agonista do receptor do peptídeo 1 semelhante ao glucagon (GLP-1) têm sido ineficaz em pacientes com a síndrome.24
Uma pequena série de relatos de casos reportou sucesso em curto prazo com cirurgia bariátrica em casos de SPW. Os resultados sugerem pouca justificativa para submeter esses pacientes aos riscos potenciais de intervenções cirúrgicas, além do risco de ruptura gástrica. A melhor recomendação de controle de peso nos casos de obesidade grave inclui dietas de redução supervisionada de energia com suplementação de vitaminas/minerais, acesso restrito a alimentos e rotina diária de exercícios.25
Até 25% dos adultos com SPW apresentavam diabetes tipo 2.26 Em um estudo multicêntrico conduzido com 274 pacientes com a síndrome foi detectado alteração glicêmica em 24,4% da amostra e significativamente associada a idade, IMC e HOMA-IR. Este estudo atesta uma forte correlação entre o surgimento de alterações no metabolismo da glicose, obesidade e envelhecimento.27
Indivíduos com SPW têm suas habilidades cognitivas, de comunicação e sociais prejudicadas. Eles podem ter comportamento compulsivo, manipulador e controlador, incluindo teimosia, episódios de birras e dificuldades com mudanças de rotinas. Também apresentam deficiência intelectual leve, com um QI médio de aproximadamente 65-70.28
Um estudo comparou imagens de ressonância magnética do cérebro e habilidades cognitivas e mostrou redução dos giros corticais principalmente nos lobos frontal, temporal e parietal, independentemente do subtipo genético. Houve forte correlação entre as alterações nessas regiões cerebrais e o comprometimento verbal e baixo escore de QI no grupo com SPW. As áreas corticais parietais frontais estão implicadas na função cognitiva, que inclui memória, regulação da atenção e linguagem.29
Portadores da síndrome são propensos a problemas comportamentais mais graves e até 85% apresentam escores clinicamente elevados em questionários de avalição comportamental. Apresentam altos índices de sintomas obsessivo-compulsivos, podendo estar relacionados a excesso de acumulação, rituais repetitivos, fala excessiva e skin-picking. Dentre esses, skin-picking parece ser o mais comum, com início na primeira infância.30 Comportamento agressivo é frequente e acessos de raiva ocorrem em 88% dos indivíduos com idade entre 4 e 16 anos, mas gravidade desses problemas varia amplamente.31
Estudos sugerem uma forte associação entre SPW e psicose atípica. Os episódios relatados tiveram, em geral, início súbito e muitas vezes incluíam características depressivas, com boa resposta à farmacoterapia e hospitalização.32
O comportamento repetitivo e ritualístico de indivíduos com SPW pode ser diferente do que se observa no Transtorno Obsessivo-Compulsivo, mas pode guardar semelhanças com as características do Transtorno do Espectro Autista (TEA).33,34 A denominação “sintomatologia autista” pode ser apropriada quando nos referimos aos comportamentos compulsivos e à falta de habilidades sociais na SPW.33
A ocitocina intranasal para o controle comprotamental nessa síndromesurgiu como uma possibilidade de tratamento, mas os benefícios e riscos ainda são desconhecidos.35
Os distúrbios do sono são frequentemente associados à SPW. Sonolência diurna excessiva (SDE) é a condição mais comum, seguida por apneia obstrutiva do sono e sintomas semelhantes à narcolepsia. Obesidade e disfunção hipotalâmica podem, juntas, ser responsáveis pelas anormalidades primárias da ventilação durante o sono e determinar os sintomas da SDE.36
Em indivíduos com a síndrome, diferentemente da população geral, a SDE não é totalmente justificada pela apneia obstrutiva do sono.
Transtornos do sono SDE e REM juntos são descritos na síndrome da narcolepsia. Na SPW, os sintomas narcolépticos se devem principalmente à disfunção hipotalâmica, uma vez que os vestígios genéticos da síndrome narcoléptica clássica não são encontrados na SPW.37
Estudos de polissonografia de pernoite são recomendados para crianças com ganho de peso anormal, roncos e aparecimento de sintomas diurnos ou baixo desempenho escolar.36 O acompanhamento dos distúrbios do sono em pacientes com SPW pode ser feito por meio de questionários bem estabelecidos sobre o assunto, voltados para distúrbios específicos.
A SDE pode ser tratada com estimulantes do sistema nervoso central, como metilfenidato ou modafinil, após avaliação clínica completa. A apneia obstrutiva do sono deve ser tratada com aparelhos orais, dispositivos de pressão positiva contínua nas vias aéreas (CPAP ou BiPAP), ou adenoamigdalectomia.
A escoliose é comum em crianças com SPW, com prevalência entre 30 e 70%. Essa alta taxa pode ser explicada em parte pela hipotonia e obesidade.38 A escoliose em crianças com SPW ocorre em dois picos de idade. Quando presente antes dos 4 anos de idade, está mais provavelmente relacionada à hipotonia, enquanto o segundo pico, por volta dos 10 anos de idade, costuma ser idiopático.
Quanto mais cedo a alteração na curva da coluna vertebral for detectada, melhores as possibilidades de tratamento com órtese e cirurgia. Esta é indicada em casos de escoliose-cifose severa de início precoce em adolescentes próximos à maturidade esquelética. As complicações cirúrgicas são: risco de paraplegia (20%) e outros problemas importantes (30% de infecções profundas, pneumonia, hook-out).39
Há poucos estudos que investigam a função gastrointestinal de indivíduos com SPW. Alguns reportaram esvaziamento gástrico normal ou lento na síndrome. Eventos graves, com ruptura gástrica e necrose, seguidos de morte têm sido relatados e podem ser atribuídos ao esvaziamento gástrico lento e ausência de vômito.40,41
A incidência de constipação é de cerca de 40% em pacientes adultos com SPW, sendo consideravelmente maior do que o relatado na população geral. A prevalência de fezes palpáveis no reto e tempo prolongado de trânsito gastrointestinal também é maior.42
Embora eventos tromboembólicos (ETs) tenham sido relatados recentemente em pacientes com SPW, não há diretrizes específicas para a sua profilaxia nessa população. Recomenda-se que pacientes internados sejam avaliados quanto ao risco de ET e recebam profilaxia mecânica (deambulação frequente precoce, meias de compressão, dispositivos de compressão pneumática intermitente e bombas venosas), uma vez que neutralizam a maioria dos componentes da tríade de Virchow e não se associam a qualquer risco de sangramento. Profilaxia mecânica e farmacológica combinada deve ser considerada apenas em pacientes com SPW com alto risco de ET.
Problemas dentários são muito comuns na SPW. Pacientes apresentam redução na taxa de fluxo salivar e aumento na quantidade de íons salivares e proteínas. A saliva se torna espessa, adere aos dentes e abriga bactérias que causam cárie dentária e doença periodontal.43
O tratamento oferecido no Departamento de Endocrinologia Pediátrica do Instituto da Criança da Universidade de São Paulo para esses pacientes é pautado por um protocolo de acompanhamento com quatro pilares principais: dieta (Figura 1), exercícios, terapia com rhGH e questões comportamentais e cognitivas, destacadas na Tabela 2 e em um cronograma de manutenção de saúde para crianças com SPW (Tabela 1).


A Síndrome de Prader-Willi é uma doença genética rara, ainda que seja a principal causa genética de obesidade em crianças. O diagnóstico precoce pode prevenir complicações e melhorar a qualidade dos cuidados ao longo da vida dos pacientes. O tratamento se baseia em quatro pilares principais: dieta, exercício, terapia com rhGH e estratégias comportamentais.
Se o pediatra geral se familiarizar mais com a SPW, a probabilidade de o diagnóstico ocorrer será maior e, portanto, o tratamento começará mais cedo. Isso pode melhorar a qualidade de vida desses indivíduos e dos cuidados a eles dirigidos.
*Autor correspondente. E-mail: carol.passone@gmail.com (C.B.G. Passone).


