Resumo: A síndrome de burnout resulta de um processo crônico de exposição a estressores laborais. Caracteriza-se pelas dimensões exaustão emocional, despersonalização e baixa realização profissional. Profissionais de saúde são propensos a ela por lidarem diretamente com pessoas e sofrimento, o que prejudica sua saúde e o cuidado ofertado à sociedade. A atenção primária à saúde é o nível assistencial mais adjacente à comunidade, expondo os profissionais às realidades desta. Este estudo objetiva identificar a prevalência de burnout nos profissionais da atenção primária e fatores associados. Estudo transversal, realizado com 153 profissionais de saúde da atenção básica do município de Juiz de Fora, entre 2013 e 2014. Utilizou-se o Maslach Burnout Inventory para mensurar o desfecho. A prevalência da síndrome foi de 51%, destacando-se que ela foi maior entre os profissionais de enfermagem. As variáveis associadas ao desfecho após análise multivariada foram: autoavaliação do estado de saúde ruim e insatisfação no trabalho. O trabalho no nível primário de atenção é complexo e exigente, o que torna relevante atentar para a saúde e satisfação destes profissionais, visando resguardar seu bem-estar e a produção do cuidado de qualidade à sociedade.
Palavras-chave:esgotamento profissionalesgotamento profissional,pessoal de saúdepessoal de saúde,atenção primária à saúdeatenção primária à saúde.
Abstract: Burnout syndrome results from a chronic process of exposure to labor stressors. It is characterized by emotional exhaustion dimensions, depersonalization and low personal accomplishment. Health professionals are prone to it by dealing directly with people and suffering, which harms their health and the care offered to society. The primary health care is the level of care that is most adjacent to the community, exposing professionals to their realities. This study aims to identify the prevalence of burnout in Primary Care professionals and associated factors. This is a cross-sectional study carried out with 153 health care professionals from the city of Juiz de Fora, Minas Gerais, Brazil, between 2013 and 2014. The Maslach Burnout Inventory was used to measure the outcome. The prevalence of the syndrome was 51%, highlighting that the prevalence was higher among nursing professionals. The variables associated with the outcome after multivariate analysis were: self-assessment of poor health status and job dissatisfaction. Work at the primary level of care is complex and demanding, which makes it relevant to care for the health and satisfaction of these professionals, in order to protect their well-being and the production of quality care for society.
Keywords: burnout, health personnel, primary health care.
Resumen: El síndrome de burnout resulta de un proceso crónico de exposición a estrés laboral. Se caracteriza por agotamiento emocional, despersonalización y baja realización profesional. Los profesionales de la salud son propensos a ella por tratar directamente con las personas y el sufrimiento, lo que perjudica su salud y el cuidado ofrecido a la sociedad. La atención primaria a la salud es el nivel asistencial más adyacente a la comunidad, exponiendo a los profesionales a las realidades de ésta. Este estudio objetiva identificar la prevalencia de burnout en los profesionales de la Atención Primaria y factores asociados. Se trata de un estudio transversal, realizado con 153 profesionales de salud de la Atención Básica del municipio de Juiz de Fora, Minas Gerais, Brasil, entre 2013 y 2014. Se utilizó el Maslach Burnout Inventory para medir el desenlace. La prevalencia del síndrome fue del 51%, destacándose que la prevalencia fue mayor entre los profesionales de enfermería. Las variables asociadas al desenlace después del análisis multivariado fueron: autoevaluación del estado de salud malo e insatisfacción en el trabajo. El trabajo en el nivel primario de atención es complejo y exigente, lo que hace relevante atentar para la salud y satisfacción de estos profesionales, buscando resguardar su bienestar y la producción del cuidado de calidad a la sociedad.
Palabras clave: agotamiento profesional, personal de salud, atención primaria de salud.
Artigo
ANÁLISE DA PREVALÊNCIA DA SÍNDROME DE BURNOUT EM PROFISSIONAIS DA ATENÇÃO PRIMÁRIA EM SAÚDE
ANALYSIS OF THE PREVALENCE OF BURNOUT SYNDROME IN PROFESSIONALS OF PRIMARY HEALTH CARE
ANÁLISIS DE LA PREVALENCIA DEL SÍNDROME DE BURNOUT EN PROFESIONALES DE LA ATENCIÓN PRIMARIA EN SALUD
Recepção: 24 Maio 2016
Aprovação: 21 Abril 2017
As transformações que o mundo globalizado vem sofrendo têm mudado notavelmente o cenário de trabalho, onde a competitividade e a produtividade ganham progressivamente mais força para suprir as necessidades dos consumidores e da economia. Cada vez mais se valoriza o capital em detrimento do trabalhador. Nesse cenário, os indivíduos são pressionados por produtividade e qualificação. Tais mudanças, cobranças e a desvalorização que os trabalhadores têm sofrido podem gerar desgaste e estresse, impactando seriamente sua saúde ( Carlotto et al., 2013 ; França et al., 2012 ; World Health Organization, 2010 ).
Estresse é a reação que um indíviduo produz diante de uma inespecífica situação estressora. A resposta pode ser benéfica ( eustress ) ou nociva ( distress ), dependendo de como o indivíduo a percebe ( Le Fevre, Matheny e Kolt, 2003 ; Selye, 1985 ). A síndrome de burnout (SB) caracteriza-se como um fenômeno psicossocial, resultado da incapacidade de adaptação e enfrentamento a estressores aos quais o profissional é exposto cronicamente, sofrendo permanentemente distress relacionado ao trabalho ( Schaufeli e Enzmann, 1998 ), sem a habilidade de atenuar esses sintomas e tampouco se revigorar ( Bakker e Costa, 2014 ; Maslach, 2009 ).
O burnout origina-se de um desequilíbrio entre demandas versus recursos e expectativa versus realidade, em que os níveis de demandas e expectativas superam os recursos e a realidade e impedem o indivíduo de se adaptar à situação ( Bakker e Costa, 2014 ; Schaufeli, Leiter e Maslach, 2009 ). Em decorrência, os indivíduos desenvolvem uma gradual perda de energia, de comprometimento e de esperança, gerando prejuízos à produtividade e à satisfação laboral ( Carlotto e Câmara, 2008 ).
A SB é definida pela dimensão exaustão emocional (EE), evidenciada por sentimentos de fadiga, esgotamento físico e emocional; pela despersonalização (DE), em que o indivíduo se distancia das relações interpessoais; e pela dimensão baixa realização profissional (RP), em que o profissional supre sentimentos negativos de si mesmo ( Maslach, 2009 ). Ela é insidiosa, associada a profissionais que lidam frequentemente com pessoas e a estressores advindos do ambiente laboral ( Maslach, Schaufeli e Leiter, 2001 ).
A síndrome provoca numerosos danos à saúde emocional e física dos trabalhadores, como irritabilidade; desenvolvimento de humor depressivo; fadiga; redução da autoestima; ideais suicidas; agressividade; alterações de memória e concentração; dores musculares; distúrbios do sono e sexuais; úlcera; comprometimento imunológico, cardiovascular e hormonal; isolamento social; aumento do consumo de drogas e desilusão ( World Health Organization, 2010 ; Maslach, 2009 ). Pode ainda gerar respostas desfavoráveis ao ambiente de trabalho e à instituição, como o aumento da taxa de absenteísmo ou de presenteísmo, aumento das taxas de acidentes laborais e de afastamentos, com redução da produtividade ( Carlotto, 2013 ; World Health Organization, 2010 ; Maslach e Leiter, 2008 ).
O reconhecimento, o sentimento de importância e a valorização são recursos fundamentais aos trabalhadores, pois são necessidades humanas fundamentais para a satisfação laboral. Esses fatores influenciam na forma como os indivíduos enxergam seu trabalho (prazeroso ou não) e como lidam com seu trabalho e suas próprias vidas, o que pode associar-se ao burnout. Um ambiente de trabalho em que faltam recursos, valorização e satisfação, por exemplo, apresenta-se como fator de risco para SB; já um ambiente que promova a valorização dos profissionais e as relações interpessoais, que garanta a satisfação dos profissionais, tende a ser um fator de proteção ( Lima et al., 2015 ; Zhou et al., 2015 ; Martins et al., 2014 ). Para Maslach (2009) , a SB é mais associada aos problemas no ambiente de trabalho do que aos individuais.
Nota-se uma insuficiência de estudos sobre burnout , sobretudo entre os profissionais da atenção primária à saúde (APS), principalmente no cenário brasileiro ( Martins et al., 2014 ). Além de profissionais de saúde serem mais propensos à SB por lidarem diretamente com pessoas e seus sofrimentos ( Maslach, 2009 ), aqueles atuantes na APS têm o encargo de prevenir e reduzir agravos, realizar a promoção, reabilitação e manutenção da saúde de forma integral, continuada, coparticipativa e equânime ( Brasil, 2012 ).
Esses profissionais ainda se encontram mais próximos da comunidade e de suas realidades, sentindo-se cobrados e pressionados a dar respostas às necessidades das comunidades que atendem. Além disso, são cobrados por produtividade num cenário com carência de recursos humanos, materiais e de infraestrutura e com visão curativista que diverge dos ideais da APS, o que demonstra ser um trabalho complexo por exigir a utilização da tecnologia leve ( Maissiat et al., 2015 ; Albuquerque, Melo e Araújo Neto, 2012 ; Trindade e Lautert, 2010 ). A APS tem o papel de ser o nível de assistência mais efetivo e eficiente, e para isto se consumar o trabalho dos profissionais é imprescindível ( Alameddine et al., 2012 ).
Estudos apontam diversos fatores associados à SB. Dentre estes, os mais discutidos são sexo, idade, escolaridade, personalidade, tempo de serviço, sobrecarga de trabalho, papéis conflitantes, dificuldades no relacionamento interpessoal e satisfação laboral. Entretanto, ainda existem muitas controvérsias sobre esses e outros fatores, não havendo um consenso sobre eles, além de muitos ainda não se diferenciarem como precursor, sintoma ou consequência, como o isolamento social, por exemplo ( Oliveira, Costa e Santos, 2013 ; Maslach, 2009 ; Schaufeli e Enzmann, 1998 ).
A maioria dos estudos sobre SB nos profissionais de saúde investiga equipes de enfermagem e médicos, observando-se uma lacuna de conhecimento acerca dos demais profissionais integrantes da APS e suas características que possam ser relacionadas à SB ( Silva e Menezes, 2008 ). Faz-se importante, diante da necessidade de se prevenir o burnout precocemente, investigar a prevalência da SB nas diversas categorias profissionais e apontar possíveis meios de resolução, alertando a sociedade e os gestores sobre sua relevância e a importância de implementar meios para a melhoria das condições de trabalho.
A pesquisa aqui apresentada objetivou identificar a prevalência da SB nos profissionais da APS e fatores associados. A hipótese inicial era de que haveria diferença da prevalência da SB entre as categorias profissionais investigadas e associação com as características sociodemográficas e do seu trabalho.
Tratou-se de um estudo seccional, realizado num município de médio porte com os profissionais de saúde da APS atuantes em todas as unidades de atenção primária à saúde (UAPSs) do município. A pesquisa foi parte de um estudo maior sobre a prevalência da SB nos profissionais do Sistema Único de Saúde (SUS) de Juiz de Fora (JF), em Minas Gerais. Realizou-se um recorte estudando os profissionais do nível de atenção primária à saúde.
Para seleção da amostra, obteve-se a lista de profissionais existentes no SUS/JF por unidade de assistência, no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), que foi conferida com a lista cedida pela Secretaria Municipal de Saúde de Juiz de Fora (SMS/JF). Constatou-se um total de 1.161 profissionais de saúde nos três níveis de assistência, com 527 da APS. Para o cálculo de tamanho de amostra, utilizou-se o programa Epi Info versão 3.5.3, considerando-se o nível de confiança de 95%, uma prevalência estimada do desfecho principal (síndrome de burnout) de 10% e erro aceitável de 5%. Realizou-se a estimativa dessa população por categoria profissional (médicos, enfermeiros, técnicos/auxiliares de enfermagem, assistentes sociais, dentistas e técnicos de saúde bucal), obtendo-se uma amostra de 176, de acordo com o tamanho da amostra calculado.
A coleta de dados foi realizada entre novembro de 2013 e maio de 2014. Os pesquisadores, após autorização do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) e da autorização da SMS/JF, comunicavam aos gerentes das UAPSs sobre a pesquisa e faziam um sorteio dos profissionais por categoria profissional que seriam abordados naquele local.
Para manter o quantitativo ideal da amostra, os pesquisadores, quando recebiam recusas, buscavam outros profissionais da mesma categoria na equipe ou em outra UAPS subsequente da listagem. Optou-se por excluir da análise os cinco assistentes sociais e um técnico de saúde bucal, pois estes resultaram em um número muito reduzido, o que poderia comprometer a análise. Após as perdas (17, todas por recusas) e exclusões, totalizaram-se 153 indivíduos. Observou-se que os profissionais que se recusaram a participar da pesquisa tinham receio em preencher os seus dados pessoais no termo de consentimento livre esclarecido, embora fosse explicitado a todos que a pesquisa era autorizada pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFJF e sobre seu caráter sigiloso.
A variável de desfecho foi a síndrome de burnout, considerando-se o proposto por Maslach e Jackson (1986) . As variáveis de exposição investigadas foram características sociodemográficas, laborais, autoavaliação do estado de saúde, apoio social e satisfação no trabalho.
Os participantes receberam um questionário com noventa questões fechadas e autoaplicáveis. Estas questões foram baseadas no questionário intitulado “Inquérito sobre as condições de trabalho e de vida dos trabalhadores da UFJF” ( Godinho, 2013 ), que utilizou o questionário validado do “Estudo Pró-Saúde” (questionário “Censo de Saúde Universidade do Estado do Rio de Janeiro/Uerj” – 1999 – Estudo Pró-Saúde) e também fez uso do questionário de apoio social traduzido e validado por Griep e colaboradores (2005) .
As variáveis sociodemográficas avaliadas foram: sexo (masculino, feminino); estado conjugal (com ou sem companheiro); idade (<34, 35-49 e ≥50); escolaridade (curso técnico, graduação e pós-graduação); e classificação econômica (A, B e C). Em relação ao trabalho, consideraram-se: cargo (médico, equipe de enfermagem e dentista); supervisão (sim e não); tempo de serviço na UAPS (≤10 anos e >10 anos); número de vínculos empregatícios (um, dois e três ou mais); carga horária semanal na APS (vinte ou trinta horas e quarenta horas); modalidade contratual (estatutário e outros); equipe completa (sim e não). As demais variáveis foram categorizadas da seguinte forma: autoavaliação do estado de saúde (bom e ruim) e prática de exercício físico (sim e não).
Para medir a percepção dos profissionais referente à valorização, reconhecimento e importância de seu trabalho, foram aplicadas 13 questões sobre estes três valores na equipe de trabalho, nas chefias das instituições e na comunidade. As respostas utilizaram uma escala de Likert 1 (sempre) a 4 (nunca). Os pontos referentes às respostas foram somados e classificados conforme o escore, baseado na média da amostra (25,7): até 26 pontos (satisfeito) e 27 ou mais (insatisfeito). Tal instrumento foi elaborado para a realização dessa pesquisa e apresentou um alfa de Cronbach de 0,89.
Para avaliar o nível econômico dos profissionais, utilizaram-se os Critérios de Classificação Econômica Brasil (CCEB) de 2013, formulados e difundidos pela ABEP – Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (2013), que têm a finalidade de categorizar a população segundo o potencial de consumo (A= alto; B= médio e C= baixo).
A fim de mensurar o apoio social, aplicou-se a escala de apoio social traduzida, adaptada e validada para o português por Griep e colaboradores (2005) , composta por 19 perguntas com escala de Likert 5, que contemplam as dimensões de apoio material, emocional, de informação, de interação social positiva e apoio afetivo. Para se calcular o escore desse item, utilizou-se o critério baseado em Godinho (2013) , que adotou ponto de corte estabelecido com base no cálculo dos valores centrais. Assim, os profissionais que obtiveram 75 pontos ou menos, como resultado do escore das cinco dimensões, foram classificados com baixo apoio social, e aqueles com mais de 75 pontos, com alto apoio social. O instrumento original apresentou alta confiabilidade, com alfa de Cronbach de 0,83 ( Griep et al., 2005 ), que no estudo aqui apresentado teve valor igual a 0,96.
Para mensurar a variável desfecho SB, optou-se pelo Maslach Burnout Inventory (MBI), que é universalmente o mais utilizado e considerado ‘padrão ouro’. A versão original do questionário criado por Maslach e colaboradores (1986) apresenta uma consistência interna satisfatória com um valor de alfa de Cronbach de 0,71 até 0,90 ( Schaufeli, Leiter e Maslach, 2009 ). Os valores de alfa de Cronbach foram calculados para cada dimensão do MBI na população do estudo e resultaram em: 0,90 para EE; 0,67 para DE; e 0,82 para a dimensão RP.
Utilizou-se o MBI-HSS, versão empregada para profissionais da área de serviços humanos e de saúde, com um sistema adaptado de pontuação na escala Likert de 5 também utilizado por Carlotto e Câmara (2008) . Tal sistema é composto por 22 itens, dos quais nove estão relacionados a sentimentos de fadiga e exaustão no trabalho, caracterizando o fator denominado EE; cinco tratam de sentimentos de insensibilidade e afastamento dos clientes ou do serviço, caracterizando a subescala DE; e oito se referem a sentimentos de incompetência, compondo a subescala RP. Nota-se que é um instrumento baseado nas três dimensões da SB, portanto, um questionário multifatorial ( Maslach e Jackson, 1986 ).
Para análise da prevalência da SB, utilizaram-se os critérios de classificação adotados por Shirom (1989) e sugeridos por Gil-Monte (2003) e Batista e colaboradores (2010) , que indicam que indivíduos com a média das opções de resposta, por dimensão, igual ou superior a “algumas vezes na semana” referente ao valor 4 na escala de Likert –, relacionada às dimensões EE e DE, apresentam alto risco de serem acometidos pela SB. Quanto aos itens pertencentes à dimensão RP, quando os sujeitos as respondiam com média igual ou inferior ao valor 4 na escala Likert demonstravam-se altamente vulneráveis à SB ( Batista et al., 2010 ). Logo, para as duas primeiras subescalas (EE e DE), altas pontuações definem alto grau de predisposição ao burnout , enquanto para a última (RP), baixos escores significam alto grau de predisposição à SB – esta independente das demais ( Maslach e Jackson, 1986 ).
Optou-se no estudo aqui apresentado por se considerar presença de burnout quando verificada alteração em qualquer uma das dimensões, conforme sugerido por Grunfeld e colaboradores (2000) . Maslach e Leiter (2008) afirmam que escores alterados para qualquer uma das dimensões devem ser valorizados no sentido de impedir o desenvolvimento de consequências negativas, como o burnout. Ressalta-se que o MBI não pode ser considerado como meio de diagnóstico do burnout , pois necessita da confirmação por métodos clínicos ( Schaufeli, Leiter e Maslach, 2009 ).
Os dados coletados foram organizados em um banco utilizando-se o programa Epi Info versão 3.5.3. No processo de digitação, optou-se pela dupla digitação a fim de minimizar os erros e garantir maior precisão aos dados. Caso houvesse discordância, o digitador responsável pelo instrumento fazia a correção usando como base o respectivo questionário. As análises foram realizadas no programa SPSS versão 21 e Stata versão 11. Para minimizar os dados faltantes, estes foram imputados considerando-se a média dos valores existentes para cada uma das dimensões da SB. Observou-se que cinco participantes deixaram caselas vazias para EE, dois participantes para DE e três para RP. Nenhum deixou de preencher mais de uma das respostas relativas a cada dimensão. Para a variável apoio social, nove participantes ficaram com uma casela vazia, e para a satisfação no trabalho, sete ficaram com uma das caselas ausente).
Realizou-se a análise univariada para a descrição da distribuição e prevalência das variáveis, seguida da análise bivariada, considerando-se como variável dependente a presença da SB e como independentes as demais variáveis coletadas. O teste qui-quadrado e, quando necessário, o teste exato de Fisher foram utilizados para avaliar as associações existentes, considerando-se estatisticamente significantes as que apresentaram p≤0,05. Verificou-se ainda a razão de prevalência bruta e ajustada com respectivos intervalos de confiança de 95% (IC 95%). Para testar o efeito independente das variáveis nos desfechos de alto risco para burnout em cada um dos domínios, utilizou a regressão de Poisson, com variância robusta.
O projeto foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFJF, mediante o parecer n. 403.217, de 3 de outubro de 2013.
Os 153 profissionais de saúde da APS de Juiz de Fora que participaram do estudo tinham, em média, 45 anos de idade (desvio-padrão: 9,78); 82,4% eram mulheres; 76,5% eram casados; 30,1% eram médicos; 69,3% possuíam casa própria já paga; e 55,2% pertenciam à classe B, conforme a classificação econômica da ABEP.
Os participantes, em sua maioria, tinham pós-graduação. As funções de gerência das UAPSs, geralmente, eram exercidas por enfermeiros, e nenhum dentista desempenhava tal função.
Dos profissionais, 79,5% revelaram trabalhar mais de dez anos na área da saúde; 56,1% trabalhavam menos de dez anos na APS; e 72,7% trabalhavam menos de dez anos na UAPS. Mais da metade da amostra tinha apenas um vínculo de trabalho (65,6%); 69,5% trabalhavam quarenta horas semanais na UAPS; 19% trabalhavam em regime de plantão; 87,5% eram concursados; e 58,9% das equipes de trabalho não estavam completas.
Quanto à autoavaliação do estado de saúde dos profissionais, 49% consideravam sua saúde boa; 41,2% revelaram ter baixo nível de apoio social; e a maioria (55,6%) era sedentária. Em relação à satisfação no seu trabalho, 65,4% mostraram-se satisfeitos.
Observou-se a prevalência de burnout de 51% nos profissionais pesquisados, ou seja, 51% apresentavam alteração em ao menos uma das dimensões avaliadas. Os valores de alfa de Cronbach foram calculados para cada dimensão do MBI na amostra do estudo e resultaram em: 0,90 para EE; 0,67 para DE; e 0,82 para a dimensão RP.
A Tabela 1 apresenta a caracterização da amostra, segundo a prevalência da SB e os fatores associados, o valor de p, a razão de prevalência e o intervalo de confiança para cada fator considerado.


Verificou-se que os profissionais que relataram trabalhar na UAPS há mais de dez anos apresentaram uma probabilidade de SB 36% menor do que os que trabalhavam há menos tempo (RP=0,64; IC95% 0,42-0,99), enquanto aqueles que autoavaliaram negativamente suas condições de saúde (RP=1,86; IC95% 1,42-2,42) e referiram-se insatisfeitos no trabalho (RP=1,91; IC95% 1,45-2,53) apresentaram maior prevalência de SB.
Incluíram-se na análise multivariada as variáveis tempo de serviço na UAPS, autoavaliação da condição de saúde, satisfação profissional e ainda as variáveis número de vínculos, carga horária semanal na APS e apoio social que apresentaram valor de p<0,20 na análise bivariada ( Tabela 1 ).
A análise multivariada, realizada por meio de regressão de Poisson robusta, controlada por faixa etária e sexo, mostrou que os fatores associados significativamente à SB ( Tabela 2 ) foram a autoavaliação do estado de saúde ruim (RP=1,67; IC95% 1,26-2,20) e insatisfação profissional (RP=1,77; IC95% 1,33-2,38).

Observou-se predominância de profissionais do sexo feminino no estudo, possivelmente pelo fato de a maior parte ser formada por profissionais da equipe de enfermagem, categoria profissional historicamente desempenhada por mulheres, pelo seu caráter solidário, de ter em sua essência o cuidado, a caridade ( Moreira et al., 2009 ).
Outro fator importante a ser destacado é que quase metade dos profissionais tinha dois ou mais vínculos de trabalho, fato que se deve, possivelmente, à busca de incremento na renda familiar. Observou-se que 39,7% dos profissionais com mais de um vínculo de trabalho assumiam plantões e trabalhavam quarenta horas semanais nas UAPSs. Destes, 48,3% eram médicos, seguidos, em ordem de frequência, pelos técnicos/auxiliares de enfermagem (34,5%) (dados não apresentados). Ressalta-se que trabalhar em regime de plantão além das quarenta horas regulares pode afetar o organismo pelas noites de sono perdidas e pela maior sobrecarga de trabalho. Soma-se a tal situação o fato de a maioria dos profissionais ser formada por mulheres, as quais usualmente realizam tarefas domésticas, o que as sobrecarrega fisicamente ( Albuquerque, Melo e Araújo Neto, 2012 ; World Health Organization, 2010 ).
O estudo apontou a prevalência da SB em 51% nos profissionais de saúde da APS. Resultados semelhantes foram encontrados por Navarro-González, Ayechu-Díaz e Huarte-Labiano (2015) , Lima e colaboradores (2013) , Moreira e colaboradores (2009) e Tucunduva e colaboradores (2006) , que encontraram, respectivamente, 39,3%, 69%, 35,7% e 52,3% de SB, considerando critérios baseados em Grunfeld e colaboradores (2000) .
O estudo de Martins e colaboradores (2014) , também realizado com profissionais de saúde da APS, foi um dos trabalhos científicos que mais se aproximaram do método da pesquisa aqui apresentada. Encontraram a prevalência da SB de 41,6%, enquanto o presente estudo encontrou 51%, apontando que os profissionais da APS apresentam alto risco para a SB.
Comparar resultados de estudos realizados sobre burnout é um processo delicado, pois não há um consenso de critérios para a mensuração da síndrome. Nota-se que existem vários instrumentos, embora o mais utilizado seja o MBI. Cabe ressaltar que o MBI tem adaptações nas escalas de Likert, não possui um padrão na definição de escores, além de contar com distintos critérios de classificação do burnout ( Moreira et al., 2009 ).
Neste artigo, os profissionais do sexo feminino apresentaram maior percentual de alto risco de desenvolvimento da SB do que o sexo masculino. Apesar da ausência de diferença estatisticamente significativa para a variável sexo neste estudo, os resultados de Silva e colaboradores (2015) demonstraram que mulheres associam-se estatisticamente à SB. No entanto, Martins e colaboradores (2014) , Navarro-González, Ayechu-Díaz e Huarte-Labiano (2015) , Thomas, Kohli e Choi (2014) e Lima e colaboradores (2013) encontraram maior percentual de homens em suas pesquisas.
Após o levantamento de estudos internacionais, a World Health Organization (2010) , sugerindo que o burnout está associado ao sexo masculino, apontou que as diferenças de genêros resultam em riscos laborais distintos para homens e mulheres. Usualmente, homens são mais vulneráveis a riscos físicos e químicos, enquanto mulheres se predispõem aos riscos psicossociais, devido às demandas da dupla jornada, do menor status ocupado e da menor autonomia quando comparadas àqueles.
O fato de ter ou não companheiro não apresentou diferenças importantes nos percentuais deste estudo. Aqueles que possuíam companheiro tiveram uma prevalência um pouco maior da SB do que os que não possuíam, o que corrobora os resultados de Moreira e colaboradores (2009) . A maioria dos estudos demonstrou que ter companheiro diminui o risco de desenvolver SB, possivelmente porque profissionais casados são mais maduros e estáveis. Com o convívio familiar, o indivíduo desenvolve as relações interpessoais, além de priorizar a segurança em detrimento da satisfação pessoal ( Shanafelt et al., 2012 ).
Em nosso estudo, indivíduos com maiores faixas etárias apresentaram menores porcentagens da SB do que os mais jovens. Em concordância, Silva e colaboradores (2015) , Carlotto e colaboradores (2013) e Trindade e Lautert (2010) demonstraram que o fato de ser jovem está associado significativamente à SB. No estudo de Martins e colaboradores (2014) , foi identificado que os profissionais maiores de trinta anos apresentavam 2,2 vezes menos chances de desenvolver SB, apesar de não ter sido significante estatisticamente. Acredita-se que o fato de indivíduos maiores de trinta anos estarem protegidos da SB pode se relacionar com o chamado ‘efeito do trabalhador sadio’, fenômeno que acontece devido à desistência e fuga do indivíduo da sua profissão, permanecendo os funcionários sadios ( Martins et al., 2014 ).
Barreto e colaboradores (2012) e Thomas, Kohli e Choi (2014) relatam que trabalhadores jovens são mais propensos à síndrome, por estarem numa fase de transição entre expectativa e realidade, podendo sofrer um choque de realidade. Ademais, ela pode advir de uma crise de identidade ante a falta de socialização no trabalho ou ainda ser explicada pelo fato de trabalhadores mais antigos desenvolverem meios de enfrentamento às situações ( Thomas, Kohli e Choi, 2014 ; Carlotto et al., 2013 ; Barreto et al., 2012 ).
A hipótese inicial do estudo aqui apresentado era de que houvesse diferença da prevalência de burnout entre as categorias profissionais de saúde da APS. De fato, a equipe de enfermagem apresentou maior prevalência da síndrome em relação aos demais cargos, porém este não foi um fator estatisticamente significativo, impossibilitando afirmar que o resultado não foi encontrado devido ao acaso. Silva e colaboradores (2015) , em seu estudo com profissionais do nível primário de saúde, também verificaram maior percentual de SB nos enfermeiros, mas sem significância estatística.
Muitos estudos referem que os profissionais da enfermagem são mais acometidos pela SB por assumirem posições de liderança, pela sobrecarga laboral, pela falta de autonomia e indefinição de papéis, geralmente manifestando cansaço, desilusão, falta de expectativas e de esperança ( Laschinger e Fida, 2014 ; Barreto et al., 2012 ; Raftopoulos, Charalambous e Talias, 2012 ). Falgueras e colaboradores (2015) , no entanto, verificaram que os enfermeiros apresentaram menor nível de SB em comparação com o restante da equipe de profissionais na APS.
Lima e colaboradores (2013) apontam que em muitos estudos a categoria médica apresenta maiores níveis de burnout , propiciado pela crescente pressão por produtividade, perda de autonomia, pelo crescente desrespeito da sociedade, a qual está cada vez mais exigente e violenta. Em concordância, Navarro-González, Ayechu-Díaz e Huarte-Labiano (2015) notaram maior percentual da SB em médicos quando comparados a enfermeiros, com a justificativa de maior pressão e maior número de consultas.
Os dentistas tiveram o menor percentual de SB dentre os trabalhadores, o que pode ser explicado pela menor responsabilidade administrativa nas UAPSs, pelo seu menor contato com os problemas da comunidade, por desenvolverem um trabalho mais específico que não necessariamente envolve os demais profissionais da equipe e pela sua menor carga horária nas UAPSs, em comparação com os demais. Existem poucas investigações sobre SB em odontólogos, o que dificulta realizar comparações. Gorter e Freeman (2011) , em estudo com dentistas da Irlanda do Norte, encontraram altos níveis de burnout atribuídos especialmente à pressão do tempo, a preocupações financeiras e a pacientes difíceis, enquanto Falgueras e colaboradores (2015) , ao estudarem profissionais da rede de atenção primária à saúde em Barcelona, encontraram níveis de burnout menores em odontólogos e enfermeiros, em comparação com os profissionais médicos e administrativos. Esses autores destacam, em seu trabalho, que o trabalho em equipe constitui um fator protetor para o burnout.
No estudo aqui apresentado, verificou-se maior percentual de burnout naqueles profissionais que tinham pós-graduação. Apesar de esses resultados não terem significância estatística, acredita-se que quanto maior o grau de escolaridade maior a expectativa de sucesso e de carreira próspera, e caso não haja a realização desses ideais, ocorrem a insatisfação e maior propensão à SB. Além disso, indivíduos com maior grau de escolaridade ocupam postos em que tendem a assumir diversas responsabilidades sobre outras pessoas ( Thomas, Kohli e Choi, 2014 ).
Os profissionais com mais de dez anos de serviço na UAPS apresentaram menor prevalência da SB, resultado também observado na maioria dos estudos ( Barreto et al., 2012 ; Maissiat et al., 2015 ). Carlotto e colaboradores (2013) e França e colaboradores (2012) também verificaram que quanto menor a experiência profissional maior é a propensão à SB, o que para os autores pode ser explicado pelo fato de profissionais mais experientes adquirirem confiança no seu trabalho e maior habilidade em lidar com fatores estressores. Além disso, jovens são mais idealistas e propensos a desilusões, sentem-se despreparados em assumir as responsabilidades da profissão e podem ser mais vulneráveis devido a possíveis dificuldades de inserção no grupo de trabalho ( Trindade e Lautert, 2010 ).
Verificou-se no estudo que originou este artigo que profissionais com dois vínculos de trabalho apresentaram menor frequência da síndrome, e aqueles com três ou mais vínculos, maior percentual de burnout – embora não tenham apresentado significância estatística. Albuquerque, Melo e Araújo Neto (2012) observaram que a atuação em dois ambientes laborais incrementa a renda, fazendo com que os profissionais se sintam mais satisfeitos com seu ganho. Além disso, o outro vínculo pode satisfazer mais o profissional, possibilitando-lhe mudar o foco dos problemas e lidar com situações diferentes de modo a gerar maior proteção aos estressores, o que poderia justificar o fato de indivíduos com dois vínculos terem apresentado menos SB em relação aos demais.
Trindade e Lautert (2010) , em seu estudo com profissionais da APS, notaram que profissionais que possuíam outro vínculo de trabalho apresentaram maiores níveis de SB; no entanto, essa relação não foi significativa. O fato de o profissional possuir mais de um vínculo ocasiona maior sobrecarga de trabalho, podendo predispô-lo à SB, o que condiz com o maior percentual da SB encontrado no estudo aqui apresentado naqueles com três ou mais vínculos.
As variáveis carga horária semanal em todos os serviços assumidos e carga horária semanal na APS, ambas de quarenta horas desenvolvidas pelos profissionais, apresentaram maior percentual de burnout . Pode-se verificar que a maioria dos profissionais que tinham até quarenta horas semanais eram os que faziam quarenta horas na APS, inferindo-se que o desenvolvimento das atividades na APS tem trazido desgaste e tensão aos trabalhadores (dados não apresentados nos resultados).
Possivelmente os profissionais da APS são mais expostos à SB, pois atuam no ponto da rede assistencial mais próximo dos usuários, sofrendo pressão para a resolução de problemas numa perspectiva de saúde ampliada e de responsabilização, em cenários que envolvem questões sociais complexas distantes da capacidade dos profissionais de as solucionarem – o que pode gerar estresse e tensão nos trabalhadores ( Albuquerque, Melo e Araújo Neto, 2012 ).
Sabe-se que a prática de exercício físico pode proporcionar uma vida mais saudável ao indivíduo e diminuir tensões, prevenindo o estresse ( Portela et al., 2015 ; Bakker e Costa, 2014 ). A variável prática de atividade física, no estudo aqui apresentado, não mostrou relação significativa com o desenvolvimento da SB, mas aqueles que relataram realizar atividade física demonstraram menor relação com o alto risco de desenvolver SB do que os que não realizavam.
A variável apoio social não apresentou significância estatística, mas pôde-se observar que aqueles que possuíam baixo apoio apresentaram maior prevalência da SB em relação àqueles que tiveram alto apoio. Nos estudos de Lin e colaboradores (2014) , Laschinger e Fida (2014) e Hombrados-Mendieta e Cosano-Rivas (2013) foi encontrada associação entre falta de suporte social e SB. A afetividade e a proteção que familiares proveem aos trabalhadores podem ajudá-los nas estratégias de enfrentamento aos estressores, indicando o apoio social como importante fator na prevenção da síndrome – assim como o apoio social no ambiente laboral, proporcionado por colegas e supervisores, pode reduzir os níveis de estresse, promovendo satisfação e diminuição do fenômeno burnout ( Thomas, Kohli e Choi, 2014 ; Bakker e Costa, 2014 ; Maslach, Leiter e Jackson, 2012 ).
Verificou-se que os participantes que autorreferiram ter condição de saúde de muito ruim a regular apresentaram associação com burnout (p<0,001). Trindade e colaboradores (2010) observaram que os profissionais esgotados sofreram mais problemas de saúde do que aqueles que não se sentiam esgotados. Grau-Alberola e colaboradores (2009) defendem a ideia de que o burnout pode ocorrer antes das repercussões negativas sobre a saúde do trabalhador, ou seja, a má condição de saúde seria gerada pela instalação da SB.
Também se observou que a variável satisfação no trabalho apresentou associação com a SB (p<0,001) e que pessoas com baixo nível de satisfação apresentaram maior prevalência da síndrome. Corroborando este achado, Navarro-González, Ayechu-Díaz e Huarte-Labiano (2015) , Martins e colaboradores (2014) e Neves, Oliveira e Alves (2014) verificaram que aqueles profissionais que se declaravam satisfeitos ou muito satisfeitos no trabalho apresentaram menor probabilidade de desenvolverem burnout , apesar de não terem apresentado significância estatística após análise multivariada.
Lima e colaboradores (2013) e World Health Organization (2010) apontam que a satisfação no trabalho pode ser um fator de proteção, o que corrobora os resultados de Zhou e colaboradores (2015) , Laschinger e Fida (2014) e Hombrados-Mendieta e Cosano-Rivas (2013) , que encontraram insatisfação no trabalho relacionada ao burnout estatisticamente significante. Jodas e Haddad (2009) verificaram que aqueles que se sentiam valorizados e reconhecidos pelo seu trabalho e incentivados pela organização tiveram menos chances de desenvolver SB.
Schaufeli e Greenglass (2001) defendem a teoria da equidade, em que os indivíduos investem nas relações interpessoais e organizacionais a fim de obter reciprocidade. Caso essa troca seja desigual, surge o denominado distress, que pode acarretar burnout. Portanto, relações interpessoais e organizacionais em que o indivíduo se sente injustiçado e insatisfeito no trabalho o predispõem à SB. Quando ocorre essa inequidade nas relações do trabalho, inicia-se um processo que acarreta conflito interpessoal. Se esse conflito perdura, possivelmente gera estresse, que ao se cronificar pode predispor os profissionais à SB ( Grau-Alberola et al., 2009 ). Grau-Alberola e colaboradores (2009) , em seu estudo longitudinal, afirmam que os conflitos interpessoais são fatores de risco significativos para o incremento do nível de EE e para a diminuição da RP, e consequentemente da SB.
A autonomia e a satisfação no trabalho repercutem em sentimentos laborais positivos, enquanto o contrário afeta o estado de saúde do trabalhador, possibilitando maior fragilidade ao burnoutWorld Health Organization (2010) .
Por se tratar de um estudo transversal, tornou-se difícil identificar a relação temporal entre as variáveis estudadas. Os fatores referentes à percepção do estado de saúde ruim e insatisfação ao trabalho podem ser consequências do trabalhador em burnout , caracterizando uma causalidade reversa.
Considera-se que o estudo aqui apresentado tem validade interna por possuir uma amostra aleatória e representativa e ter utilizado instrumento validado. Diante disso, os resultados podem traduzir a situação da população de profissionais de saúde da atenção básica à saúde do município pesquisado. Embora a pesquisa tenha sido realizada localmente, a conjuntura laboral na APS é nacionalmente similar, pois adota a mesma política de saúde, enfrenta desafios relativos ao financiamento, aos modelos de assistência e à formação dos profissionais da saúde, o que leva a pressupor que os resultados podem ser generalizados, de forma precavida em razão dos diferentes contextos municipais.
O estudo procurou contribuir para o incremento do conhecimento acerca da SB, além de apontar a importância dos profissionais de saúde para a provisão de um cuidado integral à sociedade. Sobretudo aqueles profissionais atuantes na APS, pela natureza complexa do seu trabalho, por serem responsáveis pela organização e comunicação entre os níveis de assistência do SUS, por estarem mais próximos dos usuários e por serem encarregados de prover o cuidado continuado a eles.
Os resultados demonstraram uma população vulnerável à SB e que necessita de atenção por parte do gestor de saúde do município para a realização de investigações complementares, além de ações de prevenção e promoção da saúde. Com os resultados, não se pode afirmar que uma categoria profissional tenha maior predisposição à SB do que outra, mas percebeu-se que há poucos estudos acerca do tema, o que indica uma lacuna a ser preenchida.
Também observou-se uma possível influência que a SB tem sobre a autoavaliação da condição de saúde dos profissionais. Sabendo-se que a SB causa exaustão física e emocional nos indivíduos e demais prejuízos à sua saúde, torna-se um fator importante a ser estudado. Além disso, os achados indicaram a importância que a satisfação no trabalho tem no sentido de reduzir a chance de se desenvolver a SB – o que corrobora a maioria das publicações encontradas, indicando que um ambiente de trabalho saudável, que facilite a satisfação do profissional, pode protegê-lo do burnout .
Tais resultados ensejam a realização de novos estudos que aprofundem a relação do estado de saúde, da qualidade de vida e da satisfação profissional com a SB, de modo a evidenciar quais são os fatores que possam influenciar e resultar nestas condições influenciar essas condições.


