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OBESIDADE ABDOMINAL E FATORES ASSOCIADOSEM ADULTOS ATENDIDOS EM UMA CLÍNICA ESCOLA

Abdominal obesity and associated factors among adults attending a university health center

Obesidad abdominal y factores asociados en adultos asistidos en una clínica escuela

Rafaella Santos Sabóia Endereço para correspondência
Instituto Ana Paula Pujol, Brasil
Allanne Pereira Araújo
Universidade Federal do Maranhão, Brasil
Janaina Maiana Abreu Barbosa
Universidade Federal do Maranhão, Brasil
Carlos Eduardo Pires Galvão
Universidade Federal do Maranhão, Brasil
Juliana Moreira da Silva Cruvel
Universidade Federal do Maranhão, Brasil
Suzanne Carolyne do Nascimento Ferreira
Faculdade Santa Terezinha, Brasil

OBESIDADE ABDOMINAL E FATORES ASSOCIADOSEM ADULTOS ATENDIDOS EM UMA CLÍNICA ESCOLA

Revista Brasileira em Promoção da Saúde, vol. 29, núm. 2, pp. 259-267, 2016

Universidade de Fortaleza

Recepção: 09 Dezembro 2015

Aprovação: 13 Maio 2016

Resumo: Objetivo: Determinar a prevalência de obesidade abdominal e identificar associação entre fatores socioeco­nômicos e estilo de vida em adultos atendidos numa clínica escola em São Luís, Brasil. Métodos: Estudo retrospectivo e transversal, realizado entre março e abril de 2015, com 1.022 prontuários de adultos de ambos os sexos, atendidos numa clínica escola, nos últimos cinco anos. Foram coletadas informações sobre dados socioeconômicos (sexo, idade, estado civil, renda familiar e escolaridade), antropométricos (peso atual, altura, IMC e CC) e estilo de vida (tabagismo, ingestão de álcool e atividade física). A variável dependente foi a obesidade abdominal, definida pela razão cintura/estatura (RCest). Realizou-se análise multivariada pelo método regressão logística. Resultados: A prevalência de obesidade abdominal foi de 79,8%, de acordo com a RCest e, segundo IMC, o excesso de peso correspondeu a 77,1%. Verificou-se que as idades de 30 a 59 anos foram fator de risco para obesidade abdominal para ambos os sexos e, quando estratificada, para o sexo feminino. Porém, com relação ao sexo masculino, somente a faixa etária de 50 a 59 anos foi fator de risco (OR=5,76; IC=1,13-29,35; p=0,035). Viver com companheiro (OR=1,53; IC=1,07-2,18; p=0,017) e consumir álcool (OR=1,62; IC=1,09-2,40; p=0,015) apresentaram risco para ambos os sexos, sendo este também fator de risco para o sexo masculino (OR=2,46; IC=1,02-5,95; p=0,045). Conclusão: Observou-se alta prevalência de obesidade abdominal, que se mostrou associada à faixa etária de 30 a 59 para mulheres e 50 a 59 anos para homens, à convivência com o companheiro e ao consumo de álcool para ambos os sexos.

Palavras-chave: Obesidade Abdominal, Razão Cintura-Estatura, Adulto.

Abstract: Objective: To determine the prevalence of abdominal obesity and identify the association between socioeconomic factors and lifestyle among adults attending a university health center. Methods: Retrospective and cross-sectional study conducted between March and April 2015 with 1,022 medical records of adults of both genders attending a university health center in the last five years. We collected sociodemographic data (gender, age, marital status, household income and education), anthropometric data (current weight, height, BMI and WC) and information on lifestyle (smoking, drinking and physical activity). The dependent variable was abdominal obesity, defined by the waist-height ratio (WHtR). Multivariate analysis was performed using the logistic regression method. Results: The prevalence of abdominal obesity was 79.8% according to WHtR and, according to BMI, excessive weight accounted for 77.1%. It was found that the ages 30-59 years were a risk factor for abdominal obesity for both genders, and for women when stratified. However, with regard to men, only the age group 50-59 years constituted a risk factor (OR=5.76; CI=1.13-29.35; p=0.035). Living with a partner (OR=1.53; CI=1.07-2.18; p=0.017) and drinking (OR=1.62; CI=1.09-2.40; p=0.015) constituted risk factors for both genders and also for men (OR=2.46; CI=1.02-5.95; p=0.045). Conclusion: There was a high prevalence of abdominal obesity and it was associated with the age groups 30-59 years for women and 50-59 years for men, and living with a partner and drinking for both genders.

Keywords: Abdominal Obesity, Waist-to-Height Ratio, Adults..

Resumen: Objetivo: Determinar la prevalencia de obesidad abdominal e identificar su asociación con los factores socioeco­nómicos y estilo de vida de adultos asistidos en una clínica escuela de São Luís, Brasil. Métodos: Estudio retrospectivo y transversal realizado entre marzo y abril de 2015 en 1.022 historiales clínicos de adultos de ambos los sexos, asistidos en una clínica escuela en los últimos cinco años. Se recogieron informaciones de datos socioeconómicos (el sexo, la edad, el estado civil, la renta familiar y la escolaridad), antropométricos (el peso actual, la altura, el IMC y la CC) y estilo de vida (el tabaquismo, la ingesta de alcohol y la actividad física). La variable dependiente fue la obesidad abdominal que fue definida por la razón cintura/estatura (RCest). Se realizó un análisis multivariado por el método de regresión logística. Resultados: La prevalencia de la obesidad abdominal fue del 79,8%, según la RCest y según el IMC, el exceso de peso correspondió al 77,1%. Se verificó que las edades entre 30 y 59 años fueron factor de riesgo para la obesidad abdominal para ambos los sexos y, al estratificar, para el sexo femenino. Sin embargo, respecto al sexo masculino solamente la franja de edad entre 50 y 59 años fue factor de riesgo (OR=5,76; IC=1,13-29,35; p=0,035). Vivir con un compañero (OR=1,53; IC=1,07-2,18; p=0,017) y consumir alcohol (OR=1,62; IC=1,09-2,40; p=0,015) fueron identificados como riesgo para ambos los sexos y este último ha sido también un factor de riesgo para el sexo masculino (OR=2,46; IC=1,02-5,95; p=0,045). Conclusión: Se observó alta prevalencia de obesidad abdominal que estuvo asociada a la franja de edad entre 30 y 50 años para las mujeres y 50 y 59 años para los hombres, a la convivencia con el compañero y al consumo de alcohol para ambos los sexos.

Palabras clave: Obesidad Abdominal, Relación Cintura-Estatura, Adulto..

INTRODUÇÃO

A obesidade é uma doença crônica não transmissível considerada um dos maiores problemas de saúde pública da atualidade e está asso­ciada a diversos agravos desencadeados pelo excesso de gordura corporal(1). Ela ocorre devido a um desequilíbrio prolongado entre a ingestão de alimentos e o gasto de energia(2-4) e é diagnos­ticada quando o índice de massa corporal (IMC) é maior ou igual a 30 kg/m²(5).

Estudos apontam que a obesidade atinge quase 18% da população brasileira e que 52,5% dos brasileiros estão acima do peso(6). Nos países em desenvolvimento, o número de adultos com excesso de peso quadruplicou nas últimas três décadas. Já em países desenvolvidos, como os EUA, a prevalência de obesos é de 34% entre o sexo masculino e 55% entre o feminino, com idade entre 20 e 64 anos(7).

A distribuição de tecido adiposo no corpo constitui motivo de atenção, uma vez que a obesidade abdominal, central ou androide, ou seja, a concentração de gordura na região abdominal representa maior suscetibilidade para doenças e agravos à saúde a nível metabólico e cardiovascular(8).

Dentre as ferramentas para avaliação da gordura corporal, tem-se a tomografia computadorizada, ressonância magnética nuclear e as medidas antropométricas, que se destacam como métodos de maior aplicabilidade, rápidos e de baixo custo, além de simples interpretação. Estudos corroboram ao afirmar que esses indicadores possuem relação com diversos tipos de doenças e com a distribuição da gordura corporal em adultos(8,9).

O IMC e a circunferência da cintura (CC) são os indicadores antropométricos mais utilizados em estudos populacionais, em virtude da praticidade de sua aplicação, porém, outros métodos surgiram com a finalidade de melhor avaliar a distribuição de gordura corporal, dentre eles, a razão cintura-estatura (RCest)(9).

A literatura recomenda a utilização do IMC aliada a outros parâmetros antropométricos, pois, embora seja largamente utilizado na prática clínica, apresenta limitações (sexuais, étnicas) quanto à avaliação da adiposidade de forma isolada(10).

A RCest fundamenta-se no fato de que a medida da CC do indivíduo não deve ser superior à metade da sua estatura. Além de oferecer boa correlação com a gordura visceral, a RCest tem como vantagem um ponto de corte semelhante entre os sexos, entre diferentes etnias e idades(11,12).

Além disso, estudos apontam que o tabagismo, a ingestão de álcool e de ácidos graxos saturados em excesso, a obesidade e o sedentarismo constituem os fatores de risco de maior relevância responsáveis pela maioria dos óbitos por doenças e agravos não transmissíveis (DANT) e por grande parte de doenças relacionadas, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS). Estudos também indicam que esses fatores geralmente ocorrem de forma simultânea(13-16), o que agrava significativamente o risco de mortalidade(17,18).

Considerando a escassez de estudos em relação ao nível de obesidade abdominal de pacientes atendidos em ambulatórios de nutrição na região Nordeste, sobretudo no Estado do Maranhão, este estudo teve como objetivo determinar a prevalência de obesidade abdominal e identificar associação entre fatores socioeco­nômicos e estilo de vida em adultos atendidos em uma clínica escola em São Luís, Brasil.

MÉTODOS

Estudo transversal, retrospectivo e analítico, realizado em um ambulatório de nutrição de uma clínica escola de São Luís, Maranhão. Foram avaliados, no período de março e abril de 2015, 1.022 prontuários de indivíduos de ambos os sexos, com idade entre 20 e 59 anos, que se apresentavam devidamente preenchidos. Excluíram-se da amostra os prontuários nos quais as medidas antropométricas não foram aferidas, e sim estimadas, além de prontuários de pacientes portadores de algum tipo de deficiência mental, gestantes e nutrizes.

Baseado em um total de 1.051 prontuários de pacientes atendidos no setor de nutrição, na prevalência de 26% de indivíduos com obesidade abdominal(10), seria necessário avaliar 234 prontuários. Considerando-se a probabilidade de erro do tipo I de 5%, nível de confiança de 95% e poder estatístico de 80%, foram avaliados 1.022 prontuários que contemplam os critérios de inclusão.

Para a coleta de dados, analisaram-se os prontuários de pacientes atendidos no período de janeiro de 2010 a março de 2015, sendo coletadas as informações correspondentes aos dados socioeconômicos (sexo, idade, estado civil, renda familiar e escolaridade), antropométricos (peso atual, altura, IMC e CC) e ao estilo de vida (tabagismo, consumo regular de álcool e prática de atividade física).

As variáveis independentes foram categorizadas da seguinte forma: sexo (masculino e feminino), idade (20-29; 30-39; 40-49 e 50-59 anos), estado civil (com ou sem companheiro), renda familiar (< 1 salário mínimo, 1-2 salários mínimos e ≥ 3 salários mínimos), escolaridade (ensino fundamental completo e incompleto; ensino médio completo e incompleto; ensino superior completo e incompleto), tabagismo (sim ou não), consumo regular de álcool no mínimo uma vez por semana (sim ou não), e prática de atividade física, pelo menos trinta minutos por dia, todos os dias da semana (sim ou não)(19).

A avaliação do estado nutricional, realizada por meio do IMC (divisão do peso (kg) pelo quadrado da altura (m²)), configura-se um dos indicadores mais utilizados na avaliação populacional. O IMC foi classificado, segundo proposta da World Health Organization(20), em: IMC < 18,5 kg/m2 = desnutrição; IMC entre 18,5 e 24,9 kg/m2 = eutrofia; IMC ≥ 25kg/m2 = sobrepeso; e IMC ≥ 30 kg/m2 = obesidade, sendo agrupados em duas categorias: eutrofia (IMC ≤ 24,9 kg/m²) e excesso de peso (≥ 25 kg/m²).

A obesidade abdominal constituiu a variável dependente, definida pela RCest, obtida através da divisão do valor da CC (cm) pela estatura (cm). Utilizaram-se os pontos de corte de 0,52 para homens e 0,53 para mulheres(9).

Os dados foram tabulados e analisados no programa estatístico Stata® 12.0, identificando-se as normalidades por meio do teste de Shapiro-Wilk. Para as variáveis quantitativas, a análise consistiu na observação de valores mínimos, máximos, medianas, cálculo de médias e desvios padrão. Para as variáveis qualitativas, utilizaram-se valores absolutos e relativos. Foi realizada análise multivariada pelo método de regressão logística, incluindo ao modelo múltiplo todas as variáveis associadas ao evento de interesse, com significância estatística de até 20%. Para aceitação das associações investigadas no modelo final, considerou-se o valor de p < 0,05.

Foram atendidos os critérios da Re­solução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde e suas regulamentações. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pes­quisa do Centro Universitário do Maranhão (CEUMA). Este estudo faz parte do projeto intitulado “Perfil nutricional de pacientes atendidos em um ambulatório de nutrição de uma clínica escola da cidade de São Luís-MA”.

RESULTADOS

Participaram da pesquisa 1.022 adultos, com média de 39,3 (± 10,9) anos de idade. Predominou o sexo feminino (81,5%, n=833), com faixa etária de 40 a 49 anos (30,3%, n=310) e renda inferior a um salário mínimo (45,2%, n=447). Quanto à situação conjugal, 58,9% (n=601) afirmaram viver sem companheiro e 53,6% (n=534) possuíam ensino médio completo ou incompleto. Houve maior frequência de não fumantes (96,7%, n=989), sedentários (74,3%, n=758) e, em relação ao consumo regular de álcool, 74,3% (n=760) negaram ingestão (Tabela I).

As medianas dos indicadores antropométricos IMC e RCest foram de 28,8 e 0,59, respectivamente. A prevalência de obesidade abdominal encontrada no presente estudo foi de 79,8% (n=816), considerando o indicador RCest, sendo 19,2% (n=157) para homens e 80,8% (n=659) para mulheres. De acordo com o IMC, o excesso de peso correspondeu a 77,1% (n=788) dos casos, dos quais 18,4% (n=145) foram homens e 81,6% (n=643) foram mulheres. Na análise estratificada, não houve diferença relevante entre o sexo masculino e o feminino, assim como não houve diferença estatisticamente significante entre o IMC (p=0,653) e a RCest (p=0,221) com o sexo (Tabela II).

A renda familiar (OR=0,96; IC=0,89-1,03; p=0,328) e a prática de atividade física (OR=0,81; IC=0,57-1,14; p=0,234) não entraram no modelo final da associação entre as variáveis socioeconômicas e de estilo de vida com o indicador RCest (Tabela III).

Verificou-se que as idades de 30 a 59 anos foram fator de risco para obesidade abdominal para ambos os sexos. Quando estratificada, o mesmo se observou no sexo feminino, porém, com relação ao sexo masculino, somente a faixa etária de 50 a 59 anos (OR=5,76; IC=1,13-29,35; p=0,035) foi fator de risco. Viver com companheiro (OR=1,53; IC=1,07-2,18; p=0,017) e consumo regular de álcool (OR=1,62; IC=1,09-2,40; p=0,015) representaram risco para ambos os sexos, mas este também mostrou-se risco para o sexo masculino (OR=2,46; IC=1,02-5,95; p=0,045) (Tabela IV).

Sobre o nível de escolaridade, possuir ensino superior completo ou incompleto foi fator de proteção para obesidade abdominal para ambos os sexos (OR=0,55; IC=0,33-0,92; p=0,024) e para o sexo feminino (OR=0,48; IC=0,27-0,85; p=0,012) (Tabela IV).

Tabela I
Caracterização dos pacientes atendidos em um ambulatório de nutrição. São Luís, MA, 2015.
Caracterização dos pacientes atendidos em um ambulatório de nutrição. São Luís, MA, 2015.
O somatório dos dados pode não chegar ao total da amostra devido às informações perdidas. SM: Salário mínimo vigente.

Tabela II
Indicadores antropométricos de acordo com o sexo em pacientes atendidos em um ambulatório de nutrição. São Luís, MA, 2015.
Indicadores antropométricos de acordo com o sexo em pacientes atendidos em um ambulatório de nutrição. São Luís, MA, 2015.
IMC: Índice de Massa Corporal. RCest: Relação cintura/estatura. Vmín: Valor mínimo. Vmáx: Valor máximo.

Tabela III
Análise univariada da regressão logística entre obesidade abdominal e fatores de risco de acordo com o sexo de pacientes atendidos em um ambulatório de nutrição. São Luís, MA, 2015.
Análise univariada da regressão logística entre obesidade abdominal e fatores de risco de acordo com o sexo de pacientes atendidos em um ambulatório de nutrição. São Luís, MA, 2015.
IC95: Intervalo de Confiança. OR: Odds Ratio. *p<0,05.

Tabela IV
Análise multivariada da regressão logística entre obesidade abdominal ajustada por idade, escolaridade, estado civil, fumo e consumo de álcool de acordo com o sexo de pacientes atendidos em um ambulatório de nutrição. São Luís, MA, 2015.
Análise multivariada da regressão logística entre obesidade abdominal ajustada por idade, escolaridade, estado civil, fumo e consumo de álcool de acordo com o sexo de pacientes atendidos em um ambulatório de nutrição. São Luís, MA, 2015.
OR: Odds Ratio. IC95: Intervalo de Confiança. # Completo e incompleto. *p<0,05.

DISCUSSÃO

Neste estudo, observou-se uma predominância do sexo feminino em relação ao masculino. Sabe-se que, em geral, as mulheres tendem a preocupar-se com a saúde mais do que os homens e, portanto, procuram mais os serviços oferecidos por esse setor, o que seria uma possível justificativa para tal resultado.

Dados semelhantes foram encontrados em um estudo cujo objetivo era caracterizar o perfil nutricional e social de indivíduos adultos. Tal investigação foi conduzida em um ambulatório de nutrição de uma universidade pública de São Paulo, no período de 2004 a 2012, com 1.410 pacientes. As mulheres representaram 74,7% do total de pesquisados, que teve média de 44,8 anos de idade. Destes, 56,5% eram casados, 33,1% tinham ensino fundamental incompleto, 53,7% eram não tabagistas e 86,1% corresponderam a casos de sobrepeso e obesidade(21).

Diversas publicações(10,22-28) apontam para o aumento da obesidade abdominal com a idade e em pessoas do sexo feminino, confirmando que a idade constitui fator de risco para esse tipo de obesidade.

A faixa etária predominante ficou entre 40 e 49 anos, contrapondo-se a outros estudos segundo os quais a relação entre idade e obesidade é diretamente proporcional, pois o processo de envelhecimento provoca modificações na composição corporal – alterações hormonais, na taxa metabólica basal, no ritmo do metabolismo e nível de atividade física – que acabam favorecendo o acúmulo de gordura, sem levar em conta hábitos de vida sedentários e um maior consumo de alimentos hipercalóricos. Já a renda inferior a um salário mínimo foi a mais observada, considerando que a clientela analisada corresponde a usuários do Sistema Único de Saúde (SUS)(2,29).

Uma avaliação da obesidade abdominal, através da RCest com 1.720 adultos de 20 a 59 anos em Florianópolis, evidenciou uma prevalência deste quadro em 50,5% dos homens e 38,9% das mulheres. As maiores prevalências de obesidade abdominal foram observadas em indivíduos com idade entre 50 e 59 anos e entre aqueles que viviam com companheiro(a), enquanto as menores prevalências foram observadas em mulheres que possuíam maiores escolaridade (≥12 anos) e renda, e em homens que apresentaram menor renda. Os autores destacam que o conhecimento dos fatores associados à obesidade abdominal pode nortear as interven­ções direcionadas à prevenção desse importante problema de saúde pública(30).

A obesidade, sobretudo a abdominal, apresenta forte associação com eventos respiratórios, cardiovasculares, dislipidemias, diabetes melittus tipo II, resistência à insulina, entre uma série de disfunções metabólicas. Além disso, esse tipo de obesidade está associado à inatividade física, consumo regular de bebida alcoólica, tabagismo, idade superior a 40 anos, viver em união estável e baixa renda, estando relacionado a uma maior morbimortalidade decorrente das consequências de tais comorbidades, de acordo com dados da literatura(4,10,25,31,32).

Estudo de base populacional com 1.580 adultos das zonas rural e urbana de Pernambuco, no ano de 2006, estimou a prevalência de obesidade abdominal, avaliando os fatores associados. Os resultados demonstraram uma prevalência de 51,9% desse tipo de obesidade nos adultos pernambucanos, sendo maior no sexo feminino (p<0,001). Observaram, ainda, mediana de 33 anos de idade, predominando o sexo feminino (58%), baixa escolaridade (54,3% com menos de 5 anos completos de estudos), um total de 22,3% de fumantes e 28,5% de indivíduos insuficientemente ativos, divergindo da realidade encontrada na presente pesquisa(2).

Em pesquisa realizada na cidade de Pelotas, Rio Grande do Sul, com 1.035 pessoas com idade de 20 a 69 anos, obteve-se a prevalência de obesidade e fatores associados. Foram 21% de indivíduos obesos, sendo 25% entre as mulheres e 15% entre os homens. A relação entre as variáveis socioeconômicas e a obesidade foi inversamente proporcional entre as mulheres e diretamente proporcional entre os homens. Os resultados demonstraram que os fatores determinantes de obesidade diferem entre os gêneros, ocorrendo, geralmente, entre o sexo feminino e com o aumento da idade(33).

Os resultados de outro estudo nessa mesma cidade do sul do Brasil, com 1.968 indivíduos de ambos os sexos, entre 20 e 69 anos de idade, foram comparados com os resultados do estudo supracitado. Houve uma tendência na redução da prevalência de obesidade, mas sem significância estatística. Essa tendência tem sido frequente em regiões mais desenvolvidas(34).

Um ponto a ser enfatizado é que, geralmente, as pessoas tendem a procurar os serviços de saúde quando já apresentam excesso de peso e/ou comorbidades associadas, visando à perda de peso, o que pode ser explicado pela elevada prevalência de indivíduos com excesso de peso encontrada nesta pesquisa.

A associação entre o uso de serviços de saúde e a obesidade em adultos, através de estudo em 100 municípios de 23 estados brasileiros, confirmou que o excesso de peso elevou a procura pelas consultas médicas nas Unidades Básicas de Saúde e em serviços de ur­gência e emergência(35). O excesso de peso constituiu o principal motivo de encaminhamento médico, em conjunto com as demais comorbidades associadas, totalizando 39,5% dos casos(21).

O indicador RCest tem sido considerado por vários pesquisadores um bom discriminador de obesidade abdominal e de fatores de risco cardiovascular, principalmente o risco coronariano elevado (RCE), pois ele ajusta o valor da CC (indicador de obesidade abdominal) pela estatura, minimizando, assim, a estimativa errônea de risco à saúde em adultos com diferentes estaturas, sendo, ainda, utilizado em estudos populacionais e outros semelhantes. A escolha da RCest como melhor preditor desse tipo de obesidade é vista como um diferencial metodológico desta pesquisa, pois sua sensibilidade preditiva para riscos cardiovasculares é maior que a dos indicadores antropométricos mais utilizados para esse fim, a CC e o índice de conicidade (IC)(9,12,29,30,36).

Vários autores avaliaram a RCest juntamente com os demais indicadores antropométricos de obesidade (CC, razão circunferência cintura/quadril, IC, IMC) para discriminar o RCE, em diferentes regiões do Brasil. Um estudo realizado em Salvador, Bahia, no ano de 2000, com 968 pessoas, sendo 391 homens e 577 mulheres de 30 a 74 anos de idade, evidenciou que os indicadores de obesidade abdominal são mais eficazes na discriminação de RCE do que o IMC, e que a RCest possui representação estatisticamente significativa, justificando a sua utilização(12).

Em estudo nacionalmente reconhecido, foram analisados e comparados os indicadores antropométricos de obesidade abdominal mais utilizados, com a finalidade de verificar quais deles apresentavam maior poder preditivo na detecção de RCE. Observou-se que, em estudos populacionais, é recomendável utilizar a RCest, explicando para o indivíduo que a sua cintura não deve ser maior que a metade da sua estatura(8).

Pesquisa realizada em Florianópolis investigou a associação entre obesidade geral e abdominal e entre fatores sociodemográficos e de saúde, com níveis pressóricos aumentados em 1.720, entre homens e mulheres adultos com idade de 20 a 59 anos. Os resultados evidenciaram que a RCest apresentou boa capacidade preditiva para hipertensão, estando entre os melhores indicadores(37).

Embora o presente estudo tenha sido realizado a nível local, destaca-se como ponto positivo o número elevado de pesquisados, considerando que os estudos realizados em clínicas escolas geralmente possuem menor número de participantes. Além disso, considera-se como possível limitação a presença de vários examinadores, embora previamente treinados para aferição das medidas antropométricas, sempre com a presença de um supervisor docente.

CONCLUSÃO

Observou-se uma alta prevalência de obesidade abdominal, a qual se mostrou associada à faixa etária de 30 a 59 para mulheres e 50 a 59 anos para homens, à convivência com o companheiro e ao consumo de álcool para ambos os sexos.

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Autor notes

Endereço para correspondência Rafaella Santos Sabóia, Rua Mil e oitocentos, 12, Bairro: Parque Aurora, CEP: 65051-850 - São Luíz - MA – Brasil, E-mail: rafa_saboia@hotmail.com
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