Artigo de Revisão / Articles for review

SAÚDE E QUALIDADE DE VIDA DE JORNALISTAS: ESTUDO DE REVISÃO

Health and quality of life of journalists: a review study

Salud y calidad de vida de periodistas: estudio de revisión

Regina Zanella Penteado Endereço para correspondência
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filh, Brasil
Universidade Metodista de Piracicaba, Brasil
Laiane Maria Gastaldello
Universidade Metodista de Piracicaba, Brasil

SAÚDE E QUALIDADE DE VIDA DE JORNALISTAS: ESTUDO DE REVISÃO

Revista Brasileira em Promoção da Saúde, vol. 29, núm. 2, pp. 295-304, 2016

Universidade de Fortaleza

Recepção: 07 Março 2016

Aprovação: 25 Junho 2016

Resumo: Objetivo: Realizar revisão sistemática da literatura voltada para a saúde e a qualidade de vida de jornalistas, relacionadas ao trabalho. Métodos: Foram realizadas buscas nas seguintes bases: LILACS, SciELO, Doaj, MEDLINE, Science Direct, Wiley Online Library, Springer Link e Clase. Foram priorizados artigos publicados em periódicos nacionais e internacionais, nos idiomas em português, inglês e espanhol, no período entre 2005 e 2015. O processo de seleção seguiu etapas e critérios pré-definidos do estudo, bem como a aplicação de Testes de Relevância. Resultados: A seleção resultou em oito publicações para revisão. Os aspectos e/ou questões do processo saúde-doença-cuidado de jornalistas, que têm sido enfatizados nas investigações, integram as categorias: saúde vocal/expressividade (três: 37,5%); saúde mental (quatro: 50%) e saúde alimentar/nutricional (um: 12,5%); e eles vêm sendo abordados de maneira isolada. Faltam estudos pautados por uma concepção ampliada e abrangente de saúde e qualidade de vida. Conclusão: O estudo mostra a necessidade de pesquisas e investimentos na formação de uma cultura de promoção da saúde e qualidade de vida dos jornalistas, o que pode ocorrer na interdisciplinaridade das áreas de Saúde, Comunicação e Educação, com apoio das entidades de classe da categoria e da mídia.

Palavras-chave: Promoção da Saúde, Saúde do Trabalhador, Qualidade de Vida, Comunicação, Jornalismo, Educação.

Abstract: Objective: Systematic review of the literature on work-related health and quality of life of journalists. Methods: Searches were carried out in the following databases: LILACS, SciELO, Doaj, MEDLINE, Science Direct, Wiley Online Library, Springer Link The searches focused on articles published in Portuguese, English and Spanish in national and international journals in the period from 2005 to 2015. The selection process followed pre-established steps and criteria for the study as well as the application of Relevance Tests. Results: The selection yielded eight publications for review. Aspects and/or issues regarding the health-disease-care process of journalists, which have been highlighted in studies, are included in the following categories: vocal health/expressiveness (three: 37.5%); mental health (four: 50%) and nutritional health (one: 12.5%) – all of them have been addressed separately. There is a lack of studies based on a broad and comprehensive view of health and quality of life. Conclusion: The study shows a need for research and investments in the development of a culture for the promotion of health and quality of life of journalists, which may happen through the interdisciplinarity in the fields of Health, Communication and Education, with the support from the sector associations and the media.

Keywords: Health Promotion, Occupational Health, Quality of Life, Communication, Journalism, Education..

Resumen: Objetivo: Revisión sistemática de la literatura dirigida para la salud y la calidad de vida relacionadas al trabajo de periodistas. Métodos: Se realizó la búsqueda en las siguientes bases de datos: LILACS, SciELO, Doaj, MEDLINE, Science Direct, Wiley Online Library, Springer Link y Clase. Se priorizo a los periódicos nacionales y internacionales en los idiomas portugués, inglés y español en el período entre 2005 y 2015. El proceso de elección siguió las etapas y criterios pre-definidos del estudio así como la aplicación de Testes de Relevancia. Resultados: La selección ha resultado en ocho publicaciones para la revisión. Los aspectos y/o cuestiones del proceso salud-enfermedad-cuidado de periodistas que han sido enfatizados en las investigaciones integran las categorías: salud vocal/expresividad (tres: 37,5%); salud mental (cuatro: 50%) y salud alimentaria/nutricional (uno: 12,5%); y han sido abordados de manera aislada. Hace falta estudios basados en la concepción ampliada y abarcadora de salud y calidad de vida. Conclusión: El estudio señala la necesidad de investigaciones y investimentos para la formación de una cultura de promoción de la salud y calidad de vida de periodistas lo que puede se da en la interdisciplinaridad de las áreas de la Salud, Comunicación y Educación con el apoyo de las entidades de clase de la categoría y de los medios de comunicación.

Palabras clave: Promoción de la Salud, Salud Laboral, Calidad de Vida, Comunicación, Periodismo, Educación..

INTRODUÇÃO

O trabalho do jornalista, muitas vezes, se desenvolve em condições precárias e situações de risco, violência e agressões, as quais incidem negativamente na saúde e qualidade de vida(1-6).

O Brasil é o segundo país das Américas com maior número de jornalistas mortos, em decorrência da situação de trabalho(7). Segundo a Federação Nacional dos Jornalistas, os dados de violência contra os jornalistas são alarmantes e requerem medidas urgentes(5,6). Entre junho de 2013 e fevereiro de 2014, aproximadamente 117 jornalistas foram feridos e um cinegrafista morreu na cobertura das manifestações e dos protestos públicos ocorridos no país(5,8,9). O “Relatório 2014 da Violência contra Jornalistas e Liberdade de Imprensa no Brasil” mostra que, naquele ano, registraram-se 129 ocorrências de agressão a jornalistas e três mortes; sendo 55,81% na região Sudeste, considerada a mais violenta(10). A saúde dos jornalistas merece atenção; não somente nos momentos de acidentes e/ou de tragédias.

Alguns estudos indicam que são problemas de saúde comuns dos jornalistas: desgaste, estresse, depressão, ansiedade, irritabilidade, dores/problemas posturais e Doenças Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho (DORT), dor de cabeça, insônia/alterações do sono, hipertensão arterial, problemas gastrointestinais (constipação intestinal, gastrite, úlcera), problemas e doenças do aparelho respiratório (alergias, tosse, catarro, bronquite, asma), fadiga visual, queixas e alterações vocais(3,4,11-13).

Outros fatores do mundo do trabalho afetam a saúde dos jornalistas, podendo gerar adoecimentos, como os novos recursos e tecnologias, que reconfiguram as condições do trabalho jornalístico, demandam esforços de adaptação dos trabalhadores e impõem desafios para a formação(12,14,15).

Alguns autores apontam escassez de estudos que abordem as relações entre trabalho, saúde e qualidade de vida de jornalistas, sob a perspectiva da promoção da saúde(16,17).

É necessário identificar e conhecer os estudos realizados acerca da saúde e da qualidade de vida dos jornalistas, saber quais temas/enfoques/questões/aspectos eles priorizam e quais ainda se encontram fora do foco de atenção; para apontar caminhos na perspectiva da promoção da saúde e do cuidado de jornalistas.

A presente pesquisa visa suprir uma lacuna nos estudos das interfaces entre as áreas de Saúde, Comunicação e Educação e oferecer subsídios para se criar espaços sociais para a discussão da questão do cuidado e da promoção da saúde do jornalista, inclusive nos espaços educacionais de formação profissional e acadêmica.

O objetivo deste artigo foi realizar revisão sistemática da literatura voltada para a saúde e a qualidade de vida de jornalistas, relacionadas ao trabalho.

MÉTODOS

Este estudo se refere a uma revisão sistemática, no qual as obras a respeito de um determinado tema ou questão não são escolhidas de forma aleatória – elas passam por uma seleção, feita a partir de critérios pré-estabelecidos e definidos, bem como etapas e testes que envolvem processos de inclusões e exclusões que resultam em maior ou menor número de publicações, cuja seleção pôde ser validada, e que passam a integrar a revisão e a análise(18).

O processo de uma revisão sistemática envolve as seguintes etapas: 1) definição da pergunta ou questão/problema; 2) definição de estratégias de busca e seleção (critérios de inclusão/exclusão e desenho dos Testes de Relevância); 3) busca; 4) seleção das publicações mediante aplicação dos critérios e testes; e 5) análise das publicações selecionadas para revisão(18).

As questões norteadoras da presente pesquisa foram: quais temas/aspectos/questões da saúde e da qualidade de vida dos jornalistas, relacionados ao trabalho, têm sido investigados no Brasil? Quais são as áreas que vêm se dedicando ao estudo da saúde e da qualidade de vida de jornalistas?

Foram feitas nas seguintes bases de dados: LILACS (Literatura Latino-americana e do Caribe em Ciências da Saúde); SciELO (Scientific Electronic Library Online); Doaj (Directory of Open Access Journal); MEDLINE; Science Direct (Elsevier); Wiley Online Library; Springer Link, Clase (Citas Latinoamericanas en Ciencias Sociales y Humanidades).

Os descritores empregados e combinados foram: “Saúde” (“Health”); “Promoção da Saúde” (“Health Promotion”); “Qualidade de Vida” (“Quality of Life”); “Saúde do Trabalhador” (“Occupational Health”); com uso da expressão booleana AND: Comunicador (Communicator); Jornalista (Journalist); Jornalismo (NewsCast). Observação: sempre que possível, foi empregada a técnica de truncamento de palavra – jornalis* (journalis*); jornalis# (journalis#); jornalis$ (journalis$).

A busca foi feita on-line, durante o mês de fevereiro de 2016. O período de publicação delimitado para a seleção compreende o período entre 2005 e 2015. Foram eleitos para a pesquisa artigos publicados em periódicos nacionais e internacionais, nos idiomas português, inglês e espanhol.

Uma seleção preliminar se deu a partir da leitura dos títulos e resumos das publicações, buscando identificar aquelas que se aproximavam e as que se distanciavam do escopo do estudo – sendo estas últimas excluídas. As publicações duplicadas também foram excluídas.

Nos estudos inicialmente selecionados, foram aplicados os Testes de Relevância, mediante nova leitura dos títulos e resumos, e quando esta não se mostrava suficientemente esclarecedora, foram buscados os artigos para leitura na íntegra. Nessa etapa, os estudos foram avaliados por dois revisores, de forma independente, com utilização de formulários desenhados anteriormente em uma das etapas do processo do estudo de revisão sistemática, em conformidade com a literatura(18), para que possa balizar o processo de seleção da presente pesquisa - uma vez que contém os critérios previamente estabelecidos de inclusão e de exclusão -, bem como orientar futuras leituras e aplicações em outros estudos de revisão sistemática que se proponham a reproduzir essa metodologia em pesquisas com temática similar. Os formulários dos Testes de Relevância I e II foram aplicados pelos revisores em cada publicação selecionada; e as discordâncias foram resolvidas por consenso entre eles. Os formulários padronizados dos Testes de Relevância I e II, empregados na avaliação e seleção dos revisores, no presente trabalho, são apresentados no Quadro I.

As publicações selecionadas a partir dos Testes de Relevância I e II foram novamente submetidas à leitura, e os seus dados, classificados e organizados pelos seguintes aspectos: Procedência: país (estudos internacionais); estado/região (estudos nacionais); Participantes envolvidos (número, tipo de mídia em que atuam); Estratégias metodológicas empregadas; Área dos autores/pesquisadores e/ou em que o estudo foi desenvolvido; Questões abordadas: problema, temática, conteúdo, aspecto de saúde e/ou da qualidade de vida na relação com o trabalho; Resultados: síntese dos resultados obtidos na publicação analisada.

Quadro I
Formulário dos Testes de Relevância I e II.
Formulário dos Testes de Relevância I e II.

RESULTADOS

Inicialmente, a primeira busca eletrônica resultou em 3.374 publicações; após a seleção inicial, pelo título, foram identificados 19 estudos, sendo: LILACS (n=09); MEDLINE (n=04); SciELO (n=03) e Doaj (n=03). Já nas bases Clase, Springer Link e Wiley Online Library, obteve-se n=0.

Foram excluídas quatro publicações repetidas; e para a leitura de resumos e análise na íntegra, foram elegíveis 15 publicações.

Após o Teste de Relevância I, foram excluídos 5 estudos e selecionados 10. Após o Teste de Relevância II, 2 estudos foram excluídos e 8 tiveram aceitação definitiva para a revisão sistemática. O fluxograma (Figura 1) sintetiza esse processo.

O Quadro II apresenta a caracterização das publicações selecionadas para a revisão sistemática segundo: autor e ano (em ordem cronológica de publicação); participantes e procedência; estratégias metodológicas empregadas; área(s) dos autores/pesquisadores e/ou de desenvolvimento; questões abordadas: problema, temática, conteúdo, aspecto de saúde e/ou da qualidade de vida na relação com o trabalho; e resultados dos estudos.

Fluxograma. São Paulo, 2016.
Figura 1
Fluxograma. São Paulo, 2016.

Quadro II
Caracterização e distribuição das publicações segundo participantes, procedência, estratégias empregadas, áreas, questões abordadas e resultados obtidos. São Paulo, 2016.
Caracterização e distribuição das publicações segundo participantes, procedência, estratégias empregadas, áreas, questões abordadas e resultados obtidos. São Paulo, 2016.

DISCUSSÃO

O pequeno número de publicações que passou a integrar o estudo de revisão, como resultante do processo de seleção, torna evidente que a qualidade de vida e o processo saúde-doença-cuidado de jornalistas, relacionados ao trabalho, têm sido pouco estudados, tanto no Brasil como no mundo.

Uma análise dos títulos das obras, tendo em vista uma quantificação das publicações, a partir da identificação dos aspectos e/ou questões do processo saúde-doença-cuidado de jornalistas que têm sido enfatizados nas investigações, indica as seguintes categorias: saúde vocal/expressividade (três 37,5 %); saúde mental (quatro: 50%) e saúde alimentar/nutricional (um: 12,5%). O detalhamento das questões abordadas em cada uma das categorias mencionadas é apresentado a seguir.

Referente à saúde vocal e expressividade: tipos de voz, qualidade e parâmetros vocais, expressividade e recursos vocais e não-verbais, hábitos e queixas vocais, aquecimento vocal, promoção da saúde vocal, qualidade de vida em voz, dentre outros. Em geral os estudos com foco em saúde vocal e expressividade apontam a necessidade de disciplinas relacionadas à voz/saúde vocal/expressividade em cursos de Jornalismo(16,17,25).

Referente à saúde mental: sofrimento, estresse, depressão, transtornos mentais, saúde do trabalhador (condições, ambiente e gestão de trabalho), conflitos psíquicos, relacionamentos sociais e familiares, dentre outros. Em geral, os estudos com foco em saúde mental apontam condições de risco para estresse e transtornos mentais e/ou psiquiátricos, no contexto do trabalho do jornalista. Os estudos se encontram em conformidade com a literatura e confirmam que as precárias condições de trabalho geram sofrimentos e incidem negativamente sobre a saúde e qualidade de vida dos jornalistas(1-4, 11-15).

Por fim, referente à saúde alimentar/nutricional: hábitos alimentares, diabetes e consumo de cafeína e energéticos. Cabe destacar que os alimentos energéticos e à base de cafeína têm efeitos inibidores do sono e neuroestimulantes, e o seu consumo é comum entre trabalhadores de categorias que precisam se manter alertas por longos períodos, apesar de já se sentirem acometidos pelo cansaço. A cafeína pode causar ressecamento da mucosa do trato vocal, irritações laríngeas, refluxo gastroesofágico, alterações na qualidade vocal e velocidade de fala, com prejuízos para a compreensão da comunicação. O consumo frequente de cafeína e energéticos pode, também, ter efeitos negativos sobre os estados de humor e causar problemas como insônia, hipertensão, falta de apetite, emagrecimento, alucinações e outros(26). Em geral, os estudos com foco na alimentação/nutrição dos jornalistas apontam consumo de alimentos com pouco valor nutricional e substâncias prejudiciais à saúde, com relações entre as condições e a organização do trabalho.

Vale observar que os estudos analisados abordam as categorias e os aspectos/questões de saúde de maneira isolada. Uma perspectiva abrangente e ampliada do processo saúde-doença-cuidado dos jornalistas implicaria em considerar as questões e problemáticas no conjunto da complexidade da qualidade de vida e envolver aspectos sociais, econômicos, políticos, culturais, biológicos, ambientais, psicológicos, pessoais e de estilos de vida(27-30).

As publicações analisadas na presente revisão não tocam em temas e questões que configuram aspectos de saúde que atingem a categoria dos jornalistas e já foram apontados anteriormente na literatura: problemas do aparelho respiratório (alergias, tosse, catarro, bronquite, asma); fadiga visual; Doenças Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho; problemas posturais e outros(3,4,11,12).

A Organização Mundial da Saúde define “qualidade de vida” como a percepção dos sujeitos de sua posição na vida, no contexto de sua cultura e no sistema de valores em que vive, em relação a seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações, sendo fundamentais os seguintes aspectos: subjetividade, multidimensionalidade, interdisciplinaridade e dimensões positivas e negativas(27,28). Qualidade de vida compreende diversos significados e reflete conhecimentos, experiências, valores de indivíduos e coletividades. É uma constituição social com relatividade cultural e envolve a satisfação das pessoas com sua vida em diversos campos. Tem relação com a estética existencial e com o que se entende por conforto e bem-estar em espaços e tempos definidos. Qualidade de vida está relacionada com a saúde e compreende alimentação, habitação, saneamento, trabalho, educação, cultura, lazer, modos de vida e cuidados(29,30).

No que diz respeito à autoria das publicações, o Quadro II mostra que não ocorreram repetições entre os grupos de autores. Ou seja, os diversos estudos foram realizados de maneira isolada e original; e não houve grupos de pesquisadores que tivessem avançado nas investigações, de modo a apresentar publicações que representassem aprofundamentos, desdobramentos e/ou novos olhares a partir de uma pesquisa original. Isso evidencia a ausência de grupos e/ou linhas de pesquisa voltadas para saúde e qualidade de vida de jornalistas.

Quanto à área de formação, predominam autores de Psicologia (quatro: 50%) e de Fonoaudiologia (três: 37,5%). Algumas das áreas de atuação da Psicologia são a organizacional e a do trabalho, as quais se voltam para questões ligadas aos comportamentos e relações das pessoas e bem-estar no trabalho. A temática do estresse é, portanto, pertinente e bastante cara a essa área profissional. Já a Fonoaudiologia é a área que se volta para os estudos da saúde vocal, da voz profissional e da expressividade(31) e conta com literatura especificamente voltada para comunicadores, produzida a partir de experiências de pesquisa e assessoria junto a profissionais de jornalismo(13,31,32).

No que diz respeito à procedência e ao local de origem e desenvolvimento das publicações, é possível notar o envolvimento de países da Américas do Sul (Brasil – quatro: 50%) e América do Norte (EUA – dois: 25%), além de europeus (Alemanha – um: 12,5% e Espanha – um: 12,5%). Não foram encontrados estudos originados na América Central, Ásia, Oceania nem África.

Quando se leva em conta as publicações brasileiras, a maioria (quatro: 50%) deriva de pesquisas desenvolvidas no estado de São Paulo. A região Sudeste é considerada a mais violenta para jornalistas, com maior número de agressões(10). No entanto, a temática da violência não foi central nos estudos analisados – apenas uma publicação se aproxima da questão, ao comparar o estresse entre jornalistas e guardas municipais. A prevalência de produções, pelo estado paulista, não corresponde, portanto, a uma atenção e/ou sensibilização dos pesquisadores e autores para os problemas vivenciados pela categoria dos jornalistas na sociedade atual, mas, provavelmente, ao interesse científico dos investigadores.

Ressalta-se, ainda, que nenhum estudo tratou a questão da violência sofrida por jornalistas nos contextos de cobertura às manifestações e aos protestos públicos ocorridos no Brasil, a partir de 2013, com ênfase na saúde e na qualidade de vida. Estudos despontaram com foco no trabalho dos jornalistas na cobertura dos protestos e manifestações nacionais, mas ressalta-se que o foco de preocupação foi outro: questões referentes à identidade, credibilidade, função, lugar e papel do jornalista como agente social relevante na produção de notícias – levando em conta que jornalistas e empresas de jornalismo acabaram sendo alvo de protestos, em meio às instituições consolidadas das quais também fazem parte(33). Permaneceram fora do centro de atenção a precariedade das condições de trabalho, as violências sofridas e os efeitos na saúde e na qualidade de vida.

Há necessidade de estudos voltados para a investigação dos fatores predisponentes e determinantes do processo saúde-doença-cuidado e da qualidade de vida dos jornalistas, sob diferentes realidades, condições e contextos de trabalho, nas várias regiões do país, na atualidade.

Quanto aos períodos prevalentes das publicações, cinco (50%) correspondem aos anos entre 2007 e 2010; e três (30%), aos anos de 2011 a 2014 (Quadro II). Ressalta-se que entre 2003 e 2006 não houve publicação alguma referente à temática em questão. E cabe, ainda, uma observação: apesar de delimitado o período de seleção entre 2005 e 2015, não houve nenhuma outra publicação, seja ela anterior ao período ou recente (de 2016), que tenha sido excluída ao longo do processo de seleção. Isso mostra que o universo das publicações voltadas para a temática aqui investigada é realmente muito restrito e, ao mesmo tempo, agrega valor de representatividade às publicações que integram o presente estudo de revisão.

No que diz respeito aos sujeitos envolvidos nos estudos, a maioria é jornalista atuante no mercado de trabalho: 7 (87,5%). O envolvimento de membros da comunidade acadêmica, tais como graduandos e docentes de Instituição de Ensino Superior de formação em Jornalismo, ocorreu em apenas uma (12,5%) das publicações - uma com cada grupo.

O espaço educacional da formação não tem sido campo de reflexão e discussão acerca das temáticas da saúde e da qualidade de vida, relacionadas ao trabalho do jornalista. O campo da formação do jornalista deveria contar com espaços sociais para trabalhar as questões implicadas nas relações entre o trabalho, a saúde e a qualidade de vida dos futuros profissionais.

Tais espaços poderiam ser configurados como disciplinas específicas ou conteúdos inseridos em outras disciplinas, ministrados por profissionais da saúde. As práticas educativas devem favorecer o desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem a partir de diferentes cenários e contextos, tais como: salas de aula, laboratórios de comunicação, estúdios de rádio e de televisão, empresas de mídia e comunicação e outros; a partir de uma abordagem interdisciplinar, situada no diálogo e nas interfaces entre as áreas de Saúde e Comunicação.

Entende-se que isso poderia contribuir para avanços qualitativos em relação ao que preconizam as Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Jornalismo, por possibilitar ao educando “utilizar diferentes cenários de ensino-aprendizagem, promover a integração teoria/prática e a interdisciplinaridade entre os eixos curriculares e conhecer e vivenciar situações variadas em equipes multiprofissionais”(34).

O questionário foi a principal estratégia metodológica empregada em três (37,5%) das publicações. Vale comentar que não houve emprego de estratégias que possibilitassem oferecer dados referentes à atividade, aos processos e organização do trabalho do jornalista. Não foram identificadas estratégias como: observação, entrevistas, video-gravações, autoconfrontação, dentre outras que possibilitariam uma análise com proximidade dos trabalhadores e ajudariam na compreensão dos problemas e da realidade do processo de trabalho em jornalismo. Entende-se que ganhos qualitativos seriam obtidos em pesquisas que se propusessem a analisar a saúde dos jornalistas a partir de referenciais da Análise Ergonômica do Trabalho(35).

Há necessidade de estudos pautados em perspectivas amplas e abrangentes de processo saúde-doença-cuidado dos jornalistas, a fim de subsidiar processos de educação atentos à questão do bem-estar dessa categoria profissional.

Faz-se necessário o investimento na formação de uma cultura de atenção para o cuidado, a promoção da saúde e a qualidade de vida dos jornalistas, que seja perpassada pela interdisciplinaridade e pela intersetorialidade entre os campos da Saúde, Comunicação e Educação. Destacam-se, nesse sentido, como espaços educacionais potenciais: os processos de formação inicial e continuada dos profissionais nos cursos de graduação e pós-graduação em Jornalismo; os espaços informais de educação continuada, que se desenvolvem em serviço ou em grupos assessorados por profissionais como, por exemplo, psicólogos, fonoaudiólogos, fisioterapeutas e nutricionistas; e as ações encabeçadas por equipes de Saúde do Trabalhador do Sistema Único de Saúde (SUS). Ressalta-se, por fim, que se estabeleçam parcerias com as entidades de classe da categoria e que se possa contar com o apoio das empresas de comunicação e da mídia.

CONCLUSÃO

As evidências apontam que a saúde e a qualidade de vida dos jornalistas, relacionadas ao trabalho, tem sido pouco investigadas, no Brasil e no mundo. Os aspectos e/ou questões do processo saúde-doença-cuidado de jornalistas, que vêm sendo investigados, são referentes a: saúde vocal/expressividade, saúde mental e saúde alimentar/nutricional, enquanto a abordagem da qualidade de vida se deu na relação com a voz.

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Autor notes

Endereço para correspondência Regina Zanella Penteado, Universidade Metodista de Piracicaba – UNIMEP, Rodovia do Açúcar Km 156 (SP 308). CEP 13423-170 - Piracicaba - SP – Brasil, E-mail: rzpenteado@unimep.br
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