A EMOÇÃO DO EMPREENDEDORISMO ARTÍSTICO: A JORNADA EMPREENDEDORA DE UM MÚSICO BAIANO
A EMOÇÃO DO EMPREENDEDORISMO ARTÍSTICO: A JORNADA EMPREENDEDORA DE UM MÚSICO BAIANO
Revista Pensamento Contemporâneo em Administração, vol. 16, núm. 1, pp. 161-184, 2022
Universidade Federal Fluminense
Recepción: 09 Octubre 2021
Aprobación: 28 Abril 2022
Resumo: O objetivo deste caso para ensino é proporcionar aprendizagem sobre: (a) a importância e os desdobramentos das emoções para o empreendedorismo, (b) a perspectiva sociocultural da emoção no contexto do empreendedorismo e (c) como a emoção é fundamental e intensa no contexto do empreendedorismo artístico. O caso narra a história de um jovem músico soteropolitano, que decide empreender em sua carreira. Durante sua jornada, enfrenta inúmeros desafios emocionais, aprendendo a adaptar ideias, a enfrentar dificuldades e a estabelecer parcerias. O caso pode ser útil para estudantes de administração e empreendedorismo, mas também para empreendedores culturais, artistas e administradores em geral.
Palavras-chave: Emoção, Educação empreendedora, Empreendedorismo artístico.
Abstract: The goal of this teaching case is to provoke learning about: (a) the importance and consequences of emotions for entrepreneurship, (b) the sociocultural perspective of emotion in the context of entrepreneurship and (c) how emotion is fundamental and intense in the context of artistic entrepreneurship. The case tells the story of a young musician from Salvador, who decides to undertake his career. During his journey, he faces numerous emotional challenges, learning to adapt ideas, face difficulties and establish partnerships. The case can be useful for students of management and entrepreneurship, but also for cultural entrepreneurs, artists and administrators in general.
Keywords: Emotion, Entrepreneurial education, Artistic entrepreneurship.
Contextualização do caso para ensino
Empreendedorismo artístico e musical no contexto da economia criativa
O conceito de economia criativa tem sido relacionado ao de indústrias criativas, ou seja, indústrias originadas na criatividade individual, habilidade e talento (Comunian et al., 2014), cujos produtos e serviços são caracterizados, principalmente, por valor simbólico e apresentam potencial para criação de emprego e riqueza por meio da geração e exploração da propriedade intelectual (Davies & Gauti, 2013). Embora não exista um consenso a respeito dos setores pertencentes à economia criativa (Jones et al., 2015), as artes encontram-se presentes em todas as classificações, ocupando, em geral, uma posição primordial (Phillips, 2010). Neste contexto, o empreendedorismo artístico torna-se um fenômeno imprescindível, pois é através dele que ocorre a tangibilização do capital simbólico e a transformação de ideias criativas em bens culturais (Phillips, 2010).
No âmbito da economia criativa, a música ocupa uma posição extremamente relevante no segmento das artes (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro [FIRJAN], 2019). Alguns empreendimentos musicais geram significativas receitas e podem ser incluídos entre os mais rentáveis das indústrias criativas (Vogel, 2004). A música desempenha uma função relevante para a geração de riquezas de muitos países. Na Dinamarca, por exemplo, o papel dos empresários musicais tornou-se particularmente importante para o aumento das exportações (Aggestam, 2007) e, na Escandinávia, existe uma notável participação das pequenas empresas musicais independentes na economia (Davies & Gauti, 2013).
A indústria fonográfica, uma das mais importantes entre os negócios musicais, vem adaptando-se e segue gerando expressivas receitas através de novos modelos de negócio. Apesar dos desafios recentes, como as rápidas transformações tecnológicas, novas oportunidades surgiram. A demanda virtual, especialmente através dos serviços musicais de streaming (tecnologia de transmissão de dados pela internet que dispensa o download do conteúdo), vem garantindo que o mercado global de música gravada mantenha excelentes resultados (International Federation of the Phonographic Industry [IFPI], 2021). Neste contexto, a América Latina vem apresentando um crescimento rápido, sendo o Brasil seu principal impulsionador. Um estudo revela que, até 2020, o Brasil acumulava mais de 13 milhões de assinaturas pagas, incluindo os serviços não licenciados (Associação Brasileira de Música Independente [ABMI], 2020).
Entretanto, a relevância da música para a economia criativa estende-se além das grandes companhias do setor fonográfico. A indústria musical é um sistema complexo, que engloba diversos profissionais e organizações. Trata-se de um segmento econômico que fornece produtos e serviços em diferentes formatos: músicas gravadas, espetáculos musicais ao vivo, aulas de música, entre outros (Salazar, 2015). A música possui também um enorme poder de interação com diversos meios como rádio, televisão, cinema, teatro, publicidade, aplicativos e games (Dias, 2000; Hirsch & Gruber, 2015). Deste modo, os empreendimentos musicais movimentam, indiretamente, segmentos variados como rádio, TV, lojas varejistas, hotéis e restaurantes (Aggestam, 2007). Além disso, potencializam o crescimento de setores industriais como fabricação de instrumentos musicais, equipamentos eletrônicos e aparelhos de gravação e transmissão de som (Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro [FIRJAN], 2019).
Breve histórico do empreendedorismo musical
O empreendedorismo musical é um fenômeno relativamente antigo. Existem relatos que, já no século XVI, alguns músicos realizavam ações empreendedoras, iniciando e desenvolvendo seus próprios negócios ou projetos artísticos. O termo empreendedor foi originalmente utilizado em relação à música para referir-se ao chefe de um teatro musical ou diretor de uma instituição musical pública que promovia entretenimento. Um outro conceito relacionado seria o de ‘oportunista musical’, utilizado para descrever alguém capaz de perceber uma oportunidade relacionada à música e aproveitá-la com eficácia. Para destacar-se do intérprete convencional, o empreendedor musical deveria identificar um caminho inexplorado de composição ou performance e encontrar maneiras de realizá-lo. Para tanto, além de apresentar um estilo musical distinto e atraente, era necessário que fosse capaz de atrair público, realizar a autopromoção por meio da mídia impressa, liderar outros músicos e organizar produções complexas (Weber, 2004).
A partir do século XVIII, o setor editorial foi um dos mais explorados por músicos empreendedores. Além de atuarem como artistas, era comum que trabalhassem vendendo e publicando obras, como ilustra o exemplo da parceria entre o editor londrino John Walsh e o compositor Friederich Handel no lançamento de edições das suas óperas e oratórios. No século XIX, encontramos empreendedores musicais extremamente bem-sucedidos como Henri Herz, que combinou uma carreira de pianista, fabricante de pianos e empresário de uma sala de concertos. Outros nomes merecedores de atenção são Johannes Brahms, que parece ter poupado uma fortuna com venda de canções e Richard Wagner, que fundou sua própria casa de ópera. No campo da educação musical, destacam-se como empreendedores neste período John Hullah e Guillaume Wilhem.
As principais iniciativas empreendedoras da música no século XX estão relacionadas à indústria fonográfica. As invenções do fonógrafo, do gramofone e do disco de 78 rotações abriram os caminhos para o surgimento de uma indústria de gravações musicais, que se desenvolveria e atravessaria diversas transformações. Do advento dos discos de vinil até a criação do MP3, uma série de mudanças ocorreram no segmento (Dias, 2000). A partir do século XXI, a utilização de ferramentas tecnológicas alterou radicalmente a forma de empreender no setor de gravações musicais. A tecnologia digital reduziu os investimentos necessários por diminuir os custos de gravação, enfraquecendo a barreira de entrada para novos produtos. Isso potencializou o surgimento de muitos produtores musicais independentes, além de permitir a exploração de novos métodos de divulgação e distribuição (Nakano, 2010), que modificaram as relações de consumo na indústria da música (Hirsch & Gruber, 2015).
Tipologias e características do empreendedorismo musical
O empreendedorismo musical é um fenômeno multifacetado, que pode ser associado tanto às carreiras dos músicos freelancer e artistas independentes, quanto à criação de negócios e organizações musicais de portes variados. Os músicos (instrumentistas, arranjadores, cantores) que trabalham de forma autônoma, atuam como empreendedores de suas próprias carreiras. Estes profissionais enfrentam desafios semelhantes àqueles vivenciados durante a gestão de um empreendimento, preocupando-se com os custos dos seus serviços e produtos, além do preço final a ser cobrado por eles (Davies & Gauti, 2013). O campo profissional da música, com poucos empregos formais disponíveis, não lhes permite, muitas vezes, envolver-se em trabalhos fixos ou de longa duração. Nesse sentido, percebe-se que o caminho do empreendedorismo é escolhido frequentemente por uma questão de necessidade por estes profissionais, que podem ser classificados como “empreendedores acidentais” (Coulson, 2012). Os artistas que desenvolvem uma carreira autoral costumam empreender na música por meio de projetos independentes (Bridgstock, 2013). Esta postura de autossuficiência, caracteristicamente empreendedora, exige a busca contínua de oportunidades e o desenvolvimento de habilidades necessárias ao enfrentamento de constantes novos desafios (Bennett, 2009). Algumas características como a formação e exploração de redes de contatos, capacidade de aproveitar oportunidades e proatividade são marcantes e recorrentes na atuação deste tipo de artista empreendedor (Coulson, 2012; Davies & Gauti, 2013).
Mais próxima da noção tradicional de empreendedorismo, encontra-se a criação de negócios e organizações musicais. Nesta categoria, existem diversos pequenos empreendimentos: estúdios de ensaio e gravação, escolas de música e empresas especializadas em música para eventos sociais e corporativos. No mercado de música gravada, diferentes empresas coexistem em um ambiente bastante dinâmico. Além das grandes gravadoras internacionais (majors), geradoras de vultosas cifras, atuam diversas pequenas gravadoras independentes que representam também um importante segmento dentro do setor fonográfico, inclusive no Brasil (Associação Brasileira de Música Independente [ABMI], 2020).
O empreendedorismo musical tem aspectos peculiares. Embora alguns empreendedores da música sejam bastante pragmáticos e voltados aos resultados financeiros dos empreendimentos que desenvolvem, o empreendedorismo musical é, frequentemente, permeado por uma grande dose de idealismo e apreço por elementos estéticos. Além do aspecto econômico, existe uma lógica da “arte pela arte”, relacionada ao compromisso que os músicos mantêm com a originalidade artística, habilidade profissional, técnica e beleza (Caves, 2000; Marins & Davel, 2020). Para o músico, assim como para muitos empreendedores das artes, o trabalho está intimamente relacionado à realização pessoal, liberdade artística, autonomia para criar e realização de sonhos (Comunian & England, 2020; Scherdin & Zander, 2011; Wyszomirski & Chang, 2015).
Empreendedorismo musical baiano e a relevância da cidade de Salvador
A Bahia é um local reconhecido por sua tradição musical e caracterizado por sua diversidade de ritmos e pluralidade de estilos. O estado já revelou um grupo de talentos que inclui instrumentistas, compositores e intérpretes, atuantes em gêneros diversos como o samba de roda, o forró, o pagode e o samba reggae. No âmbito da economia criativa baiana, responsável por uma parcela relevante do valor agregado do PIB estadual (Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia [SEI], 2021), a música é um dos insumos mais importantes. Quase todas as atividades do setor cultural como festas, eventos e produções audiovisuais estão relacionadas com a música, que, por sua vez, sustenta diferentes tipos de empreendimentos como estúdios de gravação, bandas, empresas de sonorização, entre outros.
Neste contexto, a cidade de Salvador, capital do Estado da Bahia, eleita “cidade da música” pela UNESCO (G1, 2020), ocupa um lugar de destaque. A imponente presença da música na cidade, manifesta-se nos carros que passam nas ruas, nas lojas de conveniência de postos de gasolina ou nos batuques dos transportes públicos (Lopes, 2013). Somado a esta forte vocação artística, a cidade de Salvador apresenta também um sólido histórico de empreendedorismo musical. Já na década de 1950, por exemplo, destaca-se como iniciativa empreendedora a criação do trio elétrico. Desenvolvido por Antônio Adolfo Nascimento e Osmar Macêdo (Dodô e Osmar), o trio elétrico foi ampliado e modificado ao longo dos anos. Além da transformação cultural, essa invenção motivou o surgimento de uma nova indústria do entretenimento fora do eixo Rio-São Paulo, alavancando negócios em diferentes segmentos, que impulsionaram a economia local.
O empreendedorismo musical na cidade de salvador é marcado pela relação com a cultura afro-baiana (Fischer et al., 1993). Ao evidenciar nos palcos o ritmo, a dança e as indumentárias baseadas na cultura africana, a música produzida na Bahia torna-se configuradora de sentido e fonte de representatividade para a juventude negra (Lima, 2002). A partir dela, muitos jovens pobres soteropolitanos encontraram outras formas de expressão e estratégias de afirmação étnica (Lima, 2002). Esta marca identitária está no âmago de algumas das principais organizações musicais, como o Olodum, que, além da produção artística, exerce um papel extremamente relevante como promotor de desenvolvimento social e resistência cultural (Davel & Neves, 2017).
O empreendedor musical soteropolitano é tipicamente um indivíduo persistente e acostumado a lidar com muitas dificuldades. Para além do glamour dos grandes empreendimentos carnavalescos e das carreiras bem-sucedidas de algumas estrelas da música, impulsionadas, em alguns casos, por grandes gravadoras nacionais e internacionais, o empreendedorismo musical de Salvador inclui uma série de artistas emergentes, que lutam arduamente para conseguir seus espaços. O artista pobre baiano que tenta empreender em uma carreira artístico-musical, é obrigado a enfrentar uma série de adversidades como a falta de estrutura dos locais onde ocorrem os shows e limitadas oportunidades de apoio institucional.
Caso para ensino
Janílson (conhecido como Pepeta) sonha em empreender uma carreira musical autoral. Com 22 anos, este artista da música é oriundo do Garcia, bairro da cidade de Salvador, Bahia, terra de grande tradição em festas populares e berço de gêneros musicais como o axé e o pagode.
Empreendendo no fogo da paixão
Durante a sua infância, Janílson era um garoto comum. Assim como as demais crianças que moravam no Garcia, bairro soteropolitano em que foi criado, se entretinha em discussões sobre futebol, campeonatos de skate e outras brincadeiras. Foi na adolescência que despertou seu gosto pela música. Influenciado por seu tio Giba, um sujeito ‘boa gente’, admirador de poesia e com ótimo gosto musical, passou a ouvir cantores e grupos musicais de diversos estilos. Daí em diante, foi no mundo dos sons, ritmos e melodias que passou a criar um crescente interesse. Nas festas que começou a frequentar, era sempre a banda atuante ou o som do DJ que lhes roubavam a atenção. Aos poucos, a paixão pela música começou a direcionar Janílson rumo a um sonho que sua mãe, dona Lurdes, via com uma séria resistência: tornar-se um empreendedor da música! Um artista profissional!
DONA LURDES – “Lá vem esse menino assoviando e batucando alguma coisa”. Vive com essa cabeça na lua, pensando em cantar e tocar violão. Devia era se concentrar no curso técnico pra conseguir um emprego sério.
VIZINHA – É, Lurdes... essas coisas de música... não sei não. Começa querendo ser artista... daqui a pouco está se metendo com o que não presta.
Por outro lado, encontrava no tio Giba, seu grande admirador, apoio incondicional. Assim como outros amigos de Janílson, costumava chamá-lo de Pepeta, um apelido de infância.
JANÍLSON – Tio Giba, estive pensando em algo. Como o senhor sempre me incentiva, gostaria de te contar.
TIO GIBA – O que é, Pepeta?
JANÍLSON – Quero ser artista profissional! Cantor e compositor!
TIO GIBA – Que maravilha! Tenho certeza que com essa voz e esse talento pra compor, você vai longe! Qual será o estilo? Axé? Adoro aquela Banda Amor de Mel... Ia muito atrás do trio deles, no Carnaval...
JANÍLSON – Não, tio. O que está no auge agora é “Modão”, um tipo de música sertaneja.
TIO GIBA – Não conheço muito essas músicas atuais, mas tenho certeza que você vai se dar muito bem no seu projeto.
A ideia de iniciar uma carreira artística era presença constante na cabeça de Janílson. Vivia sonhando em transformar sua paixão musical em realidade, virar um artista profissional. Apesar disso, não tinha a menor ideia de como realizar esse projeto. Certa tarde, um vídeo promocional do Instagram saltou na tela do seu celular com uma oferta promissora: “Empreenda na música”. Era o anúncio de um site que oferecia dicas sobre como iniciar carreiras artísticas. De acordo com o site, era preciso gravar uma música, divulgar na internet e começar a colecionar seguidores.
Parecia tudo muito fácil. Afinal de contas, talento não lhe faltava, e algumas pessoas que já haviam escutado suas canções sempre lhes faziam boas avaliações. Entretanto, até para realizar uma simples gravação demo, era necessário um investimento. Para resolver essa questão, só existia uma alternativa: mexer nas economias que estavam reservadas para o curso técnico. Isso significava, ao mesmo tempo, investir todo o dinheiro que havia poupado e enfrentar a fúria de dona Lurdes, sua mãe, quando soubesse dos seus planos. Depois de refletir sobre o assunto e tomado por uma força meio impulsiva, Janílson decidiu:
- Vou gravar a demo. Sonho é sonho, não tem preço. Além do mais, tenho certeza que com o retorno que isso vai trazer, poderei repor o dinheiro do curso. Se é que ainda vou precisar fazer curso depois que minha carreira decolar!
Estava decidido. Realizaria sua primeira gravação com uns músicos que conhecia e divulgaria o trabalho na Internet! Agora, era só selecionar as canções, ligar para os músicos, agendar os ensaios e pronto! Assim, tomado por uma alegria enorme e movido pela antiga paixão pela música, o jovem cantor tinha a motivação necessária para lançar-se no mundo do empreendedorismo artístico.
Os três instrumentistas escolhidos para a gravação foram o Chagas na guitarra, Betão na bateria, Chacal no baixo e, claro, voz, violão, composição e arranjos do próprio Janílson. A paixão do futuro empreendedor musical pelo projeto convenceu os músicos de que aquele trabalho geraria shows no futuro, o que fez com que aceitassem gravar a demo sem nenhum custo. Em seguida, fechou a sessão de gravação no estúdio KISSOM, principalmente por causa do técnico Marcão, conhecido por suas ótimas mixagens[1]. Seguindo a sugestão do guitarrista Chagas, terminou adicionando também um músico para tocar teclado e acordeom.
CHAGAS: Janílson, Modão sem um teclado para dar aquela pegada pop não rola! Também precisa de acordeom. Se não, fica ruim.
JANÍLSON: Eu não conheço nenhum tecladista que tope tocar de graça, Chagas. Muito menos um acordeonista.
CHAGAS - Tem um cara chamado Deda, que toca os dois instrumentos. Fera demais, já trabalhou até com o Carlos Vieira (famoso cantor sertanejo). Só que vai cobrar cachê.
JANÍLSON - Cachê? Quanto?
CHAGAS - Para gravar as 5 músicas... uns 2.500 reais.
JANÍLSON – O que? Loucura! Fica sem teclado.
CHAGAS - Mas, é um investimento! Quer ou não gravar algo de qualidade? Posso conversar com ele e tentar fechar um pacote. Posso dizer que você é um artista iniciante.
O Chagas convenceu o tecladista Deda a reduzir um pouco o cachê, que terminou ficando 2.000 reais. Mesmo assim, depois de somados os valores do estúdio de ensaio, das horas de gravação previstas, além da alimentação dos músicos, os números começaram a preocupar o jovem artista empreendedor. 2.000 reais do cachê do Deda, mais 500 reais do estúdio, 1.000 reais de gravação e 100 do almoço e lanche do pessoal durante esses dias... totalizaram 3.600 reais!!
Os ensaios foram marcados no próprio estúdio em que gravaria as músicas. Deste modo, o técnico Marcão já poderia conhecer a sonoridade da banda antes de realizar a gravação. Foram 5 encontros que até renderam bons resultados. Os músicos aprenderam rápido os arranjos musicais que Janílson preparou e elogiaram bastante as composições. O único que não participou dos ensaios foi o tecladista Deda, a “estrela da banda”, pois afirmou que bastava ouvir as gravações do ensaio pelo celular mesmo, que ele chegaria preparado no dia que marcassem para gravar.
Até então, as coisas estavam fluindo relativamente bem. A alegria por estar ensaiando suas próprias composições era indescritível. Entretanto, como se não bastasse o dinheiro investido, Janílson estava prestes a experimentar o que todo empreendedor inevitavelmente enfrenta: os percalços do empreendedorismo. Logo, ele descobriria que, na prática, empreender não é apenas prazer e realização pessoal. Significa lidar com uma série de imprevistos e adversidades que exigem bastante energia, do ponto de vista emocional.
Enfrentando as primeiras dificuldades e vivenciando as primeiras emoções
No dia da gravação, foi muito nervosismo! Janílson, que nunca fizera nada parecido, descobriu que empreendedor artístico acumula mil e uma funções. É motorista, carregador, comprador de lanche, organizador de horários... ufa! Como saiu de casa com antecedência, mesmo com tanta coisa para fazer, chegou ao estúdio com todos os músicos na hora certa. Bateria montada, guitarra afinada, tudo no ponto. Só faltava o tecladista Deda. A gravação estava marcada para às 14:00. Entretanto, já eram 13:45 e nada da estrela aparecer.
Janílson resolveu telefonar para o Deda, que atendeu sem muita pressa.
DEDA: Alô! Eu ia te ligar. Meu carro está na oficina e não ficou pronto. Ainda estou em casa. Você não poderia me pegar?
JANÍLSON: Como assim? Por que você não avisou antes? Já estamos em cima da hora. Se eu sair agora, vai atrasar ainda mais. Faz o seguinte: Pega um Uber que eu pago.
DEDA: Tudo bem. Chego em 20 minutos.
Janílson controlou os nervos. Mas, já ficou irritado com a irresponsabilidade do músico!
Uns 30 minutos depois, o Deda chegou e a gravação, já com 1 hora de atraso, foi iniciada. Junto com ela, começou um verdadeiro festival de imprevistos. Falha em um microfone, um músico erra uma nota, o próprio Janílson esquece um trecho da letra... e o relógio, que não perdoa, não parava. Resultado: o tempo acaba; das cinco músicas que deveriam ser gravadas, ficaram prontas apenas duas. O dono do estúdio não podia prolongar o tempo, pois já havia agendado uma outra banda para o período seguinte.
Janílson saiu frustrado e cansado. A tristeza era evidente. Assim que concluíram a gravação, esperou que o técnico Marcão lhe entregasse uma prévia das duas músicas prontas e mixadas e as transferiu para seu pen drive. Apesar, dos imprevistos, as duas músicas ficaram com uma qualidade razoável. Pelo menos, era o suficiente para um pontapé inicial.
No dia seguinte, com a cabeça mais descansada, Janílson acordou mais empolgado. A primeira coisa que fez foi criar um canal no Youtube e uma conta no Instagram com o seu nome: “Janílson Ribeiro”. Fez o upload das duas músicas para as redes sociais, adicionou um monte de hastags: “#modao”, “#modaoestourado”, #janilsoribeiro”, dentre outras. Além disso, começou a mostrar as músicas gravadas para seus amigos Lana, Moacir e também seu grande admirador: o tio Giba. As impressões foram ótimas. Todos adoraram as músicas e comentaram que já tinham uma cara de sucesso.
Aproveitando que já estava na rua, Janílson resolveu passar em dois bares para deixar uns cartões de visita e dois pen drives com as gravações promocionais, além do link para o Instagram. Os donos não estavam presentes, mas os gerentes garantiram que entregariam o material. Além disso, passou na sede da rádio local para falar com o responsável pela programação e entregou as músicas. A rádio reservava um horário para tocar canções de artistas novos, o que era uma excelente oportunidade!
Parecia que tudo estava encaminhado. O trabalho havia sido iniciado: os contatos feitos, redes sociais prontas e as pessoas elogiavam as músicas. A empolgação e a alegria voltaram a tomar conta da cabeça de Janílson. Finalmente, a sua paixão pela música estava sendo vivenciada na prática. Transformara-se em um artista empreendedor! Todavia, essa experiência de empreender na música era uma montanha russa de emoções. Um dia a ansiedade, no outro a alegria, em seguida uma tristeza e logo uma felicidade.
Encarando a frustação do fracasso empreendedor e artístico
Durante aquela semana, a cada meia hora Janílson checava o canal do Youtube e o Instagram para ver o engajamento dos seguidores. No primeiro dia, apareciam apenas as visualizações e comentários dos amigos. No segundo dia, também. No terceiro... a mesma coisa. As checadas de meia em meia hora passaram a ocorrer a cada uma hora, depois a cada turno... depois a cada dia. E, nada de visualizações... nem de pessoas comentando sobre as músicas. A quantidade de curtidas não aumentava, mas a ansiedade... crescia ferozmente.
Para piorar, ao entrar em contato com todos aqueles que receberam sua demo na semana anterior, percebeu que, assim como no mundo virtual, nenhum progresso tinha ocorrido. Dos dois bares que entregou o pen drive, o primeiro fechou contrato com outro cantor de estilo muito parecido com o seu e o segundo... não respondeu nada. Quanto à rádio, o responsável pela programação que parecia tão simpático no primeiro encontro, respondeu em uma mensagem fria pelo WhatsApp que não tinha escutado direito a música. Disse ainda que percebeu que haviam poucos seguidores no Instagram e precisava melhorar a sua comunicação nas redes antes de entrar na programação.
De repente, o desânimo invadiu a mente de Janílson. No final das contas, as duas músicas gravadas com tanto esforço não o estavam levando a lugar nenhum. Não possuía muitos seguidores além dos amigos e nem conseguia a atenção da rádio, dos bares... nada.
JANÍLSON: E agora? Será que isso tudo é uma grande ilusão? Utilizei todo o dinheiro que tinha para gravar aquela demo... O dinheiro do curso técnico.... Será que minha mãe estava certa? Será que essa história de ser artista profissional é apenas um sonho sem futuro?
A angústia e a frustração dominaram seus pensamentos. Em apenas uma semana, descobriu como é difícil empreender. Mais do que o prejuízo financeiro, o desgaste emocional não tinha consolo. Parecia que estava sem forças para reagir, como um pugilista que nem consegue ficar de pé, muito menos defender-se ou contra-atacar. Chegou até mesmo a afastar-se das pessoas. Tinha vergonha de responder as mensagens dos amigos e até dos músicos que gravaram as demos. Temia o estigma que muitas vezes é associado às pessoas que fracassam.
Quinze dias depois da gravação, o estúdio onde gravou as duas músicas entrou em contato avisando que a versão definitiva estava pronta. Entretanto, a ligação não empolgou muito Janílson. Depois dos resultados pífios da divulgação da prévia, Janílson nem estava mais animado para ouvir a versão definitiva. Mesmo assim, foi até o estúdio, inclusive porque ainda precisava pagar a segunda parte da gravação. Que tristeza!
DONO DO ESTÚDIO: Bom dia! Está divulgando as músicas? Já fechou muitos shows?
JANÍLSON: ... estou divulgando aos poucos... e estou para fechar algumas coisas...
O dono do estúdio KISSOM, observando o desânimo de Janílson e percebendo que as músicas não trouxeram nenhum resultado, fez uma cara de indiferença. Era um tipo de sujeito que não se importava muito com os problemas alheios. Além de não ligar para o insucesso do rapaz, ainda aproveitou para oferecer um desconto, caso decidisse gravar novas músicas. E, logo em seguida, foi saindo da sala.
Janílson, indignado, pensou sem falar nada: gravar mais músicas? Está de brincadeira? Mal pude pagar por essas que não me renderam nada, e ainda quer que eu grave mais? Egoísta, usurário...
Ouvindo a conversa e já percebendo a frustração de Janílson, o técnico Marcão se aproximou.
TÉCNICO MARCÃO: Fala, Janílson! A mixagem da demo ficou legal? Olha, essa versão definitiva que fiz ainda está melhor.
JANÍLSON: Olá Marcão! Ficaram ótimas! Obrigado pela força que você me deu no dia da gravação. Mesmo naquela correria, você fez um trabalho excelente! Tenho certeza que a definitiva ainda está melhor. O problema é outro...
TÉCNICO MARCÃO: Qual é?
JANÍLSON: Eu estou com vergonha. Mas, vou desabafar. Eu divulguei as duas músicas para muita gente, nas redes sociais, e nada! Além do mais, nenhum bar ou rádio se interessou... A coisa não anda. Será que não tenho talento? Eu sei que você já gravou um monte de bandas e tem experiência. Pode dar a sua opinião sincera. Estou pronto para ouvir.
Marcão era um técnico experiente. Trabalhou em gravadoras importantes por muito tempo e viu diversos artistas surgirem e desaparecerem.
TÉCNICO MARCÃO: Olha Janílson... já que está me pedindo uma opinião... vou ser bem sincero. Quer mesmo ouvir?
JANÍLSON: Claro que quero! Não tenho talento? É isso?
TÉCNICO MARCÃO: Não é nada disso. Você tem muito talento. Adorei a sua voz. Mas, assim que vocês começaram a gravar, eu já percebi um problema.
JANÍLSON: Qual foi?
TÉCNICO MARCÃO: As canções são legais. Mas, não têm muita autenticidade. Parecem demais com o que já está tocando no mercado. Falta inovação.
Janílson que julgava estar pronto para ouvir críticas se sentiu um pouco ofendido.
JANÍLSON: Inovação? Mas, não dá para ficar reinventando a roda. Modão é isso mesmo. Além disso, todo mundo gostou.
TÉCNICO MARCÃO: Está vendo? Você está na defensiva. Não quero te ofender. Se quiser, não falo mais nada. Só achei que queria ouvir a opinião sincera de um velho profissional do ramo.
JANÍLSON: Desculpa, você está certo. Estou deixando o meu ego atrapalhar. Acho que não quero enxergar a verdade. Estou tão triste que pensei em desistir...
TÉCNICO MARCÃO: Nada disso! Você tem muito potencial e vontade. Só precisa da estratégia certa. Empreender na música não é moleza. Não basta gravar uma canção e achar que vai ser um sucesso. Você precisa criar um produto musical inovador, que se diferencie dos demais. Além disso, não pode se deixar abater diante de uma primeira tentativa malsucedida.
Janílson sentiu-se estimulado pelas palavras positivas que aquele técnico proferia e voltou a esboçar um tímido sorriso.
JANÍLSON: Como acha que posso ser original então?
TÉCNICO MARCÃO: Tem vários aspectos. Talvez você precise de uma reformulação total. É possível que essas gravações... não sirvam!
JANÍLSON: Não Marcão! Desculpa, mas não vou jogar fora o que eu já produzi.
TÉCNICO MARCÃO: Calma! Eu sei que é complicado. Mas, será que adianta insistir em algo que não funciona? É preciso pensar com a cabeça de artista, mas também ser realista. Além disso, será que Modão é a sua verdadeira vocação? Se a sua música não te emociona de verdade, não vai emocionar ninguém... Tem mais, será que em Salvador o pessoal se identifica culturalmente com isso? Será que não falta baianidade?
Janílson ficou paralisado. Por um lado, não queria abandonar o que havia produzido. Mas por outro lado, as palavras de Marcão mexeram profundamente com ele. Talvez o Modão tivesse sido escolhido por ser um gênero do momento, mas não se alinhasse tanto com o seu gosto musical e nem causasse uma identificação cultural forte com grande parte do público da cidade.
JANÍLSON: Caramba! Talvez você tenha razão. Mas, como vou gravar novamente se não tenho mais dinheiro?
Marcão, abaixando a voz para que o dono do estúdio não escutasse, falou:
- É o seguinte. Eu trabalho aqui e não posso afugentar os clientes. Mas, sei que o dono não está nem aí para dificuldade dos artistas. Hoje em dia, todo mundo está fazendo suas produções independentes. Em casa mesmo. Claro que não é fácil tirar um som maravilhoso de primeira. Mas, com um equipamento barato, é possível para gravar demos em casa com boa qualidade. Pelo menos experimentar o projeto piloto. Depois, dependendo do resultado, você pode investir mais.
JANÍLSON: Mas, nem equipamento eu tenho.
TÉCNICO MARCÃO: Hum... Olha, você é um cara legal e amigo do Chagas, que é um ser humano de primeira. Além disso, apesar desses cabelos grisalhos aqui, ainda sinto o meu coração bater quando vejo um artista talentoso, com aquela paixão típica dos que vencem na carreira. Aparece tanto músico arrogante aqui que disse que não ajudaria mais ninguém, mas vou te dar uma força.
A fim de ajudar Janílson em seu projeto empreendedor, Marcão ofereceu emprestado um equipamento antigo que tinha em casa. Um notebook, uma placa de som e um microfone. O material já era um pouco ultrapassado, mas possibilitava um resultado razoável para o propósito. Sem o tratamento acústico adequado do estúdio, Janílson teria que improvisar um espaço de gravação em casa mesmo. Mas, nada que uma boa dose de criatividade e força de vontade não compensassem.
Degustando a alegria da realização e realimentando a paixão pelo empreendedorismo artístico
Além de ajudar com o empréstimo do material, Marcão deu umas dicas de produção musical muito importantes. Sugeriu que Janílson realizasse uma pesquisa com diferentes gêneros que estavam em alta no momento, avaliasse o cenário internacional e também a música tradicional da cidade. A ideia era criar algo que misturasse tendências atuais com elementos culturais da música de Salvador.
Depois de duas semanas ouvindo muitas coisas diferentes, Janílson começou a experimentar algumas batidas novas no computador, misturando um pouco de tudo aquilo. As primeiras tentativas soaram meio estranhas, mas depois de algumas adaptações, começaram a surgir ideias interessantes. Faltava agora ouvir algumas opiniões para ver se aquilo agradava outros ouvidos. O primeiro a opinar foi o Chagas, seu guitarrista e amigo.
JANÍLSON – Olá. Tudo bem? O que você acha?
CHAGAS – Eu acho balançado. A introdução é bem legal. Será que o público vai receber bem? É muito diferente...
JANÍLSON – Eu tentei lançar uma coisa lugar comum e não deu em nada. Se eu quiser me destacar, tenho que inovar. O Marcão deu essa dica e concordo com ele. Inovação envolve risco. Se não for algo novo, não é arte, nem empreendedorismo. Tem que ter coragem e experimentar.
CHAGAS – Bem, isso é verdade. Além do mais, acho que Salvador gosta de novidade e é criativa por natureza. A terra tem vocação pra absorver coisas novas. De qualquer modo, eu colocaria algo que “grude” mais no refrão.
JANÍLSON – Pode ser. Tem que ser diferente. Mas, sem perder a pegada popular. Boa sugestão!
Janílson fez alguns ajustes adicionais e marcou com os músicos a gravação definitiva das novas canções. Depois de pronto, só precisou levar o arquivo no estúdio KISSOM para que Marcão realizasse um ajuste final na mixagem. Foi mais um investimento, mas valeu a pena. Além do mais, ter gravado a voz e os instrumentos em casa já havia possibilitado uma economia substancial.
MARCÃO – Gostei muito do resultado. Acho que você incorporou bem as dicas. Está me lembrando um pouco do que rolou no Axé dos anos 1990, mas com uma influência dos estilos atuais e ainda essa pitada eletrônica. Arrebentou!
Terminada a mixagem, Janílson voltou a procurar as rádios locais, os bares e, claro, divulgar o novo trabalho na Internet. Passada a frustração do fracasso com as primeiras músicas, a paixão artística estava sendo realimentada. Dessa vez, o resultado foi bem mais positivo. Aos poucos, o número de seguidores do Instagram foi aumentando e as oportunidades de tocar ao vivo foram surgindo. A rádio continuou sem mostrar muito interesse pelas músicas, mas aqueles primeiros resultados já encheram Janílson de empolgação novamente. A cada novo pequeno degrau que subia, uma nova alegria surgia.
Resistindo aos extremos emocionais
O projeto de Janílson parecia estar bem encaminhado. Com shows acontecendo e algum dinheiro entrando. Nesse período, surgiu a oportunidade de um show privado com um cachê bem razoável. O problema era que o lugar não possuía nenhuma estrutura e o próprio Janílson teria que conseguir a sonorização.
Depois de uma série de contatos, conseguiu fechar um som razoável, que atenderia os pré-requisitos do local. Contratou um técnico de som que foi indicado por Marcão e tudo parecia correr bem. Infelizmente, um imprevisto terminou mudando tudo. Na última hora, o técnico terminou fechando um outro show e enviou um outro profissional para substituí-lo. Já na passagem de som, a banda não se entendia muito bem com o novo técnico que, além de ser limitado, pecava pelo excesso de volume.
JANÍLSON – Como é seu nome mesmo? Bigu, não é? Eu acho que os retornos estão muito altos. É possível abaixar um pouco o volume?
CHAGAS – É verdade, eu também estou achando o som que vai para o público muito alto. Estamos ouvindo de dentro do palco
BIGU – Relaxa galera, estou acostumado com show. Tem que ter volume, tem que ferver!
Apesar de não concordarem com a opinião do técnico, o show começou. O público até que estava gostando da música, mas a questão do volume alto permanecia. Por mais que os músicos sinalizassem a insatisfação, o técnico insistia em manter sua posição. Foram várias tentativas de conversa, mas não tinha jeito. Em um determinado momento, a situação ficou insuportável. Já com a cara fechada, Janílson tentou conversar mais uma vez com o técnico sobre o volume e dessa vez já foi recebido com uma certa rispidez.
JANÍLSON – Realmente, o volume está alto demais. Até o público já está fazendo sinal para abaixar!
BIGU – No meu som quem mexe sou eu. Não confia, por que contratou?
Quando Janílson ia confrontar a teimosia do técnico, uma surpresa extremamente desagradável aconteceu. Funcionários da prefeitura com aparelho de medição de som já estavam perto do palco. Era a SUPS, órgão municipal responsável pela fiscalização de poluição sonora, que havia sido chamada para resolver o problema por algum vizinho. Um dos funcionários já fazia sinal para que a banda parasse...
FUNCIONÁRIO – Boa noite! Desculpe, mas os senhores vão precisar interromper o show. Recebemos uma série de denúncias de som alto e, pelo que constatamos, está muito além do volume permitido. Quem é o responsável pelo equipamento?
JANÍLSON – Sou eu! Desculpem, eu sei que o som estava muito alto, mas vamos abaixar.
FUNCIONÁRIO – Amigo, sinto muito, mas essa é a segunda reclamação do mês neste mesmo local, vamos ter que apreender tudo...
JANÍLSON – Segunda reclamação do mês? Nunca toquei aqui antes! Nem sei do que está falando. Ninguém vai levar esse som! Ele nem é meu!
FUNCIONÁRIO – Olha companheiro, se você não nos deixar cumprir o nosso trabalho, vou ter que chamar a polícia.
JANÍLSON – Chamem quem vocês quiserem! Esse som daqui não sai!
A discussão foi se acalorando e, pouco tempo depois, a polícia chegou. Janílson, que estava bastante nervoso, terminou se exaltando. Um dos policiais, argumentando que o músico estava lhes faltando com respeito, terminou prendendo o rapaz. Sob os olhares do público e do contratante, Janílson foi sendo levado para fora do local.
JANÍLSON – Que situação, meu Deus! Não é possível! Estava tudo bem. Se aquele técnico irresponsável tivesse me escutado, nada disso teria acontecido. Que vergonha! Que raiva! Que tristeza!
Aquele imprevisto foi um choque para Janílson. Será que precisava enfrentar tantas coisas para ser empreendedor? O começo já tinha sido tão difícil! E agora, mais isso! Considerou parar com tudo. Nunca se sentira tão desanimado.
Equilibrando a emoção de empreender de verdade
Um ano depois da primeira tentativa empreendedora de Janílson, muita coisa havia mudado. Apesar das confusões, o projeto empreendedor não parou. O estilo novo que estava experimentando não se tornou exatamente uma explosão nacional, mas acumulava uma crescente base de fãs. Com o dinheiro dos shows e até alguma renda online gerada pelos downloads pagos e monetização do Youtube, a vida de empreendedor musical da própria carreira já era uma realidade. A confusão que ocorrera no fatídico show, afinal, terminou se resolvendo. A prisão foi uma coisa rápida e, depois de pagar uma multa, o som também foi recuperado.
As dificuldades continuavam presentes, mas o trabalho tornava-se cada vez mais satisfatório. Em uma pequena reunião de amigos que organizou, o bate papo mostrava que a situação já era bem diferente.
TIO GIBA – Puxa Janílson, fico feliz que as coisas estejam caminhando bem. Olhei o Instagram ontem e vi que o número de seguidores está aumentando bastante.
LIA (amiga) – Minhas amigas amam as músicas. Vivem perguntando quando sai um vídeo novo, que dia vai ter show...
MOACIR (amigo) – A galera da faculdade também é fã.
CHAGAS – Além disso, de pouquinho em pouquinho, tem rolado no mínimo dois shows por semana. Evento social, bar, não deixa de pintar sempre uma coisinha. O bolso do guitarrista aqui agradece muito.
JANÍLSON – Esses shows são mérito de Sandra, nossa produtora! Desde que começou a trabalhar comigo, as coisas melhoraram muito! Crédito para ela!
SANDRA (produtora) – Opa! Obrigada pelo reconhecimento. Mas, sem o talento e a força de lutador desse artista maravilhoso, nem a melhor produtora daria jeito. Eu sei que a luta do dia-a-dia não é brincadeira.
DONA LURDES – Esse meu filho não é fraco. Até hoje tenho medo da instabilidade dessa carreira de artista empreendedor. Mas, eu sei que sem isso ele não se realiza. Acho lindo essa capacidade de enfrentar os problemas e essa alegria que ele mostra nos olhos quando fala da música dele.
JANÍLSON – Obrigado Sandra, mainha e vocês todos. Eu confesso que tem semanas que bate um desânimo imenso. Aquela vez que a SUPS apreendeu o som do show mesmo.... até preso eu fui! Parece que a gente perde as forças. Mas, empreender na arte é isso mesmo. Sem resiliência emocional para enfrentar as batalhas, não tem artista empreendedor que fique de pé e continue realizando arte. Acho que é a paixão pela música que me dá essa sustentação. E o apoio dessas pessoas maravilhosas que me cercam, claro!
Vejam como são as coisas: foi por causa do fracasso dos primeiros lançamentos que terminei mudando o estilo das músicas e compondo outras. O que parecia um desastre terminou virando oportunidade. Devo isso ao Marcão; foi ele que me deu essa luz. Pena que não pôde vir hoje tomar uma cerveja com a gente.
TIO GIBA – Tudo isso só te deixou mais forte. Essa rádio ainda vai implorar pra tocar sua música...
JANÍLSON – Haha. Tio Giba, você é uma figura. Não importa se vou fazer sucesso nacional. O mercado musical está mudando muito. Se eu tiver meu nicho e continuar fazendo meu empreendimento artístico crescer sempre um pouquinho mais, isso já me deixa feliz. Bem... mas se uma emissora dessas me chamar pra um programa... até que topo.
CHAGAS – Falou o rei do próximo reality show!
Todos caem na gargalhada e brindam.
Notas de ensino
Sinopse
O caso narra a história de um jovem artista da música, residente na cidade de Salvador, que decide empreender em seu trabalho musical. Durante sua jornada, enfrenta todos os movimentos e desafios emocionais típicos de um empreendedor. Dentro de uma complexa dinâmica emocional, o artista empreendedor aprende a adaptar ideias, a enfrentar dificuldades e a estabelecer parcerias. O caso pode ser útil para estudantes de administração e empreendedorismo, mas também para empreendedores culturais, artistas e administradores em geral.
Objetivos educacionais
O caso busca provocar reflexões que levem o estudante a:
● Compreender a importância e os desdobramentos das emoções para o empreendedorismo,
● Conhecer a perspectiva sociocultural da emoção no contexto do empreendedorismo, e
● Discutir como a emoção é fundamental e intensa no contexto do empreendedorismo artístico.
Fonte de Informações
O caso foi construído a partir de diferentes fontes: (a) observação de várias situações enfrentadas por artistas empreendedores, (b) experiências profissionais do primeiro autor deste trabalho como empreendedor no campo das artes (especificamente no segmento da música) e (c) uma pesquisa desenvolvida a partir de experiências pedagógicas na graduação em Música da uma Universidade Federal.
Ao longo de 25 anos de trajetória profissional, o primeiro autor atuou como instrumentista, arranjador e diretor musical em produtoras de áudio, orquestras, shows musicais autorais (Carla Visi, Lazzo Matumbi, Caetano Veloso, Beto Guedes, entre outros) e produções teatrais (Carne Fraca, Quem inventou o amor foi Roberto Carlos). Essas experiências o permitiram acompanhar com proximidade as emoções vivenciadas pelos artistas empreendedores em diversas situações. Este importante aprendizado foi registrado na forma de diário de anotações de experiências a partir de várias fontes (cartazes, vídeos, fotos e matérias de jornais). Somado a isso, o primeiro autor possui experiência pessoal como empreendedor. Além de fundar e coordenar diferentes grupos musicais, criou e dirigiu uma escola de música e uma empresa de eventos especializada em música ao vivo, sonorização e iluminação. Essa vivência foi também registrada na forma de diário de anotações de experiências e gerou vários documentos (cartazes, contratos, programas de apresentações musicais e matérias de jornais).
Outra fonte importante de dados provém de uma pesquisa desenvolvida a partir de experiências de ensino na graduação em música de uma universidade federal, durante 24 meses. Em um componente curricular direcionado ao ensino do empreendedorismo musical e administração de carreira, os estudantes criaram produtos musicais inovadores e os apresentaram em um evento musical. Durante todo esse processo de aprendizagem do empreendedorismo na prática, foram utilizadas para desenvolver a pesquisa diferentes técnicas e fontes de coleta de dados (documentos produzidos pelos participantes, observação direta, vídeos e entrevistas semiestruturadas). Os documentos produzidos pelos participantes foram divididos em duas categorias: documentos de aprendizagem emocional (que forneceram informações sobre o que os estudantes aprenderam e experimentaram em termos de emoções) e documentos de aprendizagem contextual (que forneceram informações sobre o que os estudantes aprenderam em relação a outros tópicos específicos). Foram desenvolvidos dois tipos de observação direta: observação direta focada, voltada a absorver o máximo de informações a respeito dos aspectos emocionais relacionados ao processo de educação empreendedora e observação direta estendida, que objetivou colher informações a respeito dos processos de ensino e aprendizagem. Os vídeos foram organizados em três categorias: vídeos de aulas online (gravações de aulas), vídeos de performance (gravações das apresentações dos produtos finais em palco ou em formato digital ao vivo) e vídeos pós-performance (gravações pós-performance de entrevista realizada por um jornalista). Também foram realizadas entrevistas coletivas e semiestruturadas que serviram ao propósito de comparar o que os estudantes escreveram nos documentos que produziram e o que afirmaram na entrevista em tempo real. O roteiro de entrevista foi utilizado como guia, permitindo que o espaço para a sondagem e algumas perguntas de acompanhamento fossem também improvisados no momento.
Todas estas fontes (observação de situações enfrentadas por artistas empreendedores, experiências empreendedoras do primeiro autor deste trabalho e resultados de uma pesquisa desenvolvida a partir de experiências pedagógicas) inspiraram a criação do caso para ensino. Deste modo, embora situações e nomes fictícios tenham sido utilizados na estória, as informações são inspiradas em uma série de situações verídicas.
Uso pedagógico
Primeiro Momento - Preparação do caso
Os estudantes devem preparar-se previamente, realizando leituras antes dos encontros em sala de aula. Devem ler os textos de Ávila e Davel (2019 e 2020), Marins e Davel (2020) e Le Breton (2019, capítulo 3).
Segundo Momento – Leitura do caso
Em sala de aula, ocorre a leitura dramática do caso para ensino. Para esta atividade, estima-se que seja necessária uma média de 35 minutos. Sugerem-se as seguintes atividades:
a) Distribuir o texto do caso para todos os estudantes.
b) Estabelecer de 20 a 30 minutos para que todos possam fazer uma leitura inicial e individual do caso.
c) Selecionar 14 estudantes, um para cada personagem do caso (um narrador e 13 personagens). A escolha dos estudantes pode ser feita aleatoriamente ou por aptidão para leituras dramáticas.
d) Posicionar os estudantes escolhidos na frente da turma, de maneira mais destacada, para realizarem a leitura. Solicita-se a esses estudantes que tentem fazer uma leitura encenada, para dar vida aos personagens e animar, dramaticamente, o caso.
e) Discutir a leitura encenada do caso, solicitando que os estudantes exponham suas percepções sobre os acontecimentos.
Terceiro Momento: Análise do caso
Para a processo de análise do caso, sugere-se as seguintes atividades:
a) Dividir a turma em equipes de até quatro pessoas.
b) Solicitar discussão e elaboração, em cada equipe, de uma resposta para a Questão #1, a ser apresentada para a turma.
c) Apresentar a resposta que cada equipe elaborou para a Questão #1. As discussões podem ser realizadas logo após a apresentação de cada equipe ou no final, depois de todas as apresentações.
d) Solicitar discussão e elaboração, em cada equipe, de uma resposta para a Questão #2, a ser apresentada para a turma.
e) Apresentar a resposta que cada equipe elaborou para a Questão #2. As discussões podem ser realizadas logo após a apresentação de cada equipe ou no final, depois de todas as apresentações.
f) Solicitar discussão e elaboração, em cada equipe, de uma resposta para a Questão #3, a ser apresentada para a turma.
g) Apresentar a resposta que cada equipe elaborou para a Questão #3. As discussões podem ser realizadas logo após a apresentação de cada equipe ou no final, depois de todas as apresentações.
Questões para Discussão
1) Com base em Ávila e Davel (2019), como a emoção se justifica, se manifesta e impacta a atividade do empreendedorismo no caso estudado?
2) Com base em Ávila e Davel (2019) e em Le Breton (2019, capítulo 3), como as emoções que permeiam o processo empreendedor no caso estudado podem ser compreendidas a partir de uma perspectiva sociocultural?
3) Com base em Ávila e Davel (2019 e 2020) e em Marins e Davel (2020), como as emoções se manifestam intensivamente no contexto do empreendedorismo artístico do caso estudado?
Análise do caso e conexão com a literatura
Questão #1
Ávila e Davel (2019) expressam de modo contundente a importância das emoções dentro do processo empreendedor. Com amplo amparo teórico, o artigo explicita que o empreendedorismo é uma atividade extremamente emocional, na qual os envolvidos experimentam intensas relações afetivas (Cardon et al., 2005; Goss, 2008). Os autores identificam que diferentes tipos emocionais (paixão, vergonha, arrependimento, medo, alegria, etc.) podem exercer uma forte influência sobre diversos aspectos do empreendedorismo (Ávila & Davel, 2019).
O caso estudado ilustra uma série de situações nas quais as emoções atuam de modo central em vários momentos da jornada empreendedora narrada. A alegria gerada pela avaliação positiva dos amigos Lana e Moacir, a felicidade no momento do lançamento das músicas, o otimismo do técnico Marcão e o orgulho sentido a cada conquista. Apesar de tantas emoções positivas, surgiram também muitas emoções negativas. A ansiedade, por exemplo, foi sentida por Janílson durante todo o processo de organização e execução da gravação musical, por conta dos atrasos do tecladista Deda, erros de execução dos instrumentistas, entre outros imprevistos. A frustração foi gerada pelo desempenho aquém do esperado com o lançamento das primeiras músicas nas plataformas digitais e o descaso dos donos dos bares e programadores das rádios locais. Por fim, o medo e o desespero foram evidentes no momento da apreensão do equipamento de som e a prisão do protagonista.
Todos os desafios emocionais enfrentados no caso reforçam ainda a importância de uma habilidade emocional apontada por Ávila e Davel (2019) como imprescindível para o empreendedor: a resiliência emocional. Resiliência emocional é a capacidade de responder, adaptar-se e recomeçar após as adversidades emocionais (D’Andria et al., 2018). Através da resiliência emocional, os empreendedores podem aprender a gerenciar ou reduzir as emoções negativas (Patzelt & Shepherd, 2011), aprendendo a enfrentar emocionalmente os obstáculos e até transformá-los em oportunidades (Chadwick & Raver, 2018).
Janílson precisou ser emocionalmente resiliente, por exemplo, para lidar com a frustração ao perceber que precisaria modificar todo o seu conceito artístico, uma vez que o estilo das suas primeiras gravações não trazia nenhuma inovação. Foi preciso, ainda, uma enorme resiliência emocional, para não deixar que a tristeza sentida nos momentos de fracasso o impedisse de prosseguir com seu projeto. De modo bastante perspicaz, ao invés de desmoronar frente aos percalços, o artista soube transformar o erro conceitual das primeiras gravações em uma oportunidade para encontrar uma sonoridade mais inovadora e diferenciada.
Também de acordo com Ávila e Davel (2019), é possível perceber que as emoções impactam o empreendedorismo em diferentes aspectos.
● criar: o empreendedor pode ser influenciado pelas emoções no que diz respeito a criar empreendimentos. As emoções podem afetar sua capacidade de identificar oportunidades e tomar decisões relacionadas a iniciar projetos empreendedores (Franco & Sanches, 2016; Welpe et al., 2012).
No caso: A paixão pela música foi a principal responsável por levar Janílson a criar o seu primeiro projeto musical. Além disso, foi a alegria que sentiu quando começou a experimentar aqueles novos sons e batidas musicais que o levaram a iniciar um segundo projeto ainda mais ousado, inovador e arriscado do que o primeiro.
● querer: as emoções podem levar o empreendedor a querer empreender, motivando-o a permanecer investindo em seus projetos (Patzelt & Shepherd, 2011).
No caso: A paixão de Janílson pela música foi uma fonte essencial de motivação, especialmente nos momentos mais desafiadores de sua trajetória. A paixão impediu que o protagonista perdesse seu desejo de empreender, mesmo quando enfrentou percalços emocionais que poderiam minar sua vontade de seguir adiante.
● convencer: potenciais parceiros, investidores e stakeholders são mais facilmente convencidos quando as negociações envolvem apelo emocional (Roundy, 2014).
No caso: A paixão de Janílson pelo seu projeto possibilitou o convencimento dos músicos que realizaram as gravações. Por perceberem que se tratava, não apenas de um empresário interessado em seu lucro, mas de um empreendedor verdadeiramente apaixonado, os instrumentistas concordaram em participar das gravações sem custos iniciais, apostando apenas na possibilidade de um futuro retorno financeiro.
● fracassar: o fracasso empreendedor envolve fortes emoções negativas (Shepherd & Patzelt, 2018). Felizmente, embora estas emoções possam levar ao abandono do empreendimento, ocasionando até mesmo a depressão dos empreendedores não exitosos (Ucbasaran et al., 2013), elas também oportunizam experiências que contribuem para o processo de aprendizagem (Amankwah-Amoah et al., 2018; Shepherd et al., 2009).
No caso: A personagem enfrentou uma série de emoções negativas ao fracassar por mais de uma vez durante sua trajetória. Entretanto, a estória exemplifica como as derrotas podem ser encaradas como uma oportunidade para o crescimento. O fracasso do primeiro projeto levou Janílson a aprender com os erros e buscar um novo formato musical mais adequado. Para tanto, precisou lidar de forma inteligente com as emoções negativas que surgiram neste processo. Um outro revés que poderia ter levado ao abandono do projeto foi a sua prisão durante um show. Apesar dos desafios emocionais enfrentados nesta situação, Janílson soube utilizar a situação vivenciada como aprendizado, tornando-se um artista empreendedor cada vez mais experiente.
Questão #2
Um conceito teórico apresentado por Ávila e Davel (2019) e que pode ser profundamente compreendido no terceiro capítulo da obra de Le Breton (2019) é a perspectiva sociocultural das emoções. Podemos compreender melhor essa denominação a partir de seu desmembramento em dois termos: “socio” no sentido de convívio social e “cultural” no sentido dos valores culturais que estão imbricados nesta convivência. A partir deste posicionamento teórico, as emoções são entendidas, não como simples respostas naturais ou intrínsecas aos indivíduos, mas resultantes das interações sociais e moldadas com base nos valores morais e significados de cada sistema cultural na qual se manifestam (Harré, 1986).
Le Breton (2019) explica que as emoções que nos acometem e a maneira como elas repercutem sobre nós, estão subordinadas a normas coletivas implícitas. Ainda que cada pessoa as expresse de acordo com seu estilo pessoal, isso ocorre com base nos valores culturais circundantes. O autor utiliza o termo “cultura afetiva” para descrever uma espécie de manual de instruções que indica aos indivíduos a resposta emocional adequada a cada situação particular. É este repertório de normas que sugerem, por exemplo, que devemos sentir tristeza e expressá-la através do choro quando participamos de um ritual fúnebre ou demonstrar com um expressivo grito coletivo a alegria sentida no momento de um gol. Le Breton ressalta que o papel cultural é tão relevante para a construção social das emoções, que algumas delas podem ser tipicamente recorrentes em certas culturas, enquanto outras podem nem mesmo ser reconhecidas ou possuir um termo que as defina (Le Breton, 2019).
Uma das maneiras pelas quais Ávila e Davel (2019) apontam que as emoções podem ser impactadas por aspectos socioculturais no contexto do empreendedorismo é através do contágio emocional. O contágio emocional (Elfenbein, 2007) diz respeito a diferentes formas de influência social sobre as emoções e como estas podem ser moldadas através de relações interpessoais. Empreendedores podem contagiar aqueles que os cercam, levando-os a exibir o mesmo tipo de emoção através de suas ações (Cardon, 2008; Patzelt & Shepherd, 2011). Em contrapartida, o próprio empreendedor pode ser contagiado pela emoção de outras pessoas durante as interações sociais e ter seu comportamento modificado (Biniari, 2012).
Podemos reconhecer diferentes momentos nos quais ocorreu o contágio emocional no caso estudado, em especial no que tange à paixão artística. A paixão de Janílson (o empreendedor) contagiou Marcão (um importante colaborador de seu projeto). Apesar de ser um profissional bastante experiente, o técnico admitiu que ainda sentia o “coração bater” quando via um artista “com aquela paixão típica dos que vencem na carreira” e terminou emprestando o próprio equipamento para uma segunda gravação. A paixão de Janílson contagiou também o guitarrista Chagas. Independente de sua amizade com Janílson, o interesse do instrumentista pelo projeto musical foi além de uma simples participação profissional coadjuvante. Em diferentes momentos, demonstrou um envolvimento emocional pessoal ao sugerir que Janílson contratasse um tecladista para melhorar a gravação ou ao participar gratuitamente de audições, oferecendo diferentes conselhos sobre aspectos artísticos e comerciais do trabalho. Essas atitudes de Chagas não foram motivadas por nenhum tipo de vantagem financeira, mas pelo fato de já estar contagiado emocionalmente (apaixonado?) pelo projeto no qual colaborava.
Ávila e Davel (2019) demonstram ainda outras maneiras pelas quais as interações sociais podem moldar as emoções do empreendedor. O apoio emocional fornecido pelos familiares, por exemplo, pode influenciar o comprometimento e a avaliação de oportunidades (Treffers et al., 2019), enquanto feedbacks positivos podem originar emoções capazes de fortalecer a identidade empreendedora (Markowska et al., 2015). O tio Giba foi um forte incentivador da iniciativa empreendedora de Janílson. Através de frases como “você vai longe!” e “tenho certeza que você vai se dar muito bem”, o carinhoso tio ofereceu um valioso apoio emocional que o fez sentir-se seguro e estimulado para iniciar seu projeto. Por outro lado, o feedback positivo dos amigos Lana e Moacir sobre a primeira gravação gerou em Janílson o orgulho e a alegria que também o fortaleceram para seguir em frente.
As emoções podem relacionar-se também ao afastamento social. Se o sucesso do empreendimento provoca orgulho e estimula o compartilhamento desta emoção com os outros, o fracasso pode gerar um efeito oposto. O estigma associado ao fracasso pode levar o empreendedor a sentir-se envergonhado, impondo a si mesmo um isolamento e consequente afastamento social (Ucbasaran et al., 2013). Quando a primeira gravação não gerou o resultado esperado, Janílson sentiu vergonha por ter fracassado. Em consequência, desapareceu durante alguns dias, evitou encontrar-se com os próprios amigos e retornou ao estúdio apenas para quitar suas dívidas.
Por fim, podemos identificar no caso uma forte influência da “dimensão cultural” (Ávila & Davel, 2019) sobre as emoções que permeiam os atores envolvidos no processo empreendedor narrado. Tanto no caso de Marcão quanto no de Chagas, o contágio interpessoal da paixão artística (e consequentemente da paixão pelo projeto empreendedor) foi fortemente regido por uma dimensão cultural. Marcão, Chagas e Janílson são indivíduos integrantes de um mesmo ambiente musical, de uma mesma cultura. A paixão pela música já é compartilhada de certo modo entre eles, o que potencializa o contágio da paixão no empreendedorismo artístico. Além desta ligação através da música, o local em que se passa a estória (a cidade de Salvador), reforça a interseção cultural entre as personagens. A ‘cultura afetiva’ (Le Breton, 2019) não sugere e estimula apenas a paixão pela música, mas pela representação subjacente dos valores culturais da Bahia. Nesse sentido, a paixão não é inspirada por qualquer empreendimento musical, mas especificamente por um projeto musical baiano. A paixão pelo projeto espelha uma paixão pela própria cultura baiana e ressalta a identificação e o afeto que nutrem pelo local em que residem. É o que podemos perceber quando o técnico Marcão questiona a ausência de “baianidade” no projeto, ou quando o guitarrista Chagas ressalta entusiasmado a vocação de Salvador para “absorver coisas novas”, sugerindo que é uma cidade “criativa por natureza”.
Questão #3
A emoção é central no empreendedorismo artístico e encontra-se presente em quase todos os processos a ele relacionados. Percebe-se que as emoções podem manifestar-se fortemente em, pelo menos, três principais aspectos do empreendedorismo artístico (Ávila & Davel, 2020; Marins & Davel, 2020): (a) através da paixão que move o artista empreendedor, (b) na essência do produto artístico e (c) nos conflitos e desafios emocionais peculiares e inerentes.
Ávila e Davel (2020) ressaltam a paixão artística como o principal impulsionador das iniciativas empreendedoras dos artistas, que podem ser entendidas como “projetos de paixão” (Svejenova et al., 2011). Estes projetos têm características semelhantes ao que Menger (1999) denomina de ‘trabalhos de amor’, ou do que Ávila e Davel (2019) categorizam como ‘concepção substantiva’ do empreendedorismo. Em linhas gerais, todos estes conceitos descrevem tipos de ações empreendedoras nas quais motivações não econômicas emergem como essenciais. O empreendedor nestes casos é, antes de tudo, um indivíduo apaixonado, impulsionado por um tipo de vocação, chamado ou questões como satisfação pessoal e realização de sonhos.
De fato, evidencia-se no caso estudado que o principal motivador da iniciativa empreendedora de Janílson não era o desejo de ganhar dinheiro, mas sim a sua paixão pela arte musical. Em diferentes momentos, o protagonista realiza sacrifícios para viabilizar o seu sonho de empreender na música. Para tanto, utilizou até mesmo as economias que estavam reservadas para seu curso técnico, demonstrando que um trabalho com possibilidades de retorno financeiro não era prioritário em relação à realização de seu sonho. A fim de obter um resultado artístico convincente, contratou até mesmo um tecladista profissional e pagou por várias horas de estúdio de gravação. Como o próprio Janílson afirma no texto, para o artista empreendedor, “Sonho é sonho, não tem preço”.
A emoções fazem parte também da essência do produto artístico. Podemos afirmar que a característica emocional marcante das práticas artísticas (Witkin, 1974) é estendida também aos empreendimentos artísticos. Na verdade, o próprio valor subjetivo do produto artístico está em transmitir, através do seu simbolismo e significado cultural, uma série de emoções para aqueles que o consomem (Lawrence & Philips, 2002; Marins & Davel, 2020). A valoração destes produtos está mais associada à experiência que emociona do que a algum tipo de valor utilitarista facilmente mensurável (Marins & Davel, 2020; Toghraee, 2017). Nesse sentido, entende-se que não há empreendedorismo artístico sem emoções. Em um determinado momento, o técnico Marcão argumenta que, “se a sua música não te emociona de verdade, não vai emocionar ninguém”.
Podemos ainda afirmar que o empreendedorismo artístico é certamente uma atividade repleta de conflitos e desafios emocionais peculiares e inerentes. Destacamos aqui dois aspectos que ilustram bem esta constatação: 1) a tensão entre arte e comércio e 2) a incerteza do produto artístico. A tensão entre arte e comércio (Caves, 2000) é consequência da relação diferenciada que o artista mantém com seus empreendimentos. Para o artista, sua arte não é um produto comum. Se em muitos segmentos convencionais a obtenção de lucro é suficiente para o empreendedor, no empreendedorismo artístico essa é uma questão muito mais complexa. O artista espelha em seu produto (que é também sua obra de arte) a sua identidade e expressão pessoal. A imbricação entre vida pessoal e trabalho artístico pode tornar o empreendedorismo artístico contraditório (Eikhof & Haunschild, 2007; Marins & Davel, 2020; Scherdin & Zander, 2011). Ao mesmo tempo em que precisam obter renda, os artistas consideram suas obras muito raras para serem vendidas como produtos convencionais. Deste modo, entendem que o produto artístico não deve atender apenas ao gosto de quem o consome, mas estar alinhado às suas próprias escolhas estéticas.
Percebemos no texto que Janílson enfrentou uma série de desafios emocionais relacionados com a tensão entre suas preferências musicais (arte) e a busca por um produto comercializável (comércio). Na primeira tentativa, a própria escolha do Modão como gênero musical foi baseada no potencial comercial que ele visualizava, algo que estava na moda e parecia financeiramente promissor. Mas precisou reavaliar a situação e reformular seu produto. Na segunda tentativa, o conflito permaneceu em alguma medida. Foi necessário misturar algo alinhado ao seu gosto, mas que dialogasse também com a linguagem baiana e as tendências do momento, uma equação sofisticada que unia veracidade artística, identificação cultural e viabilidade comercial.
O segundo aspecto que exemplifica os conflitos e desafios emocionais do empreendedorismo artístico é a incerteza do produto artístico. O empreendedorismo já envolve, usualmente, grande dose de risco e incerteza. No caso do empreendedorismo artístico, esta questão é potencializada devido às suas próprias características. A intangibilidade do produto artístico e a subjetividade de seu valor simbólico (Khaire, 2017) contribuem para que os resultados sejam imprevisíveis, tornando os empreendimentos fortemente sujeitos ao fracasso comercial. Se a inovação contida em um produto artístico pode ser um de seus principais fatores de sucesso, ela também é capaz de tornar-se uma de suas maiores fragilidades. A aceitação do “novo” depende de uma mudança cultural que envolve a participação de agentes diversos como influenciadores, críticos musicais e diferentes meios de comunicação (Khaire, 2017). Além disso, pesquisas de mercado não são capazes de prever com exatidão quais as novas tendências que serão absorvidas pelo público (viabilizando grandes sucessos) ou quais produtos deixarão de despertar seu interesse. Todos estes fatores expõem o artista empreendedor, bem como os demais envolvidos com o empreendimento, a uma série de emoções como angústia, medo e ansiedade. Pudemos observar que, durante toda a estória, Janilson vive a expectativa constante a respeito da opinião do público. Ao contrário do ideal de glamour que pode ser atribuído aos trabalhos criativos (Comunian & England, 2020), o empreendedorismo artístico, embora propicie uma grande satisfação para aqueles que o vivenciam, é repleto também de incertezas e desafios emocionais.
Referências
Aggestam, M. (2007). Art-entrepreneurship in the scandinavian music industry. In C. Henry (Org.), Entrepreneurship in the creative industries: An international perspective (p. 30–53). Cheltenham: Edward Elgar Publishing.
Amankwah-Amoah, J., Boso, N., & Antwi-Agyei, I. (2018). The effects of business failure experience on successive entrepreneurial engagements: An evolutionary phase model. Group and Organization Management, 43(4), 648–682. https://doi.org/10.1177/1059601116643447
Associação Brasileira de Música Independente [ABMI]. (2020). Análise de mercado da música independente no Brasil. https://abmi.com.br/wp-content/uploads/2020/12/relatorio-abmi-2020-v2.pdf
Ávila, A., & Davel, E. (2019). Empreendedorismo e emoções: Conexões e desafios para o empreendedorismo cultural. Anais do XXII Semead - Seminários em Administração.
Ávila, A., & Davel, E. (2020). Educação empreendedora nas artes: Perspectivas e desafios. Anais do ENANPAD 2020 - XLIV Encontro da ANPAD.
Bennett, D. (2009). Academy and the real world. Arts and Humanities in Higher Education, 8(3), 305–324. https://doi.org/10.1177/1474022209339
Biniari, M. G. (2012). The emotional embeddedness of corporate entrepreneurship: The case of envy. Entrepreneurship: Theory and Practice, 36(1), 141–170. https://doi.org/10.1111/j.1540-6520.2010.00437.x
Bridgstock, R. (2013). Not a dirty word: Arts entrepreneurship and higher education. Arts and Humanities in Higher Education, 12(2–3), 122–137. https://doi.org/10.1177/1474022212465725
Cardon, M. S. (2008). Is passion contagious? The transference of entrepreneurial passion to employees. Human Resource Management Review, 18(2), 77–86. https://doi.org/10.1016/j.hrmr.2008.04.001
Cardon, M. S., Zietsma, C., Saparito, P., Matherne, B. P., & Davis, C. (2005). A tale of passion: New insights into entrepreneurship from a parenthood metaphor. Journal of Business Venturing, 20(1), 23–45. https://doi.org/10.1016/j.jbusvent.2004.01.002
Caves, R. E. (2000). Creative industries: Contracts between art and commerce. Cambridge: Harvard University Press.
Chadwick, I. C., & Raver, J. L. (2018). Psychological resilience and its downstream effects for business survival in nascent entrepreneurship. Entrepreneurship: Theory and Practice, 44(2), 233–255. https://doi.org/10.1177/1042258718801597
Comunian, R., & England, L. (2020). Creative and cultural work without filters: Covid-19 and exposed precarity in the creative economy. Cultural Trends, 29(2), 112–128. https://doi.org/10.1080/09548963.2020.1770577
Comunian, R., Faggian, A., & Jewell, S. (2014). Embedding arts and humanities in the creative economy: The role of graduates in the UK. Environment and Planning C Government and Policy, 32(3), 426 – 450.
Coulson, S. (2012). Collaborating in a competitive world: Musicians’ working lives and understandings of entrepreneurship. Work, employment and society, 26(2), 246– 261.
D’Andria, A., Gabarret, I., & Vedel, B. (2018). Resilience and effectuation for a successful business takeover. International Journal of Entrepreneurial Behaviour and Research, 24(7), 1200–1221.
Davel, E., & Neves, J. N. dos R. (2017). As reviravoltas da adoção do valor simbólico no Grupo Cultural Olodum (Notas de Ensino). Revista Brasileira de Casos de Ensino em Administração, 7(1), 1-31. https://doi.org/10.12660/gvcasosv7n1n8
Davies, R., & Gauti, S. (2013). Introducing the creative industries: From theory to practice. London: Sage Publications.
Dias, M. T. (2000). Os donos da voz: Indústria fonográfica brasileira e mundialização da cultura. São Paulo: Marola Edições Musicais.
Eikhof, D. R., & Haunschild, A. (2007). For art’s sake! Artistic and economic logics in creative production. Journal of Organizational Behavior, 28(5), 523–538.
Elfenbein, H. A. (2007). Emotion in organizations: A review and theoretical integration. Academy of Management Annals, 1(1), 315–386.
Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro [FIRJAN]. (2019). Mapeamento das indústrias criativas. www.firjan.com.br/economiacriativa
Fischer, T., Dantas, M., Silva, M. D. F. L., & Mendes, V. L. P. (1993). Olodum: A arte e o negócio. Revista de Administração de Empresas, 33(2), 90–99.
Franco, M., & Sanches, C. (2016). Influence of emotions on decision-making. International Journal of Business and Social Research, 1, 40–62. https://doi.org/10.1001/archneurpsyc.1936.02260080114007
G1. (2020). Salvador tem título de “cidade da música” renovado pela Unesco. setembro. https://doi.org/https://g1.globo.com/ba/bahia/noticia/2020/09/29/salvador-tem-titulo-de-cidade-da-musica-renovado-pela-unesco.ghtml
Goss, D. (2008). Enterprise ritual: A theory of entrepreneurial emotion and exchange. British Journal of Management, 19(2), 120–137. https://doi.org/10.1111/j.1467-8551.2006.00518.x
Harré, R. (1986). An outline of the social construcionist viewpoint. In R. Harré (Org.), The social construction of emotions (p. 2–14). New York: Basil Blackwell.
Hirsch, P. M., & Gruber, D. A. (2015). Digitizing fads and fashions: Disintermediation and glocalized markets in creative industries. In C. Jones, M. Lorenzen, & J. Sapsed (Orgs.), The Oxford handbook of creative industries (p. 421–438). Oxford: Oxford University Press.
International Federation of the Phonographic Industry [IFPI]. (2021). Global music report. https://www.ifpi.org/ifpi-issues-annual-global-music-report-2021/
Jones, C., Lorenzen, M., & Sapsed, J. (2015). Creative industries: A typology of change. In C. Jones, M. Lorenzen, & J. Sapsed (Orgs.), Oxford handbook creative industries.pdf (p. 3–32). Oxford: Oxford University Press.
Khaire, M. (2017). Culture and commerce: The value of entrepreneurship in creative industries. Stanford: Stanford University Press.
Lawrence, T. B., & Philips, N. (2002). Understanding cultural industries. Journal of Management Inquiry, 11(4), 430–441.
Le Breton, D. (2019). Antropologia das emoções. Petrópolis: Editora Vozes.
Lima, A. (2002). Funkeiros, timbaleiros e pagodeiros: notas sobre juventude e música negra na cidade de Salvador. Cadernos CEDES, 22(57), 77–96. https://doi.org/10.1590/s0101-32622002000200006
Lopes, M. S. (2013). “Fantasmas existem”: A aparição da música de protesto no pagode baiano. Revista Habitus | IFCS - UFRJ, 11, 65–75.
Marins, S. R., & Davel, E. P. B. (2020). Empreendedorismo cultural e artístico: Veredas da pesquisa acadêmica. Revista Pensamento Contemporâneo em Administração, 14(4), 115–140. https://doi.org/https://doi.org/10.12712/rpca.v14i4.46268
Markowska, M., Härtel, C. E. J., Brundin, E., & Roan, A. (2015). A dynamic model of entrepreneurial identification and dis-identification: An emotions perspective. Research on Emotion in Organizations, 11(October), 215–239. https://doi.org/10.1108/S1746-979120150000011009
Menger, P.-M. (1999). Artistic labor markets and careers. Annual Review of Sociology, 25, 541–574.
Nakano, D. (2010). A produção independente e a desverticalização da cadeia produtiva da música. Gestão & Produção, 17(3), 627–638.
Patzelt, H., & Shepherd, D. A. (2011). Negative emotions of an entrepreneurial career: Self-employment and regulatory coping behaviors. Journal of Business Venturing, 26(2), 226–238. https://doi.org/10.1016/j.jbusvent.2009.08.002
Phillips, R. J. (2010). Arts entrepreneurship and economic development: Can every city be “Austintatious”? Foundations and Trends in Entrepreneurship, 6(4), 239–313. https://doi.org/10.1561/0300000039
Roundy, P. T. (2014). Doing good by telling stories: Emotion in social entrepreneurship communication. Journal of Small Business Strategy, 24(2), 41–68.
Salazar, L. S. (2015). Música Ltda: o negócio da música para empreendedores (2. ed). Recife: Sebrae.
Scherdin, M., & Zander, I. (2011). Art entrepreneurship: An introduction. In M. Scherdin & I. Zander (Orgs.), Art entrepreneurship. Cheltenham: Edward Elgar.
Shepherd, D. A., Covin, J. G., & Kuratko, D. F. (2009). Project failure from corporate entrepreneurship: Managing the grief process. Journal of Business Venturing, 24(6), 588–600. https://doi.org/10.1016/j.jbusvent.2008.01.009
Shepherd, D. A., & Patzelt, H. (2018). Entrepreneurial cognition: Exploring the mindset of entrepreneurs. Cham: Palgrave Macmillan. https://doi.org/10.1007/978-3-319-71782-1
Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia [SEI]. (2021). Boletim da economia criativa na Bahia. https://www.sei.ba.gov.br/images/publicacoes/download/boletim_cultura/pdf/boletim_econ_criativa_bahia_2021.pdf
Svejenova, S., Pedersen, J. S., & Vives, L. (2011). Projects of passion: Lessons For strategy from temporary art. In G. Cattani, S. Ferriani, L. Frederiksen, & F. Täube (Orgs.), Project-Based Organizing and Strategic Management (Advances in Strategic Management) (Vol. 28, p. 501–527). Emerald Group Publishing Limited. https://doi.org/10.1108/s0742-3322(2011)0000028024
Toghraee, M. T. (2017). Introduction to cultural entrepreneurship: Cultural entrepreneurship in developing countries. International Review of Management and Marketing, 7(4), 67–73.
Treffers, T., Klyver, K., Nielsen, M. S., & Uy, M. A. (2019). Feel the commitment: From situational emotional information to venture goal commitment. International Small Business Journal: Researching Entrepreneurship, 37(3), 215–240. https://doi.org/10.1177/0266242618813420
Ucbasaran, D., Shepherd, D. A., Lockett, A., & Lyon, S. J. (2013). Life after business failure: The process and consequences of business failure for entrepreneurs. Journal of Management, 39(1), 163–202. https://doi.org/10.1177/0149206312457823
Vogel, H. L. (2004). Entertaiment Industry Economics. Cambridge: Cambridge University Press.
Weber, W. (2004). The musician as entrepreneur. Bloomington: Indiana University Press.
Welpe, I. M., Spörrle, M., Grichnik, D., Michl, T., & Audretsch, D. B. (2012). Emotions and opportunities: The interplay of opportunity evaluation, fear, joy, and anger as antecedent of entrepreneurial exploitation. Entrepreneurship: Theory and Practice, 36(1), 69–96. https://doi.org/10.1111/j.1540-6520.2011.00481.x
Witkin, R. W. (1974). The intelligence of feeling. London: Heinemann Educational Books.
Wyszomirski, M., & Chang, W. J. (2015). What is arts entrepreneurship? Tracking the development of its definition. Artivate: A Journal of Entrepreneurship in the Arts, 4(2), 11–31.
[1] Mixagem: etapa da produção musical na qual um engenheiro de som, utilizando diferentes ferramentas de manipulação e transformação do som, esculpe e equilibra as faixas sonoras de uma gravação para que os elementos soem bem no conjunto final.