EDUCAÇÃO FINANCEIRA E VIESES COGNITIVOS: ANÁLISE CONSIDERANDO VARIÁVEIS SOCIODEMOGRÁFICAS
EDUCAÇÃO FINANCEIRA E VIESES COGNITIVOS: ANÁLISE CONSIDERANDO VARIÁVEIS SOCIODEMOGRÁFICAS
Revista Pensamento Contemporâneo em Administração, vol. 16, núm. 4, pp. 51-70, 2022
Universidade Federal Fluminense
Recepción: 20 Octubre 2022
Aprobación: 19 Diciembre 2022
Resumo: Este artigo analisou a relação entre os vieses cognitivos: excesso de confiança e aversão à perda e a educação financeira, considerando variáveis sociodemográficas. A amostra da pesquisa foi composta por de 1.080 participantes e após aplicação das técnicas estatísticas, os resultados mostraram que o conhecimento financeiro percebido, o sexo, a idade, e a renda estão associados a probabilidade de o indivíduo exibir excesso de confiança em suas decisões. Em relação ao viés de aversão à perda, o sexo e a renda diminuem a probabilidade de o indivíduo apresentar tal viés, já a idade aumenta essa probabilidade.
Palavras-chave: Educação Financeira, Conhecimento Financeiro, Vieses Cognitivos, Excesso de confiança, Aversão à perda.
Abstract: This article analyzed the relationship between cognitive biases: overconfidence and loss aversion and financial education, considering sociodemographic variables. The research sample consisted of 1,080 participants and after applying statistical techniques, the results showed that perceived financial knowledge, sex, age, and income are associated with the probability of the individual showing overconfidence in their decisions. Regarding the loss aversion bias, sex and income decrease the probability of the individual presenting such bias, whereas age increases this probability.
Keywords: Financial education, Financial Knowledge, Cognitive Biases, Overconfidence, Loss aversion.
Introdução
Os mercados estão evoluindo continuamente devido à ascensão tecnológica das últimas décadas. Um dos mercados que sofreu significativas modificações foi o financeiro, no qual vários instrumentos passaram a ser oferecidos, como alternativas de créditos, financiamentos, empréstimos, investimentos, dentre outros. Com isso, há uma demanda inerente à população, que é obter conhecimento a respeito de tais produtos, para em seguida usá-los de acordo com as próprias necessidades.
Além disso, as pessoas constantemente tomam decisões a respeito de consumo, investimentos e poupança, de maneira que tais decisões afetam as suas finanças no curto e no longo prazo. De acordo com o conselho da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE (2005), o conhecimento financeiro é importante para que os consumidores não sejam vítimas de fraudes, consigam orçar de forma apropriada as suas receitas e realizem os seus investimentos de forma eficiente. Além disso, acrescentam que com a sofisticação dos mercados financeiros, as famílias acabam assumindo responsabilidades e riscos sobre as próprias escolhas financeiras.
As escolhas realizadas ou as decisões feitas por indivíduos são geralmente influenciadas por suas expectativas e fundamentadas no conhecimento que possuem. Além disso, estas decisões estão também ligadas aos aspectos do comportamento e cognição humana. Segundo a discussão apresentada por Baker, Kumar, Goyal e Gaur (2018), há uma corrente de estudiosos das finanças tradicionais que argumentam que as pessoas tomam decisões racionais visando maximizar sua utilidade esperada. Contudo, a literatura tem mostrado que fatores cognitivos e comportamentais são fortes influenciadores das decisões. Quando se trata de decisões financeiras, alguns elementos podem influenciá-la, a exemplo dos atalhos de decisões, geralmente adotados quando se está diante de uma decisão complexa.
Tversky e Kahneman (1974) argumentaram que alguns indivíduos sofrem vieses comportamentais e cognitivos, que podem influenciar a tomada de decisão, especialmente em situações complexas. De acordo com Ateş, Coşkun, Şahin e Demircan (2016), as finanças sob uma perspectiva comportamental surgiram com a premissa de compreender como as emoções e os vieses cognitivos podem afetar o processo de tomada de decisão.
Dois vieses chamam atenção em situações financeiras: excesso de confiança e aversão à perda. Para Karaa e Kugu (2016) o excesso de confiança é observado em diversos campos profissionais, onde algumas pesquisas (Farrell, Fry & Risse, 2015; Ateş et al., 2016; Baker et al., 2018) relataram que as pessoas que possuem esse viés, independentemente do nível de escolaridade ou da idade, tendem a superestimar seus conhecimentos financeiros. Já o viés de aversão à perda está interligado com a baixa participação no mercado de renda variável (Merkle, 2020), isso porque o indivíduo que possui esse viés sente mais as perdas do que os ganhos.
O conhecimento financeiro pode minimizar esses vieses, pois segundo Ateş et al. (2016) favorece a tomada de decisão assertiva. Nesse sentido, essa pesquisa visa responder o seguinte questionamento: Qual a relação entre educação financeira e os vieses cognitivos excesso de confiança e aversão à perda considerando variáveis sociodemográficas? Para responder à pergunta de pesquisa, o estudo teve como objetivo analisar a relação entre os vieses comportamentais: excesso de confiança e aversão à perda e a educação financeira, considerando variáveis sociodemográficas.
Em uma pesquisa na base de dados da Web of Science sobre os termos “financial literacy”, “financial education” e “behavior”, observou-se que as pesquisas sobre a temática aumentaram significativamente nos últimos anos, com destaque para os anos de 2017, 2018 e 2019, que apresentaram um quantitativo de 63, 79 e 87 artigos, respectivamente. Isso demonstra o interesse dos pesquisadores e também o fortalecimento da temática, mostrando que realmente é algo demandado no século XXI. Porém, conforme Baker et al., (2018), existe escassa evidência empírica estudando a relação entre o conhecimento financeiro e os vieses comportamentais, fazendo com que esse estudo contribua com a literatura sobre o tema.
Educação Financeira
Após a ênfase dada pela OCDE (2005) a respeito das questões voltadas à alfabetização financeira, com a elaboração dos princípios e boas práticas de conscientização financeira, a temática passou a ganhar notoriedade tanto em um contexto acadêmico, como social e governamental. Além disso, os momentos de crises financeiras evidenciam o despreparo das famílias no que se refere ao planejamento financeiro, fazendo com que os níveis de endividamento crescessem.
Conceitualmente falando, a alfabetização financeira tem sido frequentemente utilizada como sinônimo de educação financeira ou de conhecimento financeiro, especialmente porque não existe uma definição única e uma forma de mensuração bem estabelecida. Embora sejam construtos semelhantes, não são iguais. A alfabetização financeira é multidimensional, pois além de considerar o conhecimento financeiro, engloba também elementos de ação (Huston, 2010).
Assim, Huston (2010) define a alfabetização financeira como tendo duas dimensões: uma relacionada à compreensão, que envolve o conhecimento em finanças pessoais, e uma outra relacionada ao uso, envolvendo a aplicação dos conhecimentos. Para a autora, a alfabetização financeira consiste no conhecimento e na aplicação do capital humano em questões de finanças pessoais.
Conforme mencionado na introdução deste trabalho, a educação financeira é um meio para se chegar na alfabetização financeira (Potrich, Vieira & Kirch, 2015). O conhecimento financeiro torna-se relevante para realização de escolhas que dizem respeito a tudo que envolve finanças individual e familiar, pois a falta de conhecimento financeiro é refletida em comportamentos indesejados, como o consumo compulsivo, que pode gerar o endividamento e levar as pessoas a estados de ansiedade, insegurança e estresse. O estresse financeiro, por sua vez, impacta em vários níveis da vida dos indivíduos, podendo ser refletido no desempenho no trabalho, diminuindo a produtividade (Delafrooz & Paim, 2011).
A educação financeira ou conhecimento financeiro, portanto, torna-se um meio para alcançar a alfabetização financeira (Huston, 2010; Karakurum-Ozdemir, KokkiziL & Uysal, 2019). Nesse artigo, adotou-se o conceito de educação financeira, envolvendo os conhecimentos relacionados a aspectos financeiros diversos. Assim, de acordo com a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (Ocde, 2005), a educação financeira é definida como o processo pelo qual os consumidores, investidores e indivíduos em geral, aprimoram sua compressão sobre produtos financeiros e com base nas informações e orientações, conseguem tomar melhores decisões financeiras.
Segundo Chen e Volpe (1998) a capacidade de gerenciar as finanças pessoais está sendo cada vez mais demandada, para que as pessoas tenham um ferramental disponível para planejamento da aposentadoria e educação dos filhos. No caso do Brasil, em 2010 foi criado a partir do projeto lei 7.397/2010 a Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF) e a partir das ações que foram estabelecidas como objetivo fim (fortalecimento da cidadania, aumento da eficiência e solidez do sistema financeiro, disseminar o conhecimento financeiro), o Brasil se tornou um dos países do G20, da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico - OCDE a possuir uma ENEF (Enef, 2020).
Lusardi e Mitchell (2011) provaram empiricamente que apenas cerca de 33% da população global tem algum conhecimento a respeito dos conceitos que envolvem aspectos relacionados à decisão financeira. Além disso, existem diferenças significativas entre grupos, quando se observam questões demográficas, como escolaridade, idade e sexo. Lusardi e Mitchell (2014) mostraram que embora a escolaridade seja um ponto chave no que diz respeito ao conhecimento e entendimento de questões financeiras, ainda não é suficiente, pois ainda existem pessoas com alto nível de instrução que erraram questões propostas pelas autoras.
Pesquisas têm sido desenvolvidas em diferentes partes do mundo (Chen & Volpe, 1998; Lusardi & Tufano, 2009; Lusardi & Mitchell, 2011; Anaya, 2016) e os resultados indicam que a alfabetização financeira das pessoas é baixa. A pesquisa realizada por Klapper, Lusardi e Oudheusden (2015) em parceria com a Standard & Poor’s Ratings Services, revelou que os países com as maiores taxas de alfabetização financeira são Austrália, Canadá, Dinamarca, Finlândia, Alemanha, Israel, Holanda, Noruega, Suécia e o Reino Unido, onde cerca de 65% dos adultos são financeiramente alfabetizados. Em contrapartida, nos países do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) – considerados como principais economias emergentes, em média, 28% dos adultos são alfabetizados financeiramente, especificamente no Brasil, a taxa é de 35%.
Além disso, as mulheres apresentaram maior percentual de respostas erradas quando comparadas com respondentes do sexo masculino, mostrando que muitas mulheres apresentam uma maior fragilidade relacionada a conhecer e tomar decisões financeiras. Outro destaque feito pelas autoras foi em relação a idade, onde jovens e idosos foram os grupos que demonstraram maior percentual de erro nas questões, especialmente chama-se atenção ao grupo dos idosos, que apesar de errarem com maior frequência as perguntas feitas, apresentam uma auto percepção distorcida a respeito do seu próprio entendimento (Lusardi, Mitchell & Curto, 2010).
Nesse sentido, a educação financeira por meio do conhecimento, pode levar as pessoas a se tornarem alfabetizadas, de modo que se adquira confiança e habilidade de adentrar em produtos que ofereçam maiores retornos. Para Lusardi (2019), a educação financeira deve ser vista com um direito universal e uma necessidade fundamental e não apenas para um grupo seleto que tem condições de adquirir aconselhamento financeiro e realizar cursos.
Atrelado a isso, Baker et al., (2018) também argumentam que os vieses comportamentais fazem com que exista um desvio sistemático da tomada de decisão financeira ideal. Isso porque tais vieses podem levar a erros de decisão. Assim, parte-se da ideia de que a educação financeira auxilia os indivíduos de modo que as influências dos vieses comportamentais sejam minimizadas.
Aversão à Perda e Excesso de Confiança
Partindo das ideias apresentadas pelas finanças tradicionais, a exemplo da Teoria da Carteira, de Markowitz (1952), e da Hipótese de Mercados Eficientes, de Fama (1970; 1991) discutidas amplamente na literatura, as pessoas tomam decisões financeiras de maneira racional, buscando sempre maximizar a sua utilidade esperada. Contudo, após o desenvolvimento de pesquisas que testaram as teorias, foram identificadas anomalias (Shiller, 2003) nos processos de decisões, que contradiziam os preceitos teóricos até então estabelecidos.
O amplo trabalho desenvolvido por Tversky e Kahneman (1974) para mapear os diversos atalhos cognitivos demonstrou que as decisões (julgamentos) sob condições de incerteza se desviam da racionalidade substantiva (Pereira, Bomfim & Silva Filho, 2021). Em 1979, Kahneman e Tversky desenvolveram uma teoria alternativa à teoria da utilidade esperada, intitulada de Teoria do Prospecto. Para estes autores, o valor deixa de ser atribuído aos resultados finais, e passa a ser atribuído a ganhos e perdas; e as probabilidades apresentadas na teoria da utilidade são substituídas por pesos de decisão. No desenvolvimento da teoria, a função valor apresenta-se côncava para ganhos, e geralmente, convexa para perdas.
De acordo Ricciardi e Simon (2000), no caso específico de investimentos, os investidores tendem a avaliar as perspectivas de ganhos ou perdas correntes, ao invés de focar na geração de riqueza final dos ativos. Os mesmos autores explicam ainda, que a Teoria do Prospecto demonstra que se o indivíduo é exposto a sua situação em que existe a possibilidade de perder dinheiro, devido a aversão à perda, estes tendem a tomar decisões arriscadas. Segundo Pereira, Bomfim e Silva Filho (2021), as perdas tendem a exercer um choque emocional maior sobre as pessoas do que o ganho semelhante, de modo que os indivíduos se empenham em evitar perdas, mais do que fariam para obter ganhos.
Asbi, Ramiah, Yu, Wallace, Moosa e Reddy (2020) argumentam que os estudos que querem utilizar essa variável, pretendem identificar o fato de o desconforto da perda ser maior do que a felicidade do ganho. Além disso, Baker et al., (2018) em situação de perda pode haver uma manifestação emocional no indivíduo que é o arrependimento, gerando muitas vezes quando alguma decisão é tomada de maneira equivocada, fazendo com que esses indivíduos balizem a nova decisão a partir de uma experiência passada.
Pessoas com o viés de aversão à perda tendem a fazer escolhas mais arriscadas, quando há a possibilidade de perdas, e se tornam aversas ao risco, em situações em que são apresentados ganhos comparáveis (Costa, Teixeira, Santos & Sanros, 2021). Devido a tal viés, Yeh (2022) afirma que pessoas com baixo conhecimento financeiro estão predispostas a apresentarem vieses de decisão, e confirmaram a partir de um estudo empírico que os entrevistados com menor alfabetização financeira manifestaram um maior grau do viés de aversão à perda.
Em relação ao excesso de confiança, Ricciardi e Simon (2000) mencionam que o excesso de confiança (overconfidence) é um viés que os seres humanos tendem a superestimar as suas próprias habilidades e previsões de sucesso. Quando se trata de investimentos, o excesso de confiança é identificado quando os investidores confiam ostensivamente para reduzir o risco de perdas em situações imprevisíveis (Yang, Mamun, Mohiuddin, Al-Shami & Zainol, 2021).
Pela definição, o excesso de confiança se configura na percepção do indivíduo sobre seus conhecimentos e habilidades que são diferentes daqueles executados. De acordo com Baker et al., (2018) o viés de excesso de confiança tem a suposição de que os indivíduos possuem uma fé não justificada sob seu raciocínio intuitivo. Ou seja, tomam decisões arbitrárias sob a crença de que é a melhor decisão a ser tomada ou a melhor escolha a ser feita. Além disso, Ateş et al., (2016) realizaram uma pesquisa com foco no comportamento de investidores, e argumentam que as pessoas que sofrem esse viés, superestimam a probabilidade de um resultado favorável ocorrer, ou subestimam a chance de um resultado negativo ocorrer.
A literatura reporta situações em que tal viés pode se apresentar como sendo algo bom ou ruim. Segundo Barber e Odean (2001), excesso de confiança no próprio conhecimento ou na capacidade concernente, pode levar a negociações excessivas e retornos mais baixos. Por outro lado, pesquisas levam alguns psicólogos a sugerirem que o excesso de confiança pode ser benéfico, servindo para promover a motivação e a persistência nas tarefas (Clark & Friesen, 2009).
A pesquisa conduzida por Barber e Odean (2001), mostrou que os homens apresentam maior excesso de confiança do que as mulheres. Além disso, participam com maior frequência do mercado de capitais e investimentos em ações. De acordo com Xia, Wang e Li (2014), o excesso de confiança no conhecimento financeiro está positivamente relacionado à participação no mercado de ações. Contudo, não necessariamente é algo positivo, devido às apostas arriscadas e a desempenhos negativos que podem ocorrer. Nesse sentido, por envolverem o processo de tomada de decisão, considera-se que os vieses aversão à perda e excesso de confiança, podem impactar diretamente a situação financeira dos indivíduos.
Procedimentos metodológicos
Esta pesquisa é considerada de natureza aplicada e quantitativa, com abordagem descritiva. A pesquisa aplicada envolve a busca de soluções para problemas específicos por meio da geração de conhecimento para aplicação prática (Kauark, Manhães & Medeiro, 2010). Em relação às pesquisas quantitativas, para os autores, este tipo de pesquisa traduz opiniões e informações em números e utiliza-se de recursos estatístico para mensuração de dados. Além disso, de acordo com Kirschbaum (2013), a pesquisa quantitativa permite o estabelecimento de hipóteses baseadas no corpo teórico escolhido, sendo posteriormente realizada a coleta dos dados, para em seguida serem organizados e aplicados os testes estatísticos. Em relação aos objetivos propostos a pesquisa pode ser classificada como descritiva. Gil (2008) afirma que pesquisas com essa natureza tem o objetivo de descrever características, ou ainda, estabelecer relações entre variáveis.
Para o procedimento de coleta de dados, foi utilizado um questionário estruturado, com 36 questões construído na plataforma do Google Forms com base nos instrumentos e literatura das seguintes pesquisas: Chen e Volpe (1998); Lusardi e Mitchell (2011); OCDE (2011); Ates et al., (2016); Oliveira e Montibeler (2018); Baker et al. (2018); Fan e Chatterjee (2018); Melo e Moreira (2020).
O Questionário contemplou em 4 partes: dados socioeconômicos e demográficos (10); Conhecimento financeiro percebido (7); educação financeira real (5); vieses comportamentais (14). As seções de conhecimento financeiro e vieses cognitivos possuem uma escala de resposta, variando de 0 a 5, onde as opções são, respectivamente, não sei, discordo totalmente, discordo parcialmente, nem concordo e nem discordo, concordo parcialmente, concordo totalmente. O objetivo em utilizar o conhecimento financeiro percebido e a educação financeira real, foi justamente para observar as diferenças entre o indivíduo fazer uma auto avaliação, e em seguida, responder questões de finanças, nas quais apenas uma resposta estaria correta.
Antes da aplicação do questionário, foi feito um pré-teste com quatro especialistas das áreas de contabilidade e finanças a fim de melhorar o instrumento utilizado. Após os ajustes sugeridos, procedeu-se à aplicação do questionário com o público em geral, via internet. A amostra final contou com 1.080 respondentes, determinada de forma não probabilística, por conveniência. O instrumento foi divulgado em grupos de WhatsApp, no Instagram, LinkedIn e solicitado que as pessoas que respondessem enviassem para outras pessoas, visando uma maior circulação do questionário.
Na primeira página do questionário online continha o termo de consentimento livre e esclarecido, em que a pessoa concordava ou não com a participação voluntária para responder ao instrumento. Não foi necessária identificação do respondente, e desde que a pessoa possuísse 18 ou mais, poderia participar da pesquisa, caso desejasse. Ressalta-se que o instrumento de coleta de dados e a pesquisa foram submetidos a Plataforma Brasil, para avaliação do comitê de ética de uma Universidade Federal da Paraíba, obtendo aprovação para sua aplicação e execução no dia 18/12/2020, com número de processo 4.475.282.
As variáveis referentes aos aspectos demográficos são: sexo, idade, renda, escolaridade, estado civil, atividade profissional, e região geográfica de residência. Estas variáveis foram estabelecidas com base no Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2022) e nas pesquisas de Potrich, Vieira e Kirsh (2015) e Vieira, Bressan e Fraga (2021). Tais variáveis foram utilizadas em três momentos: primeiro para a apresentação das estatísticas descritivas, em seguida nas Análises de Variâncias - ANOVAS, para identificar a existência ou não de diferenças significativas nas médias dos grupos estabelecidos. Neste caso, além da estatística F, apresentou-se o teste Post-hoc de GT2 de Hochberg, no qual é indicado quando os números de participantes entre os grupos são diferentes, mas apresentam variâncias iguais (Nascimento, Silva & Prestes, 2018), e por fim, nos modelos logísticos estimados.
As variáveis referentes aos vieses comportamentais, excesso de confiança e aversão à perda, bem como a variável conhecimento financeiro percebido tiveram o processo de codificação semelhante. Existem 7 afirmações para cada uma dessas três variáveis, e o processo de medição final foi feito com base em Chen e Volpe (1998), com o objetivo de categorizar as respostas em 0 e 1: inicialmente identificou-se a mediana da amostra total para cada uma dessas variáveis: excesso de confiança e aversão à perda e o conhecimento financeiro percebido. Em seguida, para os respondentes que apresentaram em cada variável mediana individual maior ou igual a mediana da amostra total, foi atribuída o valor 1; e para os demais casos, foi atribuído o valor 0.
Por fim, recorreu-se ao procedimento de regressão logística, no qual é adequado quando a variável dependente possui valor binário de 0 ou 1. A regressão logística é um recurso que permite estimar a probabilidade associada à ocorrência de determinado evento em face de um conjunto de variáveis explicativas. A estimação foi feita pelo método de máxima verossimilhança. Nesse artigo foram estimados dois modelos logísticos: em um deles, a variável dependente é a probabilidade de possuir Excesso de Confiança, e no outro, a probabilidade de possuir aversão à perda. A equação 1 apresenta o modelo econométrico: Importar imagen
Onde, representa a probabilidade de o respondente possuir Excesso de Confiança em uma estimação (modelo 1) e Aversão à perda em outra estimação (modelo 2), CF representa conhecimento financeiro percebido; EF representa o score de educação financeira real obtido. Para as estimações foram utilizados os softwares estatísticos Microsoft Excel e R.
Apresentação e análise dos resultados
Nesta seção encontram-se os resultados obtidos na pesquisa, bem como as análises e discussões. A Tabela 1 apresenta as estatísticas descritivas da amostra tais resultados:
Sexo | Quantidade | Percentual |
Feminino | 510 | 47,2% |
Masculino | 570 | 52,8% |
Idade | Quantidade | Percentual |
18 a 25 anos | 259 | 24,0% |
26 a 35 anos | 387 | 35,8% |
36 a 45 anos | 218 | 20,2% |
46 a 55 anos | 139 | 12,9% |
Mais de 56 | 77 | 7,1% |
Escolaridade | Quantidade | Percentual |
Ensino Fundamental | 4 | 0,4% |
Ensino Médio | 196 | 18,1% |
Ensino Superior | 334 | 30,9% |
Especialização | 238 | 22,0% |
Mestrado | 203 | 18,8% |
Doutorado | 105 | 9,7% |
Renda | Quantidade | Percentual |
Até 1 salário | 191 | 17,7% |
Mais de 1 e até três | 311 | 28,8% |
Mais de 3 e até seis | 201 | 18,6% |
Mais de seis | 377 | 34,9% |
Estado civil | Quantidade | Percentual |
Casado | 488 | 45,2% |
Solteiro | 511 | 47,3% |
Separado/Divorciado | 74 | 6,9% |
Viúvo | 7 | 0,6% |
Atividade profissional | Quantidade | Percentual |
Funcionário público | 311 | 28,8% |
Funcionário privada | 310 | 28,7% |
Autônomo | 154 | 14,3% |
Aposentado | 29 | 2,7% |
Estagiário | 48 | 4,4% |
Bolsista | 43 | 4,0% |
Outro | 185 | 17,1% |
Regiões | Quantidade | Percentual |
Nordeste | 654 | 60,6% |
Norte | 65 | 6,0% |
Sudeste | 176 | 16,3% |
Centro-oeste | 68 | 6,3% |
Sul | 117 | 10,8% |
A Tabela 1 apresenta uma série de informações socioeconômicas e demográficas que caracterizam a amostra obtida. O total de respondentes foi de 1.080, e com relação ao sexo, 52,8% são homens e 47,2% são mulheres. No que se refere a idade, observou-se uma participação diversificada entre as faixas etárias consideradas, sendo 24% de pessoas entre 18 a 25 anos de idade, 35,8% a faixa etária de 26 a 35 anos foi a mais representativa da amostra, 20,2% estão na faixa de 36 a 45 anos, os outros 20% possuem 46 anos ou mais.
No aspecto escolaridade, apenas 4 pessoas (0,4%) possuem ensino fundamental, 18,1% possuem ensino médio, 30,9% possuem ensino superior e aproximadamente 50,5% dos respondentes possuem algum nível de pós-graduação (especialização, mestrado, doutorado). Isso demonstra que o público respondente, em sua maioria, tem conhecimentos específicos em algumas áreas.
Em relação a renda, 17,7% dos respondentes recebem até 1 salário mínimo, 28,8% recebem mais de 1 e até 3 salários mínimos, 18,6 47,4% ficam na estão na faixa de possuir mais de 3 e até 6 salários mínimos, enquanto que 34,9% recebem mais que 6 salários mínimos. No que diz respeito ao estado civil, a maioria dos respondentes são casados (45,2%) ou são solteiros (47,3%); os demais, 6,9% são solteiros ou divorciados e 0,6% são viúvos (as).
No que diz respeito à atividade profissional, um quantitativo muito parecido se divide entre funcionários públicos (28,8%) e funcionários de empresa privada (28,7%) representando mais da metade da amostra. 17,1% marcaram a opção “outro”, em que muitos estão sem atividade, reflexo dos altos índices de desemprego que o Brasil vem enfrentando. 14,3% são autônomos, ou seja, indivíduos que possuem seus negócios e trabalhos informais, 2,7 são aposentados, 4,4% são estagiários e os outros 4% são bolsistas.
Em relação às regiões, buscou-se atingir todas as regiões do país, para que a amostra tivesse participação de pessoas de realidades diferentes. Nesse sentido, a região Nordeste apresentou o maior número de participantes, com uma representatividade de 60,6% na amostra. A região Sudeste representa 16,3% dos respondentes, o Sul, 10,8%, o Centro-oeste 6,3% e a região Norte, 6,0%.
Ainda nos procedimentos exploratórios dos resultados da amostra, foi feito análise de variância para os vieses cognitivos de aversão à perda e excesso de Confiança, considerando os grupos estabelecidos nas variáveis demográficas: sexo, renda, idade, escolaridade, estado civil e atividade profissional. Além disso, para o construto Educação Financeira, adotou-se o procedimento feito por Lusardi e Tufano (2009), Ludardi e Mitchell (2010, 2011), que foi identificar o percentual de respostas corretas para cada pergunta feita. Assim, a Tabela 2 apresenta os resultados obtidos para o construto Educação Financeira real:
1 | Suponha que você tenha R$ 100,00 em uma conta poupança e a taxa de juros seja de 2% ao ano. Considerando a ideia de juros compostos, depois de 5 anos, quanto você acha que teria se deixasse o dinheiro aplicado na poupança? | Quantidade | Percentual |
Respostas Corretas | 912 | 84,4% | |
Respostas Incorretas | 168 | 15,6% | |
2 | Imagine a seguinte situação: Em um determinado ano, a taxa de juros da sua conta poupança foi de 1% e a inflação desse período foi de 2%. Ao final desse suposto ano, quanto você poderia comprar com o dinheiro dessa conta? | Quantidade | Percentual |
Respostas Corretas | 847 | 78,4% | |
Respostas Incorretas | 233 | 21,6% | |
3 | Analise a informação abaixo e responda se ela é verdadeira: “A compra de ações de uma empresa geralmente proporciona retornos mais seguros do que um fundo de ações”. | Quantidade | Percentual |
Respostas Corretas | 529 | 49,0% | |
Respostas Incorretas | 551 | 51,0% | |
4 | Qual dos seguintes investimentos requer que você mantenha o dinheiro investido até a data de resgate especificada, sob o risco de sofrer perda de valor ao retirar antecipadamente? | Quantidade | Percentual |
Respostas Corretas | 591 | 54,7% | |
Respostas Incorretas | 489 | 45,3% | |
5 | Em geral, quanto maior o risco de um investimento: | Quantidade | Percentual |
Respostas Corretas | 880 | 81,5% | |
Respostas Incorretas | 200 | 18,5% |
O intuito desse construto foi medir o real conhecimento dos respondentes acerca de questões financeiras específicas, como juros compostos, inflação e, investimentos e não a percepção pessoal de conhecimento. De acordo com a classificação adotada por Chen e Volpe (1998), uma quantidade de respostas corretas abaixo de 60% é considerada como sendo baixo nível de educação financeira, entre 60 e 79% nível médio de conhecimento financeiro e acima de 80% alto nível e conhecimento financeiro.
De acordo com a Tabela 2, os respondentes apresentam alto conhecimento quando questionados sobre a formação de juros por meio da capitalização composta e inflação (questões 1 e 2), considerados conhecimentos básicos em finanças. A esse respeito, Karaa e Kugu (2016) e Lusardi (2019) afirmam que pessoas com altos níveis de instrução conseguem compreender conceitos básicos de finanças.
As três perguntas seguintes desse construto foram relacionadas a produtos de investimentos, como renda fixa e variável e também sobre percepção de risco de investimentos. A pergunta três relacionada ao conhecimento em ações, mostrou que apenas 49% dos respondentes compreendem esse tipo de investimento. A pergunta quatro teve foco na renda fixa, e apenas 54,7% responderam corretamente à pergunta. Desse modo, para essas questões o conhecimento financeiro é considerado baixo. Desse resultado, algumas justificativas podem ser feitas: o conhecimento dos respondentes a respeito de investimentos e funcionamento de produtos relacionados a renda fixa e a renda variável é baixo. Essas questões são consideradas de nível intermediário, e o resultado mostra que muitos participantes erraram quando as perguntas foram mais específicas.
A pergunta cinco foi feita para identificar se os respondentes compreendem a relação entre risco e retorno em investimentos financeiros. O resultado foi contraditório se comparado as duas perguntas anteriores (3 e 4), onde 81,5% dos responderem acertaram a questão cinco, demonstrando que, embora o conhecimento sobre produtos financeiros específicos como ações e certificado de depósito bancário sejam baixos, muitas pessoas conhecem as implicações e relações básicas entre risco e retorno.
De acordo com Lusardi (2019) esses resultados mostram que o custo da falta de conhecimento financeiro real é um problema social que impacta não apenas nas pessoas que não possuem tal conhecimento, mas na sociedade como um todo. Além disso, a autora argumenta que as mulheres são mais propensas a responderem de forma incorreta as questões e conhecimento financeiro. Atrelado a isso, no Brasil percebe-se que muitas pessoas com instrução em determinadas áreas, ainda desconhecem conceitos importantes para a gestão financeira pessoal, principalmente no tocante aos investimentos.
Após esses procedimentos exploratórios, foram realizados os testes de análise de variância–ANOVA para aos vieses excesso de confiança e aversão à perda considerando como variáveis de grupo as questões socioeconômicas e demográficas. A Tabela 3 apresenta os resultados para o viés de excesso de confiança:
Excesso de confiança | Sexo | Idade | Escolaridade | Renda | Estado civil | Atividade profissional |
Estatística do teste | -7,113 | 22,649 | 13,046 | 48,486 | 21,875 | 13,353 |
P-valor | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 | 0,000 |
Os resultados da Tabela 3 mostram que para todos as variáveis socioeconômicas e demográficas, as ANOVAS foram estatisticamente significativas, indicando haver diferenças entre as médias dos grupos considerados. As variáveis escolaridade e renda não apresentavam teste de homogeneidade da variância estatisticamente significativo, e para esses dois casos, considerou-se a correção de Welch, que calcula a estatística F com a correção do pressuposto da homogeneidade de variância. Especificamente para o caso da variável sexo, utilizou-se o teste t, pois para essa variável existem apenas dois grupos. A Tabela 4 apresenta as médias do excesso de confiança para o sexo feminino e masculino, bem como o tamanho da diferença:
Sexo | N | Média | Desvio Padrão | |
Excesso de confiança | Feminino | 510 | 2,853 | 0,808 |
Masculino | 570 | 3,198 | 0,786 | |
Diferença média | Erro padrão de diferença | 95% Intervalo de Confiança da Diferença | ||
Inferior | Superior | |||
Resultados | -0,3453 | 0,0485 | -0,4405 | -0,2500 |
Com base nos dados apresentados na Tabela 4, observa-se que a média para o excesso de confiança entre indivíduos do sexo masculino é maior do que para indivíduos do sexo feminino. A diferença entre as médias é de 0,3453, considerada estatisticamente significativa ao nível de 5%. Essa diferença pode ser observada também nos estudos de Barber e Odean (2001), Ateş et al. (2016), Baker et al. (2018), Lusardi (2019). Na Tabela 5 apresenta-se os resultados dos testes Post-hoc GT2 de Hochberg, no qual tem a finalidade de apresentar onde estão as diferenças apresentadas no resultado das anovas:
Idade | Média | Diferença de média | Sig. | Intervalo de Confiança 95% | ||
Limite inferior | Limite superior | |||||
18 a 25 anos (média = 2,648) | 26 a 35 anos | 3,097 | -0,449* | 0,000 | -0,625 | -0,273 |
36 a 45 anos | 3,150 | -0,503* | 0,000 | -0,705 | -0,301 | |
46 a 55 anos | 3,251 | -0,603* | 0,000 | -0,834 | -0,372 | |
Mais de 56 | 3,313 | -0,665* | 0,000 | -0,951 | -0,380 | |
Escolaridade | ||||||
Ensino médio (média = 2,703) | Fundamental | 2,964 | -0,261 | 1,000 | -1,433 | 0,911 |
Superior | 3,097 | -0,394* | 0,000 | -0,603 | -0,185 | |
Especialização | 3,289 | -0,585* | 0,000 | -0,809 | -0,361 | |
Mestrado | 2,897 | -0,195 | 0,193 | -0,427 | 0,038 | |
Doutorado | 3,154 | -0,450* | 0,000 | -0,731 | -0,170 | |
Especialização (média = 3,289) | Fundamental | 2,964 | 0,324 | 1,000 | -0,846 | 1,495 |
Médio | 2,703 | 0,585* | 0,000 | 0,361 | 0,809 | |
Superior | 3,097 | 0,192 | 0,064 | -0,005 | 0,389 | |
Mestrado | 2,897 | 0,391* | 0,000 | 0,169 | 0,613 | |
Doutorado | 3,154 | 0,135 | 0,905 | -0,137 | 0,407 | |
Renda | ||||||
Até 1 salário (média = 2,555) | Mais de 1 e até três | 2,911 | -0,356* | 0,000 | -0,540 | -0,172 |
Mais de 3 e até seis | 3,030 | -0,476* | 0,000 | -0,678 | -0,273 | |
Mais de 6 | 3,384 | -0,829* | 0,000 | -1,007 | -0,651 | |
Estado civil | ||||||
Casado (a) (média = 3,223) | Solteiro (a) | 2,837 | 0,392* | 0,000 | 0,260 | 0,524 |
Separado/Divorciado | 3,172 | 0,057 | 0,993 | -0,203 | 0,317 | |
Viúvo | 2,592 | 0,637 | 0,191 | -0,157 | 1,431 | |
Solteiro (a) (média = 2,837) | Casado (a) | 3,223 | -0,392* | 0,000 | -0,524 | -0,260 |
Separado/Divorciado | 3,172 | -0,335* | 0,004 | -0,594 | -0,075 | |
Viúvo | 2,592 | 0,245 | 0,960 | -0,549 | 1,039 | |
Atividade profissional | ||||||
Sem atividade (média = 2,596) | Funcionário público | 3,186 | -0,590* | 0,000 | -0,868 | -0,311 |
Funcionário privada | 3,054 | -0,458* | 0,000 | -0,736 | -0,180 | |
Autônomo | 3,090 | -0,495* | 0,000 | -0,806 | -0,183 | |
Aposentado | 3,566 | -0,970* | 0,000 | -1,485 | -0,455 | |
Estagiário | 2,643 | -0,046 | 1,000 | -0,474 | 0,381 | |
Bolsista | 2,488 | 0,108 | 1,000 | -0,336 | 0,552 | |
Outro | 3,169 | -0,573* | 0,000 | -0,935 | -0,210 | |
Funcionário público (média = 3,186) | Sem atividade | 2,596 | 0,590* | 0,000 | 0,311 | 0,868 |
Funcionário privada | 3,054 | 0,132 | 0,645 | -0,065 | 0,328 | |
Autônomo | 3,090 | 0,095 | 0,999 | -0,146 | 0,336 | |
Aposentado | 3,566 | -0,380 | 0,297 | -0,856 | 0,095 | |
Estagiário | 2,643 | 0,543* | 0,000 | 0,164 | 0,923 | |
Bolsista | 2,488 | 0,698* | 0,000 | 0,299 | 1,096 | |
Outro | 3,169 | 0,017 | 1,000 | -0,287 | 0,321 |
A Tabela 5 apresenta as saídas do teste post-hoc GT2 de Hochberg, no qual especifica as diferenças entre os grupos apontadas no teste análise da variância. Em relação a variável idade, observa-se que as diferenças são significativas em todas as faixas de idade consideradas, com maiores diferenças apresentadas entre os mais jovens (18 a 25 anos) e os mais experientes (com mais de 46 anos). Esse resultado indica que os mais velhos tendem a apresentarem com maior ênfase esse viés comportamental.
As descobertas apresentadas por Karaa e Kugu (2016) diferem desse achado, uma vez que os autores indicaram que níveis de excesso de confiança são maiores entre jovens, pois tendem a superestimar seus conhecimentos e habilidades. Nesse sentido, nesta amostra de brasileiros, os mais velhos apresentam uma maior propensão em apresentar o viés de excesso de confiança em suas decisões.
Em relação à escolaridade, as maiores médias foram para quem possui doutorado (3,154) e especialização (3,289), e as diferenças foram significativas quando comparadas as médias de quem possui ensino médio, com quem possui ensino superior, especialização e doutorado. Esses resultados indicam que indivíduos com maiores níveis de instrução, apresentam maior confiança no conhecimento financeiro que possui. Esse achado é consistente com os resultados apresentados por Baker et al. (2018), no qual apresentou diferenças significativas entre excesso de confiança e escolaridade.
No que se refere a variável renda, observa-se na Tabela 5 que o resultado de diferenças de médias foi significativo em todos os grupos considerados. Uma ênfase é dada para a diferença de médias entre quem recebe até 1 salário mínimo e quem recebe mais de 6 salários mínimos, referente a 0,829, indicando que pessoas com níveis de renda mais altos são mais propensos a apresentarem o viés de excesso de confiança. Esse achado mostra que a renda aparenta dar confiança as pessoas quando se trata de tomar decisões a respeito e assuntos relacionados a finanças. Kumar e Goyal (2016) e Yang et al. (2021) também encontraram diferenças significativas entre renda individual e excesso de confiança, reportando maior presença do viés cognitivo entre as pessoas que apresentam rendas mais altas.
A variáveis estado civil também mostrou existir diferenças significativas entre as médias da variável excesso de confiança, com as principais diferenças entre casados e solteiros e solteiros e separados ou divorciados. Nesse sentido, as pessoas casadas e separadas/divorciadas possuem maior propensão a apresentar o viés de excesso de confiança em suas decisões. O resultado diverge dos achados de Ateş et al. (2016), onde encontraram maiores médias para os indivíduos solteiros.
Por fim, para a anova que considerou a atividade profissional como variável de grupo, os resultados mostraram que as médias para o viés excesso de confiança foram maiores entre as pessoas que possuem empregos formais, são servidores públicos, aposentados e autônomos do que as pessoas que estão iniciando a carreira como estagiários e bolsistas. Esse resultado revela que a experiência profissional dos indivíduos pode aumentar a confiança em seus próprios conhecimentos.
Em seguida, na Tabela 6, encontram-se os resultados das anovas para o construto de aversão à perda. Neste caso, as pessoas que tendem a apresentar este viés cognitivo sentem a perda com uma intensidade maior do que sentem satisfação ao obter um ganho semelhante.
Aversão à perda | Sexo | Idade | Escolaridade | Renda | Estado civil | Atividade profissional |
Estatística do teste | 4,196 | 3,886 | 1,427 | 7,024 | 0,161 | 1,545 |
P-valor | 0,000 | 0,004 | 0,240 | 0,000 | 0,923 | 0,148 |
A Tabela 6 apresenta os resultados das anovas do viés cognitivo de aversão à perda, considerado as variáveis socioeconômicas e demográficas. Observa-se que apenas as variáveis sexo, idade e renda apresentaram significância estatística dos testes, indicado que nestas variáveis existem diferenças significativas entre as médias. Ressalta-se que para a variável sexo, foi realizado o teste t, uma vez que a anova é indicada para situações em que se tem três grupos ou mais. As variáveis escolaridade, estado civil e atividade profissional não mostraram indicações de haver diferenças significativas entre as médias dos grupos.
A variável escolaridade passou processo de correção de Welch, pois não apresentou homogeneidade de variância. Com o objetivo de identificar especificamente as diferenças encontradas nas variáveis sexo, idade e renda, realizou-se o teste de comparação de médias para o caso da variável sexo e o teste post-hoc GT 2 de Hochberg para o caso das variáveis de idade e renda. A Tabela 7 apresenta as diferenças observadas na variável sexo, para o viés cognitivo aversão à perda:
Sexo | N | Média | Desvio Padrão | |
Aversão à perda | Feminino | 510 | 2,486 | 0,734 |
Masculino | 570 | 2,300 | 0,717 | |
Diferença média | Erro padrão de diferença | 95% Intervalo de Confiança da Diferença | ||
Inferior | Superior | |||
Resultados | 0,185 | 0,044 | 0,099 | 0,272 |
De acordo com a Tabela 7, observa-se que o viés de aversão à perda se apresenta de forma diferente entre homens e mulheres, com a média do grupo de mulheres maior, indicado que indivíduos do sexo feminino são mais propensos a apresentarem o viés de aversão à perda. Esse resultado assemelha-se ao apresentado por Asbi et al. (2020) e Yeh (2022). A Tabela 8 apresenta os resultados do teste post-hoc para as variáveis idade e renda:
Idade | Diferença de média | Sig. | Intervalo de Confiança 95% | |||
Média | Limite inferior | Limite superior | ||||
26 a 35 anos (média = 2,303) | 18 a 25 anos | 2,359 | -0,056 | 0,983 | -0,220 | 0,108 |
36 a 45 anos | 2,432 | -0,129 | 0,304 | -0,302 | 0,043 | |
46 a 55 anos | 2,494 | -0,191 | 0,076 | -0,393 | 0,010 | |
Mais de 56 | 2,591 | -0,289* | 0,015 | -0,543 | -0,034 | |
Renda | ||||||
Mais de 1 e até três (média = 2,523) | Até 1 salário | 2,424 | 0,098 | 0,595 | -0,077 | 0,274 |
Mais de 3 e até seis | 2,357 | 0,166 | 0,068 | -0,007 | 0,339 | |
Mais de 6 | 2,273 | 0,250* | 0,000 | 0,103 | 0,396 |
A Tabela 8 apresenta os resultados do teste post-hoc GT2 de Hochberg para o viés cognitivo de aversão à perda considerando os grupos das variáveis que mostraram diferenças de médias estatisticamente significativas: idade e renda. Em relação ao viés de aversão à perda, Kahneman e Tversky (1974) revelam que as pessoas que sofrem desse viés emocional, sentem muito mais a perda de valor do que ficariam felizes com o ganho. Mostrando que as possibilidades de perdas podem trazer impactos significativos na tomada de decisão.
No que se refere a idade, Yeh (2022) encontrou resultado semelhante, onde os mais velhos apresentaram maior aversão à perda do que os mais jovens. Observa-se na Tabela 8 que a média para as pessoas com 56 anos ou mais foi maior em 0,289 do que as pessoas que estão na faixa de 26 a 35 anos. Em relação à renda, as maiores médias foram apresentadas pelas pessoas que recebem até 1 salário mínimo (2,424) e mais de 1 e até três salários mínimos (2,523). Esse resultado pode refletir o fato de que, pessoas com renda relativamente baixa possuem maior medo de sofrer perdas, devido à folga financeira que é limitada ou nula. Além disso, observa-se que as pessoas com renda maior, que estão na faixa de mais de 6 salários mínimos/mês apresentaram a menor média em relação à aversão à perda. Esse resultado indica um menor nível de aversão à perda para aqueles que possuem maiores níveis de renda.
Dando continuidade aos procedimentos de estimação, a Tabela 9 apresenta o resultado da regressão logística, na qual tem como variável dependente a probabilidade de possuir Excesso de Confiança:
Variável dependente: Excesso de confiança | Coeficiente | Wald | Significância | Exp(B) 95% | ||
Sexo | 0,511 | 10,715 | 0,001*** | 1,667 | ||
Idade | 0,168 | 4,151 | 0,042* | 1,183 | ||
Escolaridade | -0,120 | 2,456 | 0,117 | 0,887 | ||
Renda | 0,284 | 8,658 | 0,003*** | 1,329 | ||
Estado civil | -0,024 | 0,036 | 0,850 | 0,977 | ||
Atividade Profissional | -0,011 | 0,086 | 0,770 | 0,989 | ||
CCF | 0,487 | 8,436 | 0,004*** | 1,627 | ||
scoreEF | 0,058 | 1,010 | 0,315 | 1,060 | ||
Constante | -0,323 | 0,633 | 0,426 | 0,724 | ||
Razão de chances | 75,6% | |||||
Qui-quadrado | 74.845*** | |||||
-2 log verossimilhança | 1126.437 | |||||
Ajuste (Nagelkerke R²) | 0,100 | |||||
Teste Hosmer e Lemeshow | 5.465 | |||||
Classificação correta | 76,2% | |||||
Fonte: Dados da pesquisa (2020). Nota: A regressão foi estimada considerando um nível de 5% de significância.*** significativo ao p<0,001; *significativo ao nível de p<0,05. CCF = conhecimento financeiro percebido; escoreEF = educação financeira real. |
Os dados da Tabela 9 mostram o resultado da estimação do modelo de regressão logístico, em que a variável dependente é a probabilidade de possuir excesso de confiança. Os coeficientes estimados com sinal negativo diminuem a probabilidade de o evento acontecer, e os coeficientes positivos, aumentam a probabilidade. No procedimento de estimação foi utilizado um nível de significância de 5%.
Inicialmente, na parte inferior da Tabela 9, encontram-se as saídas referentes ao ajuste do modelo em si. Em relação à razão de chances de classificação correta, tem-se um percentual de 75,6%, em que o corte é de 50%, mostrando-se um resultado satisfatório. Em relação a estatística qui-quadrada que foi significativa (74.845), mostra que a hipótese nula foi rejeitada, e pode-se dizer que todos os coeficientes da equação não são nulos. O resumo do modelo, bem como seu ajuste por meio do teste de Nagelkerke mostra que 10% das variações ocorridas na variável dependente que é a probabilidade de possuir Excesso de Confiança, são explicadas pelas variáveis independentes. Por fim, o modelo apresenta uma classificação geral da amostra satisfatória de 76,2%, em que o corte é de 50%.
Os resultados estimados e exibidos na parte superior da Tabela 9 mostram que as variáveis sexo (0,511), idade (0,1680), renda (0,284) e conhecimento financeiro percebido (0,487) apresentaram coeficientes positivos e significativos. Esse resultado demonstra que essas variáveis tendem a aumentar a chance de o evento em questão ocorrer: probabilidade de os respondentes apresentarem o viés cognitivo Excesso de Confiança.
Em relação ao sexo, com base na saída do teste t apresentada na Tabela 4, pode-se dizer que a chance de uma pessoa do sexo masculino possuir excesso de confiança é 1,667 maior do que um indivíduo do sexo feminino. Esse resultado vai ao encontro do obtido pela pesquisa desenvolvida por Ateş et al. (2016), de que o excesso de confiança é maior entre os homens, quando comparado com mulheres. Baker et al. (2018) afirmam que os homens apresentam maior propensão a serem confiantes do que as mulheres.
No que diz respeito à idade, percebe-se que ela aumenta a probabilidade de ocorrência do evento: possuir excesso de confiança em 1,183 vezes. Enfatiza-se com base nas anovas, que pessoas com mais de 56 anos apresentaram as maiores médias nesse construto. Esse resultado pode ser explicado pela experiência de vida que possuem, de maneira que a pessoa sinta confiança a respeito de assuntos que envolvem a vida, como o uso do dinheiro e decisões financeiras em geral. Contudo, diverge de explicações apresentadas por Baker et al. (2018), na qual citaram com base em estudos anteriores que o excesso de confiança tende a diminuir quando a idade aumenta.
Referente a renda, o coeficiente positivo indica que essa variável aumenta a chance de um indivíduo possuir o viés excesso de confiança em 1,329 vezes. As pessoas com maiores recursos apresentaram indicação de maior excesso de confiança, principalmente ao observar as diferenças entre as médias obtidas. Isso pode ser explicado pelo fato de a pessoa entender que possui uma maior renda faz com que ela tenha maior controle sobre seus gastos, e com isso gerar maior confiança nas decisões.
No que diz respeito a relação entre educação financeira e excesso de confiança, observou-se que para o construto de conhecimento financeiro percebido o coeficiente de regressão estimado foi positivo e significativo, indicando que a variável aumenta a probabilidade de possuir excesso de confiança em 1,627 vezes. De uma forma geral, esse achado indica que as pessoas têm uma percepção de um alto conhecimento financeiro possuem maior probabilidade de apresentar o viés excesso de confiança. Tal achado diverge dos encontrados na pesquisa de Ateş et al. (2016), onde sugeriram uma relação inversa entre conhecimento financeiro e excesso de confiança.
As variáveis de escolaridade (-0,120), estado civil (-0,024), atividade profissional (-0,011) e conhecimento financeiro real (0,058) não apresentaram significância estatística quanto a poder explicar variações ocorridas na variável dependente, embora tenham apresentados diferenças de médias nas anovas. Em relação ao conhecimento financeiro real, pode-se argumentar que o conhecimento financeiro adquirido pode fortalecer o processo de tomada de decisão, de modo que os vieses que um indivíduo venha a possuir, sejam controlados por um pensamento racional a respeito da decisão a ser tomada.
De maneira geral, o resultado indicou que as variáveis sexo, idade, renda e conhecimento financeiro percebido tem maiores chances de aumentar a probabilidade de um indivíduo possuir excesso de confiança, com uma ênfase maior para indivíduos do sexo masculino, pessoas com 56 anos ou mais, e com rendas mais altas. Nesse sentido, enfatiza-se a importância de programas e cursos que tem a finalidade de trabalhar a educação financeira, pois são meios para disseminação do conhecimento financeiro. Acredita-se que a partir da aquisição de tais conhecimentos, as pessoas poderão desenvolver habilidades e consequentemente comportamentos que favoreçam a tomada de decisão racional e reflexiva.
A seguir a Tabela 10 apresenta os resultados das estimações do modelo 2, em que a variável dependente é a probabilidade de o respondente possui o viés de aversão à perda:
Variável dependente: Aversão à Perda | Coeficiente | Wald | Significância | Exp(B) 95% | ||
Sexo | -0,364 | 6,871 | 0,009*** | 0,695 | ||
Idade | 0,220 | 9,646 | 0,002*** | 1,246 | ||
Escolaridade | 0,023 | 0,118 | 0,731 | 1,023 | ||
Renda | -0,380 | 19,846 | 0,000*** | 0,684 | ||
Estado_civil | 0,139 | 1,609 | 0,205 | 1,149 | ||
Atividade_profisional | 0,020 | 0,325 | 0,569 | 1,020 | ||
CCF | -0,175 | 1,161 | 0,281 | 0,839 | ||
scoreEF | 0,013 | 0,056 | 0,813 | 1,013 | ||
Constante | 1,073 | 8,134 | 0,004 | 2,924 | ||
Razão de chances | 63,1% | |||||
Qui-quadrado | 53.729*** | |||||
-2 log verossimilhança | 1367.902 | |||||
Ajuste (Nagelkerke R²) | 0,066 | |||||
Teste Hosmer e Lemeshow | 4.323 | |||||
Classificação correta | 65,1% | |||||
Fonte: Dados da pesquisa (2020). Nota: A regressão foi estimada considerando um nível de 5% de significância. *** significativo ao p<0,001CCF = conhecimento financeiro percebido; escoreEF = educação financeira real. |
Os resultados apresentados da Tabela 10 mostram a saída do procedimento de estimação do modelo de regressão logístico, em que a variável dependente é a probabilidade de possuir aversão à perda. Ressalta-se que no procedimento de estimação foi utilizado um nível de significância de 5%.
Em relação à razão de chances de classificação correta, tem-se um percentual de 63,1%, em que o corte é de 50%. Em relação a estatística qui-quadrada, foi significativa (53.729), mostra que a hipótese nula foi rejeitada, e pode-se dizer que todos os coeficientes da equação não são nulos. O ajuste do modelo por meio do teste de Nagelkerke mostra que 6,6% das variações ocorridas na variável dependente Probabilidade de possuir Aversão à Perda, são explicadas pelas variáveis independentes. O modelo apresenta uma classificação geral da amostra satisfatória de 65,1%, em que o corte é 50%, embora tenha sido inferior ao obtido no modelo 1.
Observa-se que as variáveis que mostraram significância estatística foram sexo (-0,364), idade (0,220) e renda (-0,380), indicando que variações na variável dependente podem ser explicadas por estas. Percebe-que este resultado é igual ao obtido no teste t para a variável sexo, e anovas para o viés de aversão à perda, em que apenas as variáveis de idade e renda mostraram ter diferenças significativas em suas médias. Assim, a regressão logística confirmou os resultados obtidos nas anovas.
No que diz respeito ao sexo, a variável apresentou coeficiente negativo, indicando que essa variável diminui a probabilidade de o indivíduo possuir aversão à perda em 0,695 vezes, apesar de que, pelas médias obtidas na amostra, pode-se dizer que as pessoas do sexo feminino tendem a possuir uma maior probabilidade de apresentar o viés aversão à perda. Em relação a idade, o coeficiente positivo indica que a variável aumenta a probabilidade de possuir aversão à perda em 1,246 vezes, com maiores médias no grupo dos mais velhos, resultado contrário ao obtido por Ateş et al. (2016), com respondentes Turcos. E, por fim, em relação a Renda, o coeficiente negativo indica que essa variável diminui a probabilidade de possuir Aversão à Perda, isso porque as pessoas com rendas maiores podem ter uma tendência a não ter esse viés de maneira contundente, como pode ser o caso das pessoas com rendas mais baixas.
As demais variáveis escolaridade, estado civil, atividade profissional, conhecimento financeiro percebido, Educação Financeira real não apresentaram coeficientes estatisticamente significativos, indicando que estas variáveis não influenciam as variações ocorridas na variável aversão à perda.
Observando os resultados, percebe-se que o sexo, a idade e a renda foram as únicas variáveis que tiveram significância estatística em relação ao evento em análise: possui o viés aversão à perda. Como já mencionado, a aversão à perda caracteriza-se por um sentimento negativo à determinada perda, que é desproporcional ao sentimento que surge em relação a um ganho semelhante. Assim, observou-se que o sexo feminino, os mais jovens e as pessoas com rendas mais baixas têm uma maior probabilidade de apresentar esse viés.
Nesse sentido, é importante o desenvolvimento de cursos e ações voltadas às mulheres, para que estas consigam desenvolver maior confiança nas decisões que precisam tomar. Ressalta-se ainda a importância de trabalhar conteúdos financeiros na infância, adolescência e juventude, para que sejam formadas pessoas com orientação financeira, e se tornem adultos com clareza nas decisões financeiras que precisam ser tomadas.
Considerações finais
Essa pesquisa buscou abordar a temática de educação financeira com vieses cognitivos, aqui representados pelo excesso de confiança e aversão à perda. Nesse sentido, teve como objetivo analisar a relação entre os vieses comportamentais: excesso de confiança e aversão à perda e a educação financeira, considerando variáveis sociodemográficas.
Os resultados do estudo mostraram que o conhecimento financeiro medido pelo construto educação financeira real é maior quando as perguntas estão associadas a juros compostos e inflação, pois o percentual de acertos a perguntas relacionadas a esses assuntos é maior. Contudo, para perguntas associadas a investimentos, os percentuais de acertos apresentam uma queda considerável, de modo que esse conhecimento é considerado baixo na amostra dessa pesquisa. Embora os respondentes tenham apresentado alto conhecimento a respeito de risco e retorno.
Para o viés de excesso de confiança, as anovas mostraram diferenças estatisticamente significativas para todas as variáveis socioeconômicas e demográficas (sexo, idade, escolaridade, renda, estado civil e atividade profissional), indicando haver diferenças entre as médias dos grupos considerados. A média para o excesso de confiança entre indivíduos do sexo masculino é maior do que para indivíduos do sexo feminino.
No que diz respeito ao viés cognitivo de aversão à perda, as anovas mostraram diferenças estatisticamente significativas para as variáveis de sexo, idade e renda. O viés de aversão à perda se apresenta de forma diferente entre homens e mulheres, com a média do grupo de mulheres maior, indicado que indivíduos do sexo feminino são mais propensos a apresentarem o viés de aversão à perda. Em relação a idade, pessoas com mais de 56 anos apresentaram maior presença do viés em suas respostas e, no que diz respeito a renda, as pessoas com rendas mais baixas apresentaram maior predisposição para a aversão à perda.
Em relação as regressões logísticas, foi encontrado que as variáveis sexo, idade, renda e conhecimento financeiro subjetivo são relevantes quando se trata de excesso de confiança, revelando que essas variáveis aumentam a probabilidade de os indivíduos apresentarem tal viés. Já para o viés de aversão à perda, foi encontrado que o sexo e a renda são variáveis que diminuem a probabilidade de os indivíduos possuírem esse viés, enquanto a variável idade aumenta essa probabilidade.
A maior contribuição do estudo está na associação da educação financeira com os vieses cognitivos, uma vez que tais vieses influenciam o processo de decisão. Além disso, conforme discutido, indivíduos com maiores conhecimentos tendem a sofrer menos com a presença de vieses em seu processo decisório, de modo que as decisões podem ser mais assertivas. Além disso, a comparação com variáveis sociodemográficas traz resultados relevantes, evidenciando quais características apresentam uma maior probabilidade de apresentarem os vieses de excesso de confiança e aversão à perda.
No que se refere as limitações encontradas no desenvolvimento do estudo, destaca-se o estabelecimento da relação entre educação financeira e as influências dos vieses cognitivos abordados, tendo em vista que existe escassa literatura estabelecendo essas associações, seja do ponto de vista teórico ou empírico. Além disso, as medidas de aversão à perda e excesso de confiança encontradas, não abordavam tais medidas de forma subjetiva, de modo que foi necessário uma busca por instrumentos de coleta dedados em diferentes pesquisas, a fim de criar o instrumento utilizado nesta pesquisa.
Por fim, sugere-se que novas pesquisas sejam realizadas, abordando os vieses de excesso de confiança e aversão à perda em outras amostras e me grupos específicos, como o de Administradores de empresas, investidores, professores. Além disso, pesquisas podem ser desenvolvidas com outros vieses que podem influenciar decisões financeira, bem como o comportamento financeiro.
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