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Recepção: 22 Novembro 2016
Aprovação: 01 Março 2017
DOI: https://doi.org/https://dx.doi.org/10.19132/1808-5245233.130-156
Resumo: São apresentados o código de catalogação RDA e a iniciativa BIBFRAME à luz dos princípios gerais da catalogação. Para tanto, realizou-se uma pesquisa bibliográfica descritiva sobre os princípios gerais da catalogação, em que foram destacados os mais importantes teóricos e os principais fatos que influenciaram o desenvolvimento dos princípios da catalogação e do código RDA, bem como da iniciativa BIBFRAME. Descreve-se o código RDA a partir de sua proposta, características e desenvolvimento, sua utilização com o Formato MARC 21 e faz-se uma comparação entre os códigos RDA e AACR2r. Em seguida, a iniciativa BIBFRAME é descrita em seus dois segmentos: modelo e vocabulário. Por fim, acredita-se que as iniciativas RDA e BIBFRAME serão assumidas ao longo do tempo como base para a descrição de recursos no ambiente web.
Palavras-chave: Resource Description and Access (RDA), Bibliographic Framework Initiative (BIBFRAME), Princípios da catalogação, Códigos de catalogação, Formato MARC 21.
Abstract: This paper presents the RDA cataloging code and the BIBFRAME initiative as trends for the future of bibliographic description on the web. Therefore, descriptive bibliographical research was carried out on the general principles of cataloging, highlighting the theoretical major and facts that influenced the development of the principles of cataloging, the RDA code and the BIBFRAME initiative. It describes the RDA code, from its evolution and terminology and outlines relations on the use of RDA with MARC 21 format from comparisons with AACR2R. It then describes the BIBFRAME initiative in its two segments: model and vocabulary. Finally, it considers that the RDA and BIBFRAME trends over time will be taken as the basis for resource description in the web environment.
Keywords: Resource Description and Access (RDA), Bibliographic Framework Initiative (BIBFRAME), Principles of cataloging, Cataloging codes, MARC 21 format.
1 Introdução
No âmbito da Ciência da Informação, a representação da informação pode ser entendida, segundo Brascher e Café (2008, p. 5), “[...] como um conjunto de elementos descritivos que representam os atributos de um objeto informacional específico.” Alvarenga (2003) indica que a representação da informação tem a finalidade de possibilitar a sua localização e utilização pelos usuários.
Para Assumpção e Santos (2015), a representação da informação realizada no domínio bibliográfico encontra-se pautada em instrumentos, princípios, modelos e tecnologias, tais como códigos de catalogação e padrões de metadados. Entre os códigos e modelos deste domínio estão o código de catalogação Resource Description and Access (RDA) e o Bibliographic Framework Initiative (BIBFRAME).
O código de catalogação Resource Description and Access (RDA), influenciado pelo modelo conceitual Functional Requirements of Bibliographic Records (FRBR), surgiu com o objetivo de alinhar os princípios de catalogação com os modelos conceituais para dados bibliográficos e para a construção e modelagem de catálogos (SANTOS; CORRÊA, 2009; WELSH; BATLEY, 2012). Para o RDA Steering Committee (RSC) (2016, tradução nossa), o código RDA foi desenvolvido pelo Joint Steering Committee (JSC) for Development of RDA como parte de seu plano estratégico de 2005 a 2009 para substituir as Anglo-American Cataloguing Rules, 2nd edition, revised 2002 (AACR2r), publicadas pela primeira vez em 1978, as quais, segundo Tillett (2007), expõem regras rígidas destinadas à descrição de materiais clássicos e, no contexto atual, apresentam linguagem desatualizada. O RDA, por sua vez, propõe regras simplificadas, além de serem projetadas para o ambiente digital. Por se tratar de um conjunto de regras para o registro dos dados catalográficos, as regras do RDA podem ser aplicadas em muitos esquemas de metadados, inclusive no Formato MARC 21, considerado como um padrão de metadados complexo e altamente estruturado e de aplicação específica.
Desde a criação do RDA, o Formato MARC 21 tem sido alterado para tornar possível a implementação desse novo código em sua estrutura, de forma que as bibliotecas possam aplicá-lo na descrição de seus registros. Porém, de acordo com a Library of Congress (2012a), as mudanças são muitas e não há segurança de que o formato MARC 21 atenderá às exigências de descrição da informação na web. Portanto, o momento exige uma ferramenta que possibilite a realização de uma descrição bibliográfica eficaz e que atenda tanto aos recursos da web quanto aos analógicos.
Nesse cenário, a Library of Congress está desenvolvendo o Bibliographic Framework Initiative, ou simplesmente BIBFRAME, com o intuito de apresentá-lo para consolidar o futuro da descrição bibliográfica na web.
O código de catalogação RDA e a iniciativa BIBFRAME são temas emergentes no contexto atual do domínio bibliográfico. Entende-se por domínio bibliográfico o universo das coleções das comunidades de informação, dentre elas, as bibliotecas, arquivos e museus (IFLA, 2009).
Nesse sentido, esta pesquisa tem como objetivo descrever o desenvolvimento das tendências da representação da informação digital no domínio bibliográfico, destacando-se as iniciativas RDA e BIBFRAME à luz dos princípios gerais da catalogação.
Para atender ao objetivo proposto, partiu-se de um levantamento bibliográfico sobre os princípios gerais da catalogação, apresentando as contribuições dos principais teóricos que influenciaram o seu desenvolvimento.
O artigo está organizado de modo a apresentar a criação dos padrões de catalogação, explicitando as razões do desenvolvimento das iniciativas RDA e BIBFRAME.
Na sequência, apresenta-se o código de catalogação RDA, de maneira a expor sua proposta, características, desenvolvimento, sua utilização com o formato MARC 21 e, em seguida, uma comparação entre os códigos RDA e AACRr2, para facilitar a compreensão da necessidade de seu desenvolvimento no contexto atual do registro da informação.
Por fim, ainda que em desenvolvimento, apresenta-se a iniciativa BIBFRAME em seus dois segmentos, modelo e vocabulário, para descrição da informação de recursos tradicionais e da web.
2 Princípios gerais da catalogação
Desde a Antiguidade a necessidade de organizar a informação era vivenciada. Isso pode ser observado com Santos e Pereira (2014, p. 15), as quais indicam que “[...] as informações apresentavam o número do tablete em uma série, o título e, muitas vezes, o nome do escriba que havia operado o registro.” Para Mey e Silveira (2009), presume-se haver, nessa época, um embrião de catálogos. No entanto, Ortega (2011, p. 46) afirma que foi no final do século XVIII que “[...] o catálogo passou a ser desenvolvido para servir como instrumento de busca.”
Da Idade Média até o início do século XX ocorreram iniciativas na produção de catálogos e bibliografias:
[...] catalogação de partes de documentos, uso de remissivas, construção de índices de autor e de assunto, entrada de autores pessoais pelo sobrenome, reunião de livros relativos à mesma obra, adaptação das normas às necessidades locais, confecção de fichas para possibilitar o registro das diversas informações sobre um documento e a sua atualização constante. (ORTEGA, 2011, p. 46).
De acordo com Barbosa (1978), o primeiro código de catalogação propriamente dito foram as 91 regras de catalogação, redigidas por Anthony Panizzi em meados do século XIX, definidas para serem aplicadas aos catálogos do Museu Britânico, em Londres, na Inglaterra.
Ainda de acordo com Barbosa (1978), estas regras foram aprovadas em 1841 pelos diretores do Museu Britânico, e influenciaram todos os códigos subsequentes. Em sua última edição, em 1936, destacam-se como características principais: a “[...] valorização da folha de rosto; a introdução do conceito de autoria coletiva, embora de maneira vaga e imprecisa; e a escolha do cabeçalho de entrada de um autor, de forma encontrada na página de rosto.” (BARBOSA, 1978, p. 27). Este cabeçalho era determinado da seguinte forma:
a) pelo prenome, quando preferido, seguido pelo sobrenome;
b) pelo título, no caso de obras anônimas, seguido pelo nome do autor quando identificado;
c) pelo pseudônimo, mesmo quando o nome verdadeiro fosse descoberto;
d) pelo sobrenome de família, para autores pertencentes à nobreza (BARBOSA, 1978, p. 27).
Em 1852, Charles Coffin Jewett publicou, para uso na Smithsonian Institution, dos Estados Unidos, um código baseado nas regras definidas por Panizzi, com as seguintes modificações:
a) as obras escritas sob pseudônimo eram catalogadas pelo nome verdadeiro do autor, mesmo que o pseudônimo fosse mais conhecido;
b) o conceito de autoria coletiva foi firmado, adotando para entrada das publicações oficiais americanas a abreviatura U.S. correspondente a United States (BARBOSA, 1978, p. 28).
Segundo Barbosa (1978), Jewett também se destacou por conta da elaboração de um catálogo coletivo, no qual pretendia reunir informações sobre coleções existentes nas bibliotecas americanas e imprimi-las pelo processo de estereotipia. Foi Jewett quem idealizou, em 1850, a catalogação cooperativa, programa no qual as bibliotecas participantes catalogavam e responsabilizavam-se pela padronização, normalização e distribuição dos registros para as instituições cooperantes.
Em 1876, Charles A. Cutter publicou o código de catalogação denominado Rules for a dictionary catalog, o qual foi considerado uma declaração de princípios contendo informações e observações diversas. Além de criar um esquema de classificação e uma tabela representativa de sobrenomes, Cutter colaborou com o desenvolvimento da catalogação determinando os objetivos do catálogo na biblioteca. Além disso, estabeleceu a visão do catalogador, que teve forte influência sobre a Declaração dos Princípios Internacionais de Catalogação (MEY; SILVEIRA, 2009).
Os objetivos do catálogo delineados por Cutter foram:
a) Permitir que uma pessoa encontre um livro em que o autor, o título e o assunto sejam conhecidos;
b) Mostrar o que a biblioteca tem por um determinado autor, sobre um determinado assunto, num determinado tipo de literatura; e
c) Facilitar a escolha de um livro quanto à sua edição e quanto ao seu caráter literário (CUTTER, 1891[1]apud WELSH; BATLEY, 2012, p. 3).
Os objetivos bibliográficos sobre as funcionalidades do catálogo, definidos por Cutter, refletem-se nas tarefas previstas pelos FRBR, modelo conceitual que subsidiou uma iniciativa internacional, a qual influenciou fortemente o desenvolvimento do RDA. Nos FRBR, as entidades, os atributos e seus relacionamentos em um catálogo são mapeados para as tarefas do usuário, de modo a formar os objetivos centrais do registro, que são: encontrar entidades que correspondam aos critérios de pesquisa do utilizador, identificar uma entidade, selecionar uma entidade adequada às necessidades do utilizador, adquirir ou obter acesso à entidade descrita e, navegar por um catálogo, ou para além dele (IFLA, 1998, 2009).
Outra contribuição de grande influência foi a de Shiyali Ramamrita Ranganathan, com a elaboração das cinco leis fundamentais da biblioteconomia, as quais, de acordo com Welsh e Batley (2012), podem ser facilmente associadas à catalogação, uma vez que tornam itens encontráveis (livros são para uso e a cada leitor seu livro), com rapidez e eficiência (economizar o tempo do leitor), e que, pelo processo catalográfico, direcionam o item para o leitor específico e executam a função de inventário para o estoque de biblioteca (Cada livro seu leitor e uma biblioteca é um organismo em crescimento).
Após a publicação de Classified Catalogue Code, Ranganathan passou a afirmar que o catálogo deveria ser concebido de forma a divulgar a cada leitor o seu documento; garantir para todos os documentos o seu leitor; poupar o tempo do leitor; e com esse propósito, economizar o tempo da equipe (RANGANATHAN, 1989[2] apud WELSH; BATLEY, 2012).
É possível observar que o usuário foi inserido como o centro da biblioteca, por Ranganathan, ao mencionar o objetivo da elaboração de um catálogo, o qual vem sendo repensado, a partir dos modelos conceituais, também com foco central nas expectativas e necessidades do usuário, porém com o uso de recursos tecnológicos que possibilitam a interoperabilidade.
Destaca-se que Ranganathan realizou um estudo comparativo sobre vários códigos e escreveu trabalhos sobre catalogação e catálogos classificados entre os anos 1930 e 1960, o que contribuiu para a elaboração do Anglo-American Cataloguing Rules (AACR).
Para Santos e Ortega (2013), em 1946, Seymour Lubetzky colaborou com a publicação do relatório intitulado Studies of descriptive cataloging, no apêndice E: Analysis of current descriptive cataloging practice. Nesse apêndice, segundo os autores Santos e Ortega (2013, p. 98), Lubetzky “[...] constatou que as regras de catalogação eram desprovidas de fundamentos e precisavam ser avaliadas.” Lubetzky assinalou que as fichas de catálogos eram inapropriadas,
[...] no conteúdo, apresentam muitas repetições, são limitadas na aplicação universal e possuem dados complexos que poderiam ser simplificados; na organização, os elementos da ficha são inter-relacionados de forma subjacente ou deficiente; e no objetivo, são voltadas mais para a descrição de página de rosto do que para os livros. (SANTOS; ORTEGA, 2013, p. 98).
Santos e Ortega (2013) afirmam que Lubetzky realizou críticas às regras do código de catalogação da American Library Association (ALA), de 1949, ao mostrar a existência de regras excessivas, redundantes, duplicadas e desprovidas de princípios, que poderiam dificultar o entendimento do código.
Santos e Corrêa (2009, p. 22) afirmam que
[...] as críticas realizadas por Lubetzky geraram a publicação da obra Cataloguing Rules and Principles que propiciou as bases para as discussões na Conferência Internacional sobre Princípios de Catalogação e para a elaboração dos Princípios de Paris.
Para Svenonius (2000), Lubetzky insistiu em uma abordagem racionalizada de normas para a catalogação, baseadas em objetivos e princípios, as quais lançaram bases para o desenvolvimento do código de catalogação subsequente. Para Chan (2007[3] apud WELSH; BATLEY, 2012), a teoria de Lubetzky seria a transformação de códigos de catalogação ricos em regras em códigos ricos em princípios. Nesse sentido, Gavin (2006[4] apud CORRÊA, 2008, p. 35) destaca os pontos principais sinalizados por Lubetzky, a saber: “[...] catálogo (auxiliar para exploração dos recursos da biblioteca), distinção entre obra e livro, privilegiar a entrada principal, fidelidade à página de rosto e profundidade na catalogação: nem mais nem menos que o necessário.”
Welsh e Batley (2012) sugerem que, como os padrões de representação da informação vêm mudando e se modernizando nos últimos anos, é importante que todos os responsáveis pela atualização das regras de catalogação sigam uma abordagem similar à de Lubetzky: a de adotar uma abordagem de racionalização das regras.
Após apresentar as principais contribuições de teóricos que influenciaram o desenvolvimento dos princípios da catalogação, passa-se, na sequência, para a criação dos padrões de catalogação.
3 Dos princípios de Paris ao BIBFRAME
A Conferência Internacional sobre Princípios de Catalogação, realizada na França, em 1961, aprovou a Declaração de Princípios, mais conhecida por Princípios de Paris. Santos e Corrêa informam que “[...] o tema central dos Princípios de Paris foi a busca pela padronização das entradas, mais tarde denominadas pontos de acesso, e dos cabeçalhos das obras existentes e passíveis de serem catalogadas.” (SANTOS; CORRÊA, 2009, p. 22).
Como resultado da conferência, ocorre a primeira edição do Código de Catalogação Anglo-Americano (AACR), publicado em 1967. Em 1969, editou-se, no Brasil, a tradução da versão americana para o português. Santos e Corrêa (2009) lembram que, nesta mesma data, o Brasil adotou o AACR devido às necessidades de uniformidade de entradas para obras representadas em catálogos. Segundo Mey e Silveira, “[...] este código passou a ser adotado em quase todas as escolas de biblioteconomia brasileiras, praticamente extinguindo a diversidade de códigos no ensino.” (MEY; SILVEIRA, 2009, p. 78).
Em 1969, outro conjunto de reuniões foi realizado em Copenhague, o que levou ao desenvolvimento da International Standard Bibliographic Description (ISBD). A ISBD abrange uma série de normas; a primeira delas, identificada como ISBD(M), indicada para a descrição de monografias, foi publicada em 1971; em seguida, foram surgindo outras para diferentes tipos de documentos (MEY; SILVEIRA, 2009).
Para Mey e Silveira (2009, p. 79), “[...] em 1978, é publicada a segunda edição do AACR, denominado de AACR2, também traduzida no Brasil entre os anos de 1983 e 1985. Porém, a uniformidade estava longe de ser alcançada.” De acordo com Santos e Pereira, “[...] a ALA publica, em 1978, o AACR2 com base na International Standard Bibliographic Description (General) – ISBD(G), dando ênfase a uma abordagem integrada na catalogação de diferentes tipos de materiais na biblioteca.” (SANTOS; PEREIRA, 2014, p. 62).
Em 1988, o AACR2 é submetido a uma nova revisão, passando a ser denominado AACR2r (MEY; SILVEIRA, 2009). Para Santos e Pereira (2014, p. 63), “[...] nesta revisão foram incorporadas as revisões de 1982, 1983 e 1985, mais as que não haviam sido publicadas até 1988.”
Em 1997, o Comitê Permanente da Seção de Catalogação da International Federation of Library Associations and Institutions (IFLA) aprovou o modelo FRBR. De acordo com Santos e Corrêa (2009, p. 32), o “Grupo de Estudos sobre FRBR da IFLA apresentou um relatório final em 1998 com recomendações para reestruturar os registros bibliográficos de maneira a refletir a estrutura conceitual de buscas de informação.” De acordo com a IFLA (1998), o objetivo desse estudo foi o de produzir uma estrutura que proporcionasse uma compreensão clara dos registros bibliográficos, de forma a responder às necessidades dos diversos usuários que utilizam estes registros.
Em 1998, o AACR2 passou por numerosas alterações. Em 2002, além de cobrir pequenas alterações, uma mudança substancial foi introduzida ao código: a entrada de instruções para descrição de recursos eletrônicos. Segundo Mey e Silveira (2009), a tradução deste código para a língua portuguesa foi publicada em 2004.
O Joint Steering Committee for Development of RDA (2009, p.1, tradução nossa), para justificar o desenvolvimento do RDA, relatou que
[...] as tecnologias digitais mudaram significativamente o ambiente em que as bibliotecas, arquivos, museus e outras organizações de gerenciamento de informação constroem e mantêm as bases de dados que descrevem e fornecem acesso aos recursos em suas coleções.
Tais mudanças tecnológicas trouxeram consigo a necessidade de alterações na representação da informação, com base nos modelos conceituais, de modo a enriquecer não só a representação dos recursos, mas também as atividades de busca de informação pelos usuários (SANTOS; CORRÊA, 2009).
Essas necessidades atingiram as AACR de tal forma que, em 2004, o Committee of Principals e o Joint Steering Committee decidiram por uma nova edição do AACR2r que incluísse a descrição de recursos digitais e analógicos e permitisse haver harmonia com o modelo conceitual FRBR. A nova revisão foi definida como AACR3.
Em 2005, esses comitês de revisão do AACR observaram que as mudanças nas AACR2r trariam grandes implicações e que seria melhor publicar um novo código de catalogação, que veio a ser intitulado como Resource Description and Access (RDA), cujo lançamento da primeira versão se deu em 2010 (OLIVER, 2011). Desde então, novas versões do RDA vêm sendo lançadas de forma online. Essas atualizações incluem alterações de conteúdos e metadados, revisões dos exemplos e melhorias da funcionalidade da ferramenta de acesso ao código por meio da produção do chamado RDA Toolkit.
Na sequência dos fatos, em 2011, a Library of Congress lançou o Bibliographic Framework Initiative (BIBFRAME), uma iniciativa para transição entre os dados do Formato MARC 21 para os dados bibliográficos vinculados ao ambiente web.
4 RDA – Resource Description and Access
O código de catalogação RDA foi desenvolvido pelo Joint Steering Committee (JSC) for Development of RDA (antiga Comissão de Acompanhamento Conjunta para o Desenvolvimento do RDA), atualmente mantido pelo RDA Steering Committee (RSC). Esse código estabelece um padrão para a descrição e o acesso aos recursos informacionais e foi projetado para o meio digital, caracterizando-se por um conjunto de instruções para todos os tipos de conteúdos e mídias, com alinhamento às tarefas dos usuários (JOINT STEERING COMMITTEE, 2016; RDA STEERING COMMITTEE, 2016).
Segundo Oliver (2011), o RDA apresenta uma estrutura coerente, flexível e extensível tanto para a descrição técnica quanto de conteúdo de todos os tipos de recursos. Pode, ainda, ser utilizada para descrição de recursos tradicionais e digitais, dentro e fora da biblioteca. Por esses motivos, o RDA foi proposto para substituir o AACR2r.
Para Oliver, “[...] apesar de manter uma forte relação com as AACR2, a RDA dela se difere por ser baseada em uma estrutura teórica, ter sido projetada para o ambiente digital e seu escopo ser mais abrangente do que das AACR2.” (OLIVER, 2011, p. 1). O escopo abrangente refere-se ao fato de a RDA poder ser adaptada de modo a atender às necessidades de outras comunidades ligadas ao patrimônio cultural, tais como arquivos, museus ou repositórios digitais.
Considerando a amplitude do tema, o RDA será apresentado sob os seguintes pontos: surgimento e desenvolvimento, utilização do RDA com o formato MARC 21 e uma comparação entre os códigos RDA e AACR2r.
O RDA surgiu após várias propostas de reorganização e atualização do AACR2r em eventos ocorridos entre 1997 e 2004, procurando atender às exigências atuais referentes aos impactos das novas tecnologias. Porém, para que essas novas necessidades surgidas fossem atendidas, seriam necessárias profundas mudanças estruturais no código.
Em 1997, ocorreu, em Toronto, a International Conference on the Principles and Future Development of AACR, convocada pelo Joint Steering Committee com o objetivo de debater os rumos futuros das AACR. Como resultado dessa conferência, o JSC listou ações que desencadeariam um processo de revisão da estrutura das AACR. De acordo com Oliver (2011, p. 52), “[...] as ações se relacionavam com o conceito de tipo de materiais, pois nas AACR2 o modo como um recurso é descrito é determinado pelo tipo de material a que pertence.” Ainda segundo Oliver (2011, p. 52), “[...] o conceito de tipo de materiais representava um grande obstáculo à flexibilidade e à extensibilidade das AACR2.”
Conforme Oliver (2011), em 1999, houve a tentativa de reorganização da primeira parte das AACR2 para desconstrução de sua estrutura baseada em capítulos por tipo de materiais, organizando-as segundo as áreas ISBD. Ainda segundo Oliver (2011, p. 53), a força-tarefa da ALA sobre coerência da parte I das AACR2 “[...] propôs revisões das regras e preparou um protótipo com novo arranjo. Esse rearranjo do texto das regras iniciou um processo em que se visualizava uma nova organização para a estrutura do código de catalogação.” Para Oliver (2011, p. 54), em 2001, o Committee on Cataloging: Description and Access (CC:DA) elaborou uma proposta de revisão da regra 0.24 das AACR2 que
[...] instruía o catalogador a ressaltar todos os aspectos do item que está sendo descrito, inclusive o conteúdo, o suporte físico, o tipo de publicação, as relações bibliográficas, bem como o fato de ele ter sido publicado ou não.
Apesar da força-tarefa do CC:DA em revisar a estrutura das AACR2, constatou-se que a solução do problema exigiria uma ampla reorganização das regras. Sendo assim,
Em abril de 2004, o Committee of Principals (CoP) e o Joint Steering Committee (JSC) decidiram que o grau de reorganização e de mudanças exigidas havia superado o nível de ‘alterações’ e justificavam uma revisão exaustiva das regras. O comitê denominou AACR3 essa nova revisão (OLIVER, 2011, p. 54, grifo do autor).
As mudanças propostas para o Anglo-American Cataloguing Rules 3rd edition (AACR3) aumentavam a integração das FRBR com estas regras de catalogação. Porém, “[...] conforme as alterações eram propostas, testadas e discutidas, tornava-se evidente que a norma estava caminhando na direção certa, mas não havia ainda ido muito longe.” (OLIVER, 2011, p. 55).
Em abril de 2005, o Committee of Principals e o Joint Steering Committee anunciaram uma nova mudança de enfoque. Ao invés de tentar trabalhar nos limites da estrutura das AACR2, foi tomada a decisão de abandonar totalmente a estrutura delas e partir para uma harmonização mais completa com o modelo FRBR (OLIVER, 2011, p. 55).
Deste modo, em 2005, apresentou-se no Joint Steering Committee for Revision of Anglo-American Cataloguing Rules a proposta para a construção de um padrão para substituir a AACR2r, a Resource Description and Access (RDA) (SANTOS; CORRÊA, 2009).
A partir desse momento, observa-se um período de estudos e amadurecimento da proposta, para então anunciar o lançamento desse novo código de catalogação, ocorrido em 2010. Entretanto, Welsh e Batley (2012) salientam que, ao contrário dos códigos anteriores, o RDA foi concebido, desde o início, para ser utilizado online, visto que se encontra em constantes atualizações, correções e implementações em busca de melhorias.
O RDA “[...] desenvolve-se a partir dos pontos positivos da AACR2 e seu foco está voltado às necessidades dos usuários para encontrar, identificar, selecionar e obter os materiais de que eles necessitam.” (FUSCO, 2011, p. 36).
Oliver (2011, p. 48) confirma que o código RDA foi construído com “[...] base nos alicerces lançados pelas AACR e nas tradições catalográficas em que se basearam. Esta estrutura aparece tanto no plano estratégico quanto no capítulo inicial do código RDA.”
Fusco (2011, p. 37) informa que:
[...] as indicações do RDA para escolha e forma de entrada têm origens nas instruções constantes da AACR2. Enquanto a forma de alguns cabeçalhos mudará com o RDA, a implementação de mudanças será facilitada por sistemas online cada vez mais sofisticados.
De acordo com Oliver (2011), a linguagem do código RDA se difere daquela usada na AACR2 por integrar um conjunto de instruções práticas baseadas nos modelos conceituais FRBR e FRAD. O desenvolvimento do RDA orientou-se pelos conceitos que tais modelos identificam e também por um conjunto de objetivos e princípios definidos, os quais são apresentados na introdução à RDA. Oliver (2011, p. 126) garante que “[...] a característica marcante da RDA é a sua harmonia com os modelos conceituais FRBR e FRAD e ser coerente com os Princípios Internacionais de Catalogação.”
Oliver (2011, p. 116) examina as vantagens da utilização da RDA, dentre as quais pode-se destacar o foco no usuário e no catalogador. Para os usuários, a vantagem está na harmonia do RDA com os modelos conceituais FRBR e FRAD, pois mostram como cada atributo e cada relação suporta determinadas tarefas de usuário. Oliver (2011, p. 116) garante que “[...] o foco no usuário traduz-se em instruções que realmente servem ao usuário ao registrar dados tendo em mente as necessidades.”
Oliver (2011, p. 128) traz vantagens ao catalogador ao fornecer um conjunto detalhado de instruções, além de “[...] apresentar uma orientação fundamental e objetivos funcionais específicos, e, em algumas instruções, abre espaço para que o discernimento do catalogador se faça valer de algo que considere importante.”
Destaca-se, também, como vantagem, o fato de os dados RDA poderem ser codificados com o emprego de esquemas existentes, como o Formato MARC 21, visto que os padrões de metadados de conteúdo não apresentam vínculo direto com os padrões de estrutura de metadados. Oliver (2011, p. 3) menciona que “[...] os dados RDA também podem ter correspondências estabelecidas com outros esquemas, atuais ou futuros.”
Para Serra (2013), o Formato MARC foi desenvolvido com o intuito de armazenar e permitir a visualização de registros, baseado em regras originais que existiam antes da tecnologia de computadores. Ainda segundo Serra (2013, p.3), o MARC é um formato “[...] com sintaxes rígidas e seus elementos de dados, compostos por indicadores, campos e subcampos, repetíveis ou não, garantindo a sua aderência ao AACR2.” O AACR2, por sua vez, foi pensado inicialmente para organização de catálogos em fichas. Para Serra (2013), esta situação não é coerente com o cenário atual.
O RDA surge em um novo contexto de descrição, cujas regras foram projetadas para a descrição de documentos digitais e de acesso online. Assim, houve a necessidade de adequação do Formato MARC 21 para viabilizar a aplicação do RDA. As atualizações estão disponíveis no site oficial do MARC 21 Bibliográfico, mantido pela Library of Congress, e é possível notar descrições detalhadas de cada elemento de dados, juntamente com exemplos.
As AACR2r apresentam, no contexto atual, limitações que dificultaram a extensão de suas regras para a descrição de novos recursos, o que levou a estudos e ao surgimento do RDA. Apresenta-se, a seguir, uma comparação entre os códigos AACR2 e RDA, a partir de Oliver (2011).
De acordo com Oliver (2011), as AACR foram desenvolvidas como um código de catalogação voltado para a descrição de documentos em papel. Embora as regras destinadas a outras mídias tenham sido incluídas no código, nunca houve uma metodologia logicamente coerente da descrição de conteúdo, mídia e suporte, enquanto que o RDA adicionou elementos, não incluídos no AACR2, que são comumente usados na descrição de recursos digitais.
Em uma comparação entre os códigos RDA e AACR2, podem ser destacadas algumas das mudanças relacionadas ao processo catalográfico, tais como: [1] a não obrigatoriedade do uso das pontuações – no AACR2 é utilizada, por exemplo, a barra oblíqua (/) antes da indicação de responsabilidade; [2] mudança no uso das abreviações, como a que é utilizada para indicar o número de páginas, a ilustração em documentos, a edição da publicação e as abreviaturas latinas – como, por exemplo, “s.l.”, para indicar que o local de publicação não foi identificado, “s.n.”, para indicar que o nome do publicador não foi identificado, e que, no RDA, utiliza-se “local de publicação não identificado” e “nome do publicador não identificado” (OLIVER, 2011).
Outra mudança é a dos pontos de acesso relativos aos responsáveis pelas obras. Oliver (2011) destaca que nas AACR2 adotava-se a regra de três – no caso de mais de três autores, indica-se o primeiro, omitem-se os restantes, e insere-se a expressão latina “et al.” para informar que a publicação tem mais autores. No RDA, a decisão sobre a quantidade de autores a serem indicados, tanto na indicação de responsabilidade quanto nos pontos de acesso, é da própria instituição catalogadora. Essas mudanças objetivam tornar a informação mais compreensível para o usuário.
5 BIBFRAME – Bibliographic Framework
A Library of Congress lançou, em 2011, o Bibliographic Framework Initiative, também chamado de BIBFRAME, com a finalidade de melhor atender as necessidades descritivas atuais e futuras. Segundo a Library of Congress (2012a), o Bibliographic Framework Initiative objetiva visualizar e, em longo prazo, implementar um novo ambiente bibliográfico para bibliotecas, que seja centralizado na web e que favoreça a interconexão de informações. Para Alves e Santos (2013, p. 94), “[...] esta iniciativa apresenta-se como um modelo inicial para o intercâmbio de dados em um ambiente de dados vinculados.”
Para a Library of Congress (2012a), o BIBFRAME constitui-se em iniciativa para tornar os recursos informacionais representados pelo Formato MARC 21 mais acessíveis em ambientes digitais, uma vez que busca estabelecer relações com outros padrões de metadados, acomodar os dados advindos das instruções do RDA e, ao mesmo tempo, garantir que o legado do padrão MARC 21 não se perca em meio às novas necessidades dos ambientes digitais.
A iniciativa está sendo projetada para integrar-se e desenvolver-se na comunidade de informação mais ampla e, ao mesmo tempo, servir às necessidades mais específicas de sua comunidade – bibliotecas e organizações similares de memória. De acordo com a Library of Congress (2012a, p. 3), o BIBFRAME realizará seus objetivos de várias maneiras:
a) diferenciando claramente o conteúdo conceitual e sua manifestação física (por exemplo, Obras e Instâncias);
b) focando na identificação inequívoca de informações sobre entidades (por exemplo, as autoridades);
c) promovendo e expondo as relações entre entidades.
No ambiente web é inegável a necessidade da citação de dados da biblioteca, de modo que não apenas diferencie a obra conceitual (um título e autor) dos detalhes físicos da manifestação desta obra (números de página, se ilustrado ou não), mas também identifique claramente as entidades envolvidas na criação de um recurso (autores, publicadores) e os conceitos (assuntos) associados ao recurso. Até o momento, as práticas empregadas em padrões de descrição em bibliotecas concentraram-se na criação de registros para comporem catálogos que fossem por si só compreensíveis, por meio da agregação de informações sobre a obra conceitual e de seu suporte físico, e do forte uso de identificadores, como o nome de um autor (LIBRARY OF CONGRESS, 2012a, tradução nossa).
Ainda segundo a Library of Congress (2012a), o BIBFRAME é um projeto inicial que continuará a evoluir, uma vez que deve ser capaz de acomodar qualquer número de modelos de conteúdo e implementações específicas, mas, ainda assim, permitir a interoperabilidade[5] entre sistemas.
A Library of Congress (2012a) informa que o BIBFRAME precisa atender às novas regras de metadados e padrões de conteúdo emergentes. Deve, pois, tanto ampliar quanto estreitar o universo de formatos para a troca de dados bibliográficos.
O ambiente informacional está, cada vez mais, utilizando os benefícios oferecidos pela web para a disponibilização da informação. Segundo a Library of Congress (2012a), o framework proposto, que aproveita a web como uma arquitetura subjacente, irá moldar um quadro descritivo comum e atingir dois objetivos: permitir maior integração dos recursos bibliográficos existentes e criar um roteiro para avançar em direção ao refinamento, remodelagem ou o desenvolvimento de abordagens alternativas.
Para Silva, “[...] a web está evoluindo de uma rede de documentos interligados para uma rede de dados interligados, tornando cada vez mais claro que esses dados são essenciais para a localização das informações disponíveis.” (SILVA, 2013, p. 95).
O BIBFRAME é um modelo Linked Data que, de acordo com Santarem Segundo (2013), é uma expressão adotada por Tim Berners-Lee, por ser entendido como um modelo associativo de publicação de dados estruturados na web, cuja característica principal está centrada no estabelecimento de links entre dados de fontes distribuídas.
Ao refletir o formato MARC 21 em um modelo Linked Data, expandem-se a utilidade e o valor destes dados tão bem quanto a comunidade de bibliotecas e instituições de patrimônio cultural o fazem (LIBRARY OF CONGRESS, 2012a). Segundo a Library of Congress (2012a), o Formato MARC possui três funções principais: relacionar dados à essência intelectual de uma obra, relacionar dados com a instância real da obra, e registrar metadados como números de controle, códigos de tratamento e outras anotações. Rezende (2016), ao analisar as funções principais do MARC a partir do documento produzido pela Library of Congress (2012a) Bibliographic Framework as a Web of Data: Linked Data Model and Supporting Services, relata que, ao desconstruir os elementos de dados correspondentes a essas funções, é possível começar a materializar os conceitos embutidos nestes conjuntos de elementos de dados como uma fonte de informação que pode ser interligada.
Para a Library of Congress (2012a), estes recursos do MARC podem ser remontados em uma arquitetura coerente, que constitui a base de um novo framework bibliográfico e permite a catalogação cooperativa em um nível mais granular[6] (pessoas, lugares, assuntos, organizações, etc.). Então, sempre que as atualizações a esses recursos MARC forem realizadas (por exemplo, alguém adiciona novas informações sobre uma pessoa, novos mapeamentos relacionados a um assunto, etc.) com a utilização da web como uma arquitetura de informações, os eventos de notificação poderão acontecer para atualizar automaticamente os sistemas que fazem referência a esses recursos.
O framework foi apresentado em dois segmentos: o modelo BIBFRAME e o vocabulário BIBFRAME. De acordo com o site oficial do BIBFRAME, mantido pela Library of Congress, o BIBFRAME é considerado como um modelo conceitual/prático que equilibra as necessidades daqueles que registram descrições bibliográficas detalhadas, dos que descrevem outros materiais culturais e dos que não precisam de um nível tão detalhado na descrição.
Conforme a tradução de Rezende (2016), a partir da Library of Congress (2012a) a iniciativa BIBFRAME irá fundamentar uma nova maneira de representar e permutar dados bibliográficos e acomodará os diferentes modelos de conteúdo e regras de catalogação, a exploração de novos métodos de entrada de dados e a avaliação de protocolos de intercâmbios atuais.
O BIBFRAME é considerado um modelo de dados interligados, baseado em Resource Description Framework (RDF)[7]. Para Rezende (2016), o modelo de dados RDF é um modelo de representação de recursos que visa à interoperabilidade e o acesso à informação em ambientes digitais.
O modelo BIBFRAME consiste nas seguintes classes principais: Work (Obra Criativa) - identifica a essência conceitual do item de catalogação; Instance (Instância)- recurso que reflete uma personificação material e individual da obra; Authority (Autoridade) - um recurso que reflete conceitos- chave de autoridade que definem relações refletidas na obra e na instância. Exemplos de recursos de autoridade incluem pessoas, lugares, tópicos, organizações, etc. Para a Library of Congress (2012a), as autoridades BIBFRAME não são projetadas para competir ou substituir os esforços de autoridade existentes, mas para, baseadas na web, fornecer uma camada de abstração comum sobre diferentes esforços de autoridade, para torná-los ainda mais eficazes; e, Annotation (Anotação) - um recurso que fornece informações adicionais a outros recursos do BIBFRAME. A Library of Congress (2012a) reforça que a abordagem dessa anotação é fundamental para criar um sistema impulsionado pela capacidade de conhecimento das bibliotecas e não pelos interesses comerciais que atualmente dominam a web. Esse modelo BIBFRAME pode ser visualizado na Figura 2.
No contexto dos modelos conceituais de relacionamento entre entidades, incluindo o FRBR, o modelo BIBFRAME reconhece entidades, atributos e suas relações. O BIBFRAME promove a prática de modelagem do RDF que identifica como recursos da web todas as entidades (recursos), atributos e relações (propriedades). Isso permite que mais anotações (como mapeamentos para outros vocabulários ou extensões da comunidade local) sejam criadas, conforme necessário (LIBRARY OF CONGRESS, 2012a).
O vocabulário BIBFRAME, por sua vez, é a chave para a descrição de recursos no ambiente informacional digital. Como os formatos MARC, o vocabulário BIBFRAME tem um conjunto de elementos e atributos definidos com um conjunto de classes e propriedades. Uma classe identifica um tipo de recurso BIBFRAME (obra, instância, autoridade ou anotação) e as propriedades servem como um meio para descrever um recurso BIBFRAME (por exemplo, título da obra, publicador, data de publicação, etc.). Para facilitar a compreensão, a Library of Congress (2012b) exemplifica que uma classe é muito parecida com um campo ou tag do Formato MARC, enquanto que uma propriedade é muito parecida com os subcampos do Formato MARC.
O modelo e o vocabulário BIBFRAME consideram os recursos que estão catalogados como obras com instâncias correspondentes (físicas e/ou eletrônicas). Os metadados que descrevem uma obra são uma fusão de alguns dos dados que foram anteriormente associados com o registro de título uniforme de autoridade, combinados com dados de assunto que foram associados aos registros bibliográficos. Assim, cada recurso catalográfico deve ter uma descrição de obra e, se esse recurso existe física ou eletronicamente, terá uma ou mais descrições de instância (LIBRARY OF CONGRESS, 2012c).
O modelo BIBFRAME é definido em RDF. O vocabulário RDF para o projeto do modelo BIBFRAME encontra-se em desenvolvimento. Pretende-se, com ele, fornecer uma maneira conveniente para navegar em torno do modelo RDF.
O vocabulário apresentado é um vocabulário inicial e contempla a descrição das áreas de informação geral, categorias de recursos catalográficos, títulos, descrição da instância, identificação, nota, assunto, classificação de assunto, termo de assunto, informação de relações, relacionamentos gerais, agentes, recursos catalográficos, anotação, anotações de holdings e administrativas, encontradas no documento Description of the category view of the BIBFRAME vocabulary, que descreve as classes e propriedades do vocabulário BIBFRAME como grupos funcionais, e explica os tipos de dados que são incluídos no vocabulário inicial das áreas citadas acima.
A Library of Congress (2012b) relacionou as diferenças básicas entre o Formato MARC e o modelo BIBFRAME, as quais serão apresentadas nos parágrafos seguintes.
O formato MARC, projetado para atender as regras do código AACR2, foi adaptado para atender dados do código RDA, enquanto o BIBFRAME já está sendo desenvolvido em consonância com dados RDA.
Como um formato de descrição bibliográfica, o MARC concentra-se em registros de catálogo que são compreensíveis em si mesmos. O BIBFRAME, por sua vez, depende fortemente de relações entre recursos (relações entre obras; relações entre obra e instância; relações entre obra e autoridade) (LIBRARY OF CONGRESS, 2012b).
O formato MARC agrega informações sobre obras conceituais e seus suportes físicos e usa cadeias de caracteres para seus identificadores, como nomes de pessoas, instituição, assuntos e outros que têm valor fora do próprio registro. O modelo BIBFRAME utiliza identificadores controlados para coisas (pessoas, lugares, línguas, etc.) (LIBRARY OF CONGRESS, 2012b).
Enquanto o padrão MARC não aproveita os benefícios que os recursos tecnológicos oferecem no contexto de dados interligados, o modelo BIBFRAME é o ponto de entrada formal da comunidade bibliotecária para se tornar parte de uma rede muito maior de dados, na qual as ligações entre as coisas são fundamentais (LIBRARY OF CONGRESS, 2012b).
O formato MARC possui um conjunto definido de elementos e atributos, e o modelo BIBFRAME possui um conjunto definido de classes e propriedades (classes: obra, instância, autoridade ou anotação; propriedades: título da obra, publicador, etc.). Ambos visam acomodar os dados gravados por outras regras, mas as regras de catalogação lhes dão características semelhantes (LIBRARY OF CONGRESS, 2012b).
Tennant (2004, p. 75, tradução nossa) menciona as dificuldades dos formatos MARC 21 no contexto atual:
[...] dentre as maiores dificuldades dos formatos MARC 21 está a ausência de conteúdo rico em sua estrutura, obrigando as bibliotecas a adotarem outros sistemas integrados à gestão de metadados para utilizar-se desse tipo de recurso.
O BIBFRAME apresenta o grande diferencial na aplicação de conceitos inovadores pertencentes ao universo da web, pois, conforme Rezende (2016), a utilização de dados interligados inova o modo com que o usuário interage com a informação e expande a capacidade de busca.
6 Considerações finais
O RDA foi projetado com base no modelo conceitual dos FRBR para a descrição de recursos no ambiente digital, cujo objetivo principal é
O RDA foi projetado com base no modelo conceitual dos FRBR para a descrição de recursos no ambiente digital, cujo objetivo principal é a satisfação do usuário, e designado para ser o sucessor do AACR2r, que foi pensado e desenvolvido para descrever documentos analógicos.
O BIBFRAME está sendo desenvolvido com o intuito de substituir o MARC 21 e de transpor os dados deste formato para dados bibliográficos vinculados no ambiente web. Isso se dá pelo fato de o Formato MARC 21 ter sido planejado para atender às necessidades descritivas de catálogos manuais, transferindo aos computadores as informações contidas em fichas catalográficas.
Tanto as AACR2r quanto o Formato MARC 21 tendem a ser substituídos por apresentarem dificuldades de adaptação às novas tecnologias da informação e às novas necessidades informacionais, inclusive aquelas propostas para a oferta de dados ligados. As informações descritas em MARC apresentam-se inflexíveis e confusas ao usuário final, por conta dos dados estratificados e de difícil identificação. As AACR2r, por sua vez, apresentam estrutura rígida e terminologia inadequada ao contexto atual.
Embora as AACR e o MARC tenham sido criticados, é incontestável a relevância que têm para as bibliotecas e para a catalogação, pois vêm sendo utilizados há mais de uma década pela maioria das bibliotecas do mundo. Oliver (2011) confirma, não apenas a importância das AACR, como também dos Princípios de Paris ao mencionar que o ponto de partida do RDA se deu a contar do sucesso muito evidente dos textos de 1967, não apenas nas comunidades inglesa, canadense e australiana para as quais as AACR foram criadas, mas também ao redor do mundo. As AACR foram adotadas na maioria dos países de língua inglesa e exerceram considerável influência na elaboração ou revisão de regras nacionais de catalogação em inúmeros outros países.
Da mesma forma, acredita-se que os formatos MARC 21 devem continuar sendo utilizados amplamente para o intercâmbio e disseminação de registros catalográficos em meio eletrônico. Apesar de o modelo BIBFRAME ter sido lançado em 2011 e, no momento, encontrar-se em fase de implementação das ferramentas de testes pela Library of Congress, considera-se uma importante iniciativa, embora sem previsão de sua efetiva implementação.
Espera-se que este estudo tenha contribuído para o avanço do conhecimento acerca do desenvolvimento da representação da informação no domínio bibliográfico, sobretudo no que se refere ao código de catalogação RDA e da iniciativa BIBFRAME, bem como para a Ciência da Informação.
Este artigo sugere como pesquisas futuras um maior aprofundamento sobre os conceitos envolvidos acerca do código de catalogação RDA e da iniciativa BIBFRAME, e sobre as suas funcionalidades para a catalogação. Sugere, ainda, o desenvolvimento de pesquisas empíricas que demonstrem os problemas e vantagens dessas iniciativas para a descrição da informação no domínio bibliográfico.
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Notas
Autor notes
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