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Recepção: 04 Janeiro 2018
Aprovação: 30 Maio 2018
DOI: https://doi.org/10.19132/1808-5245251.185-211
Resumo: O presente artigo objetiva discutir, a partir de um enfoque multidisciplinar, as dimensões conceituais que aproximam o estudo das representações sociais e da identidade ao campo da informação simbólica. Para tanto, adota por prerrogativa que a informação, pensada aqui como fenômeno social, atravessa e modula os distintos processos de negociação a partir dos quais certos discursos representacionais e identitários são elaborados, aceitos e confrontados. De modo mais específico, e considerando a realidade de determinados contextos sociais marcados pela desigualdade e pelas assimetrias de poder, analisa-se o caráter ideológico da informação e como o mesmo incide no processo de constituição dos quadros de sentido responsáveis por delinear uma imagem dissonante do outro e dos grupos em que nos encontramos inseridos.
Palavras-chave: Informação social, Informação simbólica, Informação e ideologia, Representações sociais, Identidade.
Abstract: This article aims to discuss, from a multidisciplinary standpoint, the conceptual dimensions that bring the study of social and identity representations and the field of symbolic information closer to each other. To achieve this, it assumes that information, regarded here as a social phenomenon, permeates and interferes with the different processes of negotiation from which some representation and identity discussions are elaborated, accepted and confronted. More specifically, considering the reality of certain social contexts marked by inequality and power asymmetries, it analyzes the ideological state of information, and how this influences the process of establishing the meaning responsible for drawing a distorted image from one another and from the groups in which it is inserted.
Keywords: Social information, Symbolic information, Ideology and information, Social representations Identity.
1 Introdução
Definida pela literatura como uma das principais instâncias que amparam as relações entre os indivíduos, uma vez que marca e atravessa todas as suas práticas comunicativas, a informação constitui-se como recurso de produção de sentidos e significados por meio dos quais sujeitos e grupos sociais constroem suas distintas formas de conhecer o mundo, bem como os discursos e imagens sintetizadores dos modos pelos quais querem ser vistos e representados.
Concebida, pois, como fenômeno da ordem da cultura e apreendida como recurso simbólico, a informação situa-se na base do processo representacional, instância em que os sujeitos e as comunidades elaboram imagens de si, do outro e do mundo. Razão pela qual, de acordo com Martins (2015), a informação e seus modos de produção, disseminação e apropriação encontram-se inseridos em um campo de disputas “[...] na medida em que possibilita aos sujeitos a nomeação das diferenças que os assinalam, a apresentação de suas visões de mundo, identidades, demandas, inimigos, o posicionamento e a negociação discursiva nos embates em que se envolvem.” (MARTINS, 2015, p. 8).
Nesse sentindo, e atentando para tais aspectos, o presente artigo objetiva discutir, a partir de um enfoque multidisciplinar, as dimensões conceituais que aproximam o campo da informação simbólica dos estudos das representações sociais e da identidade. A partir desse movimento, pretendemos pensar a informação como elemento que permeia as dinâmicas de constituição, objetivação e negociação em que as representações sociais e os discursos identitários são elaborados, aceitos e/ou confrontados.
Para tanto, além de pensar a informação como fenômeno social e inscrito no campo da cultura, condição que lhe confere um caráter eminentemente simbólico, assinalamos que as representações sociais são entendidas, aqui, como formas de pensamento do senso comum que servem como guia para compreender a realidade da vida cotidiana, “[...] uma forma de conhecimento socialmente elaborada e partilhada, que tem um objetivo prático e concorre para a construção de uma realidade comum a um conjunto social.” (JODELET, 1989, p.36). Como são construídas pelos sujeitos, tanto a informação como as representações sociais configuram-se em expressões ativas dos indivíduos porque se referem à tomada de posição em um conjunto de relações sociais. Atentando para tais aspectos, aproximamos esses dois conceitos ao universo dos discursos identitários, problematizando o modo como o caráter ideológico da informação incide no processo de constituição dos quadros de sentido responsáveis por delinear uma imagem dissonante do outro e dos grupos onde cada indivíduo encontra-se inserido.
Por tratar-se de uma reflexão teórica, definir informação como uma construção simbólica, inscrita na ordem da cultura, que produz significados passíveis de serem compartilhados e negociados converte-se para nós em valioso guia analítico, uma vez que buscamos ressaltar nas páginas a seguir os distintos pontos que modulam as representações sociais e os discursos identitários em interface com as dinâmicas informacionais, pois é por meio de tais dinâmicas que "[...] os significados, símbolos e signos culturais são transmitidos, assimilados ou rejeitados pelas ações e representações dos sujeitos sociais em seus espaços instituídos e concretos de realização.” (MARTELETO, 1995, p. 1). Dito isso, comecemos nosso trabalho de elaboração conceitual respondendo às seguintes questões: o que são representações sociais? Que tipo de conhecimento está na base de sua elaboração e que relações se instituem entre as dinâmicas informacionais e os processos de objetivação e ancoragem das representações sociais?
2 Representações sociais: o simbólico como elemento constitutivo do real
De maneira geral, as representações sociais podem ser definidas como ideias, valores e práticas que circulam nas mais diversas formas de interação social. Elas são elaboradas no esforço de compreender e dar significado a diferentes aspectos das nossas experiências. Esse saber, que está diretamente vinculado ao senso comum, expressa visões de mundo que orientam o modo de agir de homens e mulheres no cotidiano, colaborando, assim, para a construção de suas realidades sociais.
No contexto acadêmico, o interesse por esse conhecimento modulador das representações sociais ocupa pesquisadores em diversos campos científicos há vários anos[2]. Contudo, foi no campo da psicologia social que os estudos representacionais ganharam vigor e visibilidade, sobretudo a partir da publicação das obras de Serge Moscovici, psicólogo social romeno, radicado na França, que buscou compreender as formas pelas quais os sujeitos se familiarizam com uma novidade e a integram na vida cotidiana, transformando-a em orientador simbólico de suas ações no mundo.
Movimento esse que, segundo o autor, demarca a principal função das representações sociais, qual seja: tornar familiar o que é não familiar, de maneira que saberes estocados na memória possam ser usados para facilitar a compreensão do novo, classificá-lo e nomeá-lo, uma vez que “[...] coisas que não são classificadas e que não possuem nome são estranhas, não existentes e ao mesmo tempo ameaçadoras.” (MOSCOVICI, 2003, p. 61). Assim, o ato de “objetivar o mundo”[3] permite ao sujeito avaliar e interagir com objetos, pessoas e situações que lhe seriam completamente estranhos caso tal processo não se efetivasse. Nesses termos, a base estruturante das representações sociais mostra-se estritamente vinculada, ancorada àquilo que é classificado e ordenado mental e socialmente visando-se permitir a comunicação entre os sujeitos e entre esses e o grupo ao qual pertencem. Ou seja: para que exista o intercâmbio comunicativo, as ideias são projetadas de maneira a influenciar indivíduos ou grupos para a criação de um universo consensual “[...] de tal modo que as coisas são vistas desta maneira, em vez daquela.” (DUVEEN, 2003, p. 28).
Dito isso, ao formular as bases conceituais da Teoria das Representações Sociais (TRS), Serge Moscovici torna explícito que seu interesse não é mais buscar compreender as representações erigidas por sociedades primitivas ou os fatos sociais que condicionavam os sistemas culturais de épocas remotas, mas sim as representações que se fazem perceber em nossa sociedade presente, aquelas
[...] do nosso solo político, científico e humano, que nem sempre tiveram tempo suficiente para permitir a sedimentação que as tornasse tradições imitáveis. E sua importância continua a crescer, em proporção direta à heterogeneidade e flutuação dos sistemas unificadores – ciências oficiais, religiões, ideologias – e às mudanças pelas quais eles devem passar a fim de penetrar na vida cotidiana e se tornar parte da realidade comum. (MOSCOVICI, 1984, p. 18-19[4] apud SÁ, 2004, p. 22).
Nesses termos, a psicologia social moscoviciana reorienta a visada funcionalista dos pressupostos durkheimianos, enfatizando que as estruturas representacionais não devem ser tomadas como unidades coesas que se legitimam através do seu poder de coerção, uma vez que emergem e se fazem notar no âmbito dos pontos de conflitos instituídos e instituintes da própria cultura. Sendo assim, Moscovici defende que as representações sociais, diferentemente das coletivas, instituem-se não apenas como modo de compreender um objeto particular, mas também como forma em que o sujeito (indivíduo ou grupo) adquire capacidade de definição das maneiras como as representações expressam seu valor simbólico. Razão pela qual, para o nosso autor, as representações sociais são sempre produto da interação e da comunicação que “[...] tomam sua forma e configurações específicas a qualquer momento, como uma consequência do equilíbrio específico desses processos de influência social.” (DUVEEN, 2003, p. 21). Conjunção de elementos que serviu como ponto de partida para que Moscovici definisse as representações sociais como:
Um sistema de valores, ideias e práticas com uma dupla função: primeiro, estabelecer uma ordem que possibilitará às sociedades orientar-se em seu mundo material e social e controlá-lo; e, em segundo lugar, possibilitar que a comunicação seja possível entre os membros de uma comunidade, fornecendo-lhes um código para nomear e classificar, sem ambiguidade, os vários aspectos de seu mundo e da sua história individual e social. (MOSCOVICI, 2003, p. 21).
Além de realocar o estudo das representações para o plano do social, o conceito acima formulado assinala três avanços analítico-metodológicos em relação às propostas de apreensão das representações coletivas que até então vigoravam: reduz a amplitude de formas de conhecimento presentes na teoria durkheimiana; compreende que os fenômenos sociais contemporâneos são móveis e não possuem contornos amplamente definidos e interpela as representações sociais não como dados ou entidades explicativas absolutas, mas como fenômenos que apresentam tensões em suas estruturas e mecanismos internos.
Visando-se clarificar as dinâmicas que modulam e conferem novidade às proposições levadas à cabo pela TRS, cabe lembrarmos a etimologia da palavra “representação”. A forma latina repraesentare significa fazer presente ou apresentar de novo. Assim, como ressalta Denise Jodelet (2001), representar é fazer presente alguém ou alguma coisa ausente, inclusive uma ideia por meio da presença de um objeto, e estabelecer com ele uma relação de simbolização. Definidas nesses termos, as representações forjam versões da realidade e podem, portanto, ser incorporadas ou confrontadas, razão pela qual são sociais. Em função disso, o aspecto simbólico que caracteriza o comportamento social e seus processos de comunicação expressam um sistema de valores criados a partir de referenciais comuns e “[...] consistem de suas manifestações verbais e não-verbais que são compreendidas e se tornam visíveis somente em relação aos significados comuns que eles adquirem para os que recebem as mensagens e para aqueles que as emitem.” (MOSCOVICI, 2003 p. 161).
De acordo com essa perspectiva, considerar a dimensão social do indivíduo significa perceber que ele interioriza e apropria-se das representações, assim como age para produzi-las, disseminá-las e, por vezes, negá-las. Dito de outra maneira, as experiências sociais dos indivíduos influenciam não apenas em seus modos de vida, mas também nos valores que pautam suas relações com o mundo e as prerrogativas que justificam ou não sua adesão a certas formas de pensamento. Não por acaso, Denise Jodelet (2009) recorre à noção de agente, conforme conceituado por Giddens (1982), para se referir ao indivíduo capaz de fazer reflexões sobre sua situação e seu saber.
Colocar o indivíduo como agente implica reconhecer neste último um potencial de escolha de suas ações, permitindo-lhe escapar da passividade diante das pressões ou constrangimentos sociais e intervir, de maneira autônoma, no sistema das relações sociais, como detentor de suas decisões e senhor de suas ações. (JODELET, 2009, p. 689).
Essa concepção que considera o indivíduo como agente se faz relevante para os estudos em representação social porque não desvaloriza os limites da historicidade e das condições sociais dos sujeitos. Além disso, está relacionada a uma mudança de perspectiva epistêmica notada em outras disciplinas como a História e a Antropologia a partir dos anos de 1980. Essa mudança passa a conferir especial atenção à importância do contexto que dá sentido à experiência dos atores sociais e de suas reivindicações identitárias. O estudo dessas lutas que envolvem a estruturação do social acentua, de acordo com Roger Chartier (1991, p.184), “[...] as estratégias simbólicas que determinam posições e relações e constroem, para cada classe, grupo ou meio, uma percepção de si constitutiva da sua identidade.”.
Em função disso, os processos simbólicos que regem as relações sociais e que atuam na afirmação identitária dos sujeitos e dos grupos aos quais os mesmos se vinculam passam a ocupar uma posição de centralidade nos estudos representacionais, uma vez que a noção de subjetividade implica considerar os processos pelos quais cada sujeito/agente se constrói e se apropria das representações. Para Jodelet (2009), os modos que os sujeitos possuem de ver, conhecer e interpretar a realidade incidem diretamente sobre suas ações práticas. Segundo a autora, convém, pois, distinguir as representações que o sujeito elabora daquelas que ele integra passivamente. Isso nos conduz “[...] a integrar na análise das representações os fatores emocionais e identitários, ao lado das tomadas de posição ligadas ao lugar social e das conotações que vão caracterizar, em função da pertença social, a estrutura das representações.” (JODELET, 2009, p. 697).
Nesses termos, entre as representações criadas para o sujeito e as concebidas pelo sujeito, dá-se a ver as dinâmicas de negociação em que ele se posiciona, confrontando ou aceitando tais representações. Em outras palavras, nesse intervalo ocorre o processo de negociação em que uma imagem de si e do outro é delineada, tensionada e, por vezes, reelaborada. Condição que nos leva a assinalar que a base estruturante das representações sociais é, portanto, a visão daquilo que é classificado a partir das mediações que estabelecemos com o outro ou com o grupo. “As representações resultam dos processos de interação entre os sujeitos e da experienciação dos referenciais simbólicos que informam e modulam a vida cotidiana.” (SILVEIRA, 2012a, p. 213).
Assim explicitado, cabe ressalar, ainda, a importância que a informação e as dinâmicas informacionais assumem junto aos processos de elaboração e de mediação das representações sociais. Estando relacionada “[...] aos modos de produção de significados e sentidos que operam historicamente de maneira tensa e renovável no âmbito da representação da realidade e do imaginário social.” (MARTINS, 2015, p. 8), a informação confere sentido e explicita as conexões entre o sentido mobilizado pela representação e as relações de força, por vezes de dominação, que “[...] este sentido ajuda a estabelecer, sustentar ou alterar.” (MARTINS, 2015, p. 9). Centralidade que, por sua vez, se faz visível, também, nas discussões contemporâneas acerca da identidade e das estratégias de legitimação ou de negação de certos discursos identitários. Eis o que tencionamos demonstrar a seguir.
3 Identidade[5]: elaboração discursiva formulada e transformada no interior das representações
A ideia de identidade enquanto essência interior ou algo unificado que estabiliza o sujeito cedeu lugar a uma nova forma de entendimento a partir da globalização. Respondendo às injunções acionadas por esse novo contexto, os marcadores identitários passam a ser associados à ideia de construção, a discursos representacionais em permanente processo de elaboração. Constatação também referendada por Bauman (2005, p. 17) ao assinalar que “[...] as identidades não têm [mais] a solidez de uma rocha, não são garantidas para toda a vida, são bastante negociáveis e revogáveis.”.
Isso acontece porque, se até a modernidade o sujeito era percebido como portador de uma identidade única ou uma essência interior fixa vinculada a categorias amplas como sexo, religião, classe social e visão política, a noção de sujeito pós-moderno[6] celebra as “identidades móveis” (HALL, 2003, p. 13) e postula que as dinâmicas identitárias não estão suturadas a estruturas estáveis, assinalando, pois, seu caráter provisório e maleável. A partir desse processo de descentramento, a identidade passa a ser pensada como uma elaboração discursiva e performativa “[...] formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam.” (HALL, 2003, p. 13).
Isso se dá porque o processo de construção do sujeito pós-moderno tem a ver não só com as mudanças na organização dos sistemas de produção e a reconfiguração das instituições modernas, mas também com os resultados decorrentes das reflexões e apontamentos feitos sobre a vida em sociedade por pesquisadores oriundos das ciências humanas e sociais. Segundo Stuart Hall (2003), avanços ocorridos na modernidade tardia[7] (segunda metade do século XX), potencializaram esse processo de descentramento, desestabilizando, assim, a ideia de um “sujeito unificado”. O autor sublinha que as sociedades prefiguradas pela modernidade tardia são sociedades em permanente processo de mudança, marcadas pela diferença e pelos antagonismos sociais, onde a vida e as práticas sociais são transformadas “[...] à luz das informações recebidas sobre aquelas próprias práticas, alterando, assim, constitutivamente, seu caráter.” (GIDDENS, 1990, p. 37-38[8] apud HALL, 2003, p. 15).
O resultado desses processos assinalados e discutidos por Stuart Hall acaba por conferir ao “sujeito pós-moderno” uma identidade que não é fixa ou permanente, uma vez que pode ser elaborada e reelaborada em diferentes situações do convívio social. O sujeito, imerso em contextos sociais diversos, passa a se orientar e a organizar-se em torno das necessidades relacionadas com a produção de discursos identitários mobilizados por indígenas, negros, gays, lésbicas, ambientalistas, entre tantos outros. Por isso, para o autor, em vez de falarmos em “identidade” deveríamos pensar em processos de identificação, uma vez que somos interpelados por uma multiplicidade de representações identitárias possíveis com as quais poderíamos ou não nos identificarmos. Nas palavras do pensador multiculturalista:
Uma vez que a identidade muda de acordo com a forma como o sujeito é interpelado ou representado, a identificação não é automática, mas pode ser ganhada ou perdida. Ela tornou-se politizada. Esse processo é, às vezes, descrito como constituindo uma mudança de uma política de identidade (de classe) para uma política de diferença. (HALL, 2003, p. 21).
No entendimento do senso comum, a identificação se dá a partir do reconhecimento das semelhanças, de alguma origem ou ideal compartilhado pelos sujeitos. Em contraste com essa definição, Hall sublinha que a identificação é um processo pautado pela distinção, uma ação referencial que nunca se completa e que surge não tanto da sensação de plenitude, mas da falta, “[...] a identificação é, ao fim e ao cabo, condicional; ela está alojada na contingência. Uma vez assegurada, ela não anulará a diferença.” (HALL, 2008, p. 106). Essa concepção aceita que a identidade está em constante processo de mudança. Dito isso, considerar a identidade do sujeito, seja em sua dimensão intersubjetiva ou em seu enquadramento social, implica, a partir dessas premissas, admitir que construímos nossas percepções de mundo e de nós mesmos no cerne das relações com o outro, ou seja, não mais a partir de um centro, um “eu” interior em consonância com formas fechadas de categorização do mundo, mas no diálogo entre os discursos e práticas produzidos por nós e para nós.
As discussões contemporâneas sobre a identidade vinculam-se, assim, ao conjunto de práticas e de discursos que tensionam o caráter relativamente estável das representações que os sujeitos criam para si, para seus grupos e culturas. Isso porque tais representações, ao mesmo tempo em que evocam um passado histórico comum, reivindicam a possibilidade de erigirem novos pontos de ancoragem que, em diálogo ou em dissociação com as múltiplas camadas de sentido revelados por meio da linguagem, dos processos comunicativos, das dinâmicas informacionais e de outras instâncias da cultura, revelem menos o que o sujeito é e mais aquilo que ele se tornou. Ou, como explica o autor:
O conceito de identidade aqui desenvolvido não é, portanto, um conceito essencialista, mas um conceito estratégico e posicional. Isto é, de forma diretamente contrária àquilo que parece ser sua carreira semântica oficial, esta concepção de identidade não assinala aquele núcleo estável do eu que passa, do início ao fim, sem qualquer mudança, por todas as vicissitudes da história. Esta concepção não tem como referência aquele segmento do eu que permanece, sempre e já, ‘o mesmo’, idêntico a si mesmo ao longo do tempo. Ela tampouco se refere, se pensarmos agora na questão da identidade cultural, àquele eu coletivo e verdadeiro que se esconde dentro de muitos outros eus – mais superficiais ou mais artificialmente impostos – que um povo, com uma história e uma ancestralidade compartilhadas, mantém em comum. Ou seja, um eu coletivo capaz de estabilizar, fixar ou garantir o pertencimento cultural ou uma ‘unidade’ imutável que se sobrepõe a todas as outras diferenças – supostamente superficiais. Essa concepção aceita que as identidades não são nunca unificadas; que elas são, na modernidade tardia, cada vez mais fragmentadas e fraturadas, que elas não são, nunca, singulares, mas multiplamente construídas ao longo de discursos, práticas e posições que podem se cruzar ou ser antagônicas. [...] Elas [as identidades] têm a ver não tanto com as questões ‘quem nós somos’ ou ‘de onde nós viemos’, mas muito mais com as questões ‘quem nós podemos nos tornar’, como nós temos sido representados e como essa representação afeta a forma como nós podemos representar a nós próprios. (HALL, 2008, p. 108-109, grifo do autor).
Apesar de longa, a citação acima apresentada mostra-se relevante para assinalarmos que a identificação pode ser apreendida como um processo de negociação que se dá no movimento, no confronto entre as representações criadas para certos sujeitos e grupos e as representações acionadas e performadas por eles próprios. Nesse terreno de disputas, Hall (2008) sublinha a importância de se compreender os locais históricos e institucionais onde as identidades são construídas e “representadas”. Para o autor, esse entendimento implica reconhecer que é apenas por meio da relação com o outro, da relação com aquilo que falta, que um dado discurso identitário pode ser formulado. Uma relação dinâmica em que os pontos de identificação são traçados e entrelaçados por meio da diferença – por isso e em função das dinâmicas de comunicação e interação com o outro, nunca se definem por completo. Recorrendo mais uma vez às palavras de Stuart Hall:
As identidades podem funcionar, ao longo de toda sua história, como pontos de identificação e apego apenas por causa de sua capacidade para excluir, para deixar de fora, para transformar o diferente em ‘exterior’, em abjeto. Toda identidade tem, à sua ‘margem’, um excesso, algo a mais. A unidade, a homogeneidade interna, que o termo ‘identidade’ assume como fundacional não é uma forma natural, mas uma forma construída de fechamento: toda identidade tem necessidade daquilo que lhe ‘falta’ – mesmo que esse outro que lhe falta seja um outro silenciado e inarticulado. (HALL, 2008, p. 110, grifo do autor.).
Assim, a identidade estaria mais ligada a uma posição que o sujeito assume, tomando lugar em um processo em que nem todos são convocados a ocupar ou que nem sempre se percebem como indivíduos que podem “falar”. A identidade pode, pois, ser também apreendida pelo aspecto da desigualdade, da exclusão, já que ao lado daqueles que podem constituir “qualquer identidade”, há aqueles que se veem oprimidos por identidades impostas: “[...] identidades de que eles próprios se ressentem, mas não têm permissão de abandonar nem das quais conseguem se livrar. Identidades que estereotipam, humilham, desumanizam, estigmatizam […]” (BAUMAN, 2005, p. 44).
Compartilhando desse entendimento segundo o qual a identidade é construída em um contexto marcado por relações de poder, Castells (1999) indica três formas que podem explicar por que e para que as identidades são construídas: a identidade legitimadora seria construída pelas instituições dominantes para expandir a dominação em relação aos atores sociais. Já a identidade de resistência estaria ligada à construção feita pelos atores sociais que, diante da opressão, criam princípios diferentes de vida em sociedade. Por fim, a identidade de projeto: quando os atores sociais “[...] constroem uma nova identidade capaz de redefinir sua posição na sociedade e, ao fazê-lo, de buscar a transformação de toda a estrutura social.” (CASTELLS, 1999, p. 24).
A partir dessas considerações, torna-se pertinente pensarmos os processos simbólicos mobilizados na elaboração e reelaboração das representações identitárias observando que, em muitos casos, essas representações podem sustentar e reproduzir relações de dominação ou mesmo confrontá-las. O entendimento da informação não como dado objetivo ou “coisa”, mas como recurso simbólico mostra-se, assim, essencial para compreendermos o movimento de negociação em que as representações podem ser aceitas e incorporadas ou, em outra via, rejeitadas e reelaboradas. Assim, quando falamos em fenômeno informacional, estamos pensando nas dinâmicas de produção, disseminação e apropriação da informação. Dito de forma mais explícita, dos múltiplos processos que colocam a informação “[...] em movimento, sendo comunicada, elaborada e trabalhada em grupos sociais e gerando conhecimentos relevantes e capital social.” (AZEVEDO, 2004, p. 127). Conhecimentos que, conforme apontado acima, servem em maior ou em menor medida para objetivar certas representações sociais e diferentes discursos identitários, como também para negá-los e transformá-los no interior da própria vida social. Aprofundaremos essa questão na seção que se segue ao discutirmos o conceito de informação simbólica.
4 Informação simbólica: fenômeno social que permeia a elaboração das representações sociais e dos discursos identitários
A noção de informação a que nos referimos aqui se deixa desvelar como uma construção social e simbólica da realidade, constituída por sujeitos histórica e socialmente situados e em permanente processo de interação. A partir desse enfoque, a apreensão do fenômeno informacional deve considerar as distintas dimensões políticas, econômicas, históricas e culturais dos sujeitos que definem seus modos de produção, formas de disseminação e também suas dinâmicas de apropriação. Assim, é necessário perceber a informação não como algo neutro, mas como:
Produto das relações humanas, no contexto de uma sociedade de classes e no qual interesses divergentes se encontram presentes na arena social. De forma objetiva a informação é o resultado de uma produção social na qual os diferentes atores, na arena política, comparecem com interesses divergentes, buscando implementar os resultados que concretizem seus objetivos. (REIS, 2007, p. 26).
Buscando entender como se dá a construção social dos processos informacionais, Reis (2007) ressalta as inúmeras influências culturais, históricas e ideológicas que pautam os modos como cada indivíduo interage com os distintos contextos informativos em que atua. Dialogando com Cardoso (1994), Reis ressalta que, para tanto, é preciso levar em conta a historicidade dos sujeitos e que as relações que os mesmos mantêm com a informação são culturalmente estabelecidos, razão pela qual se faz necessário contextualizar a informação junto aos fenômenos sociais e considerar a tensionalidade existente entre grupos, classes e sujeitos que disputam a hegemonia sobre os processos, estruturas e instituições sociais. Assim, o fenômeno informacional é compreendido como constructo da ordem da cultura, entendendo “cultura” como os processos simbólicos e práticas que alimentam maneiras de ser e estar na sociedade. Nessa mirada, a informação é um elemento da cultura “[...] pois é da ordem da criação humana – que carrega sentido ao ser comunicado para produzir conhecimento”. (MARTELETO, 2007, p. 17).
Entre os diversos estudos[9] que tencionaram aproximar os conceitos de informação e cultura, alguns recorrem a Thompson (2011), muito em função de o autor retomar as múltiplas abordagens que o conceito de cultura ganhou ao longo dos anos. De acordo com o sociólogo americano, no século XX duas novas modalidades de apreensão são incorporadas ao termo e aos estudos da cultura: a primeira é o fato de que o ser humano interpreta e produz significados sobre os registros e objetos com os quais interage, transpondo, pois, a recepção passiva dos mesmos. A segunda refere-se à dimensão simbólica da própria cultura que, para Thompson, pode ser entendida como as ações, objetos e expressões significativas em relação a contextos e processos historicamente específicos nos quais as formas simbólicas são produzidas e transmitidas.
Na esteira de Thompson e inscrita no campo da epistemologia social dos estudos informacionais, Martins (2010; 2013; 2015) apreende a informação como forma simbólica que diz respeito aos processos de produção e apropriação de sentidos elaborados e transmitidos por sujeitos ou grupos em suas relações sociais. Razão pela qual, remetendo-se a Thompson (2011), ressalta cinco dimensões a partir das quais as formas simbólicas se manifestam como contextos e processos socialmente estruturados, quais sejam: as dimensões intencional, convencional, estrutural, referencial e contextual.
A dimensão intencional das formas simbólicas indica que o sujeito, ao produzir uma informação, tenta se expressar intencionalmente para outros, refletindo, assim, sua visão de mundo. A intencionalidade das formas simbólicas revela, nesses termos, seu caráter ideológico.
Por sua vez, ao refletir sobre a dimensão convencional, Thompson (2011) assinala os processos que envolvem códigos e convenções que governam a interação dos indivíduos. Trata-se do conjunto de esquemas implícitos que governam a geração e a interpretação das formas simbólicas. Dito isso, o autor enfatiza que nem sempre os sujeitos se mostram conscientes dessas regras para produzir ou interpretar as formas simbólicas, posto que as mesmas são aplicadas em situações práticas e fazem parte do “[...] conhecimento tácito que os indivíduos empregam no curso de suas vidas cotidianas, criando constantemente expressões significativas e dando sentido às expressões criadas por outros.” (THOMPSON, 2011, p. 186). Desse modo, por estar inscrita na ordem da cultura, a informação, assim como as representações sociais, configura-se como constructo de significação resultante dos processos de interação entre os sujeitos e da experienciação dos referenciais simbólicos que informam e modulam a vida cotidiana.
Complementar a essa segunda dimensão, o aspecto estrutural refere-se às construções que revelam uma estrutura simbólica, a totalidade em que as formas simbólicas estão inseridas e as inter-relações entre as muitas partes que compõem essa estrutura. A estrutura define-se, assim, como um padrão de elementos que pode ser percebido em manifestações verbais, textuais ou outras formas comunicativas. “Ao analisar esses traços e elementos, podemos aprofundar nossa compreensão do significado transmitido pelas formas simbólicas.” (THOMPSON, 2011, p. 188).
Conjugada a essas outras três, a dimensão referencial indica que tais construções representariam alguma realidade; em suma, que elas se referem a algo. Essa característica fala de um contexto em que uma forma simbólica substitui ou representa um objeto, indivíduo ou situação. Thompson chama a atenção para as maneiras pelas quais as formas simbólicas representam algum objeto ou os modos pelos quais “[...] dizem algo sobre ele, isto é, afirmam ou declaram, projetam ou retratam.” (THOMPSON, 2011, p.191). Similar aos processos de objetivação e ancoragem, a dimensão referencial busca explicitar as dinâmicas complexificadoras das sociedades contemporâneas, adotando como ponto de partida as construções simbólicas forjadas no cerne das práticas culturais e reveladas no contexto das relações sociais.
Por fim, a quinta dimensão proposta por Thompson e discutida por Martins (2015) assinala os contextos sócio-históricos, considerando que os sujeitos estão situados dentro de uma realidade específica e que, em função disso, adotam diferentes recursos para produzir, receber e transmitir as formas simbólicas. Em outras palavras, os recursos e as dinâmicas empreendidas pelos sujeitos influenciam na maneira como as formas simbólicas são produzidas, interpretadas e assimiladas.
Isso implica ressaltar que, ainda na esteira de Thompson (2011) e Martins (2015), os indivíduos não absorvem passivamente as formas simbólicas: eles produzem significados ao longo dos processos de recepção e interpretação, atuam criativamente constituindo os significados de acordo com as condições que possuem e a posição que ocupam em um dado contexto social. Assim, a dinâmica informacional está ligada ao poder de instituir a realidade, na medida em que a apropriação e produção da informação articulam sentidos e modulam as maneiras pelas quais as formas simbólicas são recebidas, significadas e ressignificadas.
Razão pela qual ressaltamos que a informação define-se como recurso em disputa, principalmente quando o que se busca é atribuir valor às formas simbólicas. Não por acaso, a valorização simbólica é um processo que envolve diferentes modalidades de conflito. “Diferentes graus de valor simbólico podem ser atribuídos às formas simbólicas pelos indivíduos que as produzem e recebem, de tal modo que um objeto que é apreciado por alguns pode ser condenado ou desprezado por outros.” (THOMPSON, 2011, p. 204) – condição similar aos processos de produção, objetivação e ancoragem das representações sociais e de elaboração, negociação ou negação de certos discursos identitários.
Essa constatação coloca nos mesmos planos de sentido e ação os três grandes conceitos aqui mobilizados, quais sejam: informação simbólica, representações sociais e identidade. Enquanto elaborações dinâmicas que se se fazem perceber como resultado de injunções histórico-culturais e também como formulações cotidianas estruturadas relacionalmente, cada uma dessas três formas de se apreender e de posicionar-se no mundo oferece aos sujeitos e aos grupos sociais a que pertencem uma possibilidade de conferir sentido, de assimilar e de reelaborar as “[...] distintas relações que podem existir entre o sociocultural e o individual, e também de analisar a pessoa como um participante cultural que é simultaneamente uma construção social e um construtor social de experiência.”[10] (VERGARA QUINTERO, 2008, p. 73, tradução nossa).
Portanto, enquanto formas expressivas de construção social da realidade, cada uma dessas instâncias evidencia, conforme nos lembra Regina Marteleto (1992), práticas socioculturais de produção de discursos, normas e valores que “[...] informam cada existência, fornecendo a cada sujeito um modelo de competência (cognitiva, discursiva, existencial) para dirigir suas vidas, para se relacionar com os outros, com a sociedade.” (MARTELETO, 1992, p. 87).
Por serem constituídas, simbolizadas e ressignificadas no espaço social, informação, representações sociais e identidade entrecruzam-se como chaves de leitura capazes de desvelarem os modos de estruturação, as formas de agenciamento e os jogos de força e de sentido que pautam nossas relações coletivas. Dito isso, e fazendo coro com Martins (2010, p. 28), é preciso assinalar que o percurso analítico-conceitual aqui traçado, cujas linhas fortes demarcam os pontos de contato entre esses três conceitos, têm como ponto de partida dois importantes aspectos balizadores tanto das dinâmicas informacionais quanto dos processos representacionais e dos discursos identitários. O primeiro confere destaque ao lugar ocupado pelo sujeito “[...] em termos de sistema de subdivisões de posições sociais e relações de poder.” (MARTINS, 2010, p. 28). O segundo, complementar ao primeiro, desvela os esquemas individuais que se constroem socialmente e que incidem de forma decisiva nesses mesmos processos. Tecemos mais algumas reflexões quanto a tais aspectos nas considerações abaixo.
5 Considerações finais
A partir do exercício de aproximação conceitual aqui constituído, buscamos definir a informação como forma simbólica que permeia as ações de produção e ressignificação das normas, valores e sentidos que amparam, seja no nível individual ou no contexto da esfera coletiva, o trabalho de elaboração das representações sociais e as dinâmicas de formulação de certos discursos identitários.
Dialogando com Denise Jodelet (2003), assinalamos que os sujeitos, por estarem imersos em múltiplas realidades sociais, não apenas assimilam as informações, representações e identidades conformadas para eles, mas agem sobre elas classificando-as, tensionando-as e reelaborando-as no contexto da sua própria vida cotidiana, o que a autora define como “[...] processos de tratamento da informação que são utilizáveis pragmaticamente no aqui e agora da ação no mundo.” (JODELET, 2003, p. 21). Nesses termos, ao articular os conceitos de representações sociais e cultura, Jodelet (2003) afirma que a abordagem das representações sociais apresenta-se como um caminho pertinente quando o que se almeja é compreender os modos como sujeitos inscritos em contextos histórico-sociais específicos produzem, organizam, disseminam e se apropriam de certas informações, convertendo-as em recurso de simbolização e de ressignificação de si e da própria cultura. Condição que também se mostra efetiva quando o que se pretende apreender são os jogos de força e os agentes que mobilizam tanto as práticas informacionais quanto as representações identitárias. Com isso, torna-se possível afirmarmos que são essas três modalidades de produção de sentido para si e sobre o mundo que:
Fornecem os quadros para examinar o papel dos fatores sociais na formação e o funcionamento do conhecimento comum e identificar os sistemas de interpretação e de pensamento coletivos, nos sujeitos que são sempre sociais por seus vínculos de intercomunicação e sua localização num contexto sociocultural e num quadro histórico. (JODELET, 2003, p. 24).
Não sem razão, compartilhando do entendimento de que as representações sociais se constituem e se dão a ver como sistemas de valores e práticas inscritos em contextos dinâmicos, Banchs (1982) sublinha que as representações são também estratégias de aquisição e de comunicação do conhecimento: “[...] portanto, são uma forma de reconstrução mental da realidade gerada na troca de informações entre os sujeitos.”[11] (BANCHS, 1982[12] apud MORA, 2002, p. 8, tradução nossa). Assim sendo, a importância da informação nos processos de elaboração das representações sociais, conforme destacado por vários autores desde Moscovici (1979), nos leva a considerar os muitos aspectos sociais, culturais, históricos e políticos que circunscrevem essa forma simbólica, sobretudo quando o que se quer analisar são suas dinâmicas de produção, de apropriação e de significação.
Dito isso, ao adotarmos por pressuposto que a informação se configura como uma forma simbólica que permeia a elaboração tanto das representações sociais quanto dos discursos identitários, nos tornamos aptos a questionar, em trabalhos futuros, em que medida as dinâmicas informacionais estabelecem ou reproduzem relações assimétricas de força, convertendo-se, assim, em instância de poder e de dominação. Indo mais além, poderemos nos indagar acerca do caráter ideológico da informação simbólica. Caráter ideológico que, segundo Thompson (2011), se refere às maneiras como o sentido serve e sustenta relações de poder e de desigualdade nos mais diversos contextos das interações cotidianas, como no caso das “[...] relações entre homens e mulheres, entre negros e brancos, entre aqueles que têm riqueza e propriedade e aqueles sem riqueza e propriedade.” (THOMPSON, 2011, p. 18).
Sendo assim, e como forma de síntese, acreditamos que a aproximação entre os conceitos acionados pela Teoria das Representações Sociais, as dinâmicas contemporâneas de elaboração dos discursos identitários e a informação simbólica pode ser um caminho para pensarmos a informação como instância que permeia todas as nossas relações com o outro e com o mundo. Modalidade de compreensão dos fenômenos e dinâmicas informacionais que não deve se furtar a analisar o modo como as formas simbólicas são produzidas, disseminadas, assimiladas e ressignificadas na vida cotidiana, sobretudo em contextos marcados pelas desigualdades e assimetrias de poder.
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Notas
Autor notes
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