Resumo: O objetivo do presente trabalho foi realizar análise de um evento extremo chuvoso ocorrido em Manaus-AM tendo-se como base dados provenientes de imagens de satélite, radar meteorológico e dados de estações meteorológicas de superfície. O evento estudado ocorreu no dia 30 de setembro de 2013 e causou dezenas de transtornos a comunidade local. As imagens de satélite mostram a formação de uma atividade convectiva intensa na fronteira dos estados do Amazonas e Pará que apresentou formação às 05:30 hora local e se propagou para oeste atingindo Manaus 6 horas depois. As imagens de radar mostram a propagação da atividade convectiva em forma de linha que se propaga em direção a cidade e provocam a formação de forte convecção sobre o setor oeste da área urbana. As chuvas registradas em uma das estações de superfície mostram que o volume chuvoso ocorrido em menos de duas horas superou o que se esperava para o mês todo de setembro. Os resultados também mostram que, em uma das estações meteorológicas, houve queda de temperatura da ordem de 12 ◦C em um intervalo de tempo de, aproximadamente, 50 minutos duração o evento.
Palavras-chave:Evento extremoEvento extremo, chuva chuva, Manaus Manaus, Amazônia Amazônia.
Abstract: The aim of this study was to analyse an extreme rainfall event occurred in Manaus, Brazil, based on data from satellite images and radar and meteorological stations. The studied event took place on September 30th 2013, 2013 and caused extensive material damage to the local communit. Satellite images show the formation of an intense convective activity on the border between the states of Amazonas and Pará at 05:30 local time, which spread westwards and reached Manaus 6 hours later. The radar images show the spread of convective activity in the form of a line that propagated toward the city causing strong convection in the western sector of the urban area of Manaus. One of the meteorological surface stations show that the rain’s volume exceeded what was expected for the entire month of September. The results also show that there was an average temperature drop of between 8-9 °C for approximately 50 minutes during the event.
Keywords: Extreme event, rainfall, Manaus, Amazon.
Análise do evento extremo chuvoso de 30 de setembro de 2013 ocorrido na cidade de Manaus
An analysis of the extreme rainfall case occurred in Manaus during September 30th 2013
Recepção: 15 Junho 2016
Aprovação: 19 Janeiro 2017
A região Metropolitana de Manaus, ou a Grande Manaus, é uma das cidades mais populosas e economicamente importantes do país. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2014, a região metropolitana de Manaus possuía em torno de 2 360 491 (dois milhões, trezentos e sessenta mil e quatrocentos e noventa e um) habitantes. Localiza-se no centro da maior floresta tropical do mundo e possui em torno de 101.474 km2 de área. A região metropolitana é composta de oito municípios: Manaus, Iranduba, Itacoatiara, Manacapuru, Careiro da Várzea, Novo Airão, Rio Preto da Eva e Presidente Figueiredo. Por outro lado, a área urbana do município de Manaus possui 229,50 km2 e comporta quase 2 milhões de habitantes. De acordo com as normais climatológicas do INMET (1961-1990), o volume total anual médio das chuvas registradas na área urbana do município de Manaus é de 2307,4 mm. O período de dezembro a maio, com 1699,2 mm de chuva, é considerado o semestre mais chuvoso. Os meses de junho a novembro, por outro lado, caracterizam o período seco, ou menos chuvoso, com registros de aproximadamente 608,2 mm de chuva acumulada.
As chuvas que ocorrem na Grande Manaus, assim como na região amazônica, são provocadas por fenômenos meteorológicos de diferentes escalas espaciais e temporais. Dentre estas escalas podem se destacar, por exemplo, os seguintes sistemas meteorológicos: convecção isolada (Molion e Bernardo, 2000), brisas fluviais (Molion e Dallarosa, 1990), aglomerados convectivos (Mapes et al., 2003), linhas de instabilidade (Cohen e Gandu, 2002; ?), Zona de Convergência do Atlântico Sul (Casarin e Kousky, 1986) e a Zona de Convergência Intertropical (Uvo, 1989). Dependendo da intensidade do fenômeno ou de seu tempo de permanência o volume de chuvas pode alcançar valores extremos. Isto é, quantidades muito acima da média climatológica, podendo provocar grandes danos materiais, principalmente sobre zonas urbanas populosas (Gomes et al., 2000; Bender et al., 2011; Leal et al., 2012; Loureiro et al., 2014), como é o caso de Manaus. O município de Manaus é comumente atingido por eventos extremos chuvosos de natureza danosa como foram os casos, por exemplo, de 28 de julho de 2006 (Ferreira et al., 2004), 08 de março de 2008 (Brito et al., 2011b), 30 de março de 2008 (Aranha et al., 2011), 10 de fevereiro de 2010 (Ribeiro et al., 2010), 20 de abril de 2010 (Santo et al., 2010), 17 de fevereiro de 2011 (Brito et al., 2011c), 01 de abril de 2011 (Brito et al., 2011a), e 02 de janeiro de 2012 (Silva e Veiga, 2012). Neste sentido, Brito e Veiga (2015) mostram que, dependendo da região, os eventos extremos chuvosos de curto prazo (entre 1 e 5 dias) produzem quantidades de chuvas significativas quando comparadas ao volume chuvoso produzido por eventos normais, considerados como aqueles que produzem chuvas dentro da média. Os autores mostram ainda que a frequência dos eventos extremos na região amazônica sofre influência dos eventos El Niño e La Niña, com redução e aumento, respectivamente, na frequência dos eventos. Vargas e Veiga (2012) baseados em dados de estações meteorológicas para Manaus e dados estimados de precipitação obtidas a partir de satélites, notaram que apesar do número de eventos extremos ser pequeno em comparação a séria analisada, os mesmos apresentam volume de chuva que fica entre os percentis de 90% (evento extremo tipo I) e 99% (evento extremo tipo IV), sugerindo que os eventos extremos possuem papel importante na modulação da climatologia local.
Desde 2010, como uma das metas do projeto Rede de Mudanças Climáticas da Amazônia (REMCLAM), vem sendo instaladas estações meteorológicas automáticas na região metropolitana de Manaus. A partir desta rede de estações meteorológicas é possível então avaliar o padrão espacial e temporal das chuvas em alta frequência temporal, principalmente na área urbana de Manaus, onde encontram-se o maior número de estações meteorológicas. Considerando os grandes impactos ambientais, sociais e econômicos que os eventos extremos podem causar, o objetivo principal deste trabalho é descrever as condições meteorológicas, a partir de dados de estações meteorológicas de superfície e imagens de radar e satélite, do evento extremo chuvoso ocorrido sobre o município de Manaus no dia de 30 de setembro de 2013. Neste dia, um dos pontos de observação à superfície registrou um volume chuvoso superior ao esperado para todo o mês de setembro e queda de temperatura da ordem de 12 °C em apenas 1 hora. As consequências na cidade foram adversas. Registrou-se queda contínua de energia, pontos significativos de alagamentos, derrubada de árvores, danificação de estruturas e problemas com o transito de veículos.
Os dados utilizados nesta pesquisa foram adquiridos a partir de oito estações meteorológicas automáticas instaladas na área urbana de Manaus e entorno (figura 1). As estações meteorológicas foram instaladas durante o período de vigência do projeto REMCLAM. As localidades de cada estação são identificadas através de suas iniciais na figura 1. Isto é, EMB (Estação Embrapa), MUSA (Estação do Museu da Amazônia), IFAM (Estação do Instituto Federal do Amazonas), EST (Estação da Escola Superior de Tecnologia), POL (Estação Policlínica), CMM (Estação Colégio Militar), CALD (Estação Caldeirão) e MAN (Estação Manacapurú).

Para o presente trabalho foram utilizados dados de precipitação (mm), temperatura do ar (°C) e umidade relativa do ar (%) em 2 metros de altura. Os dados foram medidos e registrados em intervalos de 5 minutos.
Foram também utilizadas imagens do satélite GOES-13 no canal do infravermelho realçado, com frequência de 30 minutos, obtidas da página do CPTEC (Centro de Previsão e Estudos Climáticos) a partir do link http://satelite.cptec.inpe.br/acervo/goes.formulario.logic. Ademais, foram utilizadas imagens do radar meteorológico de Manaus, banda S do CENSIPAM (Centro Gestor e Operacional do Sistema de Proteção da Amazônia) obtidas pelo software TITAN (Thunderstorm Identification, Tracking, Analysis and Nowcasting) com frequência temporal de aproximadamente 12 minutos. Para se avaliar o evento extremo chuvoso e suas relações com outras variáveis meteorológicas, abordadas no presente estudo, foram produzidos campos espaciais e temporais a partir das variáveis meteorológicas oriundas das estações de superfície.
De forma a se apresentar o padrão espacial das chuvas na área urbana de Manaus, utilizou-se o método de interpolação espacial baseado no IDW, ou ponderação pelo inverso da distância (Pingale et al., 2014; Lam et al., 2015). O IDW é uma técnica eficaz de interpolação baseada na consideração de que os valores das variáveis (ex: precipitação) a serem encontradas em um certo ponto, onde não há registro, são similares aos valores de variáveis registradas próximo deste ponto. Quanto mais afastado estiver o ponto observado do ponto a ser interpolado menor será a influência na interpolação.
A análise do estudo de caso investigado no presente trabalho ocorreu no pico da estação seca (setembro), que é raro de acontecer. Principalmente porque eventos desta natureza durante esta época do ano não produzem volumes chuvosos tão significativos.
As imagens do satélite GOES-13 na banda do infravermelho realçado para o dia 30 de setembro de 2013 com frequência temporal variável são apresentadas na figura 2. No entanto, são apresentadas imagens relativas ao ciclo de vida do evento. A partir da figura 2a observa-se na divisa entre os estados do Amazonas e Pará uma região com vários núcleos convectivos às 04:30 Hora Local (UTC-4, HL). Com o passar do tempo é possível observar a intensificação desses núcleos convectivos, de forma que às 05:30 HL os mesmos começam a apresentar temperaturas do topo entre -70 e -80 ◦C (figura 2b).
Entre às 05:30 e 07:00 HL (figuras 2b e 2c) nota-se a junção dos núcleos convectivos em forma de aglomerados, permanecendo ainda sobre o mesmo local de formação. Porém, expandindo-se horizontalmente (figuras 2c e 2d). O aglomerado convectivo se concentra sobre o leste do estado do Amazonas, com temperaturas do topo da nuvem em torno de -80 °C, sugerindo convecção profunda. A figura 2e mostra que às 10:30 HL o aglomerado convectivo passa a tomar forma de linha de instabilidade, com temperaturas mais baixas na parte frontal da direção do deslocamento. E devido sua grande expansão, este sistema já pôde ser monitorado através das imagens de radar situado na região metropolitana de Manaus.
A partir das figuras 2f-h, respectivamente, para os horários 11:30, 12:30 e 13:00 HL, observa-se a propagação do sistema a partir de sudeste em direção à área urbana de Manaus. A propagação no sentido noroeste-sudeste continua e devido a forte instabilidade vários aglomerados convectivos se formam sobre a região norte, alinhando-se e formando uma grande região convectiva entre às 14:00 e 17:30 HL (figuras 2i-j). Na figura 2j é possível observar grande parte da região norte tomada por nebulosidade.
Após a analise, através das imagens de satélite, apresenta-se imagens do radar banda S, mais detalhadas temporal e espacialmente, do sistema convectivo que atingiu Manaus (figuras 3a-l). As imagens provenientes do radar são essenciais para se identificar as áreas da cidade que foram inicialmente e mais atingidas pelo sistema convectivo.
A partir das figuras 3a-c, representativa dos horários 09:53, 10:29 e 10:41 HL, observa-se uma linha de instabilidade proveniente do quadrante sudeste se aproximando de Manaus. Esta linha de instabilidade apresenta valores de refletividade variando entre 42 e 54 dBZ na parte frontal. De acordo com Leal et al. (2012), o limiar de 40 dBZ pode representar um sistema meteorológico com potencial severo. Nos demais quadrantes, observam-se poucas atividades convectivas, principalmente sobre a área urbana de Manaus. A linha de instabilidade avança pelo quadrante sudeste, desta forma aproximando-se da cidade de Manaus. Destaca-se também pequenos aglomerados convectivos identificados no quadrante nordeste (figura 3c) formando uma outra linha de instabilidade, posteriormente.
Observa-se que, à medida que o sistema avança de sudeste em direção a Manaus, é possível identificar regiões de grande instabilidade atmosférica a frente do sistema, nos quadrantes nordeste e sudoeste, até mesmo sobre a cidade. Assim, ocasionando uma intensa convecção local com valores de até 54 dBZ sobre a porção centro-oeste da cidade de Manaus (figuras 3d-f). A convecção intensa sobre a região metropolitana de Manaus teve início às 10:53 HL (figura 3d), sobre o aeroporto de Ponta Pelada, e com o passar do tempo a área convectiva sobre Manaus aumenta espacialmente.
A partir das figuras 3g-i, representativa dos horários 11:29, 11:41 e 11:53 HL, é visível o grande aumento da atividade convectiva sobre a área urbana de Manaus. Aparentemente a convecção teve início antes da passagem da linha de instabilidade nas proximidades de Manaus, sugerindo que a presença da cidade tenha tido papel importante no início da convecção local sobre a cidade. Observa-se que a máxima atividade convectiva, vista a partir dos máximos valores de refletividade, ocorre quando a linha de instabilidade "alinha-se", no sentido sudoeste-nordeste, a cidade de Manaus (figuras 3i e j). A linha de instabilidade abrange grande parte da cidade, principalmente nas zonas norte, sul e oeste, com valores entre 51 e 54 dBZ.
Além disso, no quadrante nordeste, uma outra linha de instabilidade desloca-se em direção a cidade (figura 3j), com valores entre 54 e 57 dBZ. À medida em que se propaga, o sistema tende a se "acoplar" com outros aglomerados (figura 3k). A passagem mais intensa deste sistema se deu sobre o extremo norte da cidade, porém sua retaguarda adentra a região metropolitana de Manaus causando precipitação do tipo estratiforme sobre o leste e extremos norte (figura 3l).

Os resultados a seguir apresentam uma descrição da variação temporal das seguintes variáveis meteorológicas: precipitação, temperatura, pressão e umidade específica para o evento extremo de chuva ocorrido no dia 30 de setembro de 2013. A variação diurna da chuva, em intervalos de 5 minutos, para 8 estações meteorológicas localizadas no município de Manaus, é apresentada na figura 4a. Apresenta-se também a média das chuvas acumuladas para as 8 estações (linhas pontilhadas). Neste caso, a média foi realizada apenas para valores de chuva diferente de zero. De acordo com esta figura, nota-se, a partir da média do volume chuvoso, que as chuvas tiveram início por volta das 10:50 HL e cessaram aproximadamente às 15:55 HL, tal como observado nos diferentes pontos de observação. Por exemplo, o início da chuva na estação da EST ocorreu por volta das 10:55 HL, enquanto que na estação EMB a chuva ocorreu a partir das 12:25 HL, mostrando que a precipitação teve início em momentos diferentes sobre a área urbana. Esta defasagem de horário em ambas as estações meteorológicas está associada à propagação do sistema de nordeste que, ao se aproximar da cidade, ocasionou grande instabilidade formando convecção local e posteriormente precipitação sobre o extremo norte da cidade, assim atingindo a estação EMB. Ademais, observa-se que, nas estações CALD, MUSA e CMM a precipitação teve início, praticamente, no mesmo instante, mostrando a dimensão do sistema que se propagou de sudeste. Particularmente, chama a atenção o volume chuvoso na estação EST que foi de 103,8 mm (figura 4b), entre às 10:55 e 12:25 HL, o maior observado entre todas as estações meteorológicas. A chuva na estação EST foi provocada pela forte atividade convectiva formada sobre o centro-oeste da zona urbana de Manaus a medida em que o sistema meteorológico se aproximava da cidade. Por outro lado, o término tardio das chuvas deveu-se somente a estação EMB, cujas chuvas cessaram por volta das 12:15 HL. A chuva média acumulada durante o dia foi de aproximadamente 101 mm. Todavia, como observado a partir da figura 4b, nota-se que existem diferenças na quantidade de chuva acumulada entre as estações meteorológicas.

Com o propósito de verificar o padrão espacial das chuvas apenas sobre a área urbana de Manaus e tendo em vista que os maiores danos à população ocorreram sobre este local, apresenta-se a figura 5. A partir desta, mostra-se a distribuição espacial do acumulado chuvoso ocorrido no dia 30 de setembro de 2013 na área urbana de Manaus. Nota-se, que o maior acumulado chuvoso ocorreu no setor centro-oeste da cidade, com núcleo bem definido sobre a estação da EST, acompanhado de mínimos valores nos setores leste e sudoeste. Nota-se, ainda, um padrão bastante heterogêneo das chuvas sobre a cidade. Mesmo sendo os resultados baseados em uma distribuição de chuvas fundamentada em interpolação, os mesmos trazem informações importantes a respeito da não homogeneidade das chuvas. A razão pela qual o centro-oeste da cidade foi o mais impactado pelas chuvas está associado a formação convectiva que ocorreu nesta área a medida em que a linha de convecção se aproximava de Manaus (ver figuras 3e-j). Esta convecção ficou bem localizada no setor central e oeste da cidade provocando uma quantidade significativa de chuva neste setor.

A distribuição temporal da temperatura em intervalos de 5 minutos, medidas por estações (representadas por linhas de diferentes cores) localizadas no município de Manaus e medidas a 2 metros de altura, é apresentada na figura 6. É notório que todas as estações destacadas na figura apresentam um comportamento semelhante, com taxas de crescimento e decrescimento de temperatura próximo à superfície. Assim, baseando-se na média (linha pontilhada na cor preta), observa-se que houve um aumento local no valor da temperatura da ordem de 7,2 ◦C em um intervalo de tempo de 4 horas, entre 06:00 e 10:00 HL. Em média, no inicio do evento a temperatura decresceu abruptamente e manteve esse comportamento por aproximadamente 2 horas e 10 minutos (entre 10:20 e 12:30 HL) chegando a um decrescimento de, aproximadamente, 8,0 ◦C nesse intervalo de tempo. Os padrões de variação da temperatura apresentados na figura indicam que houve uma distribuição ampla do evento extremo de chuva em Manaus, pois todas as estações registraram comportamentos de temperatura similares. Na estação da EST, onde observou-se o maior volume chuvoso, nota-se que a temperatura tem aumento gradual de aproximadamente 26 ◦C a 34 ◦C, entre 06:00 e 10:00 HL, isto é, 8 ◦C em 4 horas. No entanto, há queda de aproximadamente 12 ◦C em um intervalo de tempo de 1 hora (entre 10:00 e 11:00 HL) durante o período das chuvas torrenciais. Após o término das chuvas, a temperatura volta a aumentar, permanecendo abaixo de 30 ◦C durante o restante do dia. Comportamento semelhante a estação da EST é observado na estação da Policlínica, contudo, com volume chuvoso muito menor.

Aproximadamente 30 minutos antes do início das chuvas, os setores mais aquecidos da cidade eram o centro-oeste e leste (figura 7a). Os setores nordeste e sudoeste apresentavam as menores temperaturas do ar próximo à superfície. Nota-se que, no domínio avaliado, um setor zonalmente mais quente, com maiores valores de temperatura sobre as redondezas da estação IFAM. Nas estações MUSA e CMM a temperatura era aproximadamente 3 ◦C mais baixa, mostrando que mesmo dentro da zona urbana a temperatura não é necessariamente homogênea. A partir da figura 7b, que mostra a anomalia de temperatura, aqui representada pela diferença de temperatura entre a estação considerada e a média da temperatura para todas as estações, nota-se um gradiente de temperatura meridional.
Em torno de 1 hora após o término das chuvas na zona urbana (13:00 HL), o centro oeste da zona urbana de Manaus registrava temperaturas entre 25,0 e 25,5 ◦C (figura 8a). Temperaturas amenas também eram observadas em outros pontos da cidade, no entanto no setor leste de Manaus a temperatura ficava em torno de 28 ◦C, mostrando que ainda existe heterogeneidade nos valores de temperatura sobre a cidade. A tendência de temperatura entre às 10:00 e 13:00 HL em Manaus (figura 8b) mostra que a maior redução de temperatura ocorreu no setor centro-oeste da cidade. Os menores resfriamentos devido a precipitação na cidade são observados sobre os setores sudoeste, leste e nordeste da cidade.
A figura 11 apresenta a distribuição temporal da umidade específica em intervalos de 5 minutos, calculada para as 8 estações meteorológicas localizadas no município de Manaus. A partir desta figura, nota-se que a evolução temporal da umidade específica na maioria das estações apresenta variação similar, com taxa de crescimento e decrescimento ao longo do dia 30 de setembro. Ao se observar o comportamento médio da umidade específica, nota-se um aumento local da ordem de 2,0 g/kg em um intervalo de tempo de 4 horas (entre 06:00 e 10:00 HL), antes de ocorrer a precipitação. Este resultado indica que o ar está sendo abastecido de vapor d’água à superfície. No entanto, a partir do início das chuvas o valor da umidade específica decresce abruptamente de 4,8 g/kg, indicando que a atmosfera está perdendo umidade.





O comportamento da umidade específica durante o evento chuvoso mostra similaridade com os padrões de temperatura. O maior volume de chuva foi observado na estação da EST, com isso, nota-se que a umidade específica para esta estação mostrou um aumento gradual de 1,73 g/kg por aproximadamente 4 horas (entre 06:05 e 10:15 HL). No entanto, no início das chuvas ocorreu uma queda abrupta da umidade específica de aproximadamente 5 g/kg em um intervalo de tempo de 30 minutos (entre 10:30 e 11:00 HL). Após o término das chuvas, a umidade específica apresentou aumento, permanecendo abaixo de 20 g/kg durante o restante do dia.
De forma a se avaliar a distribuição horizontal da umidade específica sobre a área urbana de Manaus antes e após o evento extremo chuvoso, apresenta-se a figura 12. Observa-se que às 10:00 HL, 30 minutos antes de começarem as chuvas sobre a estação da EST, são observados máximos valores (acima de 20 g/kg) de umidade específica nas estações MUSA e CMM, acompanhadas de mínimos valores (abaixo de 20 g/kg) sobre as estações do IFAM e POLI (figura 12a). Nota-se a partir desta figura que o padrão espacial apresenta heterogeneidade dentro da cidade. Por outro lado, após o evento chuvoso (figura 12b), nota-se que a atmosfera, próximo a superfície está mais seca, sugerindo que o conteúdo de vapor d’água na atmosfera diminuiu significativamente. O padrão espacial apresenta ainda não homogeneidade sobre a cidade, com considerável redução de umidade sobre a estação MUSA.

O presente trabalho teve como objetivo principal analisar o evento extremo chuvoso, ocorrido na área urbana de Manaus-AM no dia 30 de setembro de 2013, a partir de estações meteorológicas distribuídas na área urbana de Manaus e redondezas. Foram utilizadas, ademais, imagens de radar e satélite para identificar as características do evento estudado. Este evento provocou diversos tipos de transtornos a população manauára, tais como: problemas no transito, com dezenas de quilômetros de congestionamento, interrupção de pousos e decolagens no aeroporto internacional da cidade, danos a estruturas, dezenas de pontos de alagamentos e queda de energia duradoura devido a danos significativos na rede elétrica.
As imagens de satélite e radar mostraram que o evento estudado formou-se na divisa dos estados do Amazonas e Pará em torno de 6 horas antes de atingir a cidade. Os núcleos convectivos formados durante o deslocamento em direção a Manaus apresentavam temperaturas no topo das nuvens entre -70 e -80 ◦C, indicando convecção profunda. O aglomerado convectivo formado nesta divisa expandiu-se horizontalmente e pouco antes de atingir Manaus tomou forma de linha de instabilidade, com temperatura mais baixas na parte frontal da direção do deslocamento. Em particular, as imagens de radar sugerem que antes da linha de instabilidade atingir Manaus uma forte convecção se forma sobre a região centro-oeste da cidade provocando assim um grande volume de chuvas registrado na estação da EST.
As análises da variação temporal, assim como o padrão espacial das chuvas, mostram que um grande volume chuvoso foi registrado em um ponto específico da cidade, o centro oeste. Na estação EST registrou-se um volume da ordem de 103,8 mm de chuva ocorrido em menos de 2 horas. Nesta mesma estação a queda de temperatura foi da ordem de 12 °C em menos de 1 hora. Nas outras estações, com queda menos acentuada, notou-se redução de temperatura da ordem de 8 °C em torno de 1 hora. Antes do evento chuvoso, o padrão espacial da temperatura sobre a cidade é bastante homogêneo. Após o evento, a tendência de temperatura mostra que no centro-oeste houve máxima redução e mínima redução foi observada na estação IFAM. Por outro lado, os campos de umidade específica mostram que antes do evento chuvoso ter início, houve forte aumento da umidade específica, seguida de reduções significativas a partir do início das chuvas.
Este é um dos primeiros esforços em se entender, a partir de uma rede de estações meteorológicas à superfície, como se dá o padrão espacial dos campos de chuva, temperatura e umidade específica de um evento extremo chuvoso ocorrido nos meses de transição (seco para chuvoso) em Manaus. Os próximos esforços serão o de avaliar simulações numéricas em alta resolução para avaliar a destreza de modelos numéricos em antever esse tipo de evento sobre Manaus. Ademais, mais eventos desta natureza devem ser estudados a partir desta rede de estações.

Os autores gostariam de agradecer aos revisores pelas importantes críticas e sugestões. Ao laboratório de instrumentação meteorológica (LabInstru) da Universidade do Estado do Amazonas pelo fornecimento dos dados do projeto REMCLAM.
Os autores agradecem à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e a Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado do Amazonas (FAPEAM) pela concessão das bolsasde estudo.
Os autores também agradecem ao Censipam por terem cedido as imagens de radar.











