A IMAGEM DO PROFISSIONAL CONTÁBIL TRANSMITIDA NO FILME “O CONTADOR”
PUBLIC PERCEPTION OF THE ACCOUNTING PROFESSIONAL THROUGH THE MOVIE “THE ACCOUNTANT”
A IMAGEM DO PROFISSIONAL CONTÁBIL TRANSMITIDA NO FILME “O CONTADOR”
Revista Catarinense da Ciência Contábil, vol. 21, pp. 1-22, 2022
Conselho Regional de Contabilidade de Santa Catarina

Recepción: 13 Noviembre 2021
Revisado: 30 Diciembre 2021
Aprobación: 18 Enero 2022
Publicación: 11 Febrero 2022
Resumo: Com o intuito de compreender como a imagem do contador é propagada pela mídia, analisou-se elementos de legitimidade propostos por Suchman (1995) e estereótipos ligados à imagem do contador presentes no filme “O Contador” (2016). A pesquisa caracterizou-se como documental, descritiva e qualitativa. Para a análise e interpretação dos dados, utilizou-se a Análise de Conteúdo categorial proposta por Bardin (2010), sendo que as categorias foram formadas a priori. Evidenciou-se que os elementos de legitimidade estiveram presentes, quanto à legitimidade pragmática, na forma como o contador se veste; no envolvimento em trabalhos criminosos; na demonstração de sua capacidade técnica. Na legitimidade moral, existem dilemas éticos conflitantes nas ações do contador, especialista em dinheiro sujo. Quanto à legitimidade cognitiva, ele é visto como alguém que agrada seus clientes e nem sempre escolhe a profissão por afinidade. Em relação aos estereótipos, observou-se discrepância entre gêneros; dificuldade de relacionamento; falta de senso de humor e que o profissional contábil apresenta raciocínio lógico e matemático apurado e competência em suas funções. Destaca-se, portanto, como contribuições da pesquisa, a elucidação das distorções encontradas sobre a imagem dos contadores em estudos empíricos, em relação ao que é veiculado na mídia, por meio do filme analisado, buscando assim, combater imagens negativas da profissão, ao identificar como elas surgem. Com isso, a área contábil beneficia-se com uma possível mudança na percepção popular da importância dos contadores para as empresas, ao entender que o profissional criminoso, exposto nas mídias atuais, diverge daquele que é exigido pelo mercado de trabalho.
Palavras-chave: Palavras, chave: Teoria da legitimidade, Estereótipos, Mídia, Imagem do contador.
Abstract: With the goal of understanding how the image of accountants is portrayed by the media, we analyzed elements of legitimacy proposed by Suchman (1995) and stereotypes linked to the image of the accountant found in the movie “The Accountant” (2016). The research is documentary, descriptive and qualitative. To analyze and interpret data, we used the Categorical Content Analysis proposed by Bardin (2010), and the categories were determined beforehand. It was found that the elements of legitimacy were present regarding pragmatic legitimacy in the way the accountant dresses, his involvement in criminal activities, the demonstrating of his technical capacity. Regarding moral legitimacy, there are conflicting ethical dilemmas in the actions of the accountant, a specialist in dirty money. Regarding cognitive legitimacy, he is seen as someone who pleases his clients and does not always choose the profession by affinity. Regarding stereotypes, there was a discrepancy between genders, relationship difficulty, lack of sense of humor and that the accounting professional presents accurate logical and mathematical reasoning and competence in their functions. As research contributions, therefore, we can highlight the elucidation of distortions found involving the image of accountants in empirical studies, in relation to what is portrayed by the media, by the movie under analysis, seeking to combat negative images of the profession by identifying how they arise. The accounting field benefits from this with a possible shift in the popular perception of the importance of accountants for companies, by understanding that the criminal professional, exposed in the current media, are different from the professional required by the job market.
Keywords: Theory of legitimacy, Stereotypes, Media, Image of the accountant.
1 INTRODUÇÃO
As ações desejáveis, adequadas ou apropriadas de uma entidade, construídas dentro de um sistema de normas, valores, crenças e definições socialmente construídos são os elementos que formam a visão generalizada da Teoria da Legitimidade (Suchman, 1995). O comportamento individual, desta forma, é modelado por padrões criados e compartilhados entre os demais indivíduos, através da interação do indivíduo-grupo e do grupo-indivíduo (Boff, Beuren & Guerreiro, 2008).
A imagem do profissional contábil, sob a ótica da percepção popular, está atrelada a inúmeras características, que podem variar de acordo com a cultura em que o indivíduo está inserido, mas que partem de estereótipos pré-existentes sobre o contador. Neste sentido, os estereótipos são considerados como uma imagem simplificada do mundo, compreendidos como generalizações, utilizados a fim de criar percepções de uma forma mais compreensível do que na realidade é (Lippmann, 1922 apudLopes, 2014, p. 7).
Alguns pensadores da área de contabilidade pesquisaram sobre como a sociedade, em geral, compreende o profissional contábil (Dimnik & Felton, 2006; Caglio, Cameran & Klobas, 2019, Tonin et al., 2020; Rocher, Christensen & Roy, 2021). Na pesquisa de Dimnik e Felton (2006), o papel dos filmes na construção desses estereótipos ficou em evidência, uma vez que investigaram a imagem da narrativa no cinema, utilizada para caracterizar o estereótipo dos contadores. Segundo os autores, a mídia é grande influenciadora da opinião pública a respeito de vários assuntos, aqui, em especial, sobre a imagem do contador. Como resultado da pesquisa, verificaram mudanças na representação dos contadores no cinema durante a última metade do século XX, principalmente no que diz respeito ao aumento na presença de mulheres e minorias étnicas na contabilidade. Caglio, Cameran e Klobas (2019) verificaram que a percepção pública de um contador é menos favorável quando construída a partir de fontes da mídia. Por outro lado, Tonin et al. (2020), ao investigarem a percepção de estudantes e profissionais contábeis que assistiram ao filme “O Contador”, concluíram que ambos os grupos apontaram características positivas do perfil profissional associadas com o personagem do filme. Corroborando com isso, ao analisar os papéis dos personagens contadores de quadrinhos de super-heróis norte-americanos entre 1938 e 2018, Rocher, Christensen e Roy (2021) constataram que os contadores têm sido cada vez mais retratados em papéis mais positivos do que negativos, a partir do século XXI e que, assim, tornaram-se super-heróis simbólicos.
A grande circulação de informações envolvendo escândalos contábeis na mídia, como da Enron, Parmalat e WorldCom, fez com que a atenção dos contadores se voltasse, de forma bastante expressiva e pejorativa, a questões relativas à sua imagem pública (Dimnik & Felton, 2006). Recentemente no Brasil, fraudes contábeis marcaram negativamente a profissão, como no caso da Via Varejo em 2019, em que houve manipulação da provisão para processos trabalhistas, e da IRB Brasil, também em 2019, onde através de avaliações otimistas de sinistralidade, inflou-se o lucro da empresa. Outras empresas ainda, como Banco Panamericano (2006 a 2010), Mundial (2010 e 2011), IMC (2012 a 2016), MMX (2013), YDUQS (2014 a 2016), Livraria Saraiva (2015) e CVC (2019), tiveram sua imagem manchada, a partir de constatações de auditores independentes que relataram manipulações das demonstrações contábeis (Almeida, 2021).
Com esse pano de fundo, observa-se que a ideia de livre expressão, perante à sociedade democrática, é comprometida, já que as percepções partem de influências externas (como a mídia), gerando uma assimetria de relações de poder (Oliveira & Carvalho, 2013). Isso acontece, de acordo com Oliveira e Carvalho (2013), para esconder a falta de acesso ao discurso público da maioria das pessoas, intensificando essa assimetria. Desta forma, as elites que controlam o acesso ao discurso público tendem a influenciar fortemente a construção de crenças e valores de uma sociedade, uma vez que, por meio das relações de poder é possível controlar o conhecimento que é disponível, por meio dos discursos que são veiculados, pelas imagens que são (re)produzidas, ou seja, controla-se as ações de outros (Van Dijk, 2008).
Sobre esse aspecto, Tonin et al. (2020) realizaram um estudo com a aplicação de um questionário destinado a estudantes e profissionais contábeis que assistiram ao filme “O Contador” e puderam constatar que este público associou aspectos positivos dos contadores em relação à inteligência, à proatividade e ao comportamento ético, enquanto como características negativas apenas a ansiedade foi constatada como comum na visão dos dois grupos. Embora tenham utilizado o mesmo filme como objeto de pesquisa, os autores analisaram a visão dos estudantes e contabilistas sobre as competências e estereótipos da profissão e não a análise do filme em si, sob a ótica de uma teoria. Esse fato encontra-se presente em outros estudos que também analisaram a percepção de estudantes, profissionais e não contadores sobre o filme (Hunt, Falgiani & Intrieri, 2004; Sugahara e Boland, 2006; Almeida & Medeiros, 2017; Gomes, Walter & Soutes, 2019), os quais podem ter uma visão equivocada do assunto, já que o pesquisador aprofunda mais a sua visão sobre o fenômeno estudado, enquanto quem assistiu ao filme demonstra opiniões de senso comum. Com isso, o presente artigo busca preencher essa lacuna, ao observar os elementos de legitimidade presentes no filme, que com a veiculação da mídia, podem distorcer a realidade do estereótipo dos contadores.
“Considerando que a credibilidade, o desenvolvimento de futuro e o valor da profissão dependem da imagem pública” (Moura et al., 2016, p. 131) e, ainda, apoiando-se na ideia de que o cinema é um instrumento que favorece o desenvolvimento da educação informal, julga-se relevante investigar os estereótipos do contador em filmes cinematográficos. Além disso, a legitimidade representa a reação dos observadores à entidade (profissão contábil) da forma como a veem. Desta forma, os elementos de legitimidade (pragmática, moral e cognitiva) são importantes para a análise dos estereótipos, pois tratam da forma como a sociedade percebe os contadores, como o indivíduo age e o que é aceito no contexto (Suchman, 1995).
Diante disso, sob a ótica da Teoria da Legitimidade, esta pesquisa buscou responder a seguinte questão: Como elementos de legitimidade e estereótipos são ligados à imagem do profissional contábil no filme “O Contador”?
O objetivo da pesquisa, portanto, foi compreender como os elementos de legitimidade e estereótipos estão ligados à imagem do contador, transmitidos por meio do filme “O Contador”. Para tanto, foram desenvolvidas as seguintes etapas: elaboração do constructo teórico, observação crítica do filme, transcrição e, por fim, análise e interpretação das falas e imagens.
Justifica-se a escolha do filme por ser o mais atual encontrado (2016) que trata diretamente sobre assuntos relacionados a características pessoais de contadores. Além disso, o filme chamou atenção do público, superando as expectativas de bilheteria (McNary, 2016). Compreender como a imagem do contador é transmitida na mídia é relevante para que aqueles que estão em fase de escolha de sua profissão possam olhar com criticidade o que a mídia veicula. Além disso, observar o retrato do contador na mídia de forma crítica é relevante para entender se as abstrações realizadas nos filmes retratam (ou não) a realidade da profissão. Por fim, como contribuição teórica deste estudo, acrescenta-se o avanço na observação dos elementos de legitimidade (pragmática, moral e cognitiva) e estereótipos sobre os contadores presentes em uma obra cinematográfica, uma vez que, analisar os elementos de legitimidade são importantes para entender como os profissionais contábeis estão inseridos na sociedade, pois como afirmam Priebe, Manoel e Strassburg (2018), para ganhar o respeito da sociedade, o profissional precisa respeitar o que a sociedade espera deste.
2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
2.1 Elementos da Teoria da Legitimidade
Para Suchman (1995, p. 574), “legitimidade é uma percepção generalizada ou suposição de que as ações de uma entidade são desejáveis, adequadas ou apropriadas dentro de algum sistema de normas, valores, crenças e definições socialmente construídos”. Esse entendimento possui implicações, a saber, a questão da generalização. Para Suchman (1995), a legitimidade funciona como um guarda-chuva, sendo resiliente a eventos específicos, por mais que seja dependente de uma sequência de eventos, além de ser uma percepção ou suposição, pois representa a reação dos observadores à entidade da forma como a veem.
Desta forma, a legitimidade é conquistada objetivamente, mas é criada subjetivamente. É construída socialmente, depende de uma audiência coletiva, porém independe de observadores particulares. Sendo assim, uma organização pode se desviar dos valores individuais, mas ainda assim manter a legitimidade, pois o desvio não atrai a desaprovação pública (Suchman, 1995). Corroborando com esse pensamento, Zimmerman e Zeitz (2002) veem a legitimidade como um “julgamento social de aceitação, adequação e/ou desejo”. Deephouse e Suchman (2008) afirmam que a legitimação é o processo pelo qual a legitimidade de um sujeito muda ao longo do tempo.
Priebe, Manoel e Strassburg (2018) afirmam que as ações ou a maneira como as empresas ou profissionais executam o seu trabalho não é o primordial do ponto de vista da teoria da legitimidade, mas a forma como a sociedade julga ou percebe sua conduta. Suchman (1995) discerniu sobre três tipos amplos de legitimidade (Tabela 1), cada qual com uma dinâmica comportamental diferenciada:
| Tipos de legitimidade | Definição |
| Legitimidade pragmática | Se baseia na resposta imediata da sociedade envolvendo o profissional, ou seja, cada vez que são divulgadas informações, o profissional já espera respostas imediatas da sociedade. |
| Legitimidade moral | Reflete uma avaliação normativa positiva da organização e de suas atividades, buscando julgamentos sobre se a atividade é "a coisa certa a fazer". A legitimidade moral reflete uma lógica pró-social que difere fundamentalmente do interesse próprio estreito. |
| Legitimidade cognitiva | Objetiva a legitimação envolvendo o apoio afirmativo para uma organização ou sua mera aceitação como necessária e inevitável, com base em conceitos culturais tidos como certos. Assim, a legitimidade cognitiva é obtida mediante a compreensão social e não por interesse ou avaliação. |
Esses elementos de legitimidade são importantes para a análise dos estereótipos, pois tratam da forma como a sociedade percebe os contadores (legitimidade pragmática), como o indivíduo age (legitimidade moral) e o que é aceito no contexto (legitimidade cognitiva) (Suchman, 1995). O autor entende que a legitimação possui três grandes desafios: ganhar legitimidade; manter a legitimidade e recuperar a legitimidade. Para ganhar legitimidade, a entidade ou profissão necessita de aceitação em seu contexto social. Em contrapartida, para manter a legitimidade, a tarefa da empresa/profissional aparenta ser mais simples, pois basta que se perceba as mudanças futuras que podem ocorrer e proteger as realizações passadas. Por fim, para recuperar a legitimidade, a tarefa é muito semelhante à de obtê-la, no entanto, normalmente ela representa uma reação a uma crise de sentido.
No início do século XXI, escândalos de corrupção marcaram negativamente a profissão contábil, como os casos da Enron, Parmalat e WorldCom. A Enron realizou desvios de dívidas para associados e superestimação de lucros, enquanto a WorldCom ativou indevidamente 3,8 bilhões de dólares que deveriam ter sido contabilizados como gastos em contas de resultado (Kraemer, 2005). Já a Parmalat, repassava seus prejuízos e dívidas a uma subsidiária nas Ilhas Cayman e os excluía de suas demonstrações contábeis, o que, após ter vindo à tona, resultou em enorme prejuízo aos acionistas (Dapont, 2012). Entende-se, portanto, que a profissão contábil, devido aos recentes escândalos de corrupção ocorridos no início do século XXI, encontra-se em um estágio de busca pela recuperação de sua legitimidade.
2.2 Estereótipos do Contador
De acordo com Bastos (2015), um dos pioneiros da conceituação do termo “estereótipo” nas ciências sociais foi Walter Lippmann, em seu livro intitulado “Public Opinion”, de 1922. Para Lippmann (1922) apudLopes (2014, p. 7), os estereótipos são uma imagem simplificada do mundo, portanto, constituem generalizações, com o fim de satisfazer as necessidades de percepção do mundo de uma forma mais compreensível do que é na realidade. Assim, Lopes (2014) afirma que as pessoas se comportam com base nas suas percepções da realidade e não em como ela é, de fato.
Corroborando com isso, Costa (2011) afirma que é possível descrever um estereótipo como uma generalização de uma entidade social, como uma pessoa ou instituição, apresentando-se um conjunto de atribuições ou características que podem, geralmente, identificar e distinguir uma entidade da outra. Para Richardson et al. (2015), para que se faça um julgamento advindo dos atributos pertencentes a uma categoria, basta que alguém pertença a este grupo. A compreensão da imagem externa dos contadores é um passo importante para a apreciação de seus papéis num contexto social mais amplo (Carnegie & Napier, 2010). Um dos maiores desafios da contabilidade é, justamente, a sua imagem (Buffini & Cornell, 2005).
Dias e Martins (2005) descrevem que a sociedade compreende esse profissional como:
[...] um ser misterioso, não agrega valor, mas tem uma moral incrível com o dono, o acionista. Burocrático, muda de nome, passa a ser um controller, se embasa teoricamente. Vinculado a um processo extremamente simples, é visto como revestido de idoneidade. Entretanto, diz ser o contador aquele que sabe o custo de tudo e o valor de nada, é a pessoa a quem se pode dar um “jeitinho” (Dias & Martins, 2005, p. 26, grifos dos autores).
Verifica-se que a imagem do contador pode relacionar-se em um sentido positivo, como “[...] tem uma moral incrível” (Dias & Martins, 2005, p. 26), mas, também, em um sentido negativo, quando Dias e Martins (2005) referem-se ao profissional que “dá um jeitinho”, ou seja, aquele que, se preciso for, viola as leis para atingir os objetivos da organização. Enquanto a profissão de contador pareça precisar de uma legitimação pela sociedade, outras, como a de médico, advogado e engenheiro, por exemplo, se solidificam positivamente aos olhares populares (Splitter & Borba, 2014), pelo fato do status que estas profissões possuem.
No entanto, a imagem do contador contemporâneo vem passando por mudanças, saindo da imagem do profissional que realiza tarefas repetitivas para um profissional com habilidades analíticas e de julgamento crítico (Friedman & Lyne, 2001). Desta forma, o papel do contador passou a ser associado à melhoria no desempenho financeiro das empresas e à prestação de serviços de consultoria de alto padrão (Warren & Parker, 2009).
Para Guerra et al. (2011), o contador é conhecido como um profissional ético, responsável, amigo e que está em constante evolução em sua carreira. Em contrapartida, Silva e Flor (2013) identificaram o profissional contábil como limitado, pouco qualificado e sem entusiasmo por seu trabalho. Entre os estereótipos positivos relacionados à profissão contábil estão: inteligente; ético; responsável; bem-educado; honesto; dedicado aos estudos; comunicativo; preciso; analítico; competente; criativo e bom em matemática (Costa, 2011; Leal et al., 2014; Lopes, 2014; Splitter & Borba, 2014; Miranda et al., 2015; Pinto, 2016). Entretanto, em relação aos estereótipos negativos, a literatura cita: foco voltado a registros; submisso às normas; metódico; conservador; repetitivo; lento; monótono; solitário e introvertido (Costa, 2011; Leal et al., 2014; Lopes, 2014; Splitter & Borba, 2014; Miranda et al., 2015; Pinto, 2016).
Em seu estudo sobre o estereótipo dos contadores, Parker (2000, p. 50) observou o "estereótipo comum do contador (geralmente retratado como homem): introvertido, cauteloso, metódico, sistemático, antissocial e, acima de tudo, chato!". A imagem do contador pode ser percebida em dilemas éticos, uma vez que o contador pode ser tanto aquele profissional que protege as organizações de desvios de conduta por parte de outros gestores, devido à sua capacidade de dominar transações complexas, quanto aquele que, por este mesmo motivo, pode induzir à corrupção corporativa (Tonin et al., 2020).
De acordo com Silva e Silva (2012), a imagem do profissional contábil emana dos seguintes fatores: “(a) estereótipos negativos, (b) escândalos corporativos, (c) falta de informações sobre a importância do papel do contador perante a sociedade, (d) a metodologia de ensino dos cursos de graduação” (Silva & Silva, 2012, p. 2). Cory (1992) relata que os estereótipos negativos são modificados por meio do contato com um indivíduo que não se assemelha ao estereótipo. Diante disso, Davidson e Etherington (1995) e DeCoster e Rhode (1971) analisaram as personalidades dos contadores reais e determinaram que os estereótipos comuns dos contadores eram imprecisos, ou seja, o que se veicula sobre os contadores não é o que de fato ocorre. Corroborando com essa ideia, Denzin (1991) afirma que as representações do real se tornaram substitutos da experiência real vivida, fazendo, assim, uma analogia à influência da mídia sobre os valores sociais.
Outros estudos utilizaram vários adjetivos para descrever o contador, tanto positivos quanto negativos, como: pessoa honesta; confiável; íntegra; sem humor/com sentido de humor; invejoso; inteligente; ético; responsável; introvertido; antissocial; bom com matemática; excessivamente preocupado com a precisão e formalismo; com um trabalho chato; maçante; tedioso (Hoffjan, 2004; Felton, Dimnik & Bay, 2008; Gomes, 2009; Costa, 2011).
2.3 A Influência da Mídia
A mídia tem sido grande influenciadora da opinião pública e os filmes estão entre os objetos mais conhecidos da cultura popular moderna, proporcionando tanto reflexão quanto geração de valores sociais (Beard, 1994). Em seu estudo seminal, Beard (1994) enfatiza que os contadores aparecem como personagens centrais em filmes desde 1957. Smith e Briggs (1999) realizaram um estudo sobre a imagem dos contadores no cinema e concluíram que o estereótipo de contador chato que se tinha no passado, tem sido transformado para o de contador criminoso, consequência da associação com o jogo, lavagem de dinheiro, fraude e assassinato.
No sentido de influência da mídia, o estudo de Hunt, Falgiani e Intrieri (2004) trouxe um importante resultado, pois ao examinarem as impressões de contadores e não contadores sobre o profissional contábil, verificaram que as impressões mais negativas sobre contadores se relacionam àquelas formadas a partir de exposição a filmes, televisão e cursos de contabilidade. Um importante aspecto deste estudo foi o enfoque nas percepções em relação ao profissional de contabilidade, mas não em suas características pessoais, uma vez que os aspectos ligados à personalidade pessoal dos contadores obtiveram baixa pontuação pelos entrevistados, o que consiste num estereótipo do contador como um solitário competente, mas socialmente inepto.
Hunt, Falgiani e Intrieri (2004) ainda afirmam que a maioria dos estudos que enfocam as visões estereotipadas de contadores em filmes e ficção relatam representações negativas dos contadores. Tais visões retratam os contadores como deficientes em habilidades de comunicação e ética, inflexíveis, tímidos, incompetentes e antissociais (Holt, 1994; Smith & Briggs, 1999; Beard, 1994). Além disso, Hunt, Falgiani e Intrieri (2004) buscaram determinar as percepções ligadas a várias fontes, como cinema e televisão, aulas de contabilidade e contato com contadores, mencionando que isto foi essencial, do ponto de vista que para combater imagens negativas é preciso identificar como elas surgem.
Para Dimnik e Felton (2006), o cinema é um dos meios mais influentes sobre os estereótipos na sociedade. Em seu estudo, identificaram cinco estereótipos dos contadores: sonhador; trabalhador; excêntrico; herói e vilão. Destes “perfis”, Dimnik e Felton (2006) caracterizaram o contador sonhador como aquele inocente e otimista, tímido, pouco inteligente, mal-humorado. Já o trabalhador, caracteriza-se por ser pessimista, viciado em trabalho, sóbrio e mal-humorado. Como excêntrico, destacou-se o contador jovem, ativo, neurótico, estereótipo raro entre os profissionais. Em contrapartida, o contador herói é definido como aquele que é sensível, sincero, honesto, generoso, engraçado e atrativo. Por fim, o contador vilão seria frio, falso, desonesto e ganancioso.
Costa (2011) expõe que a maior parte dos estereótipos é adquirida por meio dos pais, escolas e mídia de massa, chamados pelos autores de canais de socialização. Refletindo sobre a influência da mídia, Oliveira e Carvalho (2013) afirmam que, em estados totalitários, como a União Soviética stalinista e o Brasil comandado pelo regime militar de 1964 à 1985, a censura e o controle rígido sobre o que se podia e não se podia falar e escrever para o público foram determinantes para que os ditadores alcançassem seus objetivos ideológicos. Por este motivo, o sonho de muitos políticos brasileiros é ter sua estação de rádio, emissora de televisão ou um jornal para que, assim, possam ter pleno acesso ao discurso público. Essas organizações da imprensa, portanto, possuem papel primordial na formação de opinião pública, a qual é fundamental na construção do senso comum, que veicula valores ideológicos “dos quais as pessoas geralmente não têm consciência” (Fairclough, 1989, p. 2 apudOliveira & Carvalho, 2013, p. 289).
Na tentativa de minimizar as deturpações relacionadas à imagem do contador, no ano de 2013, datado como o ano da contabilidade, o Conselho Federal de Contabilidade (CFC) promoveu uma campanha denominada “2013: Ano da Contabilidade no Brasil”. De acordo com o CFC (2013), alguns segmentos da mídia, como novelas e programas humorísticos, abusam de seus poderes, apresentando o profissional contábil de forma distorcida e irresponsável. Desta maneira, o presente trabalho vai ao encontro com esta campanha, uma vez que busca demonstrar como o profissional contábil é caracterizado pela mídia, entendendo que a formação da imagem veiculada pode tanto difamar, quanto enaltecer as características dos contadores.
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
Por utilizar dados de fontes primárias, esta pesquisa caracteriza-se como documental, uma vez que, diferentemente da pesquisa bibliográfica, onde se tem contribuições de diversos autores sobre o fenômeno estudado, na pesquisa documental os materiais sob foco ainda não receberam tratamento analítico (Oliveira, 2007). Desta forma, as falas das personagens foram transcritas literalmente, o filme foi assistido três vezes, na tentativa de descrever e analisar os significados presentes além do conteúdo verbal, como as expressões faciais e comportamentais. Quanto aos objetivos, identificou-se como descritiva, pois buscou descrever o fenômeno em análise e interpretar a realidade (Appolinário, 2011). Quanto à abordagem do problema, a pesquisa classificou-se como qualitativa, pois esse tipo de pesquisa visa entender, descrever e explicar os fenômenos sociais como base, por exemplo, em documentos como textos, imagens ou filmes (Flick, 2009).
Para a coleta dos dados, primeiramente foi realizado o download das legendas do filme em português, em formato docx. e, posteriormente, foi assistido pelos autores, identificando cada fala com o personagem correspondente, seguindo a sequência do filme. Após isso, foi conferido se as legendas estavam de acordo com o apresentado no filme dublado. A interpretação dos resultados foi realizada por todos os autores em conjunto, passando pela revisão dos orientadores e discussão sobre as análises realizadas. Para a análise das transcrições de acordo com as categorias formadas a priori, foi utilizado o software Atlas.ti, versão 7.5.7.
O constructo da pesquisa, responsável pela formação, a priori, das categorias e subcategorias de análise deste estudo encontra-se na Tabela 2. Tal constructo, foi construído durante o levantamento do referencial teórico, a partir dos elementos apontados pelos autores referenciados que caracterizam as categorias mencionadas.
| Categorias | Definição Constitutiva das Categorias | Subcategorias | Definição Constitutiva das Subcategorias | Base teórica |
| Legitimidade | Normas, valores, crenças e definições socialmente construídas e padrões criados (Suchman, 1995) | Legitimidade pragmática | Respostas imediatas da sociedade (como a sociedade percebe). | Suchman (1995) |
| Legitimidade moral | A legitimidade moral reflete uma lógica pró-social que difere fundamentalmente do interesse próprio estreito (como o indivíduo age). | Suchman (1995) | ||
| Legitimidade cognitiva | Conceitos culturais tidos como certos. A Legitimidade Cognitiva é obtida mediante a compreensão social (o que é aceito no contexto). | Suchman (1995) | ||
| Imagem(estereótipos pré-existentes) | A imagem do profissional contábil, sob a ótica da percepção popular, está atrelada a características como: organizados, responsáveis, com bons conhecimentos de matemática e tributação, competentes, inteligentes, educados e, também, maus conselheiros de negócios, monótonos, sedentários e aborrecidos. (Lopes, 2014) | Gênero | Elemento constitutivo de relações sociais baseado nas diferenças percebidas entre os sexos (Scott, 1990). | Parker (2000), Sugahara e Boland (2006). |
| Habilidades sociais (educação, empatia...) | Comportamentos sociais valorizados em determinada cultura, que podem contribuir para um desempenho socialmente competente em tarefas interpessoais (Del Prette & Del Prette, 2017). | Beard (1994), Holt (1994), Smith & Briggs (1999), Parker (2000), Hoffjan (2004), Hunt, Falgiani e Intrieri (2004), Sugahara e Boland (2006), Felton, Dimnik & Bay (2008), Gomes (2009), Costa (2011). | ||
| Habilidades cognitivas (inteligência, capacidades técnicas...) | Capacidade que permite ao sujeito interagir com o meio, envolvendo processos mentais (Gatti, 1997). | Sugahara e Boland (2006), Hoffjan (2004), Felton, Dimnik & Bay (2008), Gomes (2009), Costa (2011). | ||
| Personalidade (bem/mal humorado, temperamento...) | Tendência disposicional do indivíduo para agir de determinada maneira ao longo do tempo em diferentes circunstâncias (Malloy-Diniz et al., 2018). | Parker (2000), Hoffjan (2004), Dimnik e Felton (2006), Felton, Dimnik & Bay (2008), Gomes (2009), Costa (2011). |
Para a análise e interpretação dos dados, utilizou-se a Análise de Conteúdo proposta por Bardin (2010), do tipo análise categorial, que opera por desdobramento de textos em unidades, categorizando os dados por meio de reagrupamentos analógicos (Bardin, 2010). Diante do constructo apresentado, infere-se que a codificação é a parte central da análise dos dados. A análise categorial realizada foi guiada pelos passos descritos por Bardin (2010):
a) Pré-análise: seleção do material que foi analisado (transcrição do filme) e leitura detalhista;
b) Codificação: transformação dos dados brutos da transcrição, utilizando registros que posteriormente foram agrupados, através do software Atlas.ti;
c) Categorização: organização e classificação da transcrição das falas em unidades de registro, ordenando o material baseado no constructo previamente definido, a partir da literatura;
d) Interpretação: análise inferencial dos dados coletados e organizados.
Como verifica-se na Tabela 2, o constructo da pesquisa foi elaborado com base em duas categorias: a legitimidade, a qual divide-se em legitimidade pragmática, moral e cognitiva; e a imagem, ou seja, os estereótipos pré-existentes, os quais abrangem os gêneros, habilidades sociais e cognitivas e a personalidade.
4 RESULTADOS
4.1 Contexto do Filme “O Contador”
O filme intitulado “O Contador” explora a história de um menino chamado Christian Wolff (interpretado por Ben Affleck), diagnosticado com autismo, ainda em sua infância. Mesmo assim, seu pai não deixa que ele vá para uma clínica especializada para tratar de seu transtorno, pois para ele, seu filho deve se habituar ao mundo que o cerca. Na vida adulta, ele se torna um excelente contador (em relação à sua capacidade técnica), realizando serviços de consultoria e auditoria contábil para seus clientes. No filme, é evidente sua facilidade em lidar com números, no entanto, seu comportamento revela traços antissociais, que se assemelham com a de contadores ilustrados em outras obras cinematográficas, como nos filmes analisados por Tavares & Dantas (2017), onde os contadores são tidos como incomunicativos.
Christian Wolff possui um escritório de contabilidade em uma cidade do interior dos Estados Unidos, o qual utiliza com o fim de trabalhar para organizações criminosas, lavando dinheiro com cautela, o que enfatiza a questão da falta de ética de alguns contadores, verificada no estudo de Dimnik e Felton (2006), que afirmam que a grande circulação de publicidade envolvendo escândalos contábeis manchou a imagem pública dos contadores. Seu envolvimento com o crime se iniciou após ele ter sido preso, devido a uma confusão causada juntamente com seu pai no velório de sua mãe. Na prisão, ele conhece Francis, um homem que havia fraudado a contabilidade de uma família por mais de 40 anos, o qual se tornou seu mentor de lavagem de dinheiro enquanto estava preso.
Contudo, tempos depois, o contador é chamado para realizar um trabalho que não apresenta envolvimento com crimes, em uma empresa de robótica, após a auxiliar contábil Dana Cummings (interpretada por Anna Kendrick) ter percebido algo estranho nas contas da empresa. A partir disso, a trama se desenvolve na busca por soluções contábeis, mas também, o passado de Christian vem à tona.
4.2 Elementos de Legitimidade (pragmática, moral e cognitiva)
A legitimidade é uma percepção generalizada de que as ações de uma entidade ou indivíduo são desejáveis, adequadas ou apropriadas dentro de algum sistema de normas, valores, crenças e definições socialmente construído (Suchman, 1995). Os elementos de legitimidade pragmática estão relacionados com a maneira como a sociedade percebe um indivíduo, neste caso, os profissionais da área contábil. Em uma das falas da auxiliar contábil, ela menciona:
o meu pai era um contador. Na verdade... Ele era das antigas sabe. Ele... andava com o livro de amortização e viseira verde. Ele usava aquele protetor de bolso de nerd e....
A visão da auxiliar sobre o contador é confirmada por estudos anteriores que encontraram que os profissionais da área contábil são geralmente representados como uma pessoa de meia-idade, careca, caucasiana e antiquada, além de comumente associados a pessoas que usam viseiras, óculos e suspensórios (Dimnik & Felton, 2006; Oliveira, 2007; Curty & Tavares, 2014; Oliveira, 2014; Vicente & Machado, 2014; Moura et al., 2016). No caso do filme “O contador”, Christian é jovem, não é careca, é caucasiano e não é antiquado. A auxiliar contábil também é jovem, não é careca, é caucasiana e, também não é antiquada.
Ademais, o presidente do Tesouro Nacional dos Estados Unidos busca condenar o contador pelos seus crimes (pois ele havia fugido da prisão antes de cumprir sua pena). Para isso, ele ordena que uma analista do Tesouro o procure. Ao descrever Christian Wolff, o presidente diz:
Certo. Digamos que é a chefe do Cartel de Sinaloa. Eles contam a fortuna deles pelo peso de caminhões cheios de dinheiro. Mas, em um ensolarado dia mexicano, seu lavador chega e te diz que você perdeu US$ 30 milhões. A quem você confia uma auditoria e rastreio do dinheiro roubado? Deloitte e Touche? H&R Block? Você, de alguma forma, contata um indivíduo capaz de entrar em uma fria, revisando anos de contas, e saindo vivo.
Essa fala passa uma visão de confiança sobre a ética de empresas de auditoria, como no caso citado da Big Four Deloitte e Touche. Porém, uma visão de que os contadores que não possuem grande prestígio da sociedade podem facilmente se vender para criminosos a fim de conseguir melhores honorários, fragiliza a imagem dos contadores independentes perante o quesito da ética para a sociedade.
Além disso, quando é demonstrado o passado do contador, quando estava preso em uma penitenciária de segurança máxima, seu mentor de crimes lhe diz: “Se quiser preencher formulários, deduções fiscais, ganhando 50 mil por ano, é um modo de vida. Mas se você escolher esse caminho... não tem volta. É perigoso, entende?”. Assim, o contador é instruído a buscar trabalhos criminosos, mas que possam lhe garantir mais dinheiro. Essa questão corrobora com o achado de Smith e Briggs (1999), em que a imagem dos contadores no cinema, que antigamente era de uma personalidade chata, agora tem se transformado para o de contador criminoso, consequência da associação com o jogo, lavagem de dinheiro, fraude e assassinato, práticas realizadas pelo contador durante boa parte do filme.
Essas cenas do filme reforçam os estereótipos encontrados nos estudos de Felton, Dimnik & Bay (2008) e Tavares & Dantas (2017), onde os contadores eram vistos como gananciosos e ambiciosos, que buscam poder e riqueza, contrariando os resultados encontrados no estudo de Guerra et al. (2011), que são vistos como “um amigo responsável e ético”.
No que diz respeito à capacidade técnica do contador, a sociedade o percebe como um indivíduo inteligente, competente e confiável, como é mencionado nos estudos de Dimnik & Felton (2006), Vicente & Machado (2014) e Moura et al. (2016). Isso confronta a visão do diretor financeiro da empresa em que ele inicia a auditoria, duvidando de sua capacidade, quando ele diz:
Nosso sistema de contabilidade é muito complicado, cálculos de depreciação de centenas de itens, empregados terceirizados e da casa, contas confidenciais do Departamento de Defesa. Uma loucura numérica.
Em contrapartida, o contador é firme e demonstra que possui conhecimento, demonstrando habilidades cognitivas, além das mencionadas anteriormente, como organizado e metódico, estereótipos também vistos nos estudos de Dimnik & Felton (2006), Vicente & Machado (2014) e Moura et al. (2016), ao respondê-lo da seguinte forma: “Quero ver todos os livros dos últimos 10 anos, extratos bancários, lista de clientes, fornecedores, em cópias físicas, só para mim.”.
Após o contador descobrir que de fato havia desvios de recursos na empresa Living Robotics, o diretor financeiro comete suicídio. O dono da empresa (Lamar), que era muito amigo do diretor financeiro, fica furioso e manda Christian embora. Além disso, Lamar contrata um “matador de aluguel” (Braxton, irmão de Christian) para que elimine o contador e a auxiliar. Diante disso, uma cena interessante para analisar como a sociedade percebe o contador, é quando Braxton fala ao telefone: “Desde quando é difícil eliminar contadores? Morto? O que ele fez, matou-lhe com uma calculadora? Coloque-me em contato com o cliente. Eu mesmo vou cuidar desse contador”. Já quando a auxiliar contábil e o contador estão se escondendo para não serem mortos, a auxiliar pergunta: “Por que seus clientes te seguiriam? Você é um contador”. Isso mostra a visão “correta” de contadores que as pessoas têm, diferentemente da pessoa criminosa que é demonstrada no transcorrer do filme.
Já a legitimidade moral está ligada ao fato de como o indivíduo age, considerando o que é correto pelo grupo (Suchmann, 1995). No filme, é possível observar diferentes ações por parte do contador quanto à questão ética (conflitantes entre elas, inclusive), como o sigilo entre os trabalhos realizados entre um e outro cliente e obtenção de vantagens ilícitas aos seus clientes, como é detalhado a seguir. Ao realizar a reunião com o diretor financeiro e a irmã do dono da empresa em que havia um suposto desvio de dinheiro, em que foi questionado sobre os motivos de que outro cliente tenha o indicado para o trabalho e no que ele foi útil para aquele, o contador responde: “Não discuto negócios de clientes”, demonstrando, assim, a ética em relação ao sigilo de informações de outras empresas. Essa característica corrobora com as indicações das investigações de Dias e Martins (2005), Guerra et al. (2011) e Reis et al. (2015), nas quais os contadores são vistos como profissionais idôneos e éticos.
Contudo, no início do filme o contador diz ao casal de clientes que é possível conseguir um desconto nos impostos a partir do percentual do cômodo relativo à área total da casa. Até este momento o contador demonstra ética em sua prática, pois trata-se de uma elisão fiscal, ou seja, uma prática legal para reduzir ou postergar o pagamento de impostos. No entanto, quando seu cliente responde que o cômodo tem aproximadamente 20m², o contador faz um sinal para que ele aumente e, assim, o cliente finaliza sua fala dizendo que tem 30m.. Assim, o contador estaria agindo para obter vantagens ilícitas aos seus clientes, uma vez que o tamanho do cômodo influencia no desconto do imposto. Essa visão corrobora com o estudo de Dias e Martins (2005), no qual o contador é visto como um profissional que “dá um jeitinho” para conseguir clientes e satisfação nos resultados de seu trabalho.
Em mais um trecho que enfatiza a criminalidade do contador, em uma lembrança do período em que ele estava preso, seu companheiro de cela (Francis) lhe diz “dois anos juntos todas as noites. Te tornei PhD em dinheiro sujo”. Mais uma vez, portanto, é possível observar problemas éticos na conduta do profissional contábil. Azevedo e Cornachione (2012) aduzem que, se as pessoas ligam a área contábil a práticas eticamente duvidosas ou, ainda, a ações que não possuem comprometimento social, aqueles estudantes que valorizam a ética e a responsabilidade social podem evitar obter esse tipo de formação e, desta forma, procurar outros cursos de graduação.
O contador também é demonstrado em cenas de crime durante o filme, como no caso em que a analista do Tesouro procura pistas do contador, e seu assistente, Sorkis, encontra uma gravação em que o contador mata várias pessoas a sangue frio, como relatado pelo próprio assistente:
2006, seu cara nocauteia dois invasores com uma faca de carne que ele roubou de um restaurante italiano. Ele inicia uma série de assassinatos a sangue frio matando 7 de uma vez. Usando as armas das vítimas.
Os elementos de legitimidade cognitiva, por sua vez, dizem respeito ao que é aceito no contexto, ou seja, o que a sociedade aceita. Um dos fragmentos observados na fala do cliente do contador no início do filme, após ele conseguir a redução de impostos para o casal de agricultores, é: “Como eu disse, filho, você está convidado para nossa casa. Você pesca? Eu tenho um lago cheio de peixes-gato e robalos.”.
O contador então responde que não pesca, mas que gosta de atirar. Então, num outro dia, aparece atirando na casa do campo de seus clientes. Esse envolvimento com os clientes pode induzir o profissional a continuar realizando evasões fiscais para lhes gerar vantagens indevidas, uma vez que a proximidade entre ele e seus clientes pode tornar difícil a separação entre os interesses pessoais e profissionais. Sobre isso, o Conselho Federal de Contabilidade (CFC), através da Norma Brasileira de Contabilidade (NBC) PA 400 (2019) dedica uma seção (420), que trata sobre presentes e afins, expondo que “a aceitação de presentes e afins de cliente de auditoria pode criar ameaça de interesse próprio, de familiaridade ou de intimidação”. Assim, a conduta realizada pelo contador, o qual realiza também trabalhos de consultoria e auditoria, não está em acordo com as Normas Brasileiras de Contabilidade, banalizando essa importante norma de conduta. Isso vai ao encontro do que Carnegie e Napier (2010) aduzem em seu estudo, em que a figura do contador é vista como um indivíduo que agrada o cliente com facilidade.
Outra questão que evidencia a legitimidade cognitiva é o fato de que a auxiliar contábil não trabalha com aquilo que realmente gosta, pois segundo ela “Ele [pai da auxiliar] me convenceu a ir para o campo [Ciências Contábeis]. Porque eu queria estudar arte no Instituto de Chicago, mas... arte não paga a hipotéca. Arte não paga a hipotéca, mocinha" [Imitando seu pai]. Assim, entende-se que o curso foi escolhido devido à facilidade de encontrar empregos e possuir uma situação financeira confortável, o que pode levar ao fracasso profissional, pela falta de interesse nas matérias estudadas. Ainda, possibilita a formação de um profissional corrupto pelo desvio do interesse privado acima do interesse público e princípios éticos, como orienta a seção 100 da NBC PG 100 (R1) (2019).
A Tabela 3 apresenta de forma resumida as análises apresentadas nesta seção:
| Subcategorias de análise | Elementos de legitimidade analisados |
| Pragmática (como a sociedade percebe um indivíduo) | A sociedade percebe os contadores como pessoas que usam viseiras verdes, óculos e que andam com livros de amortização, visão corroborada pela auxiliar contábil. No filme, no entanto, o contador não utiliza esses acessórios, exceto os óculos. |
| Há confiança da sociedade sobre a ética de grandes empresas de auditoria, no entanto, a visão que se tem dos contadores é que eles podem facilmente se vender para criminosos para conseguir melhores honorários. | |
| Para que consiga mais dinheiro, o contador é instruído a buscar trabalhos criminosos (estereótipo ganancioso e ambicioso). | |
| Por mais que a sociedade duvide da capacidade do contador, ele demonstra no filme que possui conhecimento e capacidade técnica. | |
| As pessoas possuem uma visão “correta” dos contadores, diferentemente do seu comportamento criminoso durante o filme. | |
| Moral (como o indivíduo age) | Ações conflitantes em relação às questões éticas, pois em determinados momentos o contador demonstra sigilo nas informações entre seus clientes, mas em outros, busca a obtenção de vantagens ilícitas com seus clientes. |
| O contador é visto como um profissional que “dá um jeitinho”. | |
| O contador tornou-se “PhD” em dinheiro sujo. | |
| Cognitiva (o que é aceito no contexto) | A figura do contador é vista como um indivíduo que agrada o cliente com facilidade. |
| O curso de Ciências Contábeis foi escolhido pela auxiliar contábil devido à facilidade de encontrar empregos e possuir uma situação financeira confortável, não por afinidade com a profissão. |
Na próxima subseção, são analisados os estereótipos pré-existentes do contador, que formam sua imagem perante a sociedade, no que diz respeito ao gênero, habilidade sociais, habilidades cognitivas e personalidade.
4.3 Imagem (estereótipos pré-existentes)
A imagem do profissional contábil, sob a ótica da percepção popular, está atrelada a inúmeras características (Lippmann, 1922 apudLopes, 2014, p. 7), as quais são apresentadas no filme e discutidas a seguir, tanto positivas como negativas, em relação à imagem da classe contábil.
Em relação à questão da igualdade de gênero, no filme percebe-se que há uma relativa discrepância entre as funções de homens e mulheres na contabilidade, uma vez que o contador, aquele que foi chamado pela empresa para encontrar o suposto desvio de recursos é um homem, enquanto a imagem da mulher foi encenada por uma auxiliar contábil que havia percebido algo estranho nas contas da empresa, mas que não tinha certeza do que viu e por isso tiveram que contratar o contador, demonstrando, assim, a falta de capacidade dessa profissional e descrédito por parte do diretor financeiro, como fica evidente em sua fala: “Uma contadora júnior enfiou o nariz onde não devia e certamente não tem ideia do que viu”. Além disso, apenas esta mulher é demonstrada no filme como alguém que trabalha na profissão contábil, sendo que todas as demais relações que envolvem a empresa principal do estudo se dão entre homens. Estudos como o de Devonport (2008) revelam que, apesar das mulheres terem se destacado mais na profissão nos últimos 100 anos, ainda não alcancaram a igualdade frente aos profissionais do sexo masculino. Além disso, Sugahara e Boland (2006) enfatizam que estudantes não contadores percebem a profissão como sendo dominada por homens. Já o estudo de Moura et al. (2016), os quais realizaram sua análise sobre três filmes, verificaram no filme mais recente, datado do ano de 2008, a representação do profissional contábil por uma personagem feminina, destacando que isso pode representar uma tendência à desmitificação da imagem tradicional do profissional contábil. Além disso, afirma-se que desde o início dos anos 2000, as mulheres são a maioria nos cursos de Ciências Contábeis.
Quanto às habilidades sociais, uma característica notável é a forma fria com que trata as pessoas, sendo muito direto, assim como é mencionado no estudo de Beardslle & O’Dowd (1966). Isso fica evidente no tratamento que ele dá à auxiliar contábil, quando ela apenas está tentando lhe oferecer ajuda: “O que você quer, Dana Cummings?”.
Já em relação às habilidades cognitivas, ao ser perguntado pelo dono da empresa sobre quais são as fontes de renda da empresa, o contador responde uma a uma, com riqueza de detalhes, o que lhe impressiona. Além disso, o dono da empresa diz que “minha mente não funciona do jeito que a sua funciona”, aduzindo assim as habilidades sistemáticas e matemáticas do contador.
Do ponto de vista das habilidades cognitivas, verifica-se que a auxiliar contábil, assim como o contador, também é muito organizada: “São os arquivos que queria, e organizei por ordem de ano e alfabética”. Essa característica vai ao encontro da pesquisa de Taylor e Dixon (1979).
É do senso comum pensar que porque alguém cursa Ciências Contábeis possui muita habilidade matemática, o que nem sempre é verdade, tanto que o curso é classificado como uma Ciência Social Aplicada. Desta forma, muito do que se estuda no curso envolve outros aspectos, que nem sempre estão ligados diretamente à matemática. No entanto, assim como em outros estudos, a imagem do contador é vinculada como alguém que possui muita facilidade com cálculos, como pode ser observado na Figura 1, em que na cena do filme o contador realiza, em apenas uma noite, cálculos de 15 anos fiscais, demonstrando tudo isso com a seguinte fala:
Entre, entre. Precisa ver isso. Olhe isso. Vai surpreendê-la. Digo, vai... Pular em cima de você. Aí está. Living Robotics, 10 anos atrás, lucro antes da amortização fiscal, US$ 14.495.719. Nove anos atrás, ganho antes da amortização fiscal. Receitas sobem, lucros despencam. Como? Sem grandes despesas de capital desmotivando lucros. Sem aumento de matéria-prima ou custo de trabalho. 8 anos atrás, lucros e receitas sobem, mas não de forma comparável. X não é igual a Y. 6, 5, 4, 3. Você está fazendo dinheiro, mas há um vazamento. O vazamento é... O vazamento. Onde está o vazamento?

A cena chama a atenção de quem assiste, pelo raciocínio lógico apurado do contador e pela facilidade com matemática, a qual vai ao encontro aos estudos de Costa (2011), Lopes (2014), Pinto Júnior (2015) e Gomes, Walter & Soutes (2020). Ainda, em outro momento, a auxiliar lhe pergunta quanto é 298.567 vezes 92 e prontamente o contador responde: “Dá 27.468.164”. Outros elementos traçados pelo estudo de Lopes (2014) são observados no filme, como a questão da organização, conhecimento fiscal, competência em sua função e inteligência. Em contrapartida, algumas características negativas visualizadas no estudo de Lopes (2014) não foram encontradas no filme, como sedentarismo, pois o contador possui um porte físico atlético e se exercita com frequência. Quanto a auxiliar contábil, não foi possível observar esses aspectos.
Finalmente, quanto à personalidade, no intervalo do trabalho para o almoço, o contador e a auxiliar contábil conversam e, nessa cena, percebe-se a falta de senso de humor do contador, quando ela faz piadas e ele não entende, buscando uma razão lógica para responder a sua piada. Tal senso é encontrado também nos estudos de Dimnik e Felton (2006), em que o mau humor aparece em dois perfis traçados pelos autores (sonhador e trabalhador).
No início do filme também é possível identificar um traço de personalidade do contador, no que diz respeito à sinceridade, pois o contador olha para uma senhora que é sua cliente e que tem um colar, o qual ela mesmo fez e, quando questionado se gostou, ele responde: “não, não particularmente”. Essa personalidade é identificada no estudo de Cobb (1976), em que o contador é visto como uma pessoa desagradável, e no estudo de Smith e Briggs (1999) em que é caracterizado como deselegante. Além disso, quando o contador está conhecendo a empresa em que realizará o serviço de auditoria, o dono da empresa vendo um de seus pacientes colocando uma prótese, chega ao lado do contador, que também está vendo a mesma cena e diz: “O que acha que aquele jovem está pensando agora? “Por que ainda sinto meu braço?” “Como tudo deu errado tão rapidamente?”. E o contador, em sua sinceridade quase que “anormal” comenta que o jovem deve estar pensando: “Está frio. Aumente a temperatura.”. Essa característica, de sinceridade, pode ser vista nos estudos de Carnegie & Napier (2010).
Por conta do autismo, o contador tem muita dificuldade em aceitar deixar uma tarefa de lado sem terminá-la. Antes que o contador terminasse a auditoria, o diretor financeiro da empresa auditada comete suicídio, como já mencionado anteriormente, o que deixa o dono da empresa muito triste e ele decide que não quer mais que seja feita a auditoria, pois o diretor financeiro era um grande amigo seu e, qualquer que fosse seu crime, estaria perdoado. Diante disso, ele solicita a equipe de limpeza que apague todas as anotações que o contador fez durante a noite anterior e, durante a limpeza, o contador chega na empresa e fica furioso com aquilo: “Mas não terminei ainda!” [...] É difícil dizer por que as pessoas fazem o que fazem. Isso... Eu não terminei. Olhe isto. Estes relatórios, todos fora de ordem. Mudaram totalmente a ordem. Eu não... Eu não terminei ainda”. Essa característica é vista também nos estudos de Maslow (1965), Taylor & Dixon (1979) e Yeager (1991), em que o contador é caracterizado como obsessivo por exatidão, metódico e objetivo.
A Tabela 4 apresenta de forma resumida as análises apresentadas nesta seção:
| Subcategorias de análise | Imagens (estereótipos pré-existentes) analisadas |
| Gênero | Discrepância entre as funções de homens e mulheres. |
| Habilidades sociais | O contador trata as pessoas de forma fria, sendo muito direto. |
| Habilidades cognitivas | Habilidades sistemáticas e matemáticas do contador. A auxiliar contábil também é muito organizada. |
| Raciocínio lógico e apurado do contador. Possui conhecimento fiscal, competência em sua função e inteligência. | |
| Porte físico atlético do contador, diferentemente da visão encontrada em outros estudos. | |
| Personalidade | Falta de senso de humor do contador. |
| Sinceridade. | |
| Dificuldade em aceitar deixar uma tarefa de lado sem terminá-la. |
Com isso, percebe-se que a maioria dos estereótipos pré-existentes dos contadores em estudos anteriores são corroborados com a análise do filme “O Contador”, uma vez que somente o porte físico do contador não é sedentário, como citado em outras obras, e a discrepância entre funções de homens e mulheres, onde não há convergência entre os estudos anteriores.
5 CONCLUSÃO
A partir da análise do filme “O Contador”, os elementos da Teoria da Legitimidade (pragmática, cognitiva e moral) puderam ser observados na forma como a sociedade percebe os profissionais contábeis, como os contadores agem e o que é aceito no contexto, além de evidenciar os estereótipos do contador na obra cinematográfica. Diante disso, viu-se que a mídia demonstra como a sociedade percebe um indivíduo, no caso, o profissional contábil, embora essa visão possa ser deturpada em relação aos contadores reais.
Os principais achados quanto à legitimidade pragmática aduzem ao fato de que a sociedade percebe os contadores com uma visão “correta”, no entanto, o comportamento do contador durante o filme reflete ações criminosas, gananciosas e antiéticas. Além disso, a capacidade do profissional é questionada durante o filme, porém, o contador demonstra que possui conhecimento e capacidade técnica. Quanto à legitimidade cognitiva, o contador é visto como um indivíduo que agrada o cliente com facilidade e que o curso de Ciências Contábeis pode ser escolhido devido à facilidade de encontrar empregos e possuir uma situação financeira confortável, não por afinidade com a profissão. Em relação à legitimidade moral, foram observadas ações conflitantes em relação as questões éticas por parte do contador, o qual tornou-se especialista em dinheiro sujo.
Além disso, em relação aos estereótipos pré-existentes que formam a imagem do contador na mídia, foi possível observar que em relação ao gênero, há discrepância entre as funções de homens e mulheres. Em relação às habilidades sociais, observa-se que o contador trata as pessoas de forma fria, sendo muito direto. Já em relação às habilidades cognitivas, o contador é identificado como um profissional com habilidades sistemáticas e matemáticas, além de raciocínio lógico apurado, conhecimento fiscal, competência em sua função e inteligência. Diferentemente da visão encontrada em outros estudos, em que o contador era identificado como alguém sedentário, o contador interpretado no filme possui porte físico atlético. Por fim, quanto à personalidade, analisa-se a que o contador é muito sincero, não tem senso de humor e tem dificuldade em aceitar deixar uma tarefa de lado sem terminá-la.
Como contribuição teórica, nota-se que a pesquisa aborda questões verificadas no filme que não condizem com os achados de outros estudos, principalmente aqueles que foram realizados de maneira empírica, demonstrando o estereótipo de contadores da vida real. Essas divergências ocorrem em relação à forma como a sociedade percebe o contador, como alguém que usa viseiras verdes e livros de amortização, possui atitudes éticas, não demonstra capacidade e é sedentário, percepções que foram contrariadas pelo filme. No entanto, foram confirmados os resultados de estudos anteriores que descreveram os contadores como profissionais que “dão um jeitinho”, que possuem altas habilidades matemáticas, competência, inteligência e sinceridade. Portanto, essa pesquisa tem como contribuição prática o combate a imagens negativas da profissão contábil, pois buscou identificar como elas surgem, conforme orientado por Hunt, Falgiani e Intrieri (2004). Ainda, este estudo pode ser útil para que os estudantes que estejam no período de escolha de suas profissões possam analisar com maior criticidade o que a mídia veicula a respeito da profissão contábil.
Por fim, sugere-se para estudos futuros que seja realizada a análise tanto de contadores, como não contadores que assistiram ao filme e qual a visão que eles tiveram do profissional contábil através deste, preferencialmente com o uso de entrevistas, para que se possa captar profundamente os significados de suas visões.
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